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NOTICIÁRIO ARQUEOLÓGICO

Rua de Pêro Alvito, Leiria notícias sobre a produção oitocentista de faiança Mónica Ginja e António Ginja [MUNIS – Trabalhos de Arqueologia, Lda (geral@munis.com.pt)]

FIG. 1 − Excerto da Carta Militar de Portugal, folha n.º 297, com sinalização do local intervencionado, no Arrabalde da Ponte (a amarelo), assim como do antigo bairro de Santo Estêvão (a verde).

A

INTERVENÇÃO

ntre Setembro de 2008 e Setembro de 2010, conduzimos na Rua Pêro Alvito, Leiria, uma intervenção arqueológica no âmbito da construção de um edifício habitacional. A intervenção revestia-se de suma importância, dada a proximidade do local às muralhas do Castelo de Leiria, assim como do espaço que se julga ter sido ocupado pela desaparecida igreja medieval de Santiago. Das sondagens e do acompanhamento arqueológico resultaria a detecção de estruturas e espólio de cronologias compreendidas entre as épocas medieval, moderna e contemporânea, assim como evidências de produção local de faiança, até então desconhecida na cidade de Leiria.

E

O ARRABALDE

DA

PONTE

Pela posição geográfica que ocupa no panorama nacional, Leiria assumiu, desde remota época, uma relevante importância social, simbolizada pelo seu castelo, fundado por D. Afonso Henriques em 1135. Inicialmente instalada no espaço amuralhado, a população foi paulatinamente ocupando espaços extramuros, à medida que aumentava a estabilidade política e militar do convulso Portugal da Reconquista. Os novos bairros extramuros, mais burgueses, mercantis e populares, cresceram em importância social, ditando o despovoamento do interior das muralhas do castelo (GOMES, 2004b). Na encosta Norte do castelo, surge então um significativo núcleo populacional, em torno da

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Tomo 2

JANEIRO 2014

igreja de Santiago, já edificada em 1195 (CRISTINO, 1983b). O local assumiu desde cedo a denominação de bairro de Santiago, ou Arrabalde da Ponte, por se localizar junto da Ponte Coimbrã. O bairro foi-se então desenvolvendo para Norte, até às margens do rio Lis, bem como para Nascente, até ao Convento de São Francisco, acolhendo casarios senhoriais, mas também tecelagens, tinturarias, lagares, ferrarias e moinhos (GOMES, 2004b e CRISTINO, 1983b). Apesar do desenvolvimento urbanístico, o bairro foi contudo bastante fustigado pelas frequentes cheias do Lis, cuja força destrutiva significou a ruína da própria igreja de Santiago. Os danos foram potenciados pelas invasões francesas, sendo inevitável a sua demolição, corria o ano de 1811 (CRISTINO, 1983a). Desconhece-se até hoje o local exacto da sua implantação.

monta pelo menos a 1211, no bairro de Santo Estêvão instalaram-se os mouros forros e mesteirais, que levavam a cabo actividades relativamente poluentes, como sejam forjas, olarias, lagares de vinho e de azeite (GOMES, 2004a). Alguns vestígios arqueológicos da actividade oleira são ali próximo conhecidos, como o forno escavado nas margas geológicas exumado na rua Nuno Álvares Pereira, com depósito de cerâmica de construção, chacota, trempes de oleiro, cerâmica vidrada e cerâmica comum, remontando aos séculos XVII e XVIII. Na mesma rua foi ainda escavado um depósito de estratos sedimentares, com grande quantidade de material cerâmico evidenciando defeitos de fabrico, trempes de oleiro e cerâmica de construção (BASÍLIO, DIAS e SANTOS, 2011).

PÊRO ALVITO: PRODUÇÃO

OLEIRA EM

LEIRIA

A actividade oleira em Leiria encontra-se documentada já no foral de 1195. Dois outros documentos, de 1255 e do século XIV, fazem respectivamente referência a fornos de loiça e a olaria associada a barreiro (CRISTINO, 1983b). O bairro tradicionalmente ocupado pelas olarias, denominado bairro de Santo Estêvão ou da Mouraria, cresceu a Noroeste do morro do castelo enquanto núcleo urbano por especialização funcional ou social, como era de resto característico nas cidades medievais europeias. Desenvolvendo-se em torno de uma igreja homónima, que re-

EVIDÊNCIAS

DE PRODUÇÃO DE FAIANÇA

Não obstante ser conhecida a produção oleira em Leiria pelo menos desde, como vimos, finais do século XII, até à intervenção de Pêro Alvito era completamente desconhecida a produção de faianças na cidade, apontando-se Coimbra como o centro produtor mais próximo. Durante a intervenção arqueológica decorrida na rua de Pêro Alvito, foi detectado um nível estratigráfico com cerca de 30 cm de espessura, de onde foram exumados vários fragmentos de faiança, vidrados de chumbo, chacota, e ainda trempes, caixa e pilar de oleiro, num conjunto de 104 pe-


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