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20 distintos anos de Património Cultural da Humanidade

Domingos Bragança Presidente da Câmara Municipal de Guimarães

Diz Françoise Choay, na obra Alegoria do Património, que este se relaciona com o tempo vivido e com a memória, sendo a função antropológica a sua essência. É através do Património que construímos a identidade singular e coletiva. A sua existência convoca-nos para uma linearidade temporal que perdura no momento presentificado. Existindo enquanto edificado, o Património insere-se num determinado espaço/tempo e requer uma conservação incondicional para se tornar um artefacto da memória.

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Durante vários anos, indiferente aos diversos olhares, o nosso Centro Histórico existiu apenas como qualquer outro local da cidade. Porventura, existiu até mais só. Mas, nos anos 80 do século passado, foi alvo de uma atenção meticulosa. A criação do Gabinete Técnico Local, sob os auspícios de um Fernando Távora que pretendia “desembrulhar uma pérola”, permitiu encetar a valorização dos espaços públicos do Centro Histórico e sua envolvente, bem como a recuperação do património edificado. Nesse processo, e como princípio, foi mantida a população residente e foram criadas condições de atratividade para novos investimentos e novos ocupantes. Foram duas longas décadas de trabalho quotidiano, cujos resultados se tornaram visíveis e cujo processo mereceu o reconhecimento de múltiplas entidades, culminado com a sua inscrição, em 13 de dezembro de 2001, na lista do Património Classificado da UNESCO.

Mas não se pense que esta classificação é o culminar de todo o trabalho efetuado. Pelo contrário. Ela é o início de uma nova responsabilidade, a de continuar a preservar e a manter o espaço, pertença de todo o mundo, de acordo com o rigoroso e exigente caderno de encargos que a UNESCO apresenta. Um trabalho que tem vindo a ser feito exemplarmente em Guimarães e que tem permitido, durante duas décadas, continuar a figurar na lista patrimonial mais importante de todas: a lista de Património Classificado da UNESCO.

A preservação deste património é ainda importante para a criação de uma cidade plena, capaz de fazer do seu casco histórico não um espaço museológico a céu aberto, mas uma parte integrante dos percursos culturais da cidade, local onde o passado serve como projeção de um futuro que, respeitando a integridade

e o valor patrimonial do seu edificado, não se deixa cristalizar. A fruição das praças e dos largos de grande valor histórico e patrimonial é hoje, em todo o mundo, uma prática que confere às cidades uma marca distintiva. Se, a este facto, considerarmos a classificação desse património como Património Cultural da Humanidade, o potencial de atração é, indubitavelmente, bem maior. O usufruto dessas praças e largos, no caso de Guimarães, permite-nos pensar o espaço público como mais um espaço físico de criação e fruição culturais. Uma verdadeira Cidade Educadora e Cidade Criativa é a que democratiza a sua oferta artística e cultural, é a que utiliza todos os seus recursos para proporcionar uma vivência que promova a aproximação dos seus cidadãos, o contacto com a diversidade, a abertura para novas formas de ver e de ler a cidade. É através do inusitado e da serendipidade que, não raramente, despertamos para novas formas de ver o mundo e de nos relacionarmos. O património edificado, como recurso cultural, tem um potencial ilimitado que, em Guimarães, necessita de continuar a ser a fonte de inspiração de artistas, historiadores e cidadãos, pois este só faz sentido enquanto espaço de fruição e de vivências quotidianas. O crescente fluxo turístico que, desde 2001, se tem vindo a registar, e que conheceu um dos seus apogeus durante 2012, é um sinal claro de que o Património, em especial o classificado, é uma marca de território. Conseguir o equilíbrio necessário para que a sua fruição não comprometa o cumprimento dos pressupostos que subjazem à sua classificação, e para que continuem a existir as condições para a manutenção do comércio e da fruição do espaço enquanto lugar de residência e de convívio dos locais e visitantes, é um dos desafios que as cidades enfrentam nos novos tempos. Importa manter presente a necessidade de um Património preservado, cuidado e respeitado, pois ele é um BEM que atravessa gerações e que mantém a identidade de um povo. Na passagem do 20º aniversário da classificação do nosso Centro Histórico como Património Cultural da Humanidade, podemos dizer que, em Guimarães, tem-se cumprido, com distinção, esse desígnio.

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