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Figura 2: Foto de Maria Adamastor como mestre-sala

agremiações carnavalescas, com seus estilos, formas de rodar, sorrir e apresentar a bandeira (PAVÃO, 2016).

Com passar do tempo, as performances dos balizas e porta-estandartes evoluíram para o giro da porta-bandeira escoltada pelo gingado do mestre-sala. Uma das suposições históricas é de que essa mudança foi influenciada por danças rituais pré-nupciais das adolescentes africanas cortejadas pelos jovens guerreiros. Outra suposição do formato atual é a dança localizada nas festas populares e sepultamentos, em que as tribos eram identificadas por bandeiras coloridas (JORGE JUNIOR, 2019).

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É importante observar que foi no distante ano de 1938, que a fantasia do mestre-sala e da porta-bandeira passou a ser um quesito de julgamento no desfile das escolas de samba cariocas e somente a partir de 1958 é que o quesito passou a abranger a dança do casal. Dentre os passos imprescindíveis estão os meneios, as meias-voltas, os giros completos, os torneados e as mesuras (JORGE JUNIOR 2019, p.08).

Um fato comum, em vários autores, é a tentativa de achar as possíveis origens das manifestações culturais e as personagens do nosso carnaval. Com o casal de mestre-sala e porta-bandeira não é diferente. Suas transformações e a complexidade de narrativas enquanto prática performativa dentro dos desfiles das Escolas de Samba contemplam algumas linhas investigativas.

A origem do casal e sua dança nas Escolas de Samba carioca vêm de adaptações, transformações e variações, partindo de elementos apropriados já existentes em outros movimentos já estruturados da cultura, seja popular ou erudito, um processo comum nas formações culturais.

Segundo HALL (2006, p. 237) “o significado do popular” é que mais corresponde ao senso comum, logo o autor explica: “algo é popular porque as massas o escutam, compram, leem, consomem e parecem apreciá-lo imensamente”. Importante salientar que isto não constitui nas mudanças pelas quais o samba e o Carnaval passaram durante o tempo histórico, que nos faz perceber conflitos identitários e relações de poder que aconteceram durante sua existência, conforme indica Hall (2006).

Há uma luta contínua, irregular e desigual da cultura dominante com o objetivo de desorganizar e reorganizar a cultura popular. Portanto, há pontos de resistência e aceitação, como aduz HALL (2006) ao chamar de dialética da luta cultural.

Cabe salientar que durante muito tempo, as culturas dos trajes das festas de salões estiveram incorporadas aos trajes de mestre-sala e porta-bandeira, e nesse conjunto as cabeças, independente de enredo, traziam referências à nobreza da colonização com o uso das perucas. De tal forma, o hibridismo cultural em que se constituiu a dança e os trajes do casal de mestre-sala e porta-bandeira, nos remete ao que diz Burke, (2006) sobre as práticas culturais híbridas que, também, podem ser identificadas na música, na religião, na linguagem, no esporte e nas festividades, a partir das inclusões entre as criações e as pessoas.

Nas figuras a serem expostas de números 03 e 04 (três e quatro) podemos verificar algumas damas, entre os anos de 1940 a 1950 que mesmo sem uma adereçaria na cabeça como utilizada na atualidade, ainda existia a preocupação e cuidados com os cabelos. Na maioria dos exemplos, elas usavam uma coroa ou tiara para adornarem seus penteados. Esses elementos simbólicos são carregados de características da nobreza do início do sec. XIX, período que influenciou a dança do casal e seus trajes no contexto do carnaval carioca.

Nos anos seguintes, nas figuras que serão exibidas nessa seção, observamos um tratamento mais elaborado para o casal que se mostram ambos com perucas, bem como trazem traços simbólicos na adereçaria da cabeça que mostram elementos dos enredos. Quanto aos personagens masculinos, não usavam perucas, mas traziam como adereços de cabeça um chapéu decorado.

Nos anos de 1940 a 1950, tais aspectos denotam a preocupação com a cabeça, seja com relação ao mestre-sala ou à porta-bandeira. Nos anos de 1960 a 1970, os mestressalas tinham suas cabeças compostas por perucas, e algumas vezes sendo acompanhadas por elementos e designs exibidos como adereços de cabeças das portas-bandeira.

As fotografias prestam-se como aporte investigativo às influências das estruturas estilísticas europeias, especialmente quanto ao uso da peruca, que historicamente, segundo Pereira (2019), elas eram para as elites um adereço que os diferenciavam dos mais pobres, por ser um adorno extremamente caro, eram usadas tanto por homens quanto por mulheres.

A moda começou com Luís XIV da França, o Rei Sol, que durante sua regência adotou o item por necessidade, uma vez que desde a adolescência, ele já expunha sinais

de calvície. Desde então, usar perucas passou a ser status de prestígio e distinção social. Os cabelos falsos, como também eram conhecidos, serviam para esconder os primeiros vestígios da doença (sífilis), amenizava a vergonha que um nobre poderia passar. Originalmente de cabelo humano ou crina de cavalo, as versões mais baratas das perucas podiam ser de lã (PEREIRA, 2019).

O uso das perucas não foi popular no Brasil, apenas os homens de leis, magistrados e alguns nobres, homens e mulheres europeus, mesmo em solo brasileiro, insistiam em exibi-las, a França era a maior irradiadora de modas do período. No século XIX, os ingleses passam a dominar o guarda-roupa masculino, que influenciava inclusive os brasileiros.

Na figura 03 (três) 1941, conta com a imagem da porta-bandeira Dodô, Maria das Dores Alves Rodrigues, mais conhecida como Dodô da Portela (G.R.E.S Portela), notase que a mesma usava apenas um adereço de cabeça que nos lembra uma coroa, nesse ano seu par foi Manoel Bam Bam Bam que não aparece na foto. Tal desfile aconteceu no ano de 1941 com o enredo “Dez anos de glórias.”1

O samba no ano de 1941, “Dez anos de glórias”2 dizia; “Vem para me fazer a vontade/Sem você não tenho mais felicidade/Nunca mais voltou para rezar no santuário/O meu coração se transformou em lacrimário.” O samba inteiro só tinha essa única estrofe.

1 Enredo Portela 1941. Disponível em http://www.galeriadosamba.com.br/escolas-desamba/portela/1941/. Acesso em 27/12/2020.

2 Enredo Portela- Dez anos de glórias. Disponível em ;https://www.gresportela.org.br/Historia/DetalhesAno?ano=1941 . Acesso em 20/12/2020.

Figura 03: Porta-bandeira Dodô carregando a bandeira da Portela no desfile campeão de 1941. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Dod%C3%B4_da_Portela#/media/Ficheiro:Desfile_da_Escola_de_Samba_P ortela_(1941).jpg . Acesso em: 16/12/2020.

É possível notar que a porta-bandeira não expôs características que lembrassem a abordagem do samba em seu adereço de cabeça, que no raro registro, traz uma coroa em cima de um penteado, provavelmente, com seu próprio cabelo, bem como em seus trajes também não fez alusão ao samba de enredo. Observa-se as influências da nobreza europeia no festejo de Momo, refletida nos trajes da porta-bandeira Dodô no que se refere ao uso de luvas, da coroa e do tecido acetinado em sua veste.

Na figura 04 (quatro) no ano de 1953 o mestre-sala Adão trouxe um chapéu na cabeça e a porta-bandeira Dodô veio com um penteado da época, e um pequeno adereço em seu cabelo, com o enredo “Seis Datas Magnas”3 . O samba desse desfile dizia assim em parte do trecho: “4Foi Tiradentes o Inconfidente/e foi condenado à morte/trinta anos depois o Brasil tornou-se independente/era o ideal de formar um país livre e forte/Independência ou morte/D. Pedro proferiu.” No desfile de 1953, na figura 04 (quatro) a porta- bandeira

3 Enredo Portela1953. Disponível em : https://www.gresportela.org.br/Historia/DetalhesAno?ano=1953 . Acesso em 27/12/2020.

4 Enredo Portela “Seis Datas Magnas”. Disponível em : https://www.gresportela.org.br/Historia/DetalhesAno?ano=1953. Acesso em 21/12/2020.