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cidadania

de que estamos falando? Por: João Baptista Borges Pereira, Antropólogo – Professor Emérito da FFLCH-USP, Professor do curso de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Universidade Presbiteriana Mackenzie, presidente da Comissão Permanente de Políticas Públicas para a População Negra, da USP.

Somos um povo que se acostumou a contemplar a diversidade étnica do país como se esse fenômeno fosse absolutamente natural na experiência humana. Diariamente, sem qualquer surpresa ou interrogação, participamos, pelo menos publicamente, de um desfile heterogêneo de raças, cores, culturas, línguas. Todavia, esse “espetáculo étnico diferenciado” nem sempre se reproduz em outras nações contemporâneas que se vêem envolvidas no decantado processo de globalização, imensa e moderna teia que aproxima, de forma inédita, grupos, pessoas, objetos, idéias. Talvez se possam distinguir três modelos-ideais, no sentido weberiano, que dão a orientação a tais nações tidas como modernas: a sociedade monoétnica, a sociedade pseudo pluriétnica, e a sociedade pluriétnica. O Japão foi sempre um exemplo adequa-

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do de sociedade que, além de preservar, exalta em fala explícita as virtudes do que chamam de monorracialidade. Há poucos anos, o ministro de finanças daquele país informava, em discurso, que toda a prosperidade da nação após a 2ª Guerra Mundial devia-se a um único fator: a preservação da sua marca monorracial. Os decasséguis exibem ao mundo os entraves, quase sempre intransponíveis, de deixar o espaço restrito de trabalho para tentar incluir-se na sociedade japonesa, a partir do casamento misto. Interessante é que, no plano da cultura, especialmente tecnológica, o Japão é um voraz consumidor de idéias e produtos alienígenas. Esses dias, por conta de charges sobre o fundador do islamismo publicadas em seu jornal de maior circulação, a Dinamarca revelou-se ao mundo como nação que também cultiva e exalta de forma explícita a monorracialidade. Segundo o dirigente

Pia Kjaergaard, o programa de seu partido (que há anos domina a cena daquele país), “o Partido do Povo Dinamarquês não aceita que a Dinamarca se converta em uma sociedade multiétnica”. Há nações que se pretendem, se pensam, como monoétnicas, puras, baseadas no “esquecimento” de um longínquo passado plural. Todavia, a história recente está ressuscitando esse passado congelado com vivos ingredientes humanos e culturais, transformando-os, num ritmo acelerado, em sociedades pluriétnicas. Essa plurietnicidade conspira perigosamente com o decantado ethos da pureza. É o caso dos atuais países europeus que foram obrigados, por fatores políticos (descolonização) e econômicos (demanda de mão-de-obra barata), a abrir suas fronteiras a indesejáveis estrangeiros. No cenário europeu, a França ocupa uma posição singular. Baseada, ainda, nos prin-


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