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Zanzibar, fevereiro, 1984

Zanzibar, fevereiro, 1984

Passou uma semana da chegada de Zanzibar. Nos olhos e nos ouvidos, a sensação de um mundo mágico, estranho, perdido e encantador. O cheiro de cravo no nariz. (Zanzibar é o maior produtor de cravo do mundo). Nossas conversas, nossas risadas. O cachorrinho numa corda atrás da porta do quarto do hotel. Os enormes mosquitos. As lembranças de pessoas queridas que nunca mais veremos. Os sonhos, surrealisticamente familiares.

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Mulheres de preto para todo o lado, nas ruazinhas, em grupos de duas, três, nas esquinas, conversando soltas apesar do véu. Um mundo que ficou isolado, tranquilo, acolhedor e irreal. A cidade tem um ar decadente e destruído. Apesar disso, tem seu encanto.

As pessoas seguem para o mercado para as compras diárias. Zanzibar permanece uma ilha de tranquilidade. Túnicas, bicicletas, botequins mínimos com música lânguida, que parece repetir a mesma nota indefinidamente. Nas nossas cabeças, um sol de chumbo. Ao longe, o mar esmeralda.

A cor do mar de Jambiane, uma prainha ao norte da cidade principal que tem o mesmo nome do país. O mercado, as bananas enormes, o sol se pondo rápido. A praça à noite. O sorvete com salada de frutas, as mulheres de preto no ônibus pela estradinha, sacolejando minha febre. E aquele mar esmeralda, surgindo nas curvas do ônibus no meio dos coqueiros. Teu riso solto.

No terceiro dia que estávamos em Jambiane, comecei a ficar com febre alta e com calafrios, os sintomas típicos da malária. Passei a noite suando frio. No dia seguinte, Marina saiu pelo vilarejo atrás de cloroquina. Não encontrou. Num café, um

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garoto deu a ela dois comprimidos embrulhados em um guardanapo. Eu fiquei com medo de tomá-los. Mas estávamos longe da capital, o surto da malária demora de três dias a uma semana e não se pode ficar sem cloroquina.

Arrisquei-me e tomei um dos comprimidos. Resolvemos ir para a capital. Fomos para a estrada e, para nossa sorte, o ônibus não demorou a passar. Mas estava lotadíssimo. Marina explicou para uma pessoa que falava inglês que eu estava doente e gentilmente ela me cedeu o seu lugar.

Chegando em Zanzibar, fomos a uma farmácia e conversamos com o farmacêutico. Fui medicada novamente e fui para o hotel. Para minha sorte, três dias depois, o surto passou e pude novamente caminhar por aquela cidade com cheiro de cravo, olhar para tudo com calma, sentir a sua pulsação.

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