AMVAT - 06/11/2021

CADERNO ESPECIAL

AMVAT 60 ANOS

COMO O VALE SE TRANSFORMOU EM SEIS DÉCADAS

A Hora apresenta, em reportagem especial, as mudanças na região nas últimas seis décadas. A análise remonta a 1961, quando foi fundada a Associação dos Municípios do Vale do Taquari. Emancipações, investimentos em infraestrutura, desenvolvimento econômico e social estão entre os temas abordados. O Vale de ontem, hoje e amanhã.

NOVE MUNICÍPIOS FORMAVAM

O

Vale do Taquari, em 1961, era formado por nove cidades (veja mapa) com grandes extensões territoriais. Encerrou a década com 14 municípios, com as emancipações de Anta Gorda, Cruzeiro do Sul, Ilópolis, Nova Bréscia e Putinga.

Na época, sustentava a vocação rural, sem mecanização e eletrificação. E as vias de ligação não eram pavimentadas.

Neste contexto, de grandes problemas e desafios, mas com a consciência do potencial da região, surge, em 1961, a Associação dos Municípios do Vale do Taquari (Amvat), a segunda a ser criada no RS – a primeira foi a vizinha Associação dos Municípios do Vale do Rio Pardo (Amvarp), fundada seis meses antes.

Conforme o ex-prefeito de Estrela e nono presidente da Amvat - 1980 e 1981 - Hélio Musskopf, a entidade pretendia reunir gestores municipais para resolver problemas regionais e apoiar prefeitos em dificuldade. “Era a luta de todos para soluções de pro-

LUCIANE ESCHBERGER FERREIRA

blemas de cada um.”

O atual presidente da Amvat, prefeito de Santa Clara, Paulo Kohlrausch, reforça que entidade foi criada com o objetivo de a região ter uma representação política mais forte, além de oferecer apoio e suporte individual aos municípios. “Existiam demandas comuns que poderiam ser levadas às esferas superiores, com maior força política e mais probabilidade de resolução.” Os municípios também poderiam trocar experiências de ações específicas.

Com o tempo, a associação vai se modificando, fruto das mudanças da sociedade. Passa pela Ditatura Militar, na década de 1960, pelo milagre econômico brasileiro no início da década de 1970, e, recentemente, o avanço tecnológico. “E a Amvat foi caminhando paralelo a isso, sempre participativa em envolvida em grandes ações da nossa região, muitas delas com apoio de lideranças empresariais em sintonia com demais entidades representativas”, destaca Kohlrausch.

Nas comunidades do interior do Vale, como conta o economista Oreno Ardêmio Heineck, sequer tinha energia elétrica.

Aos 5 anos, morava na localidade de Picada Vinagre, atual Picada Felipe Essig, em Travesseiro, onde não tinha energia.

“Esta situação entra na década de 1960 e impunha uma realidade às pessoas que viviam da agricultura familiar: não havia o conforto da luz elétrica, banho quente, geladeira e o lazer do rádio.”

ESTA SITUAÇÃO (FALTA DE ENERGIA ELÉTRICA) ENTRA NA DÉCADA DE 1960 E IMPUNHA UMA REALIDADE ÀS PESSOAS QUE VIVIAM DA AGRICULTURA FAMILIAR: NÃO HAVIA O CONFORTO DA LUZ ELÉTRICA, BANHO QUENTE, GELADEIRA E O LAZER DO RÁDIO.” ORENO ARDÊMIO HEINECK, ECONOMISTA ARQUIVO A HORA

PULSA A VONTADE DE CRESCER A década de 1960 é marcada por um grande esforço da comunidade na busca do crescimento e desenvolvimento.

A semente foi plantada na década de 1950, quando líderes empresariais e de clubes de serviços articularam a mudança do traçado da BR-386. Inicialmente, deveria passar por Venâncio Aires, conta Heineck.

A rodovia, atualmente com 445 quilômetros de extensão, liga Iraí (km 0), na divisa com Santa Catarina, a Canoas (km 445), na Região Metropolitana de Porto Alegre, foi construída em etapas, aos pedaços. As obras começaram nos anos 1950 e atravessaram a década. Em 1960, aos 10 anos, Heineck foi com o avô conhecer as obras de abertura da BR-386, em Marques que Souza, no sentido Pouso Novo. Naquela época, o Vale era totalmente sem asfalto. Para ir de Picada Vinagre a Lajeado, o trajeto era feito de ônibus, em estrada cascalhada, com baldeação em Arroio do Meio. O itinerário seguia pela estrada velha, passava pela ponte de ferro, até chegar ao destino final.

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Uma viagem a Porto Alegre que levava 4h30 agora é feita em 1h30 ACERVO EXPRESSO AZUL

Os 25 quilômetros eram percorridos em 1 hora e 30 minutos, ou seja, numa velocidade média de 16,6 km/h.

Outra lembrança de Heineck é uma viagem a Porto Alegre, em 1959, ainda menino. Ele outros colegas estudantes participaram de uma excursão a Porto Alegre. O ônibus saía de Lajeado, passando pelo Bairro Conservas, Cruzeiro do Sul até Mariante. “Sempre ladeando o Rio Taquari.” Em Mariante, o ônibus atravessava a ponte sobre o Taquari, inaugurada por Leonel Brizola, na década de 1950. Seguia pela estrada velha (hoje BR-386),

DÉCADA DO SEM: SEM ENERGIA E SEM ESTRADAS PAVIMENTADAS

passava por Montenegro, São Leopoldo e, via BR-116, chega-

va à capital. A aventura durara quatro horas.

DINHEIRO ESTRANGEIRO É INJETADO PARA O PROGRESSO Lajeado, no início da década de 1960, estava classificada nas estatísticas entre as cidades com população entre 25 mil e 50 mil habitantes. Era governada por Bruno Born (UDN) - 31/12/1959 a 31/12/1963. E abrigava duas importantes empresas: Cia. Industrial de Papel Pirahy, com matriz no Rio de Janeiro, e a americana Souza Cruz, ambas instaladas no Bairro Piraí, atualmente São Cristóvão.

A presença de uma multinacional foi importante para o aporte de recursos do programa cooperativo Aliança para o Progresso, criado nos Estados Unidos, destinado a acelerar o desenvolvimento econômico e social da América Latina.

A sua origem remonta a uma proposta oficial do presidente John F. Kennedy, em 1961, aos embaixadores latino-americanos. A Aliança duraria 10 anos, projetando-se um investimento de 20 bilhões de dólares, principalmente de responsabilidade dos Estados Unidos, mas também de diversas organizações internacionais, países europeus e empresas privadas. Por isso, a 386 foi batizada, inicialmente, de Rodovia Presidente Kennedy.

Produção: Luciane Eschberger Ferreira Arte: Fábio Costa Diagramação: Lautenir Azevedo Junior

O VALE DO TAQUARI EM 1961 Mapa da região nas décadas de 1960/80

Mapa da região até 1959

ARQUIVO

GP ESTRADA DA PRODUÇÃO INAUGURA A OBRA DA DÉCADA

década

O jornal Diário de Notícias (RS), em de janeiro de 1963, anunciava o Grande Prêmio Estrada da Produção, evento de inauguração da rodovia. Quatro meses antes, em 20 de setembro de 1962, o governador Leonel Brizola havia inaugurado a ponte sobre o Rio Taquari, entre Lajeado e Estrela.

A largada do GP foi em Carazinho, passando por Lajeado, Estrela, Montenegro e São Leopoldo, com chegada em Porto Alegre – um total de 323 quilômetros. O vencedor da categoria força livre, Vitório Andreatta, com a carretera Ford #4, cumpriu o trajeto em 2h,51m,6s e

1960

MUNDO Os Beatles davam o tom musical nas festas jovens e influenciavam toda uma geração. No Brasil, se inciavam os festivais de música.

Era uma forma de protestar contra a Ditadura Militar - a partir de 1964. A medicina oferecia às mulheres a pílula anticoncepcional, inicialmente comercializada em 1960 nos Estados Unidos. Dois anos depois, era disponibilizada no Brasil.

média de 113,26 km/h.

A corrida, patrocinada pelo Governo do Estado e Automóvel Club do Rio Grande do Sul, seria dia 19 de janeiro, mas fortes chuvas atrapalharam a conclusão das obras, e o grande evento de inauguração ocorreu em 27 de janeiro de 1963.

POLÍTICA NACIONAL

Três partidos eram expoentes na política nacional nos anos iniciais da década de 1960: Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), com Getúlio Vargas, João Goulart e Leonel Brizola; Partido Social Democrático (PSD), a maior sigla da República Populista, com Juscelino Kubitscheck, Eurico Gaspar Dutra e marechal Henrique Lott; e União Democrática Nacional (UDN), de Jânio Quadros.

POLÍTICA ESTADUAL No Rio Grande do Sul, Leonel Brizola era o governador entre 1959 a 1963. Exilado no período de Ditadura Militar, retornou ao país em 1979. Depois de Brizola,

Ponte foi inauguarada por Leonel Brizola quatro meses antes da BR

assumiu o governo do Estado Ildo Meneghetti (PSD), até 1967, e Walter Peracchi Barcellos (PSD), até 1971.

FORMAÇÃO DA AMVAT No dia 4 de novembro de 1961, na Câmara de Encantado, os prefeitos de Encantado, Francisco Borsatto Filho; de Lajeado, Bruno Born; de Estrela, Bertholdo Gausmann; de Arroio do Meio, Antônio Setembrino de Mesquita; de Bom Retiro do Sul, Edgard Silvestre Drehmer; e de Muçum, Ermogênio Aldrovandi, além de representação do município de Roca Sales, oficializaram a criação da Amvat.

Os objetivos, de acordo com o

estatuto, eram ampliar e fortalecer a capacidade administrativa, econômica e social dos municípios; defender e reivindicar os interesses das administrações municipais e da região; e coordenar medidas que visem o planejamento integrado na região.

TELEVISÃO Os anos 1960 marcaram a inauguração do primeiro canal de televisão gaúcho. Em 20 de dezembro de 1959 entra no ar a TV Piratini, afiliada à Rede Tupi. Assistir à televisão, no ar desde 1950, era motivo para reunir a vizinhança na casa de quem tinha poder econômico para adquirir o bem.

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OBRAS DE INFRAESTRUTURA ACERVO AIRTON ENGSTER/DIVULGAÇÃO

ALDO LOPES

A

ARQUIVO A HORA

década de 1970 vem no embalo do milagre econômico brasileiro, período compreendido entre 1969 e 1973. Nesta época, com os militares no poder, o Brasil passou por um ritmo elevado crescimento econômico.

A taxa média anual de aumento do Produto Interno Bruto (PIB) foi de cerca de 10,2%. A expansão teve como um dos seus pilares o incentivo à indústria nacional, que ocorreu por meio de subsídios e benefícios fiscais.

A indústria de transformação cresceu mais de 13% ao ano no período. O setor da construção civil, que era grande empregador de mão de obra, teve ganhos de 15%.

No Vale do Taquari, os 70 foram os anos de ouro para os modais de transporte. Conforme lembra o ex-prefeito Hélio Musskopf (MDB). Estrela inaugurou o Porto durante sua ges-

tão, em 1977, no governo do presidente Ernesto Geisel. Ele não compareceu à solenidade, enviou o ministro dos Transportes, general-de-Exército Dyrceu Araújo Nogueira.

Os anos 1970 também podem ser reconhecidos como “destrava obra”. Empreendimentos de infraestutura e logística, iniciados em décadas anteriores foram retomados e concluídos Entre as obras, a ERS-130.

O economista Ardêmio Heineck conta que em 1973 comprou um Fusca na concessionária Motomecânica. Ainda sem habilitação, pediu ao sogro que levasse o carro para Arroio do Meio. A ERS-130, “a estrada nova” já estava aberta, porém, só com tempo firma para transitar. “Tivemos sorte, porque não havia chovido. Caso contrário, corria-se o risco de atolar no barro vermelho.”

ARQUIVO A HORA

RODOVIAS ESTADUAIS A Rota do Sol (RSC-453), idealizada em 1931, foi iniciada em 1972.

FERNANDO DIAS/DIVULGAÇÃO

A BARRAGEM ECLUSA DE BOM RETIRO DO SUL Começou a ser construída em 1958, mas parou em 1962. Essencial para o funcionamento do Porto de Estrela, a eclusa teve obras retomadas em 1970 e concluídas em 1976.

ALDO LOPES

ERS-130

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A chamada “estrada nova” foi aberta na década de 1970. O tráfego ficava prejudicado em dias de chuva já que não era pavimentada.

FERROVIA DO TRIGO O projeto, chamado pela imprensa de “obra do século”, foi concluído em 1978.

Entretanto, os primeiros estudos datam de 1911. A história mais recente conta que os trabalhos foram paralisados em 1968, mas destravam em 1971 a pedido dos municípios que seriam beneficiados pela ferrovia, entre eles Muçum, Roca Sales e Dois Lajeados.

EDUCAÇÃO CHEGA PARA RETER TALENTOS

Criação da Associação Pró-Ensino Universitário do Alto Taquari (APEUAT)

Início do Ensino Superior em Lajeado. Instalação do curso de Letras como extensão da Universidade de Caxias do Sul (UCS). Visita de Paulo de Tarso de Morais Dutra, Ministro da Educação e Cultura, a Lajeado, em abril de 1969

Às vésperas dos anos 1970, surgem os primeiros cursos superiores ministrados no Vale do Taquari – pela atual Universidade do Vale do Taquari - Univates - como extensão da Universidade de Caxias do Sul. Até então, os jovens buscavam profissionalização em nível superior fora da região. E muitos, não retornavam. A educação superior passa a ter o papel de reter talentos.

Da mesma forma ocorreu durante a fase das emancipações, nos anos 1980 e 1990.

Os municípios passam a se estruturar. E não era mais necessário ‘viajar’ por estradas de chão batido para frequentar Ensino Fundamental e, posteriormente, o Ensino Médio.

Ex-prefeito de Estrela, Hélio Musskopf se considera um contabilista autodidata. Adolescente, morador de Bom Retiro do Sul, trabalhava um turno na empresa de bebidas da família. Estudar, só se fosse em Estrela. “Era impossível, pois levada duas horas para chegar ao município vizinho.”

Atualmente, todas as cidades do Vale têm instituições de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio.

A educação básica está no quintal de casa.

Criação da Fundação Alto Taquari de Ensino Superior (Fates) em substituição à Associação Pró-Ensino Universitário do Alto Taquari (Apeuat)

década

MUDAM A REALIDADE LOCAL 1970

COPA DO MUNDO

Os anos 1970 começam com um presente aos brasileiros: a conquista do tricampeonato mundial de futebol. A seleção encerrou uma campanha de seis vitórias em seis jogos, tornando-se a primeira equipe a ter 100% de aproveitamento nas eliminatórias e na Copa do Mundo. Além disso, também foi o primeiro time a chegar ao tricampeonato mundial, fato que lhe garantiu a posse definitiva da taça Jules Rimet.

MÚSICA O orgulho nacional era cantado com as músicas “Este é um país que vai pra frente”, de Os incríveis, e “Eu Te Amo, Meu Brasil”, da dupla Dom e Ravel. Em contrapartida, vozes de artistas de expressão, como Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil, eram caladas com a censura imposta pela Ditadura Militar.

Em 1972, os olhos dos brasileiros se voltaram ao Rio Grande do Sul, pela televisão, durante a primeira transmissão a cores, da Festa da Uva, de Caxias do Sul, pela TV Globo. Porém, levou anos até que toda a programação da emissora chegasse a ser colorida.

POLÍTICA

A política, na década de 1970, era polarizada: a Aliança Renovadora Nacional (Arena) representava os simpatizantes ao Regime Militar; os opositores da ditadura integravam as fileiras do Movimento Democrático Brasileiro (MDB). A criação da Arena e do MDB ocorreu um ano depois do Ato Institucional 2, em 1965, que extinguia todos os partidos políticos.

A Arena, por meio de Walter Peracchi Barcellos, Euclides Triches e Synval Guazzelli, governou o RS durante os anos 1970.

A Amvat teve cinco presidentes durante a década: prefeitos de Cruzeiro do Sul, Encantado, Arroio do Meio e Dois de Lajeado. Na época, o Vale era formado por 14 cidades.

ALDO LOPES

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VALE SALTA DE NOVE PARA 38

O

Vale do Taquari, até 1961, ano de fundação da Amvat, era formado por apenas nove municípios: Arroio do Meio, Arvorezinha, Bom Retiro do Sul, Encantado, Estrela, Lajeado, Muçum, Roca

Sales e Taquari. Eram cidades com grandes extensões territoriais e subdivididas em distritos.

O mapa mudou pouco até o fim da década, com as emancipações de Anta Gorda, Cruzeiro do Sul, Ilópolis, Nova Bréscia e Putin-

ga – passando para 14 cidades.

Os anos 1970 se passaram sem nenhuma modificação no mapa regional. Porém, uma nova leva de emancipações, nas décadas de 1980 e 1990, redesenharam o Vale.

Mapa da região de 1980/89

JOVEM VOTA EM PLEBISCITO E SE TORNA DEPUTADO Quem um dia disse sim à emancipação, anos depois se tornou um líder do movimento em solo gaúcho. “Meu primeiro voto foi em 1958 pela emancipação de Bom Retiro do Sul, na época, distrito de Estrela”, conta Hélio Musskopf.

Ele prestava serviço militar em São Leopoldo e aproveitou a folga para participar do plebiscito. Jovem, acreditava que a emancipação encurtava distâncias e possibilitava o desenvolvimento das localidades. “Militar não pode votar, mas como não era eleição e sim plebiscito, votei.”

Musskopf foi vereador em Bom Retiro do Sul, prefeito de Estrela, presidente da Associação dos Municípios do Vale do Taquari e deputado estadual por três legislaturas, de 1983 a 1995. Sua principal bandeira, o movimento emancipacionista, rendeu-lhe a Medalha Mérito Farroupilha, máxima honraria concedida pela Assembleia Legislativa do RS. Como deputado, foi presidente, reeleito cinco vezes, da Comissão de Estudos Municipais, hoje de Comissão de Assuntos Municipais. “Tive este privilégio porque me engajei na questão das emancipa-

Hélio Musskof exibe a Medalha Mérito Farroupilha, uma honraria pelo trabalho como “deputado das emancipações”

ções. Sou municipalista.”

A grande jogada A legislação federal, de 1971, que estabelecia os critérios para emancipações era muito rigorosa, praticamente impossível de ser atendida. Tanto que na década de 1970 não houve desmembramentos de municípios na região. Entre outros itens, exigia 5 mil eleitores.

A grande jogada, segundo Musskopf, foi reunir as comissões de emancipação de cada localidade e criar uma associação. Os prefeitos que perderiam território eram visitados e se estabelecia uma

negociação sobre divisas, sede e outros temas. As partes entrando em acordo, ocorria o plebiscito e depois era sancionada a lei de criação no novo município. “Assim, evitava-se que o prefeito da cidade-mãe entrasse na Justiça alegando inconstitucionalidade e anulasse o processo. Porque, de fato, nenhum município criado atendia à legislação”, revela Musskopf. “Tudo isso se fez fora da lei, porque não houve contestação. O processo mostrou lisura.”

Ele vê vantagens nas emancipações pela estrutura que cada cidade tem. “Só facilitou e melhorou a vida do cidadão.”

LÍDER CONTA OS DESAFIOS BUROCRÁTICOS E OS PERCALÇOS O taxista Edvino Claas, 89, ajudou a escrever a história da emancipação de Marques de Souza. “A primeira tentativa de desmembrar o então distrito da sede Lajeado ocorreu na década de 1980.” A comunidade de Bela Vista do Fão organizou a papelada e protocolou na Assembleia Legislativa. Concomitantemente, os moradores da região central encaminharam o mesmo processo. “Fão teve o pedido reprovado, e o da sede sequer foi aceito na AL por descontinuidade territorial.” Nos anos 1990, e sede puxou a frente e Fão se uniu.

Claas conta que os processos não eram simples. “Até caravana a Brasília nós fizemos para reivindicar as emancipações.”

Além dos entraves burocráti-

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LUCIANE ESCHBERGER FERREIRA

Edvino Claas

cos, haviam outros percalços.

Claas era tesoureiro da comis-

são de emancipação, mas afirma: “Fiz tudo sozinho”.

O presidente, conta, era um homem doente, tinha problemas de coração, fez cinco cirurgias e permaneceu internado por meio ano no Instituto do Coração, em Porto Alegre, justamento no período de encaminhar a documentação.

“Ajeitava a papelada aqui, ia até Porto Alegre, esperava o horário de visita no hospital, pegava a assinatura deles e depois entregava na AL.” Sabendo da saga de Claas, uma funcionária da AL o auxiliava com os papéis. “Ela era muito querida. Eu pedia ajuda, ela dizia: tá (sic), deixa aqui e volta mais tarde.”

Claas defendia e emancipação para progredir. “Nada contra

NADA CONTRA A CIDADE-MÃE, MAS LAJEADO NÃO CONSEGUIA ATENDER TODOS OS DISTRITOS. .”

EDVINO CLAAS, TAXISTA

a cidade-mãe, mas Lajeado não conseguia atender todos os distritos”. Ele cita como exemplo a área da saúde. Na época, os pacientes que precisavam consultar em Porto Alegre tinha que ir por conta própria a Lajeado, que se encarregava de levá-los à capital. “Nossa associação de moradores era muito ativa.

Pedíamos para que mandassem uma Kombi, uma vez por semana, buscar nosso pessoal, mas eles diziam que não dava.”

Hoje, Marques de Souza tem várias vans que fazem isso, além de ter o próprio hospital, compara. “A vantagem para o povo é muito grande.” E Claas ainda diz mais: “Se tem um prefeito honesto e trabalhador, o progresso é fantástico. Não tem comparação.”

LAJEADO DEVERIA TER SIDO DIVIDIDO EM QUATRO CIDADES, OPINA SCHUMACHER Prefeito de Lajeado por três mandatos, Claudio Pedro Schumacher (82) participou de processos de emancipação nas décadas de 1980 e 1990.

“Eu sempre fui contra estas divisões, acho que foi demais. Lajeado deveria ter sido divido em, no máximo, quatro municípios.” A sua opinião, exposta na época e sustentada hoje baseia-se na projeção de desenvolvimento e visão estratégica para uma cidade.

Para Schumacher, a redução da extensão territorial de 1,2 mil km² para 90 km² inviabilizou, por exemplo, a instalação de grandes indústrias.

“Ficamos sem áreas grandes disponíveis. Se procurar um terreno de 50 hectares, não tem. E ainda temos cerca de

CIDADES NOS ANOS 80 E 90 Mapa da região a partir da década de 1990

NÚMEROS Na década de 1980 foram criados 100 municípios no RS. Nos anos 1990, 164 cidades, chegando às atuais 497.

LAJEADO REDUZ MAIS DE 1.158 KM² DE EXTENSÃO TERRITORIAL Até 1962, Lajeado tinha uma extensão territorial de 1.249 km². Com o desmembramento de Cruzeiro do Sul, em 1963, reduziu sua área em 155,2 km².

O mapa da cidade polo do Vale do Taquari, entretanto, se desenhou, como é atualmente, entre 1987 a 1996, quando Boqueirão do Leão, Progresso, Santa Clara do Sul, Sério, Marques de Souza, Canudos do Vale e Forquetinha se emanciparam. Lajeado passou a ter 90,1 km², redução total de 1,158,9 km².

EMPRESÁRIO VIU LAJEADO CRESCER O empresário e ex-vereador em Lajeado (1981 a 1992), Auri Pedrinho Althaus (70) é natural de Santa Clara do Sul, e chegou a Lajeado em meados de 1970. Em 1976, fundou a imobiliária Antares e foi precursor na abertura de loteamentos.

O primeiro deles foi o atual Bairro Campestre. A rodovia ERS-130 não era pavimentada, “mas já tinha a Polícia Rodoviária Estadual”. Althaus lembra que foi multado, não por cometer uma infração de trânsito. “Fui multado, pela Estadual, por cortar um pé de eucalipto, durante as obras da abertura do loteamento.”

Depois de ajudar a desenhar áreas residenciais em vários bairros, o empresário considera Lajeado uma cidade em constante desenvolvimento.

“Tanto que muitas pessoas vêm para morar e outras escolhem a cidade para investir.”

Sobre a extensão territorial limitada, Althaus não considera um problema, porque há empreendedores para todos os tamanhos de empresa. Com esta aposta, em breve, lançará um loteamento industrial com áreas de até 18 mil m².

Pela saúde econômica da cidade, ele defende a instalação

Pedrinho Althaus: Lajeado atrai pessoas para morar e trabalhar e também investidores

de empresas que gerem 40 empregos cada, do que uma que tenha 3 mil funcionários. “Porque se uma crise afeta uma empresa de 40 funcionários, as outras absorvem. Agora se fecha uma empresa de 3 mil empregados, ninguém absorve.

E espaço para estes empreendimentos, ainda tem.

“Nós ainda temos área suficiente por, pelo menos, 20 anos”, projeta.

ALDO LOPES

ARQUIVO PESSOAL

Depois do primeiro processo, Schumacher criou uma regra, um cálculo, a fim de definir o quanto cada nova cidade levaria da sede em patrimônio móvel.

O cálculo

Claudio Pedro Schumacher

30% de área inundável.”

Na época, Lajeado precisou readequar sua administração, porque perdeu receita e dividiu bens com as novas cidades.

“E dava muita discussão, um queria uma coisa, outro queria outra, alguns ficavam insatisfeitos, e não se chegava a um consenso. Era uma dificuldade”, relembra.

Administração apurava a população do município novo e a de Lajeado; avaliava o patrimônio móvel; dividia o valor total pelo número de habitantes de Lajeado; o resultado era multiplicado pelo número de habitantes da nova cidade.

Este valor determinava quanto em dinheiro que a nova cidade tinha para retirar em máquinas, veículos e equipamentos avaliados anteriormente. “Então o novo prefeito escolhia o patrimônio dentro daquele valor. Era bem justo.”

Autonomia A criação das cidades, para Schumacher, deixou os seus cidadãos orgulhosos, porque passaram a ter a força da segurança, a escola e a autono-

mia da administração. “E eles têm direito a tudo isso.”

Com os desmembramentos, Lajeado foi impelido a pensar diferente o seu desenvolvimento, deixando de lado a produção agropecuária, que permaneceu nas cidades emancipadas, seguindo a característica de sede, com conglomerado comercial e industrial.

O terceiro setor cresceu e se diversificou. O segmento industrial também se ampliou.

“Sem contar o avanço tecnológico.”

Lajeado, na visão do ex-prefeito, tem uma vantagem em relação aos municípios menores do Vale. A administração pública não depende unicamente de transferências da União, como o Fundo de Participação dos Municípios (FPM). A cidade-polo, com densidade demográfica de 954,5 habitantes por km², tem importante arrecadação de tributos municipais, como IPTU e ISS, o que permite investimentos em saúde, infraestru-

Bairro Conventos é um dos poucos que ainda tem área disponível

tura, desenvolvendo cada vez mais o centro urbano. “E isso traz o interior para cá.”

O ônus é que o município segue atendendo o cidadão de fora. “Quando tem um problema maior, de saúde, por exemplo, ele vem para cá; precisa de educação, vem para cá.”

Um dos desafios, conforme Schumacher, é a mobilidade urbana. “Lajeado não tem mais área, não tem como expandir.” O crescimento vertical é a saída natural, porém, ele

alerta: “O que tem por baixo é um grande problema. Há anos que se fala em tratamento de esgoto. Há anos se conversa com a Corsan, mas o tema não vai para frente.”

E se para problema surge uma solução, ou, pelo menos, uma alternativa, Lajeado faz a lição de casa. Um dos exemplos é o desenvolvimento nos bairros. “Conventos virou uma minicidade”, exemplifica, e ainda tem algum espaço para crescer.

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ALDO LOPES

CODEVAT APONTA O AVANÇO TÉCNICO ÀS ENTIDADES

P

ara o presidente do Codevat, Luciano Moresco, o Vale tem a característica desenvolvimentista. Entidades e lideranças estão, permanentemente, empenhadas em ações que melhorem a qualidade de vida das pessoas. Os municípios, por sua vez, têm o engajamento político e admi-

Setor do turismo terá grande impulso com o Cristo Protetor

nistrativo, com destaque para Amvat, “extremamente importante para puxar questões regionais”. No entanto, Moresco faz um alerta: “É preciso avançar em suporte técnico.”

A falta de conhecimento em determinados temas resulta em um embate desigual. O Vale fez um grande debate, por exemplo, sobre a concessão

da BR-386, mas muitos aspectos poderiam ter avançado, caso houvesse aporte financeiro para contratar especialistas que estudassem cada ponto da concessão, das obras.

O governo Eduardo Leite, cita, é profissional e técnico. Levam-se as demandas, apresentam-se os anseios da comunidade, mas, no debate técnico, ficamos

sem argumentos.

Para Moresco, o caminho, com tantas oportunidades surgindo, e o turismo é uma delas, é aparelhar as entidades com recursos financeiros para reivindicar não apenas com palavras, mas com argumentação baseada em dados técnicos.

“As oportunidades não param de surgir no Vale”, reforça

ARQUIVO PESSOAL

Luciano Moresco, presidente do Codevat

PAULO KOHLRAUSCH DESTACA OS DESAFIOS À FRENTE DA AMVAT Prefeito de Santa Clara do Sul, Paulo Kohlrausch está em seu segundo mandato à frente da Amvat.

O primeiro, em 2010, foi marcado por diversas viagens a Brasília em busca de recursos e apoio aos municípios atingidos pela enxurrada de 4 de janeiro.

Centenas de casas alagadas, campings devastados e prejuízos milionários no campo foram algumas das consequências de um dos maiores desastres naturais do Vale do Taquari.

A Amvat também mobilizou secretários estaduais de diversas áreas com o objetivo de aportar recursos para minimizar os impactos causados pela grande inundação.

Passados os meses iniciais, quando o foco foi unir forças para ajudar as cidades atingidas pela enxurrada, Kohlrausch começou a pôr em prática o plano inicial da gestão: dar à Amvat um endereço, uma casa.

A entidade, então com 49 anos, funcionava nas prefeituras as quais o prefeito era o presidente da associação dos municípios. De 2001 a 2010, funcionava em sala “gentilmente” cedida pela Univates, dividindo

DIVULGAÇÃO

espaço com o Codevat. “Quando assumi, já tinha em mente estruturar a Amvat em endereço próprio. Conversei com todos os prefeitos, durante um roteiro de visitas.” O então prefeito de Estrela, Celso Bronstrup, falecido em janeiro de 2014, se dispôs a reformar uma sala da extinta empresa Polar, que era de propriedade da Prefeitura. “Foi um investimento importante. No final do ano – 22 de dezembro de 2010 - entregamos a sede.

Pandemia A gestão atual de Paulo Kohlausch à frente da Amvat ainda sente os reflexos da pandemia de coronavírus. “Está sendo difícil, de muito trabalho, aprendizado e muitos resultados.” As assembleias, costumeiramente realizadas de forma presencial, algumas vezes na sede e outras em eventos nos municípios, passaram a ser virtuais. “Em um ano diferente, é mais importante ter direção do que velocidade.”

Um dos objetivos da atual gestão é promover a aproximação dos prefeitos da região com autoridades de outras esferas políticas e lideranças de áreas

Paulo Kohlrausch: duas gestões com contextos diferentes

essenciais para o desenvolvimento das cidades. Temas de interesse comum foram discutidos nas assembleias, como a concessão das rodovias estaduais, políticas públicas na esfera federal para a área das agroindústrias e cooperativismo, programas estaduais visando o desenvolvimento econômico, abastecimento de energia elétrica no Vale, crise no setor avícola, proposta de regionalização do saneamento básico, ações para implementação de turismo no Vale e duplicação da BR-386 entre

Lajeado e Marques de Souza.

As assembleias contaram com palestrantes políticos e técnicos e também com representantes de entidades regionais, entre elas Câmara de Indústria e Comércio do Vale do Taquari (CIC-VT), Consórcio Intermunicipal de Saúde do Vale do Rio Taquari (Consisa), Conselho de Desenvolvimento do Vale do Taquari (Codevat), Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica dos Rios Taquari-Antas e Associação dos Municípios de Turismo da Região dos Vales (Amturvales).

Crescimento e apoio Neste ano, a Amvat aprovou o ingresso de três municípios, Itapuca, Mato Leitão e Venâncio Aires, pela proximidade e demandas comuns. A contratação de um assessor jurídico dará suporte aos municípios nesta área técnica, que, com frequência, passa por mudanças. A sede agora está aberta em turno integral para melhor atender as demandas dos prefeitos.

Aprovados novo estatuto, readequação dos valores das mensalidades e melhorias na sede da associação.

Modernização do site “O que você é? O que você tem? O que lhe falta?” Para responder às três questões, a gestão Kohlrausch entregará à comunidade local e a quem desejar conhecer a região um novo site, mais moderno e com um banco de dados.

Para o presidente, as ações desta gestão vão ao encontro das necessidades que surgem. “É uma questão de conceito: crescer é fazer mais do mesmo.

Desenvolver é fazer diferente. É o que procuramos fazer.”