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OPINIÃO
from Jornal De Fato
ESPAÇO JORNALISTA MARTINS DE VASCONCELOS
Organização: CLAUDER ARCANJO
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PRAÇA RAIMUNDO RUBIRA – PRAÇA DA BOA VISTA
RAIMUNDO ANTONIO DE SOUZA LOPES
é escritor e jornalista rsouzalopes@hotmail.com
Foi nessa praça, na segunda metade dos anos sessenta, que eu conheci dona Dora. Naquele tempo, o namoro começava, geralmente, por uma praça. Eu morava perto de uma praça. Ela, também. Um dia os nossos olhares se cruzaram e, depois disso, lá se vão, entre namoro e matrimônio, cinquenta e cinco anos.
As praças representavam as primeiras oportunidades para muitas coisas. Lembro-me de que foi, na praça da Boa Vista, que assisti aos primeiros programas televisivos. Como o aparelho de TV custava caro para a maioria da população, a prefeitura providenciou vários deles e os colocou em algumas praças da cidade. O televisor ficava, geralmente, no centro da praça, em uma espécie de estante de cimento, guardado por grades de ferro e com um servidor público – para vigiar, ligar e desligar, nos momentos predeterminados.
Na verdade, víamos mais chuviscos e ruídos, do que imagens e vozes. Mas o programa Flávio Cavalcante e a novela O Bem Amado faziam sucesso e lotavam as praças onde houvesse um desses aparelhos. E Telecatch – reis dos ringues – então, para os fãs de luta, com Ted Boy Marino, Rasputim, Verdugo, Fantomas... era o máximo. E tinha o Chacrinha, o Clube do Bolinha, o Almoço com as Estrelas...
As praças eram, portanto, pontos de encontros (os famosos points da época) da juventude. E todas as noites elas lotavam. Os rapazes, normalmente, ficavam “rodando” a praça em grupos de dois, três ou quatro. As moças ficavam paradas, sentadas nos bancos ou em torno de quem estava ali para “pastorálas”. E a paquera acontecia em cada “volta” que os rapazes davam. Às vezes, levava uma “noite” inteira para que houvesse uma aproximação, o início de um futuro compromisso. E, como hoje em dia, ir para os lugares badalados, as praças, era a possibilidade de se ver, primeiramente, a moda sendo implantada. Nelas, eram apresentados os novos modelitos.
Em torno das praças, havia os bares, as mercearias, as lanchonetes, os clubes de dança. Na praça da Boa Vista, havia a Mercearia de Elpídio (vendia do querosene à garrafa de Pitu; da cerveja ao tiragosto de sardinha; da farinha à Montilla; da rapadura ao cigarro; enfim, você se abastecia do que quisesse. Era muito conhecido e tinha um detalhe: todos eram atendidos por sua mulher, que não tirava o cachimbo da boca nem para pesar um quilo de açúcar, nem para fazer um tira-gosto de piaba torrada. No mesmo alinhamento, havia, também, o Bar do Sargento. Particularmente, gostava de frequentar. Saía de lá e, com “três passadas”, já estava na calçada da praça, já abastecido com a coragem necessária, para flertar com uma “gatinha”. E Tinha o Pajéu e sua casa de dança. Bem, isso é modo de dizer. Era, na verdade, um galpão de uns sete metros de frente por uns vinte metros de fundo. Uma portinha na frente; outra, atrás. Ou seja, um ambiente salubre, que ficava lotado de rapazes e moças, dançando coladinhos, sob uma espécie de luz negra, que deixava o local “no escurinho total”. Era bom para perder peso, pois era impossível entrar, ficar cinco minutos, e não sair com a camisa e a calça completamente molhadas. Mas, quem ligava para esse pequeno detalhe!
A praça da Boa Vista, também, era palco dos maiores acontecimentos políticos, pois comício, para ser comício, tinha que ser em praça pública. E, na praça da Boa Vista, os políticos encontravam respaldo para os lançamentos eleitorais. Podia-se dizer que não havia um acontecimento maior do que uma aglomeração popular, em que se podiam ver/ouvir as maiores lideranças públicas da cidade e do Estado. Uma vez, um líder político da época levou seus candidatos a vereadores à praça para um comício, o primeiro da campanha eleitoral. Dentre os candidatos, um, chamado Expedito Bolão. Na sua vez de falar, Expedito Bolão (que antes tinha ido “molhar o bico” na mercearia de Elpídio), em cima da carroceria de um caminhão, olhou para a multidão à sua frente, e já “puxando fogo” disse: “Os que falaram antes de mim são todos mentirosos. Eu, para me eleger, só preciso dos votos dos cornos, das raparigas e dos “viados” da Boa Vista. Disse, entregou o microfone ao “animador de comício” e desceu. Voltou para “tomar” outra lá em Elpídio. O líder político, quando ele passou ao seu lado, pegou-o pelo braço e falou: — Você acabou de perder a eleição. Na apuração eleitoral, o candidato a vereador mais votado foi justamente Expedito Bolão (passagem citada no livro biográfico “A saga de um Bolão”).
Rapazinho, eu também gostava de frequentar outras praças, juntamente com mais dois amigos: Chico Balacu e o Burro de Epitácio (olha os apelidos!). Ah, o meu era Paca Veia. Às vezes, saíamos da Boa Vista para as praças do Alto de São Manoel (Praça dos Três Poderes – ficava em frente ao Hotel Sabino Palace – hoje não existe mais) e a do Alto da Conceição (a que fica mesmo na curva que o trem dava para poder passar pela ponte de ferro). Eram as preferidas. E não faltava gente nelas, nas vezes que fomos atrás de namoradas. Detalhe: só calculando, por cima, a ida a essas praças e o retorno davam uma meia maratona. Hoje em dia, quando olhamos fotografias de pessoas dos anos sessenta, setenta... até oitenta, não entendemos o porquê daquelas pessoas serem esbeltas. A resposta é simples: andavam muito.
Hoje ainda moro perto da praça da Boa Vista. Passo por ela quase sempre, quando vou ao centro. Dá pena vê-la. Transformou-se em várias coisas, menos num lugar onde as pessoas possam se encontrar. Abandonada pelas autoridades, inutilizada para o lazer noturno, tornou-se um local perigoso até para fazer caminhada nos finais de tardes.
Ilustrativa

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