A garota que voce deixou para trás jojo moyes

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Ele riu, e eu me peguei rindo para ele também. Talvez fosse simplesmente o alívio por ele ter parado de me olhar. — Não sei se eu… — Eu estava embrulhando a echarpe em papel de seda, então abaixei a cabeça enquanto minha supervisora se aproximava. — Sua assistente fez um trabalho excelente, Madame — disse ele com um vozeirão. Olhei de soslaio, observando-a enquanto ela tentava conciliar a aparência um tanto desalinhada do homem com o domínio da linguagem que normalmente vinha com uma extrema riqueza. — A senhora devia promovê-la. Ela tem bom olho! — Tentamos garantir que nossas assistentes sempre ofereçam atendimento profissional, Monsieur — disse ela docemente. — Mas esperamos que a qualidade dos nossos artigos faça com que todas as compras sejam satisfatórias. São dois francos e quarenta. Entreguei-lhe o embrulho, depois o observei atravessar com muita calma o andar apinhado da maior loja de departamentos de Paris. Ele cheirava os perfumes nos frascos, examinava os chapéus coloridos, falava com quem estava atendendo ou mesmo simplesmente passando. Como seria ser casada com um homem daqueles, pensei distraidamente, alguém para quem cada momento parecia conter um prazer sensorial? Mas — lembrei a mim mesma — um homem que também se sente com liberdade para ficar encarando uma vendedora de loja até ela corar. Quando chegou às imponentes portas de vidro, ele se virou e olhou diretamente para mim. Levantou o chapéu por três segundos, depois desapareceu na manhã de Paris. *** Eu fora para Paris no verão de 1910, um ano antes da morte de minha mãe e um mês depois do casamento de minha irmã com Jean-Michel Montpellier, um escriturário do vilarejo vizinho. Eu arranjara um emprego no La Femme Marché, a maior loja de departamentos de Paris, e conseguira subir de assistente de loja a assistente de andar, morando na grande pensão da própria loja. Estava satisfeita em Paris, após ter superado a solidão inicial, e ganhava bastante para usar outros sapatos que não os tamancos que me identificavam como provinciana. Eu adorava o trabalho; chegava às oito e quarenta e cinco, quando as portas se abriam e as parisienses elegantes entravam, com aqueles chapéus altos, aquelas cinturas dolorosamente finas, os rostos emoldurados por peles ou penas. Eu adorava estar livre da sombra que o temperamento do meu pai lançara sobre a minha infância inteira. Os bêbados e os tarados do 9º arrondissement não me assustavam. E eu adorava a loja: uma profusão de coisas bonitas. Seus aromas e cenários eram inebriantes, seu estoque, sempre em constante transformação, com novidades e belos objetos dos quatro cantos do mundo: sapatos italianos, tweeds ingleses, caxemiras escocesas, sedas chinesas, modas dos Estados Unidos e de Londres. No subsolo, a nova seção de comida oferecia chocolates da Suíça, untuosos peixes defumados, queijos fortes e cremosos. Passar um dia no movimentado


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