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OPINIÃO

esPaÇo JoRNaLIsta MaRtINs de VasCoNCeLos

Organização: CLaudeR aRCaNJo

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COVID XI

RaIMuNdo aNtoNIo de souZa LoPes

é escritor e jornalista rsouzalopes@hotmail.com

Dora, traga umas rodelas de abacaxi. O pedido feito pelo celular para a “minha enfermeira predileta” confirmava a minha total convicção de permanecer entre os que chamamos de vivos. No entanto, não foi fácil “engolir” as duas fatias trazidas por dona Dora. Se mastigar era difícil, mais enjoado ainda era engolir algo que parecia ter se transformado em um pedaço de isopor ou um pedaço de borracha. Só muita determinação e uma boa dose de paciência para ir “passando pra dentro” sem precisar, em seguida, “dar de comer a Joli”. Mais uma vez consegui. Tarefa cumprida, só me restou o básico: deitarme de novo. Se por um lado me deixava com muitas dores nas costas, por outro lado ficar deitado economizava minhas energias. Tinha, portanto, o lado bom e o lado ruim. Como tudo na vida. O frio e a escuridão só existem porque existem o calor e a luz. O frio é a falta de calor. A escuridão é a falta de luz. Tal como só existe o bem porque o mal existe. É claro que não quero adentrar nas questões filosóficas sobre isso tudo, se bem que essa dualidade possa ser interpretada apenas para dar um equilíbrio entre as forças que regem a natureza das coisas. Sei lá! Santo Agostinho, por exemplo, mostra que o problema ou a origem do mal não está em Deus que, segundo ele, é bom e justo, mas no homem com seu livre arbítrio e suas escolhas. A principal pauta do problema do mal é o dilema de como podemos conciliar a bondade divina com a maldade do mundo. Porém tem uma história, que não sei se verdadeira, que eu gosto muito e que explica, ou dá para se refletir, sobre essas coisas entre as forças do bem e do mal:

Durante uma conferência com vários universitários, um professor da Universidade de Berlim desafiou seus alunos com a seguinte pergunta:

— Deus criou tudo que existe?

Um aluno respondeu valentemente: — Sim, Ele criou... — Deus criou tudo? — perguntou novamente o professor. — Sim, senhor — respondeu o jovem.

O professor continuou: — Se Deus criou tudo, então Deus fez o mal! Pois o mal existe, e partindo do preceito de que nossas obras são um reflexo de nós mesmos, então Deus é mau.

O jovem ficou calado diante de tal argumento e o professor, feliz, se regozijava de ter provado mais uma vez que a fé era um mito.

Outro estudante levantou a mão e disse: — Posso fazer uma pergunta, professor? — Lógico — foi a resposta.

O jovem ficou de pé e perguntou: — Professor, o frio existe? — Que pergunta é essa? Lógico que existe, ou por acaso você nunca sentiu frio?

O rapaz respondeu: — De fato, senhor, o frio não existe. Segundo as leis da Física, o que consideramos o frio, na realidade é a ausência de calor. Todo corpo ou objeto é suscetível de estudo quando possui ou transmite energia. O calor é o que faz com que este corpo tenha ou transmita energia. O zero absoluto é a ausência total e absoluta de calor. Todos os corpos ficam inertes, incapazes de reagir, mas o frio não existe. Nós criamos essa definição para descrever como nos sentimos se não temos calor. E existe a escuridão? — continuou o estudante.

O professor respondeu: — Existe.

O estudante respondeu: — Novamente comete um erro, senhor, a escuridão também não existe. A escuridão na realidade é a ausência de luz. A luz pode ser estudada, a escuridão não! Até existe o prisma de Nichols para decompor a luz branca nas várias cores que a compõem, com suas diferentes longitudes de ondas. A escuridão não! Um simples raio de luz atravessa as trevas e ilumina a superfície onde termina o raio de luz. Como pode saber quão escuro está um espaço determinado? Com base na quantidade de luz presente nesse espaço, não é assim? Portanto, a escuridão é uma definição que o homem desenvolveu para descrever o que acontece quando não há luz presente.

Finalmente, o jovem perguntou

Ilustrativa

ao professor: — Senhor, o mal existe?

O professor respondeu: — Lógico que existe, como disse desde o começo, é só ler as manchetes. Vemos ações terroristas, crimes e violência no mundo o tempo todo.

E o estudante respondeu: — O mal não existe, pelo menos não existe por si mesmo. O mal é simplesmente a ausência do bem, como nos casos anteriores, o mal é uma definição que o homem criou para descrever a ausência de Deus. Deus não criou o mal. Não é como a fé ou como o amor, que existem como existem o calor e a luz. O mal é o resultado da humanidade não ter Deus presente em seus corações. É como acontece com o frio quando não há calor, ou a escuridão quando não há luz.

Por volta dos anos 1900, esse jovem foi aplaudido de pé, e o professor apenas balançou a cabeça, permanecendo calado.

O diretor dirigiu-se àquele jovem e perguntou qual era o nome dele. E ele respondeu: — Albert Einstein. (http:// www.chabad.org.br/biblioteca/artigos/luzEscuridao/home.html)

O dia havia ido quando tornei de novo do leve sono do após abacaxi. Olhei na tela do celular e já passava das vinte horas. Um novo banho era preciso, pois o suor continuava me fazendo companhia. E a tremedeira também. Na verdade, era um misto de tremedeira e palpitação. Só que eu não sabia onde começava uma e terminava a outra. Ou vice-versa. O que eu sabia era que assim como a formiguinha que trabalha o ano inteiro armazenando comida para a chegada do inverno, cada passo que eu dava para sair daquela situação representava uma luz no fim do túnel. Assim que saí do banheiro, pedi um caldo “da caridade” no capricho para dona Dora. O alimento quente me fez bem, mas como vinha acontecendo, tive que tomar apressadamente, para não dar “sorte para o azar”... vocês entendem.

Enquanto isso, o Bar do Gordo permanecia em silêncio. O silêncio da noite, agora já alta, trazia um conforto para os que começavam a se agasalhar para o descanso noturno. No quarto em que me encontrava, a falta de ruído externo, tipo conversa dos vizinhos em suas calçadas (algo tão difícil de ver nos dias de hoje), misturado ao que estava sentindo, transformava tudo ao meu redor em um vazio de incertezas, dúvidas, interrogações, desconfianças… Lentamente, quase sem forças, liguei o computador. Precisava atualizar a página da Sarau. No dia seguinte, quarta (10), o texto era da escritora volta-redondense Lilia Souza, denominado Sapatinhos de cristal. Com o compromisso cumprido, voltei para o leito… seria ele de vida ou de morte?

Sinceramente? A noite da terça para a quarta-feira passou num piscar de olhos. A fraqueza possibilitou alterar a realidade entre estar acordado e a ilusão do sono confortador. Esse misto de virtualidade e realidade, junto à fraqueza do corpo, fez com que o dia se apressasse a chegar. O suor que brotava em determinados momentos era o mesmo que, no delírio do sonho, proporcionava viagens por diferentes universos do pensamento. Era o que denominamos de pesadelo.

Continua...

DI reçÃO geral: César Santos DIretOr De reDaçÃO: César Santos gereN te aDMINIS tra tIVa: Ângela Karina DeP. De aSSINatUraS: Alvanir Carlos Um produto da Santos Editora de Jornais Ltda.. Fundado em 28 de agosto de 2000, por César Santos e Carlos Santos.

FILIADO À

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