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Quadro 25 Editoras de autores/artistas
6.3.2 Editoras de autores/artistas
Do quadro de editoras musicais apresentado acima, 45 editoras pertencem a compositores, o que representa 60% do total.
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Quadro 25: Editoras de autores/artistas
Fonte: Pesquisa de campo do autor.
Neste quadro, não consta o compositor Capinan que foi proprietário da editora baiana ―Soy loco por ti‖, e, por questões burocráticas, preferiu transferir seu catálogo
para uma editora carioca, a Arlequim, onde edita suas parte de suas obras mais recentes. Outra editora carioca que atende Capinan é a Musiclave, do mesmo grupo empresarial da Arlequim.
6.3.3 A formação do campo e o empreendedorismo institucional
Como informado no capítulo teórico, na Teoria Institucional, o Empreendedorismo Institucional vincula-se aos modos utilizados pelos indivíduos e/ou organizações no desenvolvimento de novas normas, atividades e regras institucionais que reconfigurem comportamentos e atitudes (DACIN et al., 2002; DIMAGGIO, 1988; NORTH, 1990). A criação de novas instituições e organismos que empreendem arranjos em campos institucionais existentes ou formulam um novo "campo organizacional" (AOKI, 2001; DIMAGGIO, 1991) foi o que aconteceu na Bahia a partir da década de 1980, com a ascensão da música baiana massiva. O ano de 1985 marca o início destas atividades no estado, a partir da criação da produtora e editora musical, atualmente desativada, Arco e Flexa, de propriedade do cantor e compositor Gerônimo, e, segundo sua empresária, Regina Coutinho, em entrevista concedida no dia 10 de agosto de 2010, a sede da empresa Arco e Flexa funcionava no Largo do Pelourinho e ―[...] há, aproximadamente, 15, 16 anos um incêndio destruiu todos os documentos, registros e objetos. De lá para cá, tudo funciona na aqui, na casa de Gerônimo, mas a empresa foi desativada‖. O ano de 1986 marca o início da Stalo Produções Artísticas e Comércio Ltda, de propriedade do produtor musical Ricardo Cavalcanti, e foi a partir da coletânea ―Bahia, Carnaval e Cerveja‖, produzido em parceria com a gravadora Polygram Discos neste mesmo ano, que as atividades de edição musical efetivamente se iniciam na Bahia. Para Ricardo Cavalcanti, em entrevista concedida no dia 17 de setembro de 2010:
Na verdade foi um LP – na época ainda não existia CD no Brasil – e chamava-se ―Bahia, Carnaval e Cerveja‖. Tratava-se de uma coletânea das músicas dos melhores blocos de carnaval de Salvador, entre eles: Pinel (o top da época), EVA, Filhos de Ghandy, e Beijo. Este disco foi um marco na música baiana por se tratar do primeiro disco lançado com os fonogramas desses blocos, até ele, os blocos simplesmente colocavam as músicas temas para tocar nas rádios, sem discos. Nós os reunimos. Este disco foi prensado na Polygram (atual Universal) e foi pago com recursos próprios. Como vendeu 30.000 unidades só na Bahia, numero bastante expressivo para a época, fomos convidados pela Polygram a fazer uma parceria. Nós produzíamos nossos fonogramas e eles fabricavam e
distribuíam no Brasil e nos pagavam um royalty sobre as vendas. Esta parceria durou 15 anos (CAVALCANTI, 2010).
Roberto Santana, à época produtor musical de companhias discográficas instaladas no Rio de Janeiro, quando em sua constante interlocução com Wesley Rangel, foi quem teria disseminado esta prática e atividade na Bahia, orientando, fornecendo modelos de documentos e contratos, além de contatos com as associações arrecadadoras instaladas no Rio de Janeiro/RJ104. Esta articulação também beneficiou João Portela, à época, um dos assistentes de Wesley Rangel, atual gerente, filial Bahia, da Associação Brasileira de Música e Artes – ABRAMUS. Em seu depoimento, Ricardo Cavalcanti informa ter recebido orientação e informação sobre administração de obra musical a partir de seu contato com funcionários das gravadoras sediadas no Rio de Janeiro.
Com relevante experiência adquirida na WR e editoras musicais como Páginas do Mar (Daniela Mercury), Bahia Discos (Rede Bahia) e Bichinho Edições (Cal Adan), João Portela, advogado por formação, também reconhece a relevância de Roberto Santana105. Portela afirma que ―[...] Nas editoras em que trabalhei, atendemos e orientamos não somente os autores, mas muitos artistas interessados em ter sua própria empresa‖ (2011, p. 03). Neste sentido, compreendendo campo organizacional enquanto "[...] organizações que, em conjunto, constituem uma reconhecida área da vida institucional" (DIMAGGIO e POWELL, 1983, p. 148), a emergência de novos campos organizacionais são processos complexos para os empreendedores institucionais, envolvendo considerável nível de articulação, busca de apoio e recursos, negociação e resolução de conflitos (DIMAGGIO, 1988; GREENWOOD et al., 2002). Entre os estudos empíricos que têm procurado analisar a formação institucional, principalmente nos Estados Unidos (DIMAGGIO, 1991; HOLM, 1995; WALTER, 2001), a relação cultura e desenvolvimento como um novo campo organizacional tem oferecido uma oportunidade atraente para examinar fatores que moldam e influenciam o processo de empreendedorismo institucional. O empreendedorismo institucional, regra geral, enfatiza como o processo organizacional e instituições são desenvolvidas a partir de forças criativas empreendedoras que oportunizam mudanças. Não obstante, investiga as propriedades
104 Roberto Santana concedeu entrevista em 22 de outubro de 2010. 105 Entrevista concedida em 07 de abril de 2010.
que diferenciam o empreendedor de outros atores do campo, via abordagem da psicologia cognitiva, mas, também do empreendedor como ator reflexivo e crítico. Neste sentido, ainda há muito a pesquisar acerca da música baiana como, por exemplo, quem são estes empreendedores institucionais e quais seus diferenciais num mercado competitivo. Esta articulação iniciada pelo produtor Roberto Santana foi relevante no desenvolvimento do campo baiano da gestão da obra musical, o que não ocorreu em outros centros de produção musical, vide Recife, Goiânia, Belo Horizonte. Para Greenwood et al. (2008), o institucionalismo organizacional preocupa-se, em linhas gerais, com instituições e processos de institucionalização no que se refere às organizações e ao campo organizacional, mas ampliou os estudos para a relevância central dos atores sobre a origem, manutenção e transformação de estruturas institucionais, argumentando positivamente acerca da protagonismo e proatividade dos atores individuais e organizacionais (SCOTT, 2001). Neste sentido, se aplica o conceito de agência, central na teoria institucional, e, consequentemente, ao empreendedorismo institucional, destacando, o agente como aquele diretamente vinculado ao proprietário e possuidor de agência, enquanto o empreendedor institucional é aquele que exerce atividades de empreendedorismo institucional. Agência incorpora ações intencionais e não-intencionais na capacidade de ação (MACHADO-DA-SILVA; FONSECA; CRUBELLATE, 2005). Sendo assim, os primeiros artistas, editores e empresários da música baiana se configuram como empreendedores institucionais e agentes na busca de seus interesses de forma consciente, articulada, planejada e dotada de considerável habilidade analítica (KOENE, 2006; GREENWOOD; SUDDABY, 2006; BATTILANA, 2006; BECKERT, 1999).
O campo da gestão da obra musical, a partir deste grupo de organizações que formam uma determinada área reconhecida de vida institucional, a gestão cultural, em que são compartilhados os valores, as normas e os demais significados comuns (SCOTT, 1991). DiMaggio e Powell (2005, p. 76) conceituam campo organizacional
como:
[...] aquelas organizações que, em conjunto, constituem uma área reconhecida da vida institucional: fornecedores-chave, consumidores de recursos e produtos, agências regulatórias e outras organizações que produzam serviços e produtos similares‖ (2005, p. 76).
Neste sentido, a gestão da obra musical na Bahia é composta por inúmeras organizações relevantes no campo da produção musical, fonográfica e da gestão cultural, conectadas e equivalentes estruturalmente. Para conectividade, entendem os autores como ―a existência de transações que vinculam as organizações umas às outras‖. Para ―equivalência estrutural‖, a similaridade de vínculos estruturantes com os ―mesmos grupos de outras organizações‖. Para DiMaggio e Powell (1983, p. 148) o campo organizacional só pode ser considerado se houver legitimação empírica e com definições institucionais. Para tal, os autores afirmam que são necessários quatro elementos para a sua estruturação:
e) um aumento na amplitude da interação entre as organizações no campo; f) o surgimento de estruturas de dominação e padrões de coalizões interorganizacionais claramente definidos; g) um aumento na carga de informação com a qual as organizações dentro de um campo devem lidar; h) o desenvolvimento de uma conscientização mútua entre os participantes de um grupo de organizações de que estão envolvidos em um negócio comum.
Bourdieu (2003), em seu estruturalismo cognitivo106, opera com o conceito de campo a partir da configuração de relações entre atores posicionados com objetividade, procurando impor e influenciar os demais, a partir da sua posição na estrutura social dominação, subordinação, entre outros. O objetivo, para Bourdieu, está na posse e acesso aos benefícios que estão em jogo no campo, ou seja, este se configura como uma arena de disputa por legitimidade, onde estão os dominadores e os dominados. Para autores como Everett (2002), a lógica de Bourdieu contém, implicitamente, o determinismo social, e prossegue sua crítica, identificando aproximações e fusões entre a noção bourdiniana de classe com a visão de Marx para classe social, e Weber e seu conceito de status de grupo. Neste sentido, o surgimento do campo da música baiana se fortalece com a apropriação destas atividades vinculadas a relevantes etapas da produção musical, ampliando as possibilidades de atuação no campo da indústria fonográfica e da propriedade intelectual.
106 Construtivismo estrutural ou estruturalista construtivista é como o próprio Bourdieu define a sua abordagem que, brevemente, poderia ser entendida a partir do objetivo de superar a dicotomia existente entre objetivismo e subjetivismo. Defende a análise sociológica a partir de dois momentos: o primeiro é a análise do espaço social, e a segunda é a própria noção de habitus – aqui compreendida, como a internalização ou institucionalização das estruturas e esquemas mentais na compreensão do mundo.
A estruturação deste campo é conveniente aos artistas, empresários e editores musicais do estado. Convergentes com DiMaggio e Powell (1983) acerca da estruturação do campo a partir dos quatro elementos apontados acima, Phillips, Lawrence e Hardy (2000) trabalham com a estruturação de um campo a partir da relação direta de dependência do fator colaboração. Ressaltando os campos institucionais como fonte de regras, analisam o papel da colaboração e dos aspectos relacionais neste, propondo um modelo teórico a partir de quatro situações distintas, presentes na estruturação do campo. Para os autores, as regras, as relações de poder e os recursos dos atores em um determinado campo definem os processos de colaboração e, em paralelo, os próprios campos são reconfigurados pelos resultados desses processos. Em outras palavras, quanto maior a interação e colaboração entre os atores do campo, maior a possibilidade de reconfiguração e estruturação deste. Para Machado-da-Silva et al. (2003), Giddens (2003) ainda que não aborde o campo organizacional como unidade de análise ou mesmo conceito, é possível utilizá-lo em sua abordagem acerca de sistemas sociais e sua multiplicidade a partir da teoria da estruturação e da construção social da realidade de Berger e Luckmann (1967). Machado-da-Silva et al. (2003), entretanto, alerta que compreender a estrutura como forma de reprodução de sistemas estruturais a partir dos atores pode ser útil, mas, também, deve-se aceitar as inúmeras outras possibilidades de interação no campo que podem alterar, consideravelmente, a estruturação do mesmo. Para estes autores, a realidade é construto da ação humana, via processo histórico de institucionalização de ações, regras, valores e crenças compartilhadas entre os atores, que passam a orientar os comportamentos individuais ou organizacionais. De acordo com a teoria da estruturação, os atores sociais criam e seguem regras. A partir desta abordagem, agência é a capacidade do ator de protagonismo no mundo social, alterando regras ou provocando (re)configurações de diversas ordens. Para Giddens (1989) e Scott (2001), todos os atores possuem, em diversos níveis de análise, capacidade de agência, mas esta é de alta variabilidade entre os atores e as estruturas sociais.
Para autores como Vieira e Paula (2009), um campo além de possuir características próprias, historicamente, registra fases distintas em seu processo de estruturação. Para tanto compreendem quatro etapas: a) ―campo em pré-formação‖; b) ―campo emergente‖; c) ―campo em expansão‖; d) ―campo institucionalizado‖ (VIEIRA; PAULA, 2009, p. 32).