POR ESCOLHA, NÃO POR ACASO

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PLANEJAMENTO FAMILIAR EM SITUAÇÕES HUMANITÁRIAS: SOMÁLIA As mulheres somalis têm as mais altas taxas de fecundidade do mundo: mais de seis filhos cada, em média (Fundo de População das Nações Unidas, 2012b). A despeito do conflito, da fome e das altas taxas de mortalidade materna, neonatal e infantil, a população do país quase triplicou nos últimos 50 anos. Nessa sociedade pastoril, onde se perderam tantos para a guerra, as crianças têm enorme valor. Durante as últimas duas décadas de conflito na Somália e na falta de um governo central atuante desde 1991, a atenção internacional se centrou na solução da crise política e na prestação de ajuda de emergência. Nesse contexto, o desenvolvimento de programas e de infraestrutura de saúde, necessários para gerar e atender à demanda pelo planejamento familiar, não foi prioridade. Alguns acreditam que a única maneira de se obter uma comunicação eficaz sobre o planejamento familiar com as e os somalis, a maioria dos quais muçulmanos sunitas devotos, é através da religião. O estabelecimento de parcerias com organizações baseadas na fé pode aliviar as pressões religiosas e sociais sobre as mulheres que praticam o espaçamento entre as gravidezes. Os métodos tradicionais, como o coito interrompido e a amamentação exclusiva, são mais facilmente aceitos na sociedade somali. O UNFPA está colaborando com organizações governamentais e não governamentais para ofertar insumos e serviços essenciais de saúde reprodutiva. Com o pior da fome agora superado, a Somália tem diante de si a oportunidade de se focar em programas de planejamento familiar como um meio de salvaguardar o bem-estar das futuras gerações.

“profundo e preciso” do HIV, o que sugere ser necessário mais apoio para a saúde sexual reprodutiva masculina, inclusive educação sexual e contraceptivos (Nações Unidas, 2009b). Os homens expressam cada vez mais o desejo de se envolver mais no planejamento de suas famílias, inclusive na redução do número de gravidezes não planejadas (Barker e Pawlak, 2011). Até 50% dos homens de alguns países—Brasil, Alemanha, México, Espanha e Estados Unidos—considerariam a anticoncepção à base de hormônios se esse método masculino viesse a ser oferecido (Glasier, 2010). O envolvimento dos homens em idade reprodutiva nos programas de planejamento familiar desde cedo pode promover a comunicação mais construtiva entre os casais sobre o momento e o intervalo entre as gravidezes.

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CAP ÍT ULO 3: Desafios da extensão do ac esso a todas e todos

4 Outros grupos marginalizados Povos indígenas e minorias étnicas. Os povos indígenas e as minorias étnicas quase sempre enfrentam a falta de acesso ao planejamento familiar. Resultados de entrevistas qualitativas apontam que os próprios prestadores expressam dificuldades em dar assistência a mulheres indígenas e de diferentes etnias, frequentemente porque não conseguem comunicar-se adequadamente ou entender suas práticas culturais (Silva e Batista, 2010; Cooper, 2005). O preconceito contra esses grupos pode levar a níveis de investimento mais baixos em sua saúde sexual e reprodutiva (Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, 2009). As consequências negativas do subinvestimento governamental se refletem em grandes disparidades entre mulheres indígenas e não indígenas, segundo os indicadores essenciais de saúde reprodutiva e materna – e que se referem a taxas de mortalidade materna, taxas de fecundidade total e necessidades não atendidas de planejamento familiar (Silva e Batista, 2010). Há significativas desigualdades relacionadas à saúde entre grupos indígenas e não indígenas em todo o mundo. Na Guatemala, por exemplo, onde grupos indígenas (maias, xinka, e garifuna) respondem por quase 40% da população total e 75% da população pobre, 39% das mulheres indígenas casadas têm necessidades não atendidas de planejamento familiar e, portanto, estão impossibilitadas de exercer o direito de planejar suas famílias (Ministério de Saúde Pública e Assistência Social da Guatemala, 2003). Em contraste, 22% das mulheres não indígenas têm necessidades de planejamento familiar não atendidas. Essas disparidades quanto ao acesso a serviços contribuem para a alta taxa de fecundidade entre mulheres indígenas (6,1), que também estão em maior risco de mortalidade materna em comparação com as mulheres não indígenas.


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