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Uma visita síntese relativa à reabilitação do Centro Histórico de Guimarães

António Magalhães Ex-Presidente da Câmara Municipal de Guimarães Mandatos de 1989 a 2013

Sempre que há algo de marcante assumido por qualquer governo nacional ou municipal, sempre que a posteriori se aborda o tema, há inevitáveis distorções! Umas porque a memória dos homens é curta, outras porque deliberadamente distorcem a evolução do processo que conduziria à construção do referido projeto. Há só uma possibilidade de ser fiel à realização em causa: servir-se das fontes que preservam o “acontecido” e demonstrar seriedade no tratamento dos dados coevos que é possível recolher. Vou corresponder ao pedido que me fizeram, ainda que não seja muito propenso a abordar temas que referiram responsabilidades nas quais estive envolvido. Dito isto, serei generalista tentando não falsear a verdade e servir-me-ei apenas do mais marcante que a minha memória ainda reserva. Assim, não é possível abordar a candidatura do Centro Histórico a Património Mundial sem distinguirmos a sua reabilitação, com todas as intervenções de vária índole que foram assumidas. Para os cidadãos que não acompanharam a fase a que me refiro, direi que o mais difícil foi a decisão e a consumação da reabilitação física do espaço classificado. Primeiro foi necessário contratualizar uma equipa técnica capaz que aceitasse a proposta política e a levasse à prática no terreno. Um projeto desta envergadura, com um conceito completamente desconhecido dos moradores e também da atividade comercial ali existente à época, iria ser, como aconteceu em variadíssimas decisões violentamente polemizado. Após a reabilitação, os insultos de muitos e as querelas de outros tantos seriam sufragados pela obra em si e pelo benefício que a todos veio a trazer. O reconhecimento dos cidadãos, a procura de um espaço reabilitado que todos procuravam agora e que antes, tantos e tantos não se atreviam a percorrer, encorajou-nos a todos. Dito isto, o sonho começou, na minha opinião, com a criação do GTL, com suporte estatal no início, mas que mais tarde teve de ser assumido pelo município. Depois desse trabalho preliminar urgia escolher, para além da nossa equipa técnica, uma outra com estatuto reconhecido, a nível nacional e internacional, para que propusessem ao poder político o que urgia fazer para levarmos à prática tal desiderato que vários interventores políticos e técnicos da autarquia pretendiam executar. Constitui-se, então, uma equipa com pretensão assumida, no âmbito das suas responsabilidades, para

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que o projeto fosse por diante, com êxito. A equipa do saudoso arquiteto Fernando Távora, com contributos importantes de técnicos do município, traçou o percurso a seguir e o que urgia fazer para que a pretensão política de tantos fosse consumada. Depois, face aos recursos que fomos angariando, ganhando a confiança de membros do governo que validaram o projeto, consumou-se o início da execução do mesmo, ainda que contrariado por muitas posições hostis, compreensivas de moradores e comerciantes do Centro Histórico. À medida que os trabalhos de reabilitação foram sendo executados em determinados espaços e face às profundas alterações dos mesmos, a pouco e pouco foi-se ganhando o apoio de alguns, apoio esse que ia crescendo à medida da evolução da reabilitação em curso. O primeiro prémio de reabilitação do gabinete onde funcionava o GTL, liderado pela arquiteta Alexandra Gesta, foi, para o exterior, o sinal do trabalho de excelência que se pretendia levar à prática. Todavia, o prémio da “Real Fundação de Toledo” foi como que o culminar de um trabalho de reabilitação de excelência, pois vários técnicos, conhecedores do arquiteto Fernando Távora e também do arquiteto Nuno Portas (que deu em certas circunstâncias um grande apoio) deram forças a todos para prosseguir o projeto que haviam idealizado. Os moradores e os cidadãos de Guimarães foram acreditando no trabalho em execução, visitado por várias personalidades que iam conferindo ao projeto o estatuto que foi granjeando e que aplanou o caminho trilhado para consecução do objetivo final – o reconhecimento da UNESCO, em 13 de Dezembro de 2001. Nesta data já a população do Centro Histórico e também genericamente os vimaranenses, reconheciam o mérito da reabilitação. Convém recordar que a saudosa vereadora Drª. Francisca Abreu, à medida que as praças iam sendo reabilitadas, organizava eventos culturais de grande qualidade, suprindo as carências da falta de espaços dedicados a essa função que, à data, Guimarães não possuía. Foi esse aproveitamento inteligente que começou a conquistar os moradores e sobretudo os jovens, não apenas de Guimarães, mas de cidades e vilas vizinhas.

A mensagem passava, fomos visitados pelas figuras mais proeminentes da cultura europeia, do Brasil e também do Uruguai, que culminou com a geminação (Colónia de Sacramento). O dia da decisão do comité do Património da UNESCO foi celebrado num dia de chuva, no Largo da Oliveira após a informação transmitida pela Drª. Francisca Abreu, representante do município na reunião de Helsínquia. Vinte anos depois e durante este espaço temporal, Guimarães ganhou estatuto a nível europeu e mundial que ajudou a abalançarmo-nos na candidatura a Capital Europeia da Cultura, em 2012. Este evento foi de difícil execução; valeu-nos o apoio firme do governo de então e o sucesso conseguido tornou Guimarães conhecida e reconhecida por tudo aquilo que podia oferecer aos visitantes, não olvidando o seu legado histórico, desde a independência como nação. A transição deste grande evento culminou com a candidatura a Cidade Europeia do Desporto, evento de menor dimensão, mas muito bem conseguido ao ponto de Guimarães ser reconhecida como a melhor cidade europeia do desporto daquele ano, na Europa. Aqui urge destacar a competência do então vereador Amadeu Portilha que tudo fez, com parcos recursos, para nos ser concedido o estatuto que atrás referi. Quanto ao futuro, quem liderar os destinos de Guimarães não pode ignorar este passado bem conseguido, continuando a explorar aquilo que será sempre possível fazer numa cidade recheada de um ímpar passado histórico, orgulho mor dos vimaranenses.

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