ARQUEOLOGIA
FIG. 1 − A Península da Arrábida na transição Bronze Final / 1.ª Idade do Ferro. Os pontos vermelhos referem-se aos sítios do Bronze Final; os pontos verdes aos sítios da Idade do Ferro. 1. Povoamento do Risco (base agropastoril?); 2. Povoado do Castelo dos Mouros (povoado central?); 3. Povoado da Serra da Cela / Portinho da Arrábida (povoado portuário); 4. Povoado de Valongo (I); 5. “Atalaia” de Valongo (II); 6. “Casal agrícola” da Quinta do Picheleiro; 7. Bico dos Agulhões (“atalaia” de costa?); 8. Núcleo artefactual de Pedreiras; 9. Monumento funerário da Roça do Casal do Meio; 10. Lapa do Fumo (“gruta-santuário”?); 11. Lapa da Furada (“gruta-santuário”?); 12. Gruta do Médico (“gruta-santuário”? / “gruta-necrópole”); 13. Lapa da Cova (“gruta-santuário” fenícia); 14. Fenda; 15. Povoado da Casa Nova; 16. Povoado da Meia Velha; 17. Necrópole do Casalão; 18. Bronzes de Alfarim? (in SOARES, 2012-2013 – imagem Google Earth adaptada).
A Arrábida, cordilheira que coroa a Península de Setúbal, enquanto território “entre águas” definido e circunscrito pelo Tejo, pelo Sado e pelo Oceano, reúne um conjunto de particularidades geográficas que, associadas às suas excelentes condições naturais de defesa, acessibilidade e abrigo de costa, disponibilidade de recursos hídricos, marinhos e cinegéticos e fertilidade dos vales, proporcionaram um oportuno quadro, em termos de fixação humana e ao longo da história. Porém, as propriedades orógenas da Arrábida resumiram as possibilidades de circulação interna ao mínimo essencial – as veredas de “pé-
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II SÉRIE (18)
Tomo 1
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-posto” ou de transporte montado que a Serra permitiu e que ainda hoje podem ser em parte trilhadas, algumas entretanto perdidas, outras alargadas, asfaltadas ou encurtadas pela engenharia das estradas. Independentemente da motivação prática e funcional dos seus utilizadores, ou da teórica perspectiva da investigação arqueológica, as vias inter e trans-regionais encurtaram distâncias e lançaram efectivas pontes entre diferentes territórios, povos e culturas... sempre com “duplo sentido”. Então, que sentido(s) teriam os caminhos confluentes na encruzilhada da Arrábida? Estamos perante um território emissor, receptor ou aglutinador? Um território autónomo ou subsidiário? Por um lado, a região da Arrábida pode ser estimada como uma dependente “ocidental praia alentejana”, um “desaguadouro” de influências provenientes do montante interior, a partir dos grandes pólos dominantes do Alentejo Central. Noutra perspectiva, a Arrábida pode ser entendida como um território culturalmente livre, um ponto de aportagem de novos estímulos materiais, tecnológicos, culturais e sociais, integrados e retransmitidos ao hinterland pelas vias de penetração. Ora, se a Arrábida for apercebida como o limite Sul da grande “placa giratória” estremenha, beneficiando da sua situação de encruzilhada entre o litoral e o interior, entre o Atlântico e o Mediterrâneo, como um território de confluência de propícias linhas naturais de transitabilidade e circulação – terrestres (os grandes festos), fluviais (o Tejo e o Sado) e marítimas (o Atlântico) –, poderá ter-se emancipado enquanto região colectora de estímulos, com provas dadas desde o Calcolítico regional, particularmente numa diferenciada cultura material de matriz autóctone ou livremente evolucionada a partir de impulsos provenientes de outras paragens.