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Fala, Técnico! SURPRESA EM RORAIMA
Em 1980, fui a Boa Vista, a convite da Associação de Assistência Técnica e Extensão Rural do então Território Federal de Roraima - ASTER-RO, para oferecer um curso concentrado de melhoramento animal aos seus técnicos: agrônomos e médicos veterinários.
Voltado para gado de corte, o curso foi apresentado em sala envolvendo conceitos básicos, estratégias de melhoramento (seleção e cruzamentos), descrição das principais raças e algumas práticas relacionadas a planos de cruzamento e evolução de rebanho.
Ao longo daqueles dias fui informado de que a produção de leite no Território era praticamente uma atividade extrativa, com baixa produção, muito aquém da demanda potencial do próprio município de Boa Vista.
Decidido a resolver este problema, o Secretário de Agricultura do Território havia importado um lote de vacas e um touro da raça Holandesa, diretamente do Uruguai! Considerada uma ideia inovadora, fui convidado pelos extensionistas a conhecer este rebanho, ao final do curso.
Chegando a Campo Grande, passei este material ao meu colega pesquisador da área de entomologia, Dr. José Raul Valério. Levada ao Museu de História Natural de Londres, a praga foi identificada: Haematobia irritans, a famosa mosca dos chifres! Minha atitude foi espontânea. Fiz a minha parte. O Dr. Zé Raul, no entanto, leal, cuidadoso, na verdade um gentleman, como ele é, reconheceu esta minha participação citando o meu nome no artigo que publicou para descrever esta nova praga, pela primeira vez no Brasil! (1)
AO CHEGAR À FAZENDA, FIQUEI ALARMADO COM
O QUE VI. LOGO PERCEBI
O PORQUÊ: NÃO TINHAM
TEMPO, NEM SOSSEGO PARA PASTAR!
Ao chegar à fazenda, fiquei alarmado com o que vi. Embora com abundância de pasto, como normalmente se observa em áreas tropicais com calor e chuva o ano todo, os animais estavam muito magros. Logo percebi o porquê: não tinham tempo, nem sossego para pastar! O pouco da energia que ainda restava era só para movimentos, na tentativa de espantar a verdadeira nuvem de moscas que os deixavam atordoados! Aliás, alguns dos animais já tinham morrido, disseram-me. Perguntei aos técnicos que me acompanhavam que praga era aquela. Ninguém soube me dizer. Minha primeira reação foi fazer uma coleta de moscas para investigação. Fumante, ainda, naquela época, joguei fora os palitos de fósforo que tinha e com rápidos movimentos de mão sobre o costado do touro, enchi a caixinha de fósforo de mosca. Com uma estrutura admirável, ficava imaginando aquele touro naquela planície uruguaia... a elegância que deveria ser...
Ao chegar de volta ao hotel, percebi que havia amassado muito as moscas e pedi que me levassem de volta à fazenda no dia seguinte. Aí, sim! Fiz uma coleta caprichada, enchendo um vidrinho com aquelas moscas, pequenas, na verdade, mas que faziam um estrago danado!
Deste ponto em diante se montou uma verdadeira maratona de trabalhos, liderados na Embrapa Gado de Corte pelos pesquisadores Drs. Ivo Bianchin e Michael Honer: estudos de simulação, para se ter uma ideia de quanto tempo a mosca levaria para chegar até o Brasil Central Pecuário, alertas ao Mapa para vigilância sanitária, controle biológico (com a importação do besouro “rola-bosta” da Austrália), e controle da mosca com inseticidas.
Decorrido este tempo, graças aos trabalhos realizados e às características da própria natureza no Brasil Central, com estações mais bem definidas de verão (chuvoso e quente) e inverno (seco e mais frio), esta praga se encontra praticamente estável.
Geralmente se observam apenas dois picos de infestação (início e final do período de chuvas), exigindo-se atenção e controle em rebanhos com animais na turalmente mais sensíveis, es pecialmente aqueles com mais proporção de sangue taurino (origem europeia), leiteiro ou de corte.
Antônio do Nascimento Ferreira Rosa (Toti) Eng. Agr., D. Sc. pesquisador e chefe-geral da Embrapa Gado de Corte
