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“A ÁGUIA VERMELHA”

No dia 23 do corrente mês de Abril achando-me na Legação por volta do meio dia, fui procurado por um empregado do Paço que me entregou um convite para jantar nesse mesmo dia com Suas Magestades Imperiais.

Grande foi o meu espanto por serem tais convites absolutamente contra a etiqueta.

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Na Côrte de Berlim só os Embaixadores são convidados a jantar; os outros Cefes de Missão nunca têm essa honra, excepto quando os seus respectivos Soberanos, Seus Filhos ou Irmãos se acham nesta residência.

Não se dando então nenhuma destas circunstâncias, fácil será ajuizar da curiosidade que se apoderou de mim.

Ás 5 horas a tarde, segundo as indicações do convite, apresento-me no Palácio.

Poucos minutos depois Suas Magestades davam entrada na sala e o Imperador, depois de ter saudado o resto dos convidados, dirigiu-se a mim e apertando-me a mão disse :

“Comment vous nous quitez?”

Muito admirado, observei respeitosamente a Sua Magestade que nada sabia a esse respeito, ao que me retorquiu : “Cependant je le sais officiellement et por vous marquer mon estime, je vous ai ac corder quelque chose de grandiose (sic), la croix au cou de l’aigle rouge! Outre cela, je vous invité á ma table se qui est une derogation á tous les usages.

Profundamente comovido por estas expressões proferidas em voz alta e diante de todos, disse algumas palavras, agradecendo a Sua Magestade estas manifes tas provas da sua bondade, mas entendi dever repetir-lhe que eu não tinha aviso da minha partida, ao que ele respondeu :

“Tant mieux; vous garderez quand même la decoration que je vous ai accor dée, et j’espere que elle sera un bien de plus qui vous attachera á Berlin”

Passo por alto as demais expressões de bondade que o Imperador e a Imperatriz me dispensaram ainda depois do jantar.

Tendo-me Suas Magestades despedido, dirigi-me imediatamente á Legação, aon de referi textualmente ao Exmo Chefe desta Missão o que fica dito.

A emoção causada por estes aconteci mentos era muito grande, o que se ex plica, sendo o caso de um Secretário de Legação jantar nestas condições com o Imperador, absolutamente sem prece dentes, pois nem somos autorizados a despedirmo-nos de Sua Magestade, quando nos retiramos desta Côrte. Além disso a condecoração que me foi conferida é tão alta que nenhum Secretário ou Conselheiro de Embaixada a possui neste mo-

Fui ao Ministério e eis o relato dessa entrevista :

Mr. de Holstein começou por me dizer que Sua Magestade, o Imperador, havendo recebido do Ministério a notificação apenas nota da promessa de me ser esta conferida quando partisse.

Enquanto á terceira Classe parecia-me ser inútil conceder-ma, porquanto não partindo eu por ora, nem tendo sido assinado nenhum tratado entre Portugal e a Alemanha, podia isso parecer a muitos uma derrogação aos usos estabelecidos, mas, acrescentei eu, se é necessário aceita-la, peço que me deem tempo para consultar o meu Chefe, para tomar uma resolução definitiva.

Partilhando este meu modo de ser, Mr Holstein deu-me um “rendez-vous” para as 10 horas da noite.

Isto passava-se ás 3 horas da tarde.

Pouco depois, Mr. Holstein fez-me saber que “l’affaire étant entrée dans une abutre fase, le “rendez-vous” arreté n’aurait plus de but”.

Esta mudança, (soube-o depois), proveio de uma conversa que o “Marechal de la Cour”, conde de Perponcher tivera com o Príncipe de Hohenlohe e em que o primeiro afirmaria a vontade do Imperador de manter intacta a resolução primitiva.

Sua Magestade partiu, nessa mesma noite para Wiesbaden.

Os dias 26 e 27 passaram-se sem que me fosse feita comunicação nenhuma, mas hoje, pela manhã (28), foi-me comunicado pelo Exmo. Chefe desta Missão que o Príncipe de Hohenlohen lhe dissera ontem que em consequência da resolução do Imperador de me manter a condecoração, primitiva, o Príncipe de Bismarck entendia que eu devia deixar esta residência, não podendo admitir que me fosse concedida tão alta distinção, sem que fosse motivada pela

Escusado é insistir sobre o efeito que esta resolução há-de causar sobre o espírito do Imperador que, querendo dar-me uma prova da sua benevolência, será involuntariamente a causa da minha parti-

Nesta conjuntura nunca deixei de consultar o meu Chefe, como era do meu dever, e devo dizer que tanto Sua Excelência como o Embaixador de Inglaterra aprovaram sem reserva o modo como me zia, eu me considerava mais do que satisfeito do modo porque o Imperador me havia tratado, e que, longe de reclamar as insígnias da condecoração que o Imperador me havia concedido, eu tomava