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Os brasileiros em Moçambique

Os brasileiros em Moçambique

Lembro que um dia, quando eu ainda estava morando no hotel Rovuma, cruzei com o Saulo e a Andrea saindo do elevador. Estavam junto: a Eliane, a Djanira, o Paulo, seu companheiro, e o Aderbal, recém-chegados do Brasil. Todos, com exceção do Saulo, eram arquitetos. Fui almoçar com eles no restaurante do hotel e ficamos conversando um tempão. Mais tarde, chegaram a Maria Alice e a Marta, também arquitetas.

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Formamos um grupo que não se perdeu mais de vista. Nos encontrávamos em todas as refeições. A nossa diária era paga pelo governo moçambicano. Por causa disso, tínhamos que fazer as refeições no hotel durante a semana.

O Rovuma era o hotel do único partido que existia naquele momento, a Frelimo (Frente de Liberação de Moçambique). Por causa disso, todos os cooperantes (estrangeiros que iam trabalhar em Moçambique) ficavam hospedados lá.

A Frelimo se tornou um partido depois da independência, em 1974. Era o único, reconhecido internacionalmente, que tinha lutado pela independência do país. Dirigiu Moçambique como partido único até 1994.

O hotel tinha quatro restaurantes. Cada pessoa, dependendo do seu “status”, almoçava em um determinado restaurante. O mais modesto era o dos moçambicanos que trabalhavam ali perto. Era uma sala grande, mas, como muita gente ia lá comer ao meio-dia, tinham sempre que enfrentar uma longa fila.

Depois vinha o “nosso” restaurante. Nossa comida era um pouco melhor, mas bem simples. O terceiro, era para os funcionários das Nações Unidas. A comida lá era mais refinada do que a nossa. Minha amiga Vera, que veio para Maputo

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com um contrato da Unesco, fazia as refeições lá. Um dia me convidou para almoçar com ela na sala dos funcionários internacionais. Quando me sentei, um garçom se aproximou e disse que eu não poderia comer ali porque não era funcionária internacional. Acho que a Vera também tentou comer com a gente, mas foi impedida por um dos garçons. O último restaurante ficava no décimo andar e era utilizado somente pelos funcionários da antiga Alemanha Oriental, que ainda existia naquela época. Coisas do socialismo crioulo.

Os encontros diários com a turma dos brasileiros foram nos aproximando. Passamos a nos encontrar nos fins de semana, para tomar vinho, jantar em um dos poucos restaurantes da cidade, e nas muitas festas. A trilha sonora da maioria era sempre a mesma. Um brasileiro tinha gravado um pot-pourri que tocava em quase todas.

A maioria dos brasileiros que estava no Rovuma ficou em Maputo por dois anos, o tempo do contrato com o governo. Alguns iam embora antes, outros renovavam o contrato. Nunca esqueci das nossas reclamações diárias da comida, dos transportes, da dificuldade de encontrar uma casa. Alguns, como o Mário, não aguentaram os problemas do dia a dia, a corrupção que acontecia entre funcionários de alto nível do governo, a enorme pobreza de muitos moçambicanos, as diferenças de classe, e foi embora.

Sempre que nos encontramos, lembramos algumas de nossas aventuras, as viagens, os pores de sol, os dias de praia, os almoços e jantares. Apesar das dificuldades, foi uma época divertida.

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