O guardiao da meia noite rubens saraceni

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causa de um preconceito mesquinho! Em breve chegamos ao lugar onde havíamos deixado nossas bagagens. Apanhamos tudo e continuamos a caminhada. Quando chegamos nas canoas fizemos uma rápida refeição e partimos. A volta foi mais difícil, pois agora remávamos contra a correnteza. Navegamos até o entardecer. Quando o sol já se punha no horizonte, paramos à margem do rio num lugar de fácil acesso. O cozinheiro preparou o jantar. Todos estávamos em silêncio. Não havia mais as brincadeiras ou as gargalhadas da ida. Todos experimentavam o gosto amargo da louca aventura. Sim, que loucura! O saldo da expedição tinha sido uma aldeia inteira chacinada. Aquilo pesava em minha consciência como nada até aqueles dias. Não conseguia esquecer a cena dos homens varando os corpos dos indígenas já feridos. Matar alguém numa luta, eu aceitava como normal, mas aquilo não! Já era noite quando todos se preparavam para dormir. Alguns ficariam vigiando. tínhamos que descansar, pois agora era cansativo remar. Já não tínhamos mais tanto peso nas longas canoas, mas isto não facilitava em nada a volta, principalmente porque o rio, naquela região, tinha uma forte correnteza. Eu, como estava com minha esposa, afastei-me dos homens. Temia que viessem a fazer com ela o que fizeram com outras brancas e índias. Alguns haviam se apossado das poucas brancas que trazíamos de volta e isto deixou os outros com olhos de desejo incontido. Quando estávamos afastados do grupo, estendi uma manta embaixo de uma árvore com galhos até o solo. Poderíamos ficar ali durante a noite, sem sermos vistos do acampamento. Ia deitar-me, quando ela me pediu para acompanhá-la até a margem do rio. - O que você quer fazer lá? - Preciso lavar-me. Fazem quatro dias que não passo uma água no corpo, sinto-me imunda. - Eu não me lavo há semanas também. Vou com você. - Preferia entrar na água sozinha. - Fique tranqüila, não vou incomodá-la. Eu havia entendido sua insinuação. Como a lua iluminava a tudo com o seu clarão, margeamos o rio até uma curva. Ali não nos veriam tomando banho. Havia levado minhas armas. Tirei-as e as roupas, deixando-as encostadas no tronco de uma árvore. Entrei na água e lavei-me bem. Ela fez o mesmo. Fiquei observando seu corpo. O luar prateado tornava-a mais bela


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