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Mangás e animes: a cultura pop japonesa

Made in Japan

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A indústria de cultura pop japonesa movimeta bilhões de dólares por ano. As produções de mangás e animes são um sucesso dentro e fora do país. O Brasil representa uma parte importante dos consumidores dessa cultura

Texto: Gabriella Soares Imagens: Divulgação Diagramação: Gabriella Soares

NÃO É DE HOJE que mangás são conhecidos pelo público brasileiro. Os fãs dessa arte garantem a distribuição dos produtos da cultura pop japonesa no país. A Panini e a JBC (Japan Brazil Communication) são as editoras líderes de mercado no segmento e lançam por mês, em média, 30 novos volumes do estilo, segundo dados das próprias empresas. O mangá é um estilo de desenho japonês que foi inventado no século XVII e significa “desenhos involuntários”. Em 1950, o trabalho de Osamu Tezuka transformou a arte em histórias em quadrinhos. Foi nesse momento também que essa tradição artística passou a ter as características que apresenta hoje. O traço estilizado e expressivo, em sua maioria em preto e branco e a finalização narrativa são marcas da produção japonesa.

Alexandre Nagado, autor do Almanaque da Cultura Pop Japonesa, afirma que “esse gosto pela estilização no traço vem de séculos, em contraposição ao modelo de quadrinho americano, que sempre buscou mais realismo em seu design. Em termos de história, com poucas exceções, os japoneses gostam de narrativas com começo, meio e fim, enquanto os americanos reciclam eternamente seus maiores sucessos”.

A indústria de mangás no Japão é uma prova da sua importância e solidificação no mercado de histórias sequências. Segundo dados da Associação Japonesa de Papel são movimentados mais de R$ 14 bilhões por ano nessa área. No país, cada capítulo de uma história é publicado semanalmente em revistas voltadas especificamente para o mangá, como a Shonen Jump, que lançou obras de sucesso, como Cavaleiros do Zodíaco, Naruto e One Piece, por exemplo. Após um número específico de capítulos, é lançado um volume independente para venda. O fator cultural também é uma influência para a produção, já que o pop nipônico é voltado para a comercialização dentro do próprio país e para a retratação de sua cultura. No entanto, essa representação às vezes pode acontecer de forma idealizada, como aponta Pedro Henrique Conceição, pesquisador da Universidade Federal Fluminense (UFF), que estuda os fãs desses produtos. “Os japoneses costumam trabalhar com diversos estereótipos do que é ‘ser japonês’. O mais interessante é que quando consumimos acreditamos que esse imaginário realmente se trata do Japão. Porém, todo produto de uma indústria cultural sempre favorecerá uma imagem”, avalia.

Inserção no Brasil Em 1980, Lobo Solitário, de Kazuo koike e Goseki Kojima, foi a primeira publicação de estilo nipônico no país. A editora Cedibra, agora extinta, lançou a obra adaptando o estilo de leitura para o ocidente. Ou seja, a ordem de leitura era da esquerda para a direita e não “de trás para a frente”, como é originalmente.

A partir dos anos 2000, a cultura japonesa se tornou mais popular no país pelo sucesso dos animes Os Cavaleiros do Zodíaco e Dragon Ball. O público, então, passou a exigir um conteúdo mais fiel ao original e o estilo japonês passou a ser respeitado.

Atualmente, três editoras têm como uma de suas principais bandeiras os mangás, a multinacional Panini e as nacionais JBC e NewPOP. Juntas, elas garantem a importação de, em média, 40 mangás diferentes para o Brasil por mês. Não há divulgação do número de vendas, mas Nagado estima que o mercado nacional tem certa maturidade. “Há vários títulos sendo publicados e lançamentos são anunciados a todo momento. Isso indica certa consolidação do mercado, mesmo que não exista nenhum fenômeno de vendas atualmente”, avalia.

A exemplo do Japão, o mercado editorial brasileiro leva em consideração os fãs para as estratégias de publicação, já que o país conta com uma base de entusiastas. Para Conceição, isso é reflexo da identificação do público, que agora é mais variado em idade, interesses e classe social, com as produções, “muitas vezes por conta de como os temas são retratados. Algo que aproxima o Brasil e o Japão é o pensamento altamente moral das culturas”. Maria Luiza Grantaine, conhecida como Moo-chan na subcultura formada por fãs de produtos

Kodomo Voltados para crianças, tratam de aventuras inofensivas, como Pokémon e Hamtaro

Shounen Histórias para jovens do sexo masculino de aventura, como Naruto e One Piece

Shoujo Mangás para o público feminino jovem sobre relacionamentos, como Sakura Card Captors e Sailor Moon

Seinen Voltados para adultos, tratam de violência e política, como Death Note e Old Boy

Hentai Gênero erótico com mangás voltados ao consumo adulto, como Futari H nipônicos, é um exemplo. A mulher de 24 anos é atriz, estudante universitária e, além de consumidora, também é a apresentadora do Bunka Pop, um programa de TV e do YouTube que tem como foco produções japonesas. “Acho que faz parte dessa cultura a participação ativa do fã, seja com cosplay, fanart, cover de músicas, etc. Não nos contentamos em consumir a obra, queremos fazer parte de sua produção também”, comenta. No Brasil, essa demonstração de afeto dos fãs encontra espaço em diferentes eventos que ocorrem pelo país. Um exemplo é o Anime Friends, que é realizado desde 2003 em São Paulo e reúne uma média de 120 mil entusiastas de mangás, animes e da cultura pop japonsa em geral.

O anime que abriu espaço para a maior distribuição de mangás no Brasil, Cavaleiros do Zodíaco, teve diferentes versões em mangá e anime, inclusive uma nova animação está prevista para este ano, pela Netflix.

A arte de animação japonesa

Essas características também servem para entender os consumidores brasileiros de animes, que na maioria das vezes é a adaptação de um mangá. Os animes surgiram no Japão nos anos de 1910 – não há registros oficiais por causa de desastres naturais e da Segunda Guerra Mundial. Para comemorar o importante elemento cultural, o país convencionou o ano de 2017 como o centenário dessa arte.

Tal forma de produção cultural, entretanto, só ganhou força na segunda metade do século XX. As obras de Osamu Tezuka, que também revolucionaram os quadrinhos japoneses, permitiram que os animes chegassem à televisão em curtas metragens, longas e séries de em média 20 minutos. É nesse momento que começa a mundialização. Em 1963, a estreia de Tetsuwan Atom (Astro Boy) foi um marco para a exportação para o ocidente.

Como essa produção sofreu as mesmas influências das histórias em quadrinhos, muitas de suas características são similares; além de algumas serem a adaptação da mesma narrativa e personagens para o novo meio. Apesar das diferenças tecnológicas necessárias e do uso de cores, muito continua o mesmo: histórias com começo, meio e fim, representação da cultura japonesa e traço estilizado.

Processo de globalização

A indústria de animes tem grande importância econômica e cultural no Japão, mas também há aspectos políticos envolvidos na globalização das produções. “O anime e o mangá, assim como o videogame, representam parte importante do ‘soft power’ japonês. Em termos de negócios, o próprio governo já revelou que a cultura pop representa um item de exportação do Japão”, explica Alexandre Nagado.

“Soft power” é a estratégia de um país expandir sua influência global através de produtos culturais ou de consumo, e não de poder econômico ou militar. O Japão passou a investir nessa política após 2010, e criou o Cool Japan Fund, uma parceria público-privada, para o financiamento de produtos nipônicos, como o pop japonês.

Fenômenos dos anos 90

Apesar dos animes serem conhecidos no Brasil desde 1960, “a grande explosão começou no final de 1994, com os Cavaleiros do Zodíaco. Foi um fenômeno de audiência sem precedentes, com lances de verdadeira histeria coletiva que impulsionou o mercado de licenciamento e editorial no Brasil”, situa Nagado. O lançamento da obra de Masami Kurumada abriu espaço na TV aberta do país para a exportação das animações japonesas.

Digimon, Pokémon, Dragon Ball, Sakura Card Captors e Hamtaro são alguns dos animes que conquistaram o público infantil e jovem brasileiro. Para Maria Luiza Grantaine, a forma de transmissão foi um impulsionador. “Por três décadas – 80, 90 e 2000 – a dublagem também aproximou muito essas obras do público brasileiro e para mim essa foi a grande fórmula do sucesso”, comenta. No entanto, as produções não têm mais tanto espaço e ficaram restritas à canais da TV por assinatura e aos serviços de streaming. Mas há a questão de acessibilidade, já que, como aponta Pedro Henrique Conceição, “a televisão paga ainda não é uma realidade para o grande público. A TV aberta ajuda a popularizar ideias e diversos tipos de produtos e produções. Na época de exibição de Naruto no SBT [em 2007], o anime virou febre no Brasil”.

No que diz respeito às empresas de streaming, além da Netflix, que possui 72 títulos no catálogo, a Crunchyroll é especializada em produtos asiáticos. Ela funciona no Brasil desde 2012 e transmite animes antigos e atuais, alguns de forma simultânea com o Japão, ao público brasileiro com legendas em português.

Esse cenário, apesar de positivo para os que já são fãs da cultura pop japonesa, dificulta a disseminação das produções e o interesse de novos públicos, incluindo os mais jovens. “A maioria das pessoas desse meio começou a assistir anime na TV, e mesmo com o fácil acesso à internet atualmente, no Brasil ela ainda não é tão acessível ao brasileiro médio, o que dificulta o consumo desse tipo de produção”, pontua Maria Luiza.

O Studio Ghibli foi fundado em 1985 e até o ano de 2014 produziu mais de 20 animes longa metragens. Ele foi criado pelos renomados diretores Isao Takahata e Hayao Miyazaki, que voltou de sua aposentadoria e está trabalhando em um novo filme previsto para 2020. O Stúdio Ghibli se diferenciou na qualidade, estética e histórias de suas animações. Abaixo você pode conferir alguns de seus maiores sucessos:

1988 - Meu Vizinho Totoro

Esse filme de Hayao Miyazaki conta a história de Mei, que descobre no quintal de sua nova casa a entrada para uma floresta mágica, onde vive Totoro, um espírito protetor. O longa ganhou seis prêmios no Japão e o personagem Totoro, inclusive, se tornou o logo do estúdio.

1988 - Túmulo dos Vagalumes

Isao Takahata dirigiu e roteirizou esse filme ao mesmo tempo que seu colega fez Totoro. Considerado como um dos melhores filmes de guerra já feitos, Túmulo dos Vagalumes, conta a história de duas crianças, Seita e Setsuko, tentando sobreviver sozinhas durante a Segunda Guerra Mundial no Japão.

1997 - Princesa Mononoke

Esse anime de Miyazaki acompanha um príncipe doente que, em sua jornada em busca da cura, se depara com Mononoke, uma humana que foi adotada por deuses-lobo. A garota é a líder de uma rebelião dos animais, deuses e espíritos contra os seres humanos, que exploram a natureza e os animais.

2001 - A Viagem de Chihiro

Um dos maiores sucessos do Studio Ghibli no ocidente, dirigido e escrito por Miyazaki, o filme conta a história de Chihiro, uma menina de dez anos, que no caminho de sua mudança com a família acaba perdida em um mundo sobrenatural. A trama ganhou o Oscar de Melhor Animação em 2003 e outros 33 prêmios.

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