Anais do VI CBDEH

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A contraprodutividade é descrita como uma ferramenta que passa a produzir efeitos paradoxais, operando contra o objetivo implícito em suas funções como, por exemplo, instituições de saúde que produzem doenças, medicina que produz iatrogenias. No caso em questão, a cesariana que produz morbidade e mortalidade materna e neonatal. [...] em relação ao parto, a medicalização influenciou a capacidade da mulher de enfrentamento autônomo da experiência de parir, gerando dependência excessiva, heteronomia e um consumo abusivo e contraprodutivo de cesarianas. (LEÃO, 2013, p. 2396)

A experiência individualizada do parto e nascimento domiciliar, onde a mulher se sentia segura e confortável, acompanhada de sua família, torna-se uma experiência similar a uma linha de montagem (sala de pré-parto, sala de parto e sala de pós-parto) dentro de uma indústria (hospital) (FRAGA; MATOS, 1996). Sozinha, em um lugar estéril, mecânico, metálico, a mulher tem vivido um momento de violência e desrespeito à sua fisiologia. 3 UMA NOVA PERSPECTIVA Muitos esforços têm sido feitos para disfarçar a frieza e a impessoalidade dos ambientes hospitalares. A tentativa de humanizar espaços hospitalares já construídos nos moldes tradicionais parece não surtir efeito, pois a instituição ainda é atrelada a patologias e sofrimento no inconsciente coletivo. No Brasil, os projetos de arquitetura de maternidades que levam em consideração a humanização do parto ainda são incipientes. Além disso, as práticas profissionais de conduta humanizada – “respeito ao parto como experiência pessoal, cultural, sexual e familiar, fundamentada no protagonismo e autonomia da mulher” (BRASIL, 2015 [s.p.]) – nem sempre estão presentes nessas edificações. A implantação de unidades obstétricas não hospitalares, como as Casas de Parto, surge como uma possibilidade de resgatar a percepção do parto e nascimento como evento fisiológico, dissociado da imagem de doença normalmente vinculada ao hospital. Em 1999, foi publicada a Portaria 985/MS, que instituiu os Centros de Parto Normal no âmbito do Sistema

Único de Saúde (SUS) (BRASIL, 1999). No mesmo ano, foi aberta no Ministério da Saúde uma linha de financiamento para construção e implantação de Centros de Parto Normal, que recebeu diversos projetos. Destes, foram aprovados 19, referentes a 33 CPN, dos quais apenas uma minoria foi concluída e está em funcionamento (ABENFO, 2011). Além do Ministério da Saúde, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), após ampla consulta pública, reconheceu o CPN como instituição de saúde, através da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 36/2008, que regulamenta o “Serviço de Atenção Obstétrica e Neonatal” (BRASIL, 2008). A implementação de Casas de Parto, contudo, “envolve disputas corporativas e de recursos, e é um campo de intenso conflito, pois os médicos sentem seu espaço expropriado, reagindo de várias formas” (DINIZ, 2005, p.634). Nas Casas de Parto se observa o alinhamento de duas premissas necessárias para a humanização do nascimento: práticas profissionais inclusivas e o ambiente construído com aparência doméstica. A equipe que atua nesses espaços é multidisciplinar, majoritariamente composta de enfermeiras obstétricas e obstetrizes. Todas as demandas do ciclo gravídico puerperal de baixo risco são contempladas, com práticas fundamentadas em evidências científicas, sendo os profissionais atuantes também no âmbito social e emocional da mulher. 4 OS IMPASSES NA IMPLEMENTAÇÃO A Portaria MS 985/1999 (BRASIL, 1999) admite três modalidades de CPN: intra-hospitalar, peri-hospitalar e comunitário. Este último, um serviço de administração própria, situado a distâncias variáveis de um hospital de retaguarda. Exige ambulância de plantão, bem como autonomia técnica da equipe no atendimento de emergências obstétricas e neonatais. Todo o processo de atendimento – captação, triagem, admissão, prestação de cuidados, remoção e alta – são de responsabilidade de enfermeiras obstétricas. O termo CPN se refere tanto a essas unidades autônomas, também chamadas Casas de Parto, quanto àquelas que configuram um dos serviços hospitalares (peri ou intra) (ABENFO, 2011). 61

ARTIGOS CIENTÍFICOS

CASA DE PARTO: reconstruindo a forma de nascer


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