TRIBUTO AO POETA 2008

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apreensível pela melodia e pela intenção comunicadora. Lembremo-nos das recitações do poema O Rio… Por seu cunho clássico, por sua reconhecibilidade ou sentido identitário. Seus textos não se esgotam na leitura nem na audição, evocam mais do que declaram, despertam sentidos telúricos, encarnados na audiência. Não é um poeta “filosófico” – como pretende ser a maioria de nossos poetas nacionais, pelo discurso lógico e persuasivo. É um poeta de formas de linguagem, de imagens reconhecidas por sua permanência em nosso imaginário. Na origem da poesia castelhana – que o nosso bardo pernambucano conhecia muito bem, por ter vivido tanto tempo na Espanha – está a contraposição da poesia “popular” (juglaresca) com a “culta” (ou culterana). Berceo foi um dos culteranos. Don Luis de Góngora y Argote (15611627), o mais maneirista de todos, o do barroco mais preciosista. Berceo, no entanto, acabou sendo incluído no repertório dos trovadores mambembes de seu tempo, enquanto Gôngora deve ter ficado confinado às rodas palacianas. João Cabral conseguiu sair das torres de marfim de uma poesia escultórica para povoar os palcos e as ondas hertzianas de nossos tempos.

RESPOSTA A VINICIUS DE MORAES Camarada diamante! Não sou um diamante nato nem consegui cristalizá-lo: se ele te surge no que faço será um diamante opaco de quem por incapaz do vago quer de toda forma evitá-lo, senão com o melhor, o claro, do diamante, com o impacto: que incapaz de ser cristal raro vale pelo que tem de cacto. Falsa modéstia… Chamado de diamante, J.C se define como cacto… Cacto e diamante, na sua cosmogonia, são estados de uma mesma condição de mineral… J.C se define claro e ao mesmo tempo opaco”.. Não conseguiu “cristalizar” o poema quem é incapaz de ser vago, que é de impacto. Incapaz do cristal raro mas que vale pelo que tem de cacto, de conciso, com o melhor do diamante… Outro poeta que J.C. estuda é Don Francisco de Quevedo (1580-1645), que viveu nos anos em que as coroas castelhana e portuguesa estiveram unificadas por matrimônio), um dos fundadores do esperpentismo.

A QUEVEDO Hoje que o engenho não tem praça, que a poesia se quer mais que arte e se denega a parte do engenho em sua traça

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Biblioteca Nacional de Brasília Tributo ao Poeta


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