6 minute read

Caroline Dias de Souza e Carlos Frederico Wilcken, IPEF-UNESP

Índice cientistas como manter a produtividade frente ao aumento das pragas?

As florestas plantadas brasileiras, principalmente as baseadas em eucalipto e pinus, são reconhecidas mundialmente pela sua produtividade, baseada em sólidas pesquisas em melhoramento e manejo florestal.

Entretanto, nos últimos anos, essa produtividade estagnou e, em alguns casos, até reduziu. O que tem acontecido? Uma das suposições está relacionada com os anos da crise econômica, iniciada em 2008, que fez alguns setores realizarem cortes nos investimentos, e mesmo em algumas operações, para sobreviver a esse período. Isso é verdadeiro para o setor de siderurgia, demandante de carvão vegetal de eucalipto, e o setor de madeira sólida, chapas e painéis.

Na área de proteção florestal, esses cortes aconteceram no controle de formigas cortadeiras e de pragas de parte aérea, como psilídeo-de-concha e percevejo-bronzeado, para o eucalipto. Entretanto, o setor de papel e celulose foi o menos afetado, pois a demanda mundial por esses produtos e os preços internacionais se mantiveram altos, além do câmbio, com a desvalorização do real, e rapidamente as despesas com controle de pragas e doenças se mantiveram. Porém, mesmo esse setor apresentou estagnação da produtividade na última década.

Pelo levantamento anual de pragas e doenças florestais, realizada pelo PROTEF (Programa de Proteção Florestal), do IPEF, começamos a ter uma série histórica, com 11 anos de dados.

De 2010 a 2017, a área média afetada por pragas em florestas de eucalipto tem sido de 10% a 15% da área de efetivo plantio, excluindo formigas cortadeiras e cupins. De 2018 a 2020, a área atacada por pragas tem atingido média de 30% da superfície plantada, ou seja, praticamente dobrou o tamanho do problema, mesmo controlando essas áreas. Esse aumento se deve basicamente a três pragas: psilídeo-de-concha, percevejo-bronzeado e lagartas-desfolhadoras.

Por que essas pragas, mesmo com programas de controle biológico e uso de inseticidas químicos, têm aumentado seus danos (que podem reduzir o IMA entre 10% e 30%)? Uma das possíveis explicações está relacionada com as mudanças climáticas. A interação entre as mudanças climáticas e a ocorrência de pragas e doenças florestais já vem sendo evidenciada há quase dez anos, principalmente nos EUA e no Canadá. Porém, nas regiões tropicais, tem sido mais difícil evidenciar as mudanças climáticas.

Por outro lado, os fenômenos climáticos mais estudados, como o El Niño e La Niña, têm abrangência global e afeta diretamente o Brasil. Cruzando os dados dos levantamentos de pragas florestais e o histórico de ocorrência de El Niño/La Niña, verificamos que, durante os anos de La Niña, que se caracteriza por invernos e primaveras mais secas e com temperaturas mais amenas nas regiões Sul, Sudeste e parte do Centro-Oeste, ocorreram mais surtos das pragas de eucalipto,

Por que essas pragas, mesmo com programas de controle e uso de inseticidas, têm aumentado seus danos (que podem reduzir o IMA entre 10% e 30%)? "

Caroline Dias de Souza e Carlos Frederico Wilcken

Coordenadora do Programa Cooperativo sobre Proteção Florestal do IPEF e Professor de Entomologia Florestal da FCA/UNESP-Botucatu, respectivamente

como lagartas-desfolhadoras, psilídeo-de-concha e percevejo-bronzeado. Nos anos de El Niño, em que as secas ocorrem com maior intensidade nas regiões Norte e Nordeste, verificamos surtos de lagartas-desfolhadoras na Bahia.

Essas evidências ainda carecem de análises estatísticas para serem confirmadas, mas permitem que as empresas e os produtores florestais possam se preparar melhor para um possível aumento de surtos durante a vigência desses fenômenos climáticos.

Os efeitos de secas mais intensas e prolongadas, associados ao aumento da frequência de eventos extremos, como ondas de calor ou frio, por vezes intercaladas por diferença de duas a três semanas, como ocorreu durante os meses de agosto (geada) e setembro (onda de calor com máximas acima de 40oC) nos estados do MS e São Paulo em 2021, intensificam os estresses em árvores de eucalipto. Esses estresses podem aumentar a predisposição das florestas plantadas à ocorrência das pragas citadas e afetar as populações dos seus inimigos naturais, por ação direta sobre eles, que são menos resistentes que as pragas, e, por ação indireta, afetando o sub-bosque e fragmentos florestais, onde os parasitoides buscam seu alimento (pólen e/ou néctar).

Portanto, o cenário no campo é complexo, e, só com mais estudos e dados de séries históricas, é que poderemos compreender melhor os problemas com pragas que vêm ocorrendo no Brasil.

Frente a isso, o que fazer? As empresas florestais sempre consideraram as formigas-cortadeiras como praga-chave para as florestas plantadas, independente da espécie plantada, e o controle de formigas é parte obrigatória em qualquer planejamento florestal, inclusive quantificando os custos de controle e incluindo nos orçamentos anuais.

Entretanto, as demais pragas florestais geralmente são deixadas em segundo plano e poucas vezes são incluídas na planificação dos novos plantios. Os dados dos levantamentos do PROTEF evidenciam que, desde 2018, as pragas de copa de árvores também precisam ser consideradas pragas-chave e devem ter seu controle previsto e orçado, para facilitar a tomada de decisão, caso seu controle seja necessário. O segredo do sucesso no controle de pragas reside, em parte, na rapidez das decisões e das operações de controle e, na outra parte, na previsibilidade do risco de ocorrência de surtos e no planejamento do uso de controle biológico, que é de efeito mais lento, porém mais duradouro. Outro caminho é considerar, dentro dos programas de melhoramento florestal, a avaliação de novos clones ou genótipos quanto à suscetibilidade/resistência às pragas florestais. A seleção de clones mais adaptados regionalmente auxilia na redução dos efeitos dos estresses abióticos e, sendo possível agregar a resistência às pragas ou, pelo menos, evitar o plantio de clones suscetíveis, permitirá reduzir sobremaneira os danos das pragas e manter os altos níveis de produtividade florestal.

Os avanços tecnológicos, como uso de drones na aplicação de inseticidas químicos e biológicos e na liberação de inimigos naturais, e científicos, como pesquisas de uso de RNAi (RNA de interferência) para controlar as pragas de forma mais específica e seletiva, também ajudarão a manejar melhor as pragas. As soluções para os problemas de pragas e doenças florestais só avançarão considerando uma abordagem multidisciplinar, com o esforço de pesquisas conjuntas entre as áreas de proteção, melhoramento e manejo florestal e a rapidez na transferência dos melhores resultados para o setor produtivo. n

HECTARES ÁREA

PROPORÇÃO ÁREA PLANTADA X INFESTADA POR PRAGAS EM EUCALIPTO • 2010-2020

Proporção área plantada x infestada por pragas em eucalipto 2010-2020

4.000.000 3.500.000 3.000.000 2.500.000 2.000.000 1.500.000 1.000.000 500.000

2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 Área infestada 206.648 213.464,7 272.795,7 221.435,9 214.301,2 184.174,8 237.730,0 458.364,1 741.592,9 514.190,2 836.257,6 Area plantada 1.500.000 2.331.215 1.183.257 1.630.267 1.755.122 1.386.168 2.402.476 2.516.234 2.482.494 2.710.337 2.749.710