Betty friedan mistica feminina

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mestiça pode e deve expandir-se para preencher todo o tempo disponível, uma vez que não há outro objetivo na vida. Afinal, se o trabalho fosse realizado em uma hora, com as crianças na escola, a enérgica dona de casa acharia insuportável o vazio de seus dias. Foi assim que uma senhora despediu a empregada. E mesmo fazendo os trabalhos domésticos e as habituais atividadcs comunitárias não conseguia desgastar toda a sua energia. — Resolvemos o problema — disse, falando de si mesma e de uma amiga que tentara suicidar-se. — Jogamos boliche três vezes por semana, senão enlouqueceríamos. Assim, pelo menos dormimos à noite. — Há sempre um jeito — ouvi uma senhora dizendo a outra, durante um almoço no Schrafft's, discutindo a questão da tarde de folga recomendada pelo médico. Alimentos dietéticos e ginásios de educação física tornaram-se negócios lucrativos no combate ao excesso de peso que não se transforma em energia. E é ainda mais chocante pensar que mulheres inteligentes e cultas sejam forçadas a perder peso ingerindo um pó que parece cal, ou lutando com uma máquina de emagrecer. Mas ninguém se escandaliza com esse desperdício de energia criadora, que poderia ser usada para uma finalidade social mais ampla, uma vez que esta é a própria essência da carreira doméstica. Viver de acordo com a mística feminina supõe uma reversão da história e uma desvalorização do progresso humano. Trazer a mulher de volta ao lar, não como os nazistas, gritando ordens, mas por meio de propaganda, «com a finalidade de restabelecer o prestígio e a auto-estima da esposa e mãe, na realidade ou em potencial... da mulher que vive como mulher», significava que a classe precisava resistir ao seu «desemprego tecnológico». As fábricas de enlatados e massas não fecharam as portas, mas até os criadores da mística precisaram defender-se da pergunta: «será que nós, sugerindo que a mulher, de livre e espontânea vontade, volte às suas funções domésticas, tais como cozinhar, conservar e decorar, estaremos revertendo a marcha do progresso?» I0 Progresso não é progresso, argumentavam; teoricamente, a libertação da mulher dos trabalhos caseiros as deixaria livres para o cultivo de objetivos mais elevados, porém «muitos são os chamados e poucos os escolhidos, tanto entre os homens como entre as mulheres». Que voltem, portanto, ao trabalho doméstico, fácil para todas, e que a sociedade o oriente de modo a «prestigiar as que a servem mais plenamente como mulheres». 10 Farnham e Lundberg, Perdido), p. 369.

"Modern Women:

The Lost Lex"

(Mulher Moderna:

O Sexo

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