Audiovisual comunitário e educação: histórias, processos e produtos

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Pensamentos e trajetórias de jovens realizadores do audiovisual comunitário

papéis de oprimidos e opressores. É inegável o fato de que o assumir-se periférico, num primeiro momento, é de extrema importância para a edificação da autoestima destruída por anos de padronização eurocêntrica. Movimentos como o punk e o hip-hop são, para as comunidades de baixa renda, uma forma legítima de resistência cultural e de embate contra as desigualdades sociais do Brasil urbanizado. No entanto, o rótulo “periférico”acabou por enfraquecer esses movimentos, já que todo o sistema de controle se voltou para a repressão e contenção das ações dos coletivos. Esses grupos, inicialmente revolucionários, foram cooptados e integrados à indústria cultural, depois que foram devidamente rotulados e embalados pela moda. Isso gerou certa dormência no ideário de transformação do movimento. Os grupos foram homogeneizados em torno de uma imagem que os caracterizava frequentemente como bandidos ou baderneiros e reprimidos à revelia pelos órgãos de segurança pública. Ao refletir sobre uma imagem representativa do que é a periferia, por que não pensar em senhores reunidos num bar tocando viola caipira e cantando antigas toadas de boi à beira de um córrego? Por que não pensar nos ônibus lotados? Nas crianças correndo atrás de pipas? Nos carros rebaixados, tocando funk no último volume? Devemos buscar nossas raízes culturais esquecidas, além de assumir as novas manifestações culturais, por mais que essas novidades violentem nossa consciência. A mudança de paradigma precisa partir da história do outro e de sua vivência social. Ela deve buscar, no respeito à condição alheia, a crítica saudável e construtiva. Isso é importante para que alteremos os valores retrógrados e preconceituosos. Precisamos fomentar a produção da imagem-enigma, imagem que provoca o refletir sem entregar uma verdade fechada, exigindo do outro sua interpretação de mundo e convocando sua posição, com firmeza e personalidade no espaço. Sem a necessidade de rótulos.

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