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Sebastião Amâncio

Sebastião Amâncio

Menino de Engenho em poesia

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Lembro-me como se fosse hoje Da minha mãe caída no chão, ensanguentada Feito bicho do mato, na espreitada. Da viagem de trem, prolongada Da chegada ao engenho, na invernada Dos banhos de rio, das mergulhadas Dos passarinhos cantando, das revoadas Das brincadeiras de crianças, levadas

Mas também me lembro das tristezas e das angústias que aquilo me causava

De como fui parar ali, desgostoso Do motivo mortis de mamãe, tenebroso Do meu pai levado pela polícia, como doido Da morada no engenho, um desafogo Carregado de sentimento ruim, maldoso

O gosto pelas máquinas me faziam esquecer daquilo, brutal E voltava para o meu mundo, normal Um mundo de coisas novas, sem igual

O tempo foi passando e com ele, entendendo como funcionava o engenho

Da lida no eito, ferrenho Da safra do ano, comendo

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Do bueiro fumaçando, cinzento Das negras cantando, um alento Do sorriso do meu avô, a contento Dos passeios às tardes, um momento Das primeiras letras escritas, desalento

E fui crescendo como um menino normal Conhecendo as fruteiras, a senzala e o curral Saía o cheiro de leite e entravam as curvas do mal O sabor do primeiro beijo pelo prazer sexual

Então a hora era chegada Da despedida malvada Da ida ao colégio, forçada Minha sentença estava marcada Cheguei criança ingênua, apavorada Saí pestinha perdida, demoniada