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Crônica fálica
from Falo Magazine #40
Cartografia do falo e do vazio
O prazer nunca é inocente. Surge como promessa, mas cobra pedágio em carne, em alma, em coração.
Na busca pelo falo – não só o órgão, mas metáfora de poder, de inteireza, de algo que acreditamos nos completar – atravessamos territórios de sombra. Não se encontra apenas um corpo: encontra-se o vazio tentando se preencher, a fissura sonhando em ser muralha. O gozo é breve. O vazio, persistente.
Pagamos caro: com a vida, quando a vulnerabilidade nos coloca em mãos erradas; com a saúde, quando a noite é mais rápida que a prudência; com o coração, quando o fogo que acendemos não encontra combustível no outro.
Há quem busque o prazer como quem gira o tambor de uma roleta russa. Entramos em becos sem nome, em corpos sem rosto, em lugares sem coordenadas – entregues à fagulha que incendeia por instantes. O risco é a moeda de troca. O desconhecido, a adrenalina. No fundo, sabemos que flertamos com a morte –mas a vida nunca pareceu tão viva quanto no limite entre o perigo e o gozo.
Não buscamos apenas prazer nessas travessias: buscamos a vertigem de existir em estado máximo, quando corpo, prazer e perigo se tocam na mesma explosão.
A era digital apenas multiplicou nossos becos: aplicativos que cabem na palma da mão, guetos, banheiros, cinemas, clubes, festas que oferecem aquele escuro quase anônimo – porque ainda sabemos quem somos, e quase sabemos o que buscamos.
Mas o prazer, ao abrir portas, também expõe nossas entranhas. Somos navegadores em mares incertos: cada corpo uma ilha, cada olhar um farol que tanto pode guiar quanto naufragar. A paixão, às vezes, não passa de uma bússola quebrada.
E mesmo assim seguimos. Entre o risco e o vazio, escolhemos sempre o risco. O corpo insiste em lembrar que está vivo. E viver, afinal, nunca foi seguro – nem deveria ser. Desejar e ser desejado é a centelha que move o que chamamos de existência.
O prazer, essa substância necessária, é luz que persegue e consome. Não significamos o antes, nem o depois — mas mergulhamos no durante como se ali estivesse o sentido de tudo.
Que brindemos, então, à busca. Ao caminho, às paradas incendiárias, às bocas que nos revelam, aos corpos que nos confundem, às vozes que nos prometem. Brindemos ao risco que nos mantém pulsando. Porque no fim, em cada fagulha, o que procuramos – mesmo sem admitir – é um amor: não o amor romântico de novela, mas o porto improvável onde prazer e cotidiano se tornam possíveis. Um amor que, paradoxalmente, é também risco – e ainda assim, seguimos a buscá-lo.
Crônica de Hilton Soubhia Jr.

