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Por que Temos um Ritual?

Uma breve história das origens dos rituais e a sua importância para a Ordem DeMolay

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Fernando Locks Machado

Sênior DeMolay do Capítulo Criciúma nº 125 e Maçom

Nas primeiras décadas de existência da Ordem DeMolay, por volta de 1930, Tio Land, em uma entrevista a uma rádio, foi questionado sobre o que tornava sua criação diferente das demais agremiações de jovens já existentes. Ele, sem hesitar, respondeu: “ela tem um ritual”. Essa resposta, além de corroborar algo que, de fato, era evidente, deixou transparecer a importância que o idealizador de nossa Ordem atribuía à execução de nossas cerimônias. Mas, será mesmo que precisamos de um ritual? Antes de responder a essa pergunta, vamos primeiro entender como se define um ritual, como e por que ele surgiu.

De acordo com o Dicionário Brasileiro de Língua Portuguesa, um ritual pode ser definido como “os atos e o conjunto de práticas próprios de qualquer rito cerimonial”. Se tomarmos como exemplo as nossas cerimônias, não fica difícil de visualizar esse conceito. Mas há ainda uma segunda caracterização, que diz ser um “conjunto das regras sociais estabelecidas, que regulam certos atos solenes ou oficiais; cerimonial, protocolo, rito”. A partir dessa definição, podemos perceber a presença de rituais em nossas vidas de forma mais ampla. Uma formatura, por exemplo, possui um ritual. Uma sessão no Tribunal, possui um ritual. Assim como atos mais triviais também constituem pequenos rituais, como misturar farinha, ovos, fermento e sal, levar ao forno e retirar após um tempo determinado – um ritual para se fazer um pão.

É claro que rituais, conforme as principais definições aceitas, são marcados por certa solenidade ou importância, seja ela religiosa ou oficial, e, por isso, não faz muito sentido atribuir a qualquer ato repetitivo a alcunha de ritual. Se pode confirmar isso se levarmos em consideração as origens das práticas ritualísticas, que são mais antigas do que podemos conceber. Suas raízes remontam aos primeiros povos sedentários, que utilizavam rituais como forma de se comunicarem com os poderes da natureza, não compreendidos ainda por eles. Estabeleciam rituais para chuva, plantio, colheita e até mesmo de cura de doentes.

Ao longo dos milênios, o uso de rituais persistiu e passou a ganhar um caráter mais religioso, transformando as sequências de ações de um ritual em cerimônias sacralizadas. Assim, para a participação nessas cerimônias era preciso que os praticantes demonstrassem algum tipo de mérito, como pertencer a uma casta específica, a um clã, ou passar por cerimônias iniciáticas, provando seu valor e merecendo, portanto, ocupar um lugar no ritual. Nessa mesma época, surgem entre sumérios, babilônios, assírios, egípcios e hebreus os sacerdotes: os responsáveis pela execução e preservação dos rituais, servindo como elo entre Deus e os homens.

Dentre os povos da antiguidade cujas práticas ritualísticas se tornaram mais evidentes, talvez os egípcios sejam aqueles que recebem maior destaque, tanto pela importância dos rituais dentro do cotidiano da cultura do Antigo Egito, quanto pela beleza e complexidade das suas práticas, que servem de base para fórmulas ritualísticas de muitas fraternidades contemporâneas. Não obstante, na Índia Antiga havia também a prática de rituais voltados à adoração dos deuses do hinduísmo, a constituição de cerimônias de passagem entre outras práticas que persistem até hoje, tanto pela religião Hindu, quanto pelo Yoga.

Durante a Idade Média, o advento do cristianismo transformaria totalmente a realidade dos rituais por todo o ocidente: muitas práticas ritualísticas antigas foram colocadas à margem do que era aceito, transformando-as em heresia. Em contrapartida, a própria Igreja seria responsável por institucionalizar uma série de rituais que se tornaram parte essencial da realidade ocidental – e que compõem nossos costumes até hoje. Temos a missa, o batismo, a eucaristia, bem como a celebração de datas cristãs, dentre as quais se destacam o Natal e a Páscoa – respectivamente, a celebração do nascimento e da morte de Jesus. Entretanto, mesmo com a severa proibição de práticas não ortodoxas, tidas pela Igreja como feitiçaria e heresia, muitos ainda se aventuravam na prática de rituais antigos, desde aqueles descobertos por cientistas medievais – os alquimistas – em manuscritos antigos, quanto aqueles que persistiam graças à preservação da tradição oral – como no caso da cultura Celta. Essas práticas se disseminaram – ainda que de forma velada – durante toda a Idade Média e o Renascimento, permaneceram nas sombras durante centenas de anos, até que, durante o Iluminismo, essas práticas passaram a influenciar fortemente o corpo ritualístico das sociedades secretas que nasciam naquela época, dentre as quais, está a Maçonaria. É com base nos rituais maçônicos que o Tio Frank Marshall, a pedido de Tio Land, criaria o Ritual DeMolay.

Mas e a questão inicial? Como isso permite entender a importância dos rituais, especificamente aquele praticado em nossos trabalhos?

Observando a trajetória e a evolução dos rituais no decorrer das eras, não fica difícil de perceber que os seus objetivos têm sido sempre o de transmitir e incutir verdades na mente de seus participantes. Em outras palavras, os rituais são ferramentas valiosas para que possamos condicionar nossos comportamentos de acordo com os ditames de uma religião ou de códigos morais impostos por um grupo ou sociedade.

Ao considerarmos isso e a presença da ritualística em nossos trabalhos, a Ordem DeMolay, de fato, se diferencia e se destaca em relação às outras instituições juvenis – sem a pretensão de desmerecer qualquer outro grupo –, ainda que seus objetivos também sejam o aperfeiçoamento do caráter e a prática da caridade. A existência de um Ritual DeMolay e a estrutura ritualística de graus e postos, ou cargos, faz com que a cada cerimônia mantenhamos acesas em nossas mentes e corações as chamas das Sete Virtudes Cardeais. Permanecem vivos em nossas lembranças valores que conduzem à maioridade de forma adequada, nos preparando para uma vida adulta de trabalho e proveito. E se ainda resta dúvida quanto à importância de nossas cerimônias, lembremo-nos sempre que o próprio Tio Land foi enfático quando disse aos primeiros membros de nossa Ordem que nossas “[...] cerimônias são solenes para imprimir em suas mentes as verdades do viver correto, agora e nos anos do futuro”.

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