
5 minute read
OPINIÃO
from Jornal De Fato
eSPaÇO JOrNaliSTa MarTiNS De VaSCONCelOS
Organização: ClauDer arCaNJO
Advertisement
COVID
raiMuNDO aNTONiO De SOuZa lOPeS
é escritor e jornalista rsouzalopes@hotmail.com

1º Dia
Sexta-feira, dia 29 de outubro de 2021, às 21 horas, eu fui (pode acreditar: sem querer ser) apresentado ao coronavírus e sua variante mais agressiva. Estava eu sentado na poltrona da minha mesa de trabalho, computador à frente, recebendo o frescor do vento que entrava pela área de sol que fica ao lado de onde me sento quando, de repente - não mais do que de repente -, passo a ter uns tremeliques, puxado para o lado de arrepios, pelo corpo, sem que houvesse para isso nenhuma justificativa, do tipo: mudança brusca do clima de Mossoró (de 28º para - 10º Celsius), o sol ter “parado” de funcionar e desligado seus motores atômicos ou eu ter, inconscientemente, tomado dez potes de sorvete de um quilo (cada um) em menos de cinco minutos. Nada disso aconteceu para justificar que eu passasse a estremecer o corpo inteiro, bater os dentes feito zabumba (quando tocada acompanhando um forró de Luiz Gonzaga) e ainda sem entender direito (porém com uma leve desconfiança do que possivelmente fosse) resolvi fazer o que quase todo homem faz nessas horas: fui me deitar para “ver” se passava. Ledo engano. Depois de um banho rápido, três ou quatro tentativas de conciliar o sono (sem tomar nenhum tipo de antitérmico), achei melhor “meter” 40 gotas de um deles para dentro e acabar de vez com a farra da escola de samba que o meu corpo desfilava nas avenidas das “minhas carnes”.
Agora vou dizer uma coisa que parece absurda, mas naquele momento foi estranhamente prazeroso sentir o torpor que tomou conta de mim, que veio misturado com o corpo (agora sem tremer) febril e uma espécie de alucinação fantasiosa (no caso, somente para o prazer) que relaxaram meus sentidos e eu dormi feito menino besta quando se deita com o bucho cheio de cuscuz com coalhada e tendo como “mistura” um pedaço de rapadura preta do Cariri. Sonhei com a primeira namorada, com as tertúlias da Rua da Palha; de Pajeú, na Praça da Boa Vista, do Clube Ipiranga; com a primeira vez que vi dona Dora (pronuncia-se Dôra) na bodega do pai dela, seu Chicô; das vezes em que fui noivo, em três momentos distintos e com três distintas damas; enfim, parece que a dormida, da sexta para o sábado, só me reservou os bons momentos da vida. Impecável. Bem, até então esse sonho, ininterrupto, só me causara deleite. Porém…
2º Dia
No sábado, dia 30, acordei disposto, a febre tinha ido embora, se bem que uma estranha tosse passasse a fazer rotina em minha garganta. Sabe aquela tossezinha seca, que fica a coçar insistentemente como se fosse o bichinho do ram ram? Pois foi ela. Entretanto, alheio a tudo isso, eu passei o dia “bem”. Quer dizer, bem nada! Lá por dentro de mim algo vinha se aproximando ligeiro, querendo, como se fosse um maremoto, um terremoto, um tsunami, ou uma moto de 1000cc, me engolir de qualquer jeito. Resolvi então tirar a prova dos nove e perguntar aos especialistas em eventos aleatórios à rotina social, mais conhecidos como “agentes de saúde”, o que poderiam ser esses esquisitos sintomas que estavam ocorrendo em meu interior. Juro que pensei, antes, em consultar alguma vidente famosa, mas lembrei que irmã Jurema, mãe Dinah, Chico Cocada, todos eles já não estão entre nós.
Assim, liguei para a chefe do posto da UPA do Belo Horizonte e relatei o que estava acontecendo. Ela me tranquilizou, disse que podia ser apenas uma gripe viral, porém não descartava (e foi aí que eu passei a cair “na real”) que eu estivesse com os sintomas do famigerado coronavírus. Dizem que a melhor das defesas que o organismo pode ter é a da positividade. Você pensar positivo, acreditar que sempre vai dar certo, não se abastecer de pensamentos negativos e não se maldizer de forma nenhuma é meio cami-
Ilustrativa nho andado para a autoimunização de seu corpo. Dizem que nem bala pega. Então eu precisava testar, desta vez, o meu lado mental. Se fosse apenas uma gripe, eu estava bem na fita, pois a minha positividade estava a mil; se fosse confirmada a covid, isso significava que eu precisava melhorar muito nesse conceito. Agora, aqui para nós, duvideodó que alguém diante de um cenário catastrófico, vendo se achegar algo considerado mortal (já tendo matado cinco milhões de pessoas em todo mundo) não se maldiga, pondo-se a pensar como foi que adquiriu (sem querer e ainda por cima de graça) uma desgraça dessas. Depois que desliguei o telefone, eu passei a fazer as análises de praxe: como alguém transmitiu para mim, onde, quando, e por que logo eu, que passei, desde o início da pandemia até então, tendo o máximo de cuidado, nunca havendo relaxado, sempre de máscara, usando álcool gel, evitando aglomerações, saindo só o necessário? Onde foi que errei, meu Deus!? A cabeça ficou dando voltas, a fraqueza tomando conta, os sintomas começaram a piorar, a febre voltou imediatamente, a tosse passou a ensaiar a sonata número 16 de Mozart, e lá fui eu, de novo, deitar-me. A cama, como na noite anterior, pareceu a coisa mais positiva do mundo. Adormeci logo. Porém agora o sono veio cheio de questionamentos, com imagens de parentes que já estão no “andar de cima”. Acordei sobressaltado e com o coração palpitando. E ainda era sábado. Ah, me esqueci de mencionar: a chefe do posto de saúde me disse que se os sintomas aumentassem, “corresse” para o posto para fazer o teste, porém não antes de três dias de terem começado. Como só havia sentido no dia anterior, para fazer o teste eu precisaria esperar até o dia seguinte, o domingo. Dessa forma, já isolado preventivamente dos demais da casa, aguardei os sintomas passarem, ou aumentarem, para poder tomar uma decisão. Olha, não me condenem. Homem é assim. Sempre acredita que acontece com os outros; com ele não. Eu não fujo à regra.
Continua...


DI reçÃO geral: César Santos DIretOr De reDaçÃO: César Santos gereN te aDMINIS tra tIVa: Ângela Karina DeP. De aSSINatUraS: Alvanir Carlos Um produto da Santos Editora de Jornais Ltda.. Fundado em 28 de agosto de 2000, por César Santos e Carlos Santos.
FILIADO À