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ZERO WASTE FASHION DESIGN: VANTAGENS DO MÉTODO NOS PROCESSOS PRODUTIVOS INDUSTRIAIS

Camila Dal Pont Mandelli, SENAI/UNESC, camila.dpm@hotmail.com Valdecir Babinski Júnior, UDESC, vj.babinski@gmail.com Lucas da Rosa, UDESC, darosa.lucas@gmail.com

Resumo: Na indústria de confecção executa-se processos produtivos conforme um cronograma que pode considerar ou não a criação de peças de vestuário pró-sustentabilidade. A partir dessa observação, o objetivo deste artigo consiste em evidenciar as vantagens da aplicação do método Zero Waste Fashion Design (Design de Moda para Mitigação de Resíduos) nos processos produtivos industriais.

Palavras-chave: Indústria de Confecção; Processos produtivos industriais; Zero Waste Fashion Design.

INTRODUÇÃO

Na indústria de confecção, os processos produtivos envolvem a elaboração de modelos orientados segundo as tendências de mercado e com base no histórico de desempenho comercial de coleções passadas de peças de vestuário. Nesse percurso, profissionais de modelagem interpretam os modelos gerados por equipes de criação e executam a construção de moldes que servem de base para a prototipagem e, consequentemente, para produção em série (ROSA, 2011; SILVEIRA, 2017). Para Fletcher e Grose (2011) e Carvalho et al. (2020), pela necessidade de urgência no lançamento das novas coleções e de reabastecimento dos estoques de lojistas e franqueados, as equipes de criação e de modelagem podem acabar por negligenciar o emprego de métodos projetuais pró-sustentabilidade. Martins (2018) e Salvaro e Mandelli (2019) confirmam o exposto ao observarem que, de modo geral, raramente se prevê a utilização completa dos insumos materiais nos processos produtivos tradicionais da indústria de confecção, apesar de existirem abordagens voltadas para essa finalidade, a exemplo do Design para Modularidade, do Design para Reciclabilidade e do Zero Waste Fashion Design (ZWFD ou, em tradução livre, Design de Moda para Mitigação de Resíduos). Em especial, o ZWFD trata da criação de peças de vestuário a partir de estratégias multidisciplinares que possuem ênfase na redução do desperdício de tecidos planos e malhas por meio do planejamento ecoeficiente da modelagem e do encaixe dos moldes (FLETCHER; GROSE, 2011; GWILT, 2014; BREVE, 2018; MARTINS, 2018).

Com base nisso, este estudo possui como objetivo destacar as vantagens da aplicação do método projetual ZWFD nos processos produtivos tradicionais da indústria de confecção de vestuário. Por conta desse foco, cabe ressaltar que não foram apresentadas as desvantagens do método. Assim, acredita-se que, como contribuição prática e mercadológica, o estudo pode estimular os profissionais de criação e de modelagem a adotarem em suas rotinas ênfases pró-sustentabilidade com vista a eliminar quaisquer eventuais desperdícios de insumos têxteis. Com base nos estudos de Gil (2008), este artigo classifica-se como pesquisa básica, qualitativa e descritiva. Dentre os procedimentos técnicos, realizou-se uma revisão bibliográfica de modo narrativo e assistemático sobre o método ZWFD. As obras foram selecionadas a partir de pesquisas stricto sensu desenvolvidas por Camila Dal Pont Mandelli e Valdecir Babinski Júnior no contexto do Programa de Pós-Graduação em Design de Vestuário e Moda (PPGModa) da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). Diante disso, a seguir, procede-se ao referencial teórico levantado.

MÉTODO ZERO WASTE FASHION DESIGN: VANTAGENS PERCEBIDAS

O método projetual ZWFD está relacionado com a indústria de confecção no tocante à eliminação do descarte de insumos materiais nos processos produtivos ligados à manufatura de peças de vestuário (GWILT; 2014). Firmo (2014), Breve (2018) e Babinski Júnior et al. (2021) evidenciam que o desperdício de recursos nesses processos convencionais pode flutuar entre 15% e 20%. Isto implica dizer que, por exemplo, em média, a cada 100 metros de tecido adquirido para confecção de novas peças de vestuário, 20 metros podem vir a se tornar retalhos ou resíduos sólidos têxteis no chão de fábrica devido ao desenho dos moldes empregados. Nessa perspectiva, pode-se compreender que os resíduos sólidos têxteis gerados nos processos produtivos industriais não implicam apenas em prejuízos de ordem ambiental, mas, também, de caráter econômico. Ao se considerar o modelo de negócios de fast fashion (moda rápida, em livre tradução), esses resíduos têxteis são escalonados exponencialmente e incluídos no preço final de venda do produto. Pois, esse modelo de negócio trata de antecipar o lançamento de novas coleções no mercado consumidor por meio da aceleração do fluxo de fabricação das peças de vestuário, vistas, então, como roupas-commodities que são padronizadas para atender uma escala de produção em série.

Na visão de Camargo e Rüthschilling (2016), ao precipitar o fluxo dos processos fabris, a indústria de confecção de vestuário pode acabar por adotar práticas antiéticas de greenwashing (maquiagem ecológica, em livre tradução) no lugar de estratégias eco-friendly (ambientalmente amigáveis, em livre tradução). Esse

ritmo acelerado, também, interfere no trabalho dos profissionais de criação e de modelagem. Por observação empírica, percebe-se que, geralmente, designers e estilistas de grandes e médias empresas desenvolvem peças de vestuário sem dar atenção projetual para requisitos sustentáveis em função do cronograma curto de desenvolvimento de coleção. Tampouco há oportunidades para modelistas experimentarem técnicas de ecoeficiência no corte das peças ou testar amplamente diferentes métodos para redução na geração de resíduos sólidos têxteis ou de outros subprodutos indesejados.

Todavia, ao fazerem uso de software (programas de computador, em livre tradução) do tipo Computer Aided Design (CAD ou, em livre tradução, Projeto Assistido por Computador), a equipe de modelagem pode obter certa economia no consumo de tecidos planos e malhas por meio do desempenho operacional de encaixe de moldes no sistema informatizado. Apesar disso, Fletcher e Grose (2011, p. 48) salientam que “[...] toda a redução de sobras do corte obtida com o CAD é invisível no produto final; designer e consumidor não percebem as economias e os impactos ecológicos.”

Nesse sentido, o método ZWFD contribui para aumentar o desempenho do algoritmo de encaixe dos sistemas CAD, assim como pressupõe a integração das funções dos profissionais de criação e de modelagem, uma vez que as peças a serem desenvolvidas devem ser orientadas para a mitigação de resíduos sólidos têxteis desde os primeiros insights (ideias, em livre tradução) acerca da coleção. Ao engendrar esforços conjuntos, o método ZWFD pode tornar-se vantajoso para a indústria e contribuir para o fomento à criatividade no planejamento da coleção. Outro aspecto que incentiva a busca por soluções criativas está na oportunidade de associação do método ZWFD à técnica de moulage (do francês, modelagem tridimensional, em livre tradução para a língua portuguesa) (GWILT, 2014; BREVE, 2018; SALVARO; MANDELLI, 2019; BABINSKI JÚNIOR et al., 2021). Entre essas vantagens percebidas na literatura pesquisada, cita-se:

A)

B)

Antecipação do plano de corte: se nos processos produtivos industriais, regularmente, o corte dos modelos sobre o enfesto do tecido acontece sem antever possíveis perdas materiais, a partir da aplicação do método ZWFD torna-se possível projetar o plano de corte desde o desenho das peças de modo que o desperdício de insumos seja evitado (FIRMO, 2014; BREVE, 2018; MARTINS, 2018); Agilidade no processo de corte: ao se fazer uso de formas geométricas plenamente encaixadas umas às outras, assim como segmentos regulares e perpendiculares uns aos outros, a modelagem das peças criadas sob o método ZWFD permite a execução do corte de forma mais rápida, pois uma única operação pode gerar duas partes distintas a serem unidas, posteriormente, na costura (BREVE, 2018; BABINSKI JÚNIOR et al., 2021);

C)

D)

Economia de esforço mecânico e humano: com menos reentrâncias, curvaturas e formas orgânicas, a preparação e a costura na montagem das peças de vestuário que usam o método ZWFD em sua criação podem ser menos complexas do que nos processos industriais tradicionais, bem como, a sequência operacional a ser seguida pode ser reduzida, o que leva a uma economia de esforço mecânico e humano (FLETCHER; GROSE, 2011; FIRMO, 2014; GWILT, 2014; SALVARO; MANDELLI, 2019; BREVE, 2018);

Melhor uso do capital financeiro empregado na compra dos insumos: como nos processos produtivos tradicionais, até 20% dos materiais têxteis adquiridos para o desenvolvimento das peças de vestuário pode ser desperdiçado pela sobra de retalhos no corte, portanto, ao adotar o método ZWFD, a indústria de confecção pode garantir o uso de 100% dos insumos adquiridos e pode evitar que o custo seja incluído no preço de venda do produto (BRE-

VE, 2018; MARTINS, 2018, SALVARO; MANDELLI, 2019). A partir do exposto, observa-se que o método ZWFD oferece vantagens que podem impactar na competitividade das coleções a serem lançadas pela indústria de confecção de vestuário, pois o método pode gerar a economia das forças mecânicas, humanas e financeiras usualmente dispendidas e desperdiçadas, em parte, nos processos convencionais. Sem contar que o consumidor final não vai pagar por algo que não está incluído no produto por ter sido descartado durante o processo de fabricação. Assim, procede-se para as considerações finais deste artigo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o intuito de efetivar a adoção do método ZWFD na comunidade acadêmica interessada na sustentabilidade com foco nos negócios de moda e na indústria de confecção de vestuário, os autores do presente artigo evidenciaram algumas das vantagens da aplicação do método ZWFD nos processos produtivos industriais, a saber: (I) otimização do uso do algoritmo de encaixe dos sistemas CAD; (II) sincronia entre as funções dos profissionais de criação e de modelagem; (III) combinação com a técnica de moulage; (IV) liberdade de criação pró-sustentabilidade no planejamento e desenvolvimento da coleção; (V) antecipação do plano de corte em consonância com a criação dos produtos; (VI) agilidade no processo de corte; (VII) economia de esforço mecânico e humano; e (VIII) melhor destinação do capital financeiro empregado na compra de insumos. Estima-se que, se ampliado o escopo bibliográfico, outras vantagens podem ser aferidas. Por fim, os autores do artigo acreditam que a geração de resíduos sólidos têxteis consiste em uma constante na confecção de peças de vestuário, todavia, designers, estilistas e modelistas podem empregar métodos projetuais pró-sustentabilidade para minimizar o impacto ambiental de suas criações, bem como mitigar os resíduos gerados em seus processos de manufatura.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BABINSKI JÚNIOR, V. et al. Relatos de experiências com a utilização da técnica de moulage em associação com a abordagem zero waste. In: ENCONTRO DE SUSTENTABILIDADE EM PROJETO, 9., 2021, Florianópolis. Anais [...]. Florianópolis: UFSC/VIRTUHAB, 2021. v. 9, p. 280-291. Disponível em: https://bit.ly/3pjUsBV. Acesso em: 18 jun. 2021. BREVE, D. G. Zero Waste: design sustentável aplicado ao ensino de moda. 2018. 152 f. Dissertação (Mestrado) — Curso de Pós-Graduação em Têxtil e Moda, Escola de Artes, Ciências e Humanidades, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. Disponível em: https://bit. ly/36J69Jj. Acesso em: 21 fev. 2019.

CAMARGO, C. W.; RÜTHSCHILLING, E. A. Procedimentos metodológicos para projeto de moda sustentável em ambiente acadêmico. ModaPalavra e-periódico, Florianópolis, v. 9, n. 17, p.299-312, jan.-jun. 2016. Disponível em: https://bit.ly/2UA8aC7. Acesso em: 20 jun. 2019.

CARVALHO, M. M. et al. Preocupação ambiental e produção industrial: um exemplo de Santa Catarina (SC). Mix Sustentável, Florianópolis, v. 6, n. 2, p. 163-174, maio 2020. Disponível em: https://bit.ly/3nvth4M. Acesso em: 27 out. 2020.

FIRMO, F. da S. Zero Waste (Resíduo Zero): uma abordagem sustentável para confecção de vestimentas. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO EM DESIGN, 11., 2014, Gramado. Anais [...]. Gramado: Blucher Design Proceedings, 2014. p. 1-13. Disponível em: https://bit.ly/35D0vcg. Acesso em: 25 jul. 2020.

FLETCHER, K.; GROSE, L. Moda & Sustentabilidade: design para mudança. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2011. Tradução de: Janaína Marcoantonio.

GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2008. GWILT, A. Moda sustentável: um guia prático. São Paulo: G. Gilli, 2014.

MARTINS, C. R. Sustentabilidade nos processos produtivos de design de moda: abordagem zero waste em tecnologias tradicionais e novas tecnologias. In: FÓRUM FASHION REVOLUTION, 1., 2018, São Paulo. Anais [...]. São Paulo: Instituto Fashion Revolution Brasil, 2018. p. 50-54. Disponível em: https://bit.ly/3f8WX4K. Acesso em: 15 jul. 2019.

ROSA, L. Vestuário Industrializado: uso da ergonomia nas fases de gerência de produto, criação, modelagem e prototipagem. 2011. 175 f. Tese (Doutorado) — Curso de Pós-Graduação em Design, Departamento de Artes e Design, Pontifícia Universidade Católica, Rio de Janeiro, 2011. Disponível em: https://bit.ly/3kDNtzL. Acesso em: 24 fev. 2019.

SALVARO, T.; MANDELLI, C. Zero Waste: proposta de modelagem para vestido de gala. In: FÓRUM FASHION REVOLUTION, 2., 2019, São Paulo. Anais [...]. São Paulo: Instituto Fashion Revolution Brasil, 2019. p. 243-247. Disponível em: https://bit.ly/2UHH23O. Acesso em: 21 out. 2019.

SILVEIRA, I. Modelo de gestão do conhecimento: capacitação da modelagem de Vestuário. Florianópolis: Editora UDESC, 2017.

Ilustrações

Direitos

(Direitos Humanos e Direitos da Natureza)

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