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Florian Hetz

  • por Filipe Chagas

Nossa linguagem e nossa memória se estabelecem em nosso cérebro a partir de imagens. Imagine, então, que algo interfira nessa dinâmica e, de repente, você se veja com dificuldades de confiar no que você se lembra. Foi isso que aconteceu, em 2007, com Florian Hetz após uma encefalite aguda.

Por sermos uma sociedade extremamente visual, criamos inúmeras tecnologias para facilitar a ampliar nossa capacidade de acesso e registro à imagens. Hetz buscou a fotografia como uma forma de registrar e estruturar os dias, que muitas vezes se confundiam durante sua recuperação. A partir de 2016, fotografar se tornou um método artístico deliberado para lidar com a natureza fragmentada da memória.

Tornei-me fotógrafo por acaso, mas nunca quis ser fotógrafo. O que inicialmente servia para documentar a vida tornou-se uma ferramenta para reorganizá-la. Uso a câmera para ampliar minha maneira de ver a vida.

Isso levou Hetz a ter um entendimento democrático sobre a arte (“há espaço suficiente para diferentes maneiras de abordar o mesmo assunto”) e a se preocupar mais com sua produção (“não olho muito para o que os outros fazem”) e com o presente (“não sou nostálgico”). Não leva pré-conceitos ou ideias para seus ensaios, pois precisa vivenciar o momento (“ver em vez de encenar”). As imagens que cria brincam com a tensão entre o que permanece na memória e o que se perde em composições precisas, detalhadas, íntimas e escultóricas.

Desde o início, a figura masculina foi um “objeto disponível” que serviu para questionar o cânone da objetificação feminina e da não-beleza masculina. Optou por “homens comuns” ao invés de modelos “que passam muito tempo em frente das câmeras” porque está mais interessado na vulnerabilidade do que no ângulo perfeito.

Há algo de belo em homens confiantes com seus rostos, corpos e genitais. Me surpreendo um pouco quando as pessoas me dizem que nunca viram um corpo ou uma pele assim. Para mim, é tão normal. E sempre foi.

Hetz considera que o homem enquanto objeto de arte provavelmente será sempre um nicho, porém, nossa maneira de lidar com a nudez e o sexo mudou com o advento das redes sociais e plataformas de conteúdo adulto. A circulação do privado de forma pública transforma a nudez em um discurso revelador e voyeurístico com menos drama social.

Para o fotógrafo alemão, o pênis tem o potencial de trazer algo a mais, seja para a composição, seja para o espectador.

A maioria de nós, homens, tem um pênis, mas, infelizmente, o relacionamento nem sempre é fácil. Gostaria que os pênis fossem mais visíveis na mídia. E não apenas os enormes. É preciso oferecer outras maneiras de se olhar para ele.

Sabendo que é muito fácil cair em clichês ao trabalhar com pessoas nuas, Hetz constantemente muda suas perspectivas sem receio de ser mal compreendido ou de ter seu diagnóstico de autismo referenciado. Atrelou seu desejo por ser artista à sua própria validação e não a certificações identitárias dadas pelo sistema de arte e, assim, tem seu trabalho reconhecido internacionalmente pela clareza emocional de sua linguagem visual. 8=D

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