2016 Ed 15

EXCLUSIVO: O VELEJADOR ROBERT SCHEIDT FALA SOBRE A RIO-2016, APOSENTADORIA E FRAUDES NO BOLSA ATLETA

A NOVA CARA DO BOXE

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A RESSURREIÇÃO DE DIEGO HYPOLITO O GINASTA QUE QUASE PERDEU TUDO PARA A DEPRESSÃO DÁ UMA IMPROVÁVEL REVIRAVOLTA NA CARREIRA

ATLETAS COMO CLÉLIA COSTA, BRONZE NO MUNDIAL, CHEGARÃO A 2016 COM CHANCES INÉDITAS DE LEVAR O BRASIL A UMA POSIÇÃO DE DESTAQUE DENTRO DA NOBRE ARTE

MOMENTO DE DECISÃO POR QUE 2015 É UM ANO CRUCIAL NA PREPARAÇÃO PARA OS JOGOS DO RIO E MAIS: ETIENE MEDEIROS, O TORPEDO DA NATAÇÃO O CELEIRO DE TALENTOS DA AACD

www.istoe2016.com.br FEVEREIRO/MARÇO 2015 Edição 15 • Ano 6 VENDA PROIBIDA EXEMPLAR DE DISTRIBUIÇÃO GRATUITA E PARTE INTEGRANTE DA REVISTA ISTOÉ

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Carlos José Marques diretor editorial-adJunto

luiz Fernando sá diretor de redação

aMauri segalla editor

luCas Bessel editor de arte

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Cesar itiBerê

editor de FotograFia

JuCa rodrigues

cOLAbORADORES

fotoGrafia aGência istoÉ APOIO ADMINISTRATIVO

PROjETO gRÁfIcO coPY-desK e revisão SERVIçOS gRÁfIcOS OPERAçõES

VENDA AVuLSA LOgíSTIcA E DISTRIbuIçãO DE ASSINATuRAS ASSINATuRAS

MARkETINg PubLIcIDADE

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índice seções

Aquecimento Os planos da NBA para transformar o basquete brasileiro em show entrevistA: robert scheidt “Se os Jogos não fossem no Rio, talvez eu tivesse deixado a vela olímpica”, diz o campeão concentrAção Os melhores lugares do Rio para passear com as crianças PáginA dourAdA A história de Afrânio da Costa, o medalhista olímpico que virou ministro do STF

rePortAgens

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novA chAnce PArA diego hyPolito Como o ginasta superou a depressão em busca do sonho de disputar a Olimpíada em casa PorrAdA de tAlentos O Brasil nunca teve tantas chances – e condições – de se destacar no boxe olímpico etiene medeiros brilhA A recordista mundial na piscina curta tenta tirar a natação feminina das sombras questão de trAdição Como o esporte ajudou a moldar o Rio de Janeiro em seus 450 anos de história sPrint finAl Por que o ano de 2015 é fundamental na preparação para os Jogos de 2016 o clube AAcd Uma das principais entidades de apoio a pessoas com deficiência se tornou um celeiro de talentos paraolímpicos todos querem A olimPíAdA Municípios de todas as regiões do Brasil “brigam” para atrair delegações estrangeiras para seus centros de treinamento

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editorial

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menos Pessimismo, Por fAvor Convide um amigo para almoçar e ele só falará da crise no Brasil. Chame aquele parente bacana, sensato e inteligente, e o sujeito dirá que está tudo uma porcaria. Converse com o pessoal do trabalho, seu chefe, seu subordinado, seus iguais, e todos só tratarão de uma coisa: o lixo onde nós chafurdamos.

O País quebrou, eles gritam. A corrupção arruinou nossas esperanças. Os empregos estão prestes a desaparecer. Os investimentos sumiram. A água vai acabar. Não teremos energia para mover nossas indústrias e iluminar nossos lares. Em breve afundaremos no lodaçal brasileiro, e não há a mais remota chance de escaparmos do turbilhão de males que nos afeta diariamente.

Está chato viver no Brasil. Mergulhamos num mar de pessimismo que paralisa e destrói sonhos. Sim, a corrupção deve ser combatida, a economia clama por mudanças, a escassez de água é uma barbaridade que exige respostas rápidas das autoridades.

Tudo isso é verdadeiro e é preciso ser um idiota para não reconhecer que nossas aflições são legítimas. A questão é outra: não dá para viver assim, como se só houvesse o inferno. Tem coisa boa – muita coisa – acontecendo também. Pergunte à turma do audiovisual sobre os rumos dessa área e você descobrirá que o Brasil importa profissionais de tanto trabalho que há por aqui.

O setor do turismo nunca faturou tanto, o de cosméticos ri à toa.

Estamos em crise, mas o País pulsa também.

E há o esporte. O Brasil está prestes a receber um evento extraordinário, que traz milhões de turistas, que gera negócios em praticamente todos os setores da economia e que, como nenhum outro, revigora a imagem externa de um país. Se você adorou a Copa, ficará surpreso com a Olimpíada. Ela é muito maior – e, em diversos aspectos, até melhor – do que o torneio de futebol.

Na Rio-2016, serão vendidos 8 milhões de ingressos, quase o triplo dos 3,4 milhões da Copa do Mundo. Transforme isso em cifrões e você entenderá por que a Olimpíada é um tremendo negócio.

Combater as mazelas brasileiras é vital, mas pessimismo em excesso faz mais mal do que bem.

Amauri Segalla, diretor de redação asegalla@istoe.com.br istoÉ2016 FeveReiRO/MARçO 2015

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“O BRASIL É PRIORIDADE PARA A NBA” POR LUCAS BESSEL

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ISTOÉ2016 FEVEREIRO/MARÇO 2015

Tem dedo gringo no basquete brasileiro. E, desta vez, não é só dentro das quadras, com os atletas estrangeiros que participam do Novo Basquete Brasil (NBB), o campeonato nacional. A National Basketball Association, a mundialmente famosa NBA, que organiza o esporte nos Estados Unidos, agora toma conta das iniciativas comerciais e de marketing em parceria com a Liga Nacional de Basquete (LNB). A entidade estrangeira será responsável por dar cara de show ao esporte que, se não está em primeiro lugar na preferência dos brasileiros, tem crescido em popularidade graças ao retorno da seleção aos Jogos Olímpicos, à presença de atletas nacionais nos EUA e à popularidade cada vez maior dos “esportes americanos” por aqui. À frente da missão de rentabilizar e profissionalizar o business do basquete brasileiro está Arnon de Mello, diretor-executivo da NBA no País e filho do ex-presidente e hoje senador Fernando Collor de Mello. Desde a abertura do escritório da liga por aqui, em 2012, é ele quem dá as cartas em nome dos americanos. “A busca de patrocinadores e novos parceiros é fundamental para que o basquete nacional evolua”, diz. “É interesse da NBA, também, ter uma liga mais forte, mais sólida, mais bem estruturada, um produto cada vez melhor para os fãs.” Nesta entrevista, ele explica por que a NBA resolveu investir no basquete brasileiro e como será a parceria.

Arnon de Mello (acima), diretor-executivo da NBA no Brasil, e Anderson Varejão (à esquerda), que joga nos Estados Unidos. Estratégia de trazer jogos da liga americana para o País ajudou a aumentar a popularidade do basquete

2016 O Brasil é um dos países em que o interesse pela NBA mais aumenta. O senhor espera que parte dessa popularidade seja retransmitida ao NBB? O brasileiro gosta de basquete, gosta de NBA, NBB e Seleção Brasileira. E quer, cada vez mais, assistir aos jogos, estar perto dos atletas, consumir o esporte como produto. Desde que abrimos o escritório no Brasil, um dos principais objetivos é ajudar no desenvolvimento e na massificação do basquete, sempre em parceria com a LNB e a Confederação Brasileira de Basquete (CBB). Temos trazido eventos, buscando parcerias, trabalhando para que os fãs tenham mais oportunidades de praticar, jogar, respirar basquete. _ Quais foram os principais fatores que despertaram o interesse da NBA pelo NBB? O primeiro deles é o interesse que a NBA tem pelo Brasil. Hoje, o País é uma das prioridades para a liga, pelo momento que vive internacionalmente, tendo recebido a Copa do Mundo e perto de sediar a Olimpíada, e pelo interesse que os fãs mostram pela NBA. O basquete está crescendo no Brasil, temos cada vez mais atletas jogando nos Estados Unidos, e entendemos que o crescimento do basquete nacional é fundamental para que o esporte se desenvolva e evolua. A LNB vem fazendo um excelente trabalho, resgatou a modalidade com o apoio dos clubes, e vemos muito potencial no NBB. Firmamos uma parceria que vai ajudar bastante o esporte, que renderá muitos frutos. _ Quais serão, na prática, as ações sob responsabilidade da NBA? Atuaremos ao lado da LNB na gestão comercial, buscando patrocínios, parcerias, trabalhando na parte de licenciamento de produtos, bastante envolvidos com o marketing. _ As recentes perdas de patrocínio da LNB preocupam a NBA? Estamos olhando para frente. Queremos buscar patrocinadores, novos parceiros, ajudar a LNB a crescer e ser cada vez melhor. Isso é fundamental para que o basquete nacional evolua. É interesse da NBA, também, ter uma liga mais forte, mais sólida, mais bem estruturada, um produto cada vez melhor para os fãs. Já começamos a trabalhar nisso e, quem sabe, essas empresas que já apoiaram ou estiveram juntos da LNB antes possam voltar como parceiros novamente no futuro.

Vemos o NBB como um produto com muito potencial. _ Existe algum plano para estender a ação da NBA além da parte comercial e chegar às categorias de base? A liga terá algum tipo de participação na formação de atletas?

Hoje, o nosso acordo é apenas para uma colaboração na gestão comercial. Todo o trabalho nas categorias de base é de responsabilidade dos clubes, que são formadores de atletas.

FOTOS: DIVULgAçãO

A presença de jogadores brasileiros na NBA é um fator que atrai interesse para o basquete dentro do Brasil?

Ajuda muito, sem dúvidas, especialmente se esses jogadores estiverem perto dos fãs, dos torcedores que moram no Brasil.

E isso é algo que estamos fazendo. Em todos os eventos no País, procuramos ter a presença dos ídolos brasileiros que atuam na NBA. Desde que inauguramos o escritório no Rio de Janeiro, a NBA organizou dois jogos oficiais, trazendo equipes de muita tradição, como Miami Heat e Chicago Bulls, e franquias com brasileiros, casos de Nenê e Anderson Varejão, além dos eventos da plataforma de 3x3, o NBA3X, que sempre contaram com jogadores brasileiros, dançarinas e mascotes. Temos tido um retorno muito positivo do público e o interesse é promover mais ações como essas em 2015. _ Historicamente, o Brasil tem um problema com a solidez financeira dos clubes. A NBA pode ajudar a mudar isso?

Não vivemos o dia a dia dos clubes, não sabemos a realidade de cada um. Sabemos, sim, que os clubes enfrentam dificuldades, alguns mais, outros menos, e que é uma preocupação diária. A questão financeira é um problema generalizado no esporte do País. Vamos, sim, trabalhar em parceria com a LNB para ajudar, buscar um modelo de gestão comercial que melhor se adapte ao basquete atualmente. Vai ser bom para todos os envolvidos, é uma parceria para que todos possam crescer. Esperamos que isso seja benéfico para os clubes, também, pois eles são partes mais do que importantes nesse processo de fortalecimento do NBB, de desenvolvimento e massificação do esporte. _ Os brasileiros devem esperar, daqui pra frente, o tipo de “evento show” visto nas partidas de basquete da NBA? Acredito que os resultados vão aparecer, sim, mas no médio prazo. O interesse, tanto da NBA, quanto da LNB, é valorizar o produto, melhorar o basquete como um todo, e isso requer tempo e paciência. É nítido que o basquete melhorou muito, cresceu depois da criação do NBB, que, hoje, é um campeonato equilibrado, com grandes times e jogadores de alto nível.

A mídia tem dado excelentes espaços à competição, há patrocinadores fortes investindo nas equipes, e isso é muito bom. Há muitos problemas, que todos conhecem, e que podem ser resolvidos, podem ser trabalhados. O objetivo é melhorar, pouco a pouco, para crescer. Se a NBA puder ajudar, na parte da apresentação do jogo, do entretenimento do evento, vamos ajudar, com certeza. _ Existe algum plano para intercâmbio de jogadores ou técnicos?

Hoje o nosso acordo é apenas para a área comercial. Mas, claro, se for interessante para as duas partes, a ideia é expandir essa parceria para outros departamentos. A NBA está aberta e disposta a colaborar. O Brasil é um mercado importantíssimo e vamos trabalhar muito em parceria com a LNB.

ISTOÉ2016 FEVEREIRO/MARÇO 2015

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A LUTA OLÍMPICA AVANÇA >Antiga arte

CONSIDERADA UMA DAS PRÁTICAS ESPORTIVAS MAIS ANTIGAS DO MUNDO, A LUTA OLÍMPICA É COMPOSTA POR DOIS ESTILOS: GRECOROMANO, SÓ PARA HOMENS, E LIVRE, QUE PODE SER MASCULINO OU FEMININO. >OBJETIVO: dominar o adversário de costas para o chão – posição chamada de touch. >GRECO-ROMANA: os atletas não podem usar as pernas para atacar ou defender. Todos os golpes e pegadas devem ser feitos acima da linha da cintura. >LIVRE: praticada por homens e mulheres, permite o uso de todos os membros do corpo para desequilibrar o oponente. >ORIGENS: há registros que indicam que a luta livre já existia na Babilônia, reino na região do Egito, cerca de 3 mil anos a.C. Mas foi na grécia Antiga, por volta de 500 anos a.C., que ela se popularizou.

Curiosamente, o estilo greco-romano só foi oficializado na segunda metade do século XIX.

A Confederação Brasileira de Lutas Associadas já selecionou os atletas que representarão o País nos torneios internacionais de luta olímpica neste ano. Ao todo, 23 esportistas irão mostrar a que vieram em três modalidades: livre masculino, livre feminino e greco-romano (só masculino).

Entre as apostas estão nomes como Aline Silva, prata no Campeonato Mundial em 2014, Ronisson Brandão, Diego Romannelli e Davi Albino, destaques no estilo grecoromano, e Adrian Jaoude, Carlos Murta, Pedro Rocha e Hugo Cunha, no estilo livre.

De acordo com Roberto Leão, superintendente da entidade, a experiência nas competições, intercalada com os períodos de treinamento intenso, é fundamental para o desenvolvimento tanto dos atletas seniores como dos mais novos. A temporada das meninas começou já em 29 de janeiro, quando o time seguiu para a França e participou do Grand Prix. Já o time masculino marcou presença no tradicional Torneio Cerro Pelado, que aconteceu no dia 2 de fevereiro em Havana, capital cubana.

Nos planos da Confederação está o armênio Eduard Soghomonyam, do estilo greco-romano, primeiro atleta naturalizado pelo Brasil de olho nos Jogos de 2016.

Ele vive no País desde 2012 e, com o novo passaporte em mãos, poderá disputar todas as principais competições, incluindo o Pan de 2015, em Toronto (Canadá).

LENTIDÃO NO VELÓDROMO A principal preocupação entre as obras do Parque Olímpico da Barra da Tijuca está muito clara: o velódromo. A pista de ciclismo ganhou os primeiros pilares no segundo semestre do ano passado, mas desde então o ritmo de construção tem sido lento. O equipamento tem cronograma atrasado em quase um mês.

A Tecnosolo Serviços de Engenharia, responsável pela obra, é subsidiária da Tecnosolo Engenharia, empresa que está em recuperação judicial desde 2012 – ou seja, luta para não entrar em falência. Mesmo assim, a subsidiária venceu a licitação, que tem valor estimado em R$ 118 milhões. A RioUrbe, empresa municipal de urbanização, responsável por fiscalizar a construção, notificou a empresa duas vezes pelos atrasos. Mas tanto representantes da companhia quanto o prefeito carioca, Eduardo Paes, já deram declarações públicas afirmando que nada disso compromete a entrega, prevista para dezembro de 2015.

OS NOVOS EMBAIXADORES DO RIO O Comitê Olímpico Brasileiro escolheu as oito personalidades que irão atuar como embaixadores da Olimpíada carioca. A lista é composta pelos músicos Toni garrido e Preta gil, a empresária Carol Sampaio, o apresentador Luciano Huck, a chef de cozinha Roberta Sudbrack, os atores Rodrigo Lombardi e Otaviano Costa e o artista plástico Romero Britto. Segundo o diretor executivo de esportes do COB, Marcus Vinícius Freire, todos os escolhidos se destacam em sua área de atuação e devem “bombar” as redes sociais com notícias e resultados dos nossos atletas.

FOTOS: SHUTTERSTOCK • DIVULGAÇÃO

BRONZE INÉDITO NA NEVE O para-atleta André Cintra conseguiu um feito inédito: trazer uma medalha da Copa do Mundo de Snowboard paraolímpico para o Brasil. Em janeiro, o paulistano de 34 anos ficou com a terceira posição no campeonato disputado em Aspen, nos Estados Unidos, deixando nomes de peso como o americano Mike Schultz e o italiano giuseppe Communale para trás. Primeiro brasileiro a disputar os Jogos Paraolímpicos de Inverno, André teve a perna direita amputada acima do joelho após um acidente de moto, aos 18 anos. O contato com o snowboard, no entanto, veio há apenas cinco anos, quando ele adquiriu uma prótese especial para poder competir.

SUPERBACTÉRIA CONTRA A VELA Nem o mau cheiro, nem o lixo em excesso: a nova preocupação para os atletas olímpicos que irão disputar competições de vela na Baía de guanabara é microscópica e quase imperceptível. Cientistas brasileiros encontraram superbactérias (que resistem a antibióticos) em um rio que deságua na praia do Flamengo, uma das áreas que compõem a baía. Os especialistas acreditam que os micro-organismos são originários da rede hospitalar. Eles foram encontrados em três pontos, incluindo na nascente do rio. Segundo os especialistas, a superbactéria poder causar infecções que exigiriam internação. O governo do Estado tinha a meta de entregar as águas da região até 80% mais limpas em 2016, o que não será cumprido, como admitiu o secretário de Ambiente do Rio de Janeiro, André Corrêa. Uma das maiores apostas do governo para despoluir a região, a Unidade de Tratamento de Rios (UTR) do rio Irajá está sendo construída desde 2011 e teve a inauguração adiada quatro vezes – e ainda não está funcionando.

“Se oS JogoS foSSem em outro paíS, talvez eu tiveSSe deixado a vela olímpica” RobeRt Scheidt

poR Luiz PauLo Castro Montes

foto Pedro dias

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istoÉ2016 fevereiro/março 2015

Robert Scheidt não é mais um garoto. Aos 41 anos, o bicampeão olímpico (Atlanta-1996 e Atenas-2004) e 15 vezes campeão mundial de vela se reinventa para superar rivais com a metade de sua idade. “Se eu não acreditasse que dá, não estaria fazendo”, disse à 2016 durante uma longa entrevista em São Paulo, sua cidade natal. Pouco mais de dois anos depois de retornar à classe Laser – ele deixou a Star porque a categoria foi excluída do cronograma olímpico –, Scheidt mostra o tipo de maturidade esportiva que só a participação em cinco Jogos Olímpicos (com uma medalha em cada) pode proporcionar. “Sou um dos favoritos para 2016”, afirma, sem rodeios. “Não tenho mais o domínio que tive durante anos, mas estou na briga e esse é meu objetivo.” Realizado como atleta, este homem alto e magro (1,88 m e 78 kg), com o rosto marcado pelo sol e pelo sal, ainda encontra na vela aquele tipo de conexão única com a natureza que só quem vive dela pode experimentar. “Estar em um barco e usar a força do vento e da água é muito gratificante”, diz. Focado na preparação para os Jogos de 2016, Scheidt admite que as condições da Baía de Guanabara não são as ideais para competir, mas mostra otimismo com a preparação. “Tem que estar sem detritos, mas, se a qualidade da água não for um Caribe, não vai mudar a competição.” O fator casa, aliás, foi decisivo para o atleta continuar a almejar medalhas. “Se fosse em outro país, talvez tivesse deixado a vela olímpica.” _Qual a sua avaliação da vela brasileira em 2014?

Foi um ano positivo. Tivemos a Martine Grael e a Kahena Kunze sendo campeãs mundiais. Tem o Jorginho Zarif, que é um grande talento, que vem bem e é promessa para 2016. Tem a Patrícia Freitas, o Bimba, a Fernanda Oliveira e a Ana que são experientes, são medalhistas olímpicas. É uma equipe muito forte para 2016. O importante é a vela entrar com cinco, seis classes com chances de medalha. Quem sabe a gente consiga três medalhas, o que seria um resultado excepcional. _Mas o brasil só conquistou um título mundial em 2014. É preocupante?

O Mundial em si, como resultado, não foi muito bom para a equipe. Se analisar a temporada como um todo, com todas as competições, foi bom. O lado positivo de não ganhar tudo é que tira o foco de você ser o cara com o alvo nas costas. _Você se considera um dos favoritos para a olimpíada de 2016?

Sou um dos favoritos. Não tenho mais o domínio que tive durante anos, mas estou na briga e esse é meu

objetivo. Eu sei que naquela semana vou ter chances reais de brigar por medalha, e de repente consigo ter uma semana iluminada, excelente. Mas não vou conseguir ter a hegemonia que tinha. Estou com 41 anos e vou ter 43 em 2016. Coloco objetivos na temporada, mas sei que não posso estar bem em 12 meses do ano. _Quem são os maiores rivais para 2016?

Hoje teriam sete ou oito nomes para disputar três medalhas. Mas se eu for apontar três, apontaria o australiano Tom Burton, o croata Tonci Stipanovic e o holandês Rutger Van Schaardenburg. _o fator casa pode ser o diferencial para você?

Eu quero acreditar que sim. Você está no seu país, olha para o Rio e é aquela beleza, o lugar em que velejei tanto. Velejei de Laser, de Star, tenho história com aquele local. Se fosse em outro lugar, eu talvez não estivesse mais participando. Talvez tivesse deixado a vela olímpica depois de Londres. Mas, por ser no Rio, foi um estímulo para continuar mais quatro anos.

entrevista

RobeRt Scheidt

_Qual a diferença da primeira olimpíada, em Atlanta-1996, para hoje?

Na primeira eu era inexperiente, nem sabia a magnitude de uma Olimpíada. Só fui cair na real quando cheguei ao Brasil com a medalha de ouro e fui recebido no carro dos Bombeiros. Minha vida mudou. Meu trunfo hoje é a experiência. E vou competir contra atletas com 20 anos a menos, mas que não passaram por tudo que passei. É a carta na manga que tenho que guardar e usar no momento certo. _e a questão da idade? o fato de você ter 41 anos pesou na preparação física?

Sim, eu fazia um volume de preparação muito grande quando tinha 25 anos. Fazia natação, bicicleta, e com poucas interrupções. O corpo aguentava esse tranco todo. Agora tem que ter mais qualidade e menos quantidade. Eu tenho disposição, mas se treinar demais e esticar a corda, posso ter lesões, e é o que quero evitar.

No barco, já sei o que fazer, onde treinar, quantas manobras realizar e o que tirar daquele dia. _Você, 100% em forma, e com a sua experiência, é difícil de ser batido?

Eu acredito que sim (risos). Nunca competi contra mim mesmo, mas acredito que tenho dom para a coisa.

Se eu não acreditasse que dá, não estaria fazendo. Ir para uma Olimpíada por ir não é a intenção. Se fosse para ir por ir, era melhor ir um jovem, que está começando agora, para usar a Olimpíada como experiência.

Eu vou tentar ir porque acho que tenho chance de trazer medalha para o Brasil, de chegar à sexta medalha olímpica, o que seria um recorde. O desafio continua. _Você tem mais um ano e meio para os Jogos.

Nesse período, o que muda em relação ao que foi feito nos últimos anos?

O foco da preparação passa a ser mais no Rio de Janeiro. Quero velejar mais lá, conhecer ainda mais as raias em que vou competir. São cinco raias, e demanda muito tempo conhecer todas. Fora isso, é administrar lesões e tocar a parte física. Não adianta querer complicar demais, fazer coisa muito diferente.

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istoÉ2016 fevereiro/março 2015

_como você vê a formação de novos talentos na vela brasileira?

A formação ainda depende muito dos clubes. Eu, por exemplo, fiz escola no Yatch Club de Santo Amaro. Tem alguns clubes que são formadores em São Paulo, Santa Catarina, Rio de Janeiro... O mundo ideal é que tivessem alguns projetos desvinculados dos clubes, que a grande massa pudesse ter acesso a um barco. A vela não é um esporte fácil, você lida muito com leitura do vento. A evolução é lenta, demora para amadurecer. Temos uma nova geração vindo agora, mas poderia ser melhor, mais abrangente, desvinculada de instituições. _Você tem um papel importante no surgimento de novos velejadores?

Sim. Hoje na Confederação tem um departamento da Vela Jovem. Eles selecionam alguns jovens velejadores para fazer viagens com a equipe olímpica, trocar experiências, ver como a gente treina, como é nosso dia a dia, como a gente se prepara. Como eu disse, demora muito para se formar um velejador olímpico. _depois de tantos títulos, o que ainda te motiva?

Sempre vivi em cima de objetivos. Desde o momento em que sonhei em ir para uma Olimpíada, aquela era minha meta. Quando a Star ficou fora da Olimpíada, tive oportunidades de fazer outras coisas. Mas eu pensei: “De repente, consigo chegar bem a mais uma Olimpíada, no meu País.” E isso me motivou. Ir lá e participar dessa grande festa, com chances de brigar. Isso faz valer a pena. _o que velejar significa para você? É um esporte maravilhoso, pois você lida com elementos da natureza. Lidar com vento, água, mar e usar esses elementos para andar mais rápido é muito gratificante e dá sensação de liberdade. Já fiz outros esportes, como tênis e natação, mas a vela ajuda a zerar os problemas. _A baía de Guanabara é o local ideal para as competições de 2016?

Quando anunciaram que os Jogos seriam no Rio, fiquei um pouco reticente pela escolha da Baía de Guanabara, pois temos Búzios e Cabo Frio, que são próximos e são locais

“teNho ceRtezA de Que o Rio eStá Se eMpeNhANdo pARA eNtReGAR GRANdeS JoGoS. É uMA chANce úNicA pARA o bRASil e pARA A AMÉRicA do Sul. dificilMeNte VeReMoS NoVA oliMpíAdA NoS pRóxiMoS 100 ANoS AQui. A chANce É eSSA e leVo fÉ de Que VAi SeR iMpReSSioNANte” muito bons. Mas neste meio tempo já velejamos bastante e eu estou bem surpreso. Tem se provado uma raia técnica, com mais ventos do que eu esperava. E o problema da poluição, que tem sido muito falado, não está tão preocupante quanto pensava. Ele não vai ser completamente sanado, mas vai haver a coleta do lixo flutuante, que é o pior para quem veleja. Se a qualidade da água não for um Caribe, não vai mudar a competição. Mas se tiver detrito, vai ter muita reclamação. Mas não acho que vá acontecer. _Você acredita que tudo funcionará bem em 2016?

Eu acredito que sim. Tem muita gente que adora criticar, mas eu sou da linha positiva. Claro que vai haver problemas, é impossível não ter. Teve na Copa, teve em Atenas, teve em Pequim, com o problema das algas, em Sydney, com os tubarões que atacavam os triatletas, em Londres teve a segurança sem contingente suficiente. Tenho certeza de que o Rio está se empenhando para entregar grandes Jogos. É uma chance única para o Brasil e para a América do Sul. Dificilmente veremos nova Olimpíada nos próximos 100 anos aqui. A chance é essa e levo fé de que vai ser impressionante. _Você, como velejador, sente a deterioração do mar pelo mundo?

O que sinto muito é a questão do aquecimento global.

Em Ilhabela (SP), a praia era enorme. Hoje em dia, a água chega no muro, não tem mais aquela praia. O meio ambiente mudou bastante. Fora que, naturalmente, com as obras e construções, a qualidade da água piorou um pouco.

A poluição, também. Eu passo uma parte do ano na Itália, e quando chego aqui no inverno, tem um colchão de nuvens na cidade. No primeiro dia, sinto o olho ardendo e fico resfriado. Isso faz diferença na vida. O mundo tem que ter consciência de onde queremos chegar e deixar um ambiente razoável para as próximas gerações. _Você pensa em aposentaria?

Eu tenho que pensar na transição. A palavra aposentaria é pesada. A transição vai acontecer, e felizmente a vela não

é um esporte em que você precisa abruptamente parar. A vela dá chance de participar de outras categorias de barco, em equipe, de fazer regatas longas, transoceânicas. Eu tenho convite para várias regatas dessas, tenho que negar muita coisa, mas são oportunidades para agarrar depois de 2016. Mas sempre vou ter um Laser onde eu morar. Eu nasci para esse barco. _Você se sente realizado com tudo que a vela te deu na vida?

Sim. É claro que o ser humano sempre quer mais, ele não se contenta com o que tem. Quando você coloca uma meta e alcança, é natural que, no dia seguinte, você pense em outra. Eu me sinto realizado. Minha carreira me deu mais do que eu imaginava que teria. Pelo talento e pelo dom, pelo esforço próprio, pelas pessoas que ajudaram, pela estrutura familiar que tive e pelas escolhas que fiz na vida, de ser determinado, disciplinado. Já conquistei muita coisa, mas, se dá para conquistar mais, vamos tentar.

Você acompanhou as denúncias de irregularidades no bolsa Atleta entre esportistas da vela?

Houve algumas questões bem discutíveis. Pelo que a Confederação falou, eles agiram de acordo com o que o Ministério do Esporte passou, mas não me aprofundei nisso. Eu não sou bolsista, não tenho nem Bolsa Atleta nem Bolsa Pódio. Eu tenho meus patrocinadores. O Banco do Brasil, a Audi, a Confederação e o COB ajudam. O COB tem dado fisioterapeuta para me acompanhar e isso faz diferença. Fora isso, acho que o importante é que a coisa seja clara para todo mundo nessas questões do Bolsa Atleta, e que atinja o atleta que realmente precisa e tenha credencial para ser bolsista.

Você não é bolsista por opção?

Eu não sou bolsista por opção. Eu não quero ter pressão de ficar entre os 20 primeiros do ranking. É claro que, se estiver, é bom, mas não quero ter a pressão de competir para manter a bolsa, como acontece com muitos atletas.

Esse critério tem que ser revisto, também. Tem que ser uma análise caso a caso, ver quem faz jus a ter a bolsa.

fo i

punk ginástica artística

por Nathalia ZiemkiewicZ

fotos frederic jeaN/ag.istoé

Quando todos achavam impossível, o ginasta diego hypolito superou a má fase Que o levou à depressão, saiu da reserva e conQuistou o bronze mundial. agora, tem ambições ainda maiores: Quer medalha na olimpíada em casa

Antes de dar a volta por cima no Mundial, Diego vivia a pior fase da carreira. A falta de um clube para treinar e os resultados fracos afetaram o psicológico do atleta: ele tinha medo de entrar em carro, elevador e avião. “Me senti descartável”, diz istoÉ2016 fevereiro/MArço 2015

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o ik ginástica artística

“agora o diego se sente valorizado e amado”, diz, referindo-se a si mesmo na terceira pessoa 22

istoÉ2016 fevereiro/MArço 2015

Diego Hypolito não deu apenas a volta por cima.

Deu um duplo mortal com pirueta de 360 graus no eixo longitudinal e posição estendida antes de cravar novamente os pés no chão. Saltou da fase mais punk de sua carreira para o bronze no Campeonato Mundial de Ginástica Artística, disputado em outubro passado na China. A medalha lhe devolveu tanto a autoestima quanto o sentimento olímpico. Meses antes, as perspectivas eram bem diferentes. O atleta estava desempregado, sem patrocínio, treinando de favor no clube Pinheiros, em São Paulo. Os bons resultados não vinham – as más línguas, sim. Diego tentou se equilibrar com auxílio de uma terapeuta, mas acabou caindo em depressão: “Me senti descartável”, diz. O desânimo conseguiu paralisá-lo.

Logo ele, tão hiperativo. De repente, tinha medo de entrar em carro, elevador ou avião.

No meio de uma negociação com o clube ASA São Bernardo do Campo, ele foi internado pelo médico. Passou cinco dias dopado e emagreceu dez quilos. Quando o técnico Fernando Lopes comentou com algumas pessoas sobre o interesse em contratar Diego, ouviu que talvez fosse “investimento demais para um defunto, um cara morto para a ginástica”. A situação era crítica em todos os sentidos. Acontece que o próprio Fernando pensava seriamente em abandonar a profissão. Cansara de formar ginastas de alto rendimento que depois trocavam de clube em busca de melhores condições financeiras e infraestrutura – caso de nomes da seleção brasileira, como Sérgio Sasaki e Felipe Arakawa. Não queria mais trabalhar para os outros levarem o crédito. Então o ASA ganhou o apoio de um patrocinador para construir um ginásio de ponta e contratar bons atletas. Fernando procurou Diego e disse que não tinham mais nada a perder: “Sabia que poderíamos ajudar um ao outro a recuperar nossa motivação”.

Os dois fecharam acordo em abril de 2014. Foi fundamental para Diego perceber que, a despeito da péssima fase, ainda havia gente que acreditava nele, na dedicação de uma vida inteira ao esporte. Seis horas por dia, de segunda a sábado, ele se entrega ao preparo físico, às acrobacias e à fisioterapia para prevenir lesões.

Brincalhão, desses que tiram sarro de tudo e têm risos incontroláveis, não resiste a imitar o técnico – um sujeito sério e sistemático. As personalidades opostas se complementam. Há quem quebre o gelo de uma rotina exaustiva e quem traga o foco necessário ao treinamento. “Ele é extremamente experiente, sabe o momento certo de cada coisa: brinca sem deixar de cumprir todos exercícios”, afirma Fernando.

Graças ao ASA, Diego trocou um flat “claustrofóbico” em São Paulo por uma casa espaçosa em São Bernardo do Campo. Aos 28 anos, é a primeira vez em que mora sozinho – a família ficou no Rio de Janeiro. Tem saudade da praia, mas gosta do “clima

de interior” e de “conhecer o pessoal da padaria, da farmácia e os vizinhos”. Dona Geni, a mãe, liga todos os dias para saber se o caçula tem se alimentado direito. Agora é dele a responsabilidade de tirar o lixo às segundas e comprar amaciante para as roupas. Ele não reclama das tarefas domésticas, quer aprender a se virar. Mostra uma conta atrasada, culpa da falta de tempo (e de hábito), e se pergunta como não cortaram a luz. Enquanto dá esta entrevista, é três vezes interrompido para tirar selfies com fãs.

“Agora o Diego se sente valorizado e amado”, diz, referindo-se a si mesmo na terceira pessoa. A frase vem carregada de mágoa. Em 2013, descobriu pela imprensa que havia sido demitido do Flamengo. Os repórteres ligavam para repercutir a notícia e ele rebatia que a “informação estava errada”. Em sua cabeça, aquilo não era possível. Nas semanas anteriores, tivera reuniões com a diretoria sobre a crise financeira da instituição, chegando a sugerir que baixassem seu salário – até porque, segundo Diego, já lhe deviam dois anos de pagamentos. Para seu espanto, a informação procedia.

Vinte e oito atletas foram demitidos ao todo, seis da ginástica, incluindo a irmã, Daniele Hypolito. “Faltou respeito”, diz. Embora sócio vitalício, nunca mais conseguiu aparecer no clube em que treinou por 19 anos.

O Flamengo foi um divisor de águas na história dos Hypolito. Antes dele, a família vivia na pacata Santo André (SP). O pai, Wagner, saía para trabalhar como operário numa fábrica de pneus. Geni, cabeleireira e manicure, recebia as clientes em casa. Diego e os irmãos mais velhos, Daniele e Edson, estudavam em colégios públicos. O mais próximo que se via de ginástica artística por ali eram as crianças escalando os batentes das portas. Ou quando, na folga dos pais, os três filhos iam brincar num parque da cidade. “Eles davam umas piruetas na grama, antes de aprender qualquer coisa, e o pessoal passava batendo palmas”, conta Wagner. Então Daniele assistiu à romena Nadia Comaneci na televisão e teimou em fazer estripulias iguais. Coincidência, tinham um vizinho de rua professor da modalidade. Ele a convidou para treinar no Sesi.

Diego se animou apenas quatro anos depois. “Ele não gostava muito no início”, diz a irmã. “Eu insistia e perturbava para que continuasse.” Não demorou para que ambos inventassem de praticar em casa, arrastando colchões das camas para o quintal. Antigamente, lembra o pai, o preconceito contra “menino em esporte de menina” gerava piadinhas maldosas. Como se não houvesse alternativa ao futebol. O pequeno se divertia no ginásio - para alívio de Dona Geni, gastava boa parte da energia que não parecia ter fim. “Diego sempre foi acelerado, fica procurando o que fazer o tempo todo”, diz a mãe.

“Castigo era botá-lo sentado e paradinho.” Nas aulas,

o nk ginástica artística

“eu me achava invencível, me deslumbrei mesmo”,

afirma diego sobre as primeiras conQuistas. “era

de uma família pobre e, de repente, estava na mídia e ganhando um alto salário”

Diego treina antes nos Jogos olímpicos de Londres-2012.

Após cair de cara, ele mais uma vez precisou se desculpar

enquanto a molecada terminava um exercício, já tinha feito três. Mas a verdade é que, ao contrário de Daniele, ninguém enxergava nele um fenômeno de ginasta.

Naquela época, a treinadora Georgette Vidor bateu os olhos na menina, de “talento sensacional”, e propôs um contrato com o Flamengo. Mas seria necessário que a família se mudasse para o Rio de Janeiro e se sacrificasse pelo sonho dela. Wagner pediu as contas. Todos arrumaram as malas, partindo com a cara e a coragem.

Além do salário de Daniele, o clube cederia um apartamento, arcaria com escola particular para os três filhos e os treinaria na ginástica. “Eu era só um pacote da minha irmã”, diz Diego. “Mas tudo bem, porque eu era, e sou, o maior fã dela, queria ser como a Daniele.” Os problemas começaram quando o clube atrasou seis meses de remuneração e Wagner não encontrava emprego. Deu para sobreviver de bicos como motorista ou vendendo livros em semáforo e refrigerante na praia. Geni corria em função das crianças, acompanhando de ônibus para o clube durante a manhã e depois levando as marmitas.

Não tinham dinheiro para o gás e tomavam banho de balde. Diego se emociona ao narrar a lembrança

da mãe dissolvendo uma lata de leite condensado para servir de sopa aos filhos. Eram pobres, sem nada para comer, em plena zona sul. “Viam a gente como a família Buscapé: os caipiras coitadinhos na cidade grande”, afirma. Anos mais tarde, em 2001, Daniele se classificou para o Mundial. Sem verba para que ela viajasse e competisse, Geni conseguiu o contato do jogador Ronaldo Fenômeno e lhe implorou ajuda. Ele bancou as despesas, ela voltou com o ouro e o feito de conquistar a “primeira medalha brasileira da ginástica artística em mundiais”. No ano seguinte, Diego surpreendeu como finalista do Mundial. O desempenho calou comentários que ecoavam nas arquibancadas. “Nossa, até que o irmão dessa menina também é bom, hein?”, passaram a dizer.

Os patrocínios surgiram à medida que Diego colecionava títulos. E não foram poucos. Bicampeão do mundo, em 2005 e 2007. Ouro nas provas de salto e solo dos Jogos Pan-Americanos do Rio, em 2007 – mais uma prata na disputa por equipes. “Ele abriu as portas para a ginástica masculina”, afirma Arthur Zanetti, campeão olímpico e eleito o atleta de 2014 pelo COB. “É experiente, focado, disciplinado e tem muita garra.” Georget-

o

o pAsso A pAsso Do sALto MAis DifÍCiL eXeCutADo por Diego

Desde 2006, a acrobacia evolui e incorpora novos e complexos elementos. Não tente fazer isso em casa.

Mas, se tentar, é assim que funciona.

1 2 3 4 5 6 7 pegue muito impulso e corra

faça meia volta com o corpo no ar

Conclua com o primeiro mortal

Dê uma pirueta de 360 graus no eixo longitudinal

te o descreve como um esportista perseverante, alguém que treinava mais que os colegas e montava as próprias técnicas com elementos difíceis. “Ele tinha condições físicas e se mostrava habilidoso”, diz. “Mas confesso que não detectei que se tornaria quem se tornou.” Em 2008, em Pequim, Diego estreou nos Jogos Olímpicos dois meses após uma cirurgia no joelho. O Brasil parou para assisti-lo. Na última pirueta no solo, ele aterrissou de bunda no tablado. Declarou que havia “amarelado” e ficou meses com vergonha de sair de casa.

Agora ele olha para trás com a franqueza de quem amadureceu. “Eu me achava invencível, me deslumbrei mesmo”, diz. “Era de uma família pobre e, de repente, estava na mídia e ganhando um alto salário.”

Diego não era somente um esportista, mas também uma celebridade que não sabia lidar com o assédio.

Remoeu a cena em Pequim por vários anos. Não se perdoava por ter “decepcionado tantas pessoas”. Culpa, em parte, de uma cultura que valoriza somente o lugar mais alto do pódio e massacra quem julga perdedor.

Nos Jogos de 2012, foi desclassificado antes da final depois de uma queda de cara. Abordado pela imprensa ILUSTRAÇÃO: RICA RAMOS • FOTO: AMY SANCETTA/AP

Mantenha as pernas na posição estendida durante o salto

finalize o segundo mortal

Crave os pés no chão sem se desequilibrar

na saída do ginásio, disse com a voz embargada e os olhos boiando: “Quero pedir desculpa de novo por esse fracasso. Não sei o que aconteceu.”

Hoje, Diego faz sessões semanais de terapia para encarar a derrota de outra forma e tentar acreditar que a maior vitória está longe dos holofotes. Porque ela se dá no dia a dia. Como todo atleta de alto rendimento, ele se cobra demais e acaba sendo injusto consigo mesmo. Basta dizer que a modalidade tinha zero tradição antes dele. Os ginastas que vieram na sequência já desfrutavam do respeito conquistado internacionalmente por Diego. Puderam aprender com seus erros e acertos. Após Londres-2012, sem resultados expressivos, houve quem tivesse dado sua carreira por encerrada. Superada a demissão do Flamengo e a grave depressão, Diego começou a treinar no ASA em meados de 2014 sem o alarde do favoritismo.

Sua reviravolta foi sendo construída de um jeito silencioso. Almejava voltar para a seleção brasileira e disputar o Mundial. Diego foi convocado como segundo reserva, o que significou uma tremenda frustração.

Já planejava uma guinada drástica de vida. Se fosse ISTOÉ2016 fevereiro/MArço 2015

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ginástica artística

entre os demais atletas, Diego é reconhecido como um sujeito sociável, divertido e animado. No karaokê que frequenta quase toda semana, adora cantar Chitãozinho e Xororó

AssisteNte De fotogrAfiA: feLipe gAbrieL/ proDução: CiNtiA sANChez

preciso, defenderia outro país para participar da Olimpíada no Rio. Embarcou para a China sem qualquer esperança. Sua chance dependia de uma hipótese rara – o titular e o primeiro reserva se machucarem. Duas horas antes da competição, Diego soube que o improvável acontecera. “Meu coração disparou, fiquei com muito medo de travar”, diz. Sua apresentação foi solta e segura, com duas pequenas falhas, o que lhe garantiu o bronze. Do pódio, parecia mais orgulhoso que os vencedores dos degraus acima. “É inexplicável, essa medalha tornou meu sonho olímpico ainda mais vivo.”

Ao lado do treinador na recém-inaugurada e bem equipada Arena Caixa, Diego traça estratégias para alcançar seu próximo objetivo: integrar a equipe de 2016. Como o nível técnico evoluiu muito nos últimos anos, ele não pode se conformar em ser um dos melhores ginastas do país no solo e no salto, aparelhos nos quais se favorece pela característica explosiva. “Diego tem potencial nas barras fixa e paralelas”, afirma Fernando. “Estamos trabalhando nelas porque são uma defasagem na seleção.” Ou seja, daqui para frente, a exigência e o cansaço serão ainda maiores. Daniele acredita que o irmão “vai tranquilamente até 2020” porque tem “ginástica e força de vontade”. Se o físico aguentar, Diego não pensa em aposentadoria antes.

Por esse motivo, poupa o corpo como nunca. Deixou de competir no Japão em dezembro passado para não correr o risco de se lesionar.

Também não abre mão da vida fora do ginásio.

Daquilo que contribui para seu bem-estar psicológico.

“A prioridade é o Diego estar feliz”, diz, no estilo Pelé, explicando que não vive só para a ginástica. Os 98 mil seguidores de sua conta no Instagram curtem as fotos em que aparece na praia ou na balada. As atletas gêmeas do nado sincronizado Bia e Branca estão sempre posando com ele por lá. Outra companhia constante é Bárbara Evans, com quem adora frequentar quase semanalmente um karaokê no centro de São Paulo. “Se não fosse ginasta, ele com certeza seria cantor”, diz a amiga. O repertório de Diego vai de “Evidências”, da dupla Chitãozinho e Xororó, à música gospel de Robinson Monteiro. “Sou cafonérrimo”, brinca. A mãe, tiete assumida, insiste em que ele faça aulas de canto e violão.

Na rede social, os braços musculosos e a barriga tanquinho estão retratados em todos os ângulos – algumas com a legenda “semi-vulgar kkk”. Puxou a genética magra da linhagem do pai, favorecida pelo treinamento pesado. Dizer que Diego é vaidoso não abarca sua imensa preocupação com a própria imagem. Durante a sessão de fotos para esta reportagem, resistiu a ser clicado sem camisa porque estaria “fora de forma”. A pele ganha atenção extra nas consultas AgrADeCiMeNtos: Nike, CALviN kLeiN, tritoN, fóruM, DuDALiNA, breChó MiNhA Avó tiNhA, C&A, riAChueLo e eLLus.

com a dermatologista. E o cabelo, bem, o cabelo é arrumado para sobreviver intacto a um vendaval. Seu treinador conta que, no meio de uma competição na Colômbia, pegou Diego escondido num canto. Estava passando laquê para alinhar os fios que se rebelaram numa série de acrobacias.

Não à toa recebe tantas fotos de gente pelada pelo aplicativo de mensagens Snapchat. “Tem gente muito atirada, não gosto dessa vulgaridade”, afirma. Solteiro na pista, Diego diz que anda numa fase autossuficiente e sem tempo para namorar. Mas quer muito ter filhos.

Não comenta sobre os rumores acerca de sua suposta homossexualidade. Aliás, sobre todo tipo de boato que envolve seu nome, responde apenas que “não está nem aí” e “cada um fale o que quiser”. No universo do esporte, é conhecido como um cara de bom coração e extremamente gentil. De fala acelerada, emenda um assunto no outro, para agonia de quem tenta acompanhar seu raciocínio. Wagner diz que o sossego acaba quando o filho chega: “O menino ri de tudo e não deixa a gente quieto”.

Quase todo fim de semana, Diego embarca na ponte aérea para descansar na cobertura da família na Barra da Tijuca, onde residiu até 2013. Define-se como “o bobo alegre” dos três irmãos, enquanto Daniele seria “reservada” e o promotor de eventos Edson, “muito bravo”. Ora é recebido com bolo de cenoura, ora cozinha um risoto de camarão. Pequenos luxos para os Hypolito, que experimentaram por tanto tempo perrengues financeiros. A renda dos cinco integrantes da família vai para o que Diego chama de caixa único. “Não tem essa de cada um ter o seu dinheiro”, diz. Tão logo a condição de vida melhorou, compraram casa e comércio para os parentes – uma tia e uma prima seguem morando com Wagner e Geni.

São muito religiosos.

O ginasta frequenta os cultos da Bola de Neve Church, talvez a mais moderna das igrejas evangélicas. Para ele, só a fé explica o fato de ter ido ao Mundial como segundo reserva e voltado com a medalha de bronze.

Do futuro, não espera nenhum milagre. Quer evoluir nos treinos para meter o pé no peito dos críticos e fazer história em 2016. Daqui a seis anos, deseja cursar a faculdade de jornalismo para atuar na televisão – trancou a de educação física por não conseguir conciliar com a rotina de atleta. Diego garante que a nova profissão não teria nada a ver com exposição e vaidade. A ideia, assegura, é mostrar os bastidores do esporte e seus heróis invisíveis. “Tem um monte de fulaninhos se esforçando para subir num pódio sem o reconhecimento que merecem”, diz. “O sonho olímpico deles é tão vivo quanto o meu.” istoÉ2016 fevereiro/MArço 2015

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Caminho aberto a soCos boxe

por DemĂŠtrio rana

fotos peDro Dias/ag.istoĂŠ

as histórias de superação dos boxeadores que, após a profissionalização dos irmãos falcão, querem se tornar os novos ídolos do esporte brasileiro e conquistar um número recorde de medalhas em 2016. as chances – e as condições – nunca foram tão boas

Patrick Lourenço, criado na favela do Vidigal, é o segundo melhor do mundo na categoria até 49 kg.

Tem apenas 21 anos

boxe O terceiro sargento Roberto Custódio vestia a farda impecavelmente passada e saía de carro da favela Nova Holanda, no Complexo da Maré, Rio de Janeiro, quando ouviu o desdém de um garoto da rua: “Ó o Exército aí”. Outro jovem se aproximou, olhou pelo vidro entreaberto e, admirado, disse ao amigo: “Relaxa, é o lutador!”

O respeito era uma conquista. Aos 15 anos, Roberto se aproximou do boxe para esquecer a morte do pai, assassinado pelo tráfico. Uma vez lá, seus objetivos se diversificaram. O “lutador” confessa que também batalhou muito nos treinos para ganhar a atenção das meninas. E venceu. Hoje, enquanto vê a filha crescer a distância, dedica-se mais do que nunca à nobre arte e quer usar o boxe para tirar a mãe da favela. As marcas da violência, no entanto, são indeléveis. Tanto que, quando assina algo, escreve: “Roberto – Atleta da Paz”.

A história de Roberto se assemelha à de tantos outros pugilistas, marginalizados na infância, que procuram nos ringues uma vida melhor. Patrick Lourenço, criado no Vidigal, na zona sul do Rio, costuma dizer que teve dez chances de escolher o lado ruim, do tráfico, mas se esquivou de todas. Assim como Michel Borges, amigo de infância, e Roberto, companheiro deles na seleção brasileira de boxe, Patrick se agarrou à única oportunidade que passou com destino ao bom caminho. Hoje, os três carismáticos cariocas sonham em ganhar a medalha olímpica em casa, no Rio, em 2016. Não são os únicos com esse objetivo. “Cinco”, “seis”, “sete”. Pergunte a qualquer lutador da seleção brasileira quantas serão as medalhas da modalidade em 2016 e você dificilmente ouvirá uma resposta contida. O otimismo faz brilhar os olhos. Todos parecem acreditar piamente que o boxe irá mais vezes ao pódio do que qualquer outra modalidade – são 13 disputas pelo ouro, sendo dez no masculino e três no feminino.

Entre as mulheres, tudo pode acontecer. A chave olímpica terá apenas 12 pugilistas. Quem tiver sorte “pulará” a primeira rodada (“ficar de bye”, no jargão do esporte) e precisará de apenas uma vitória para assegurar a medalha olímpica. Quem pode se beneficiar no sorteio é Clélia Costa, atualmente a número 2 do mundo e bronze no Mundial de 2014 na categoria olímpica até 51 kg. Sem alarde, em seu terceiro ciclo olímpico, ela ofuscou a medalhista Adriana Araújo e virou a principal esperança para 2016. Cláudio Aires, treinador da seleção feminina, não se surpreendeu. O técnico conheceu Clélia em 2005, quando a menina tinha 17 anos. Ela ajudava o pai a construir novos cômodos na casa, fazendo uma laje, e impressionava a todos com o preparo físico. “Uma hora, peguei uma lata cheia de cimento e coloquei na corda. Um pedreiro disse: ‘Você é forte, por que não vai fazer boxe?’”, conta a atleta. E Clélia foi. Indicada por uma amiga, chegou “gordinha”, com 64 kg, às primeiras aulas no Clube Escola Santo Amaro, na zona sul de São Paulo.

O talento escondido foi lapidado exatamente por Aires, ex-atleta da seleção.

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Sem alarde, ClÊlia Costa tornou-se a principal esperança de medalha do boxe feminino.

No fim do ano passado, foi bronze no Mundial

boxe roberto Custódio, que assina como “atleta da Paz”, usou o boxe para superar a morte do pai, assassinado pelo tráfico. “Passava o dia no treino para não pensar em vingança”

aNoS douradoS as maiores conquistas do boxe nacional ocorreram a partir de 2010. Confira:

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istoÉ2016 feVereiro/Março 2015

Mundial Juvenil de Baku (2010) DaviD Lourenço – aTé 69 kg > ouro olimpíada da Juventude de Cingapura (2010) DaviD Lourenço – aTé 69 kg > ouro Mundial feminino de Bridgetown (2010) roseLi Feitosa – aTé 81 kg > ouro Mundial Masculino de Baku (2011) everton Lopes – aTé 64 kg > ouro olimpíada de Londres (2012) esquiva FaLcão – aTé 75 kg > prata olimpíada de Londres (2012) Yamaguchi FaLcão – aTé 81 kg > Bronze olimpíada de Londres (2012) aDriana araújo – aTé 60 kg – Bronze Mundial Masculino de almaty (2013) roBson conceição – aTé 60 kg > prata Mundial Cadete de kiev (2013) cássio oLiveira – aTé 63 kg > Bronze Mundial feminino de Jeju (2014) cLéLia costa – aTé 51 kg > Bronze

de Boxe (CBBoxe), patrocínio da Petrobras, bolsa do governo da Bahia e Bolsa Pódio, Everton recebia R$ 29 mil mensais. Agora, muitas das apostas de vitória se dirigem aos nomes menos estrelados – uma mistura promissora de juventude e experiência. Com salários de cerca de R$ 6 mil na seleção, soldo do Exército e recursos do Plano Brasil Medalhas, Michel, Roberto e Patrick não têm rendimentos tão altos quanto os de Everton, mas já se permitem sonhar alto. Dividem com Robson uma casa alugada pela CBBoxe em Santo Amaro, na zona sul de São Paulo, perto do CT da seleção, colocam na conta da entidade a refeição feita sempre no mesmo restaurante e guardam o que sobra para ajudar as famílias no Rio. Roberto, pai de uma menina de 6 anos (Rillary, em homenagem à atriz Hilary Swank, protagonista do filme “Menina de Ouro”), quer tirar a mãe da Maré. Foi na gigantesca comunidade da zona norte do Rio que o pai foi assassinado pelos líderes do tráfico depois de uma desavença com a mulher. Aos 15 anos, o sentimento de vingança era extravasado em cada soco dado nos sacos de areia instalados no Parque União, também na Maré, pelo britânico Luke Dowdney, vencedor do Laureus (o Oscar do esporte) em 2007 na categoria “esporte para o bem”. “Eu passava o dia no projeto para não ficar pensando em vingar a morte do meu pai”, conta o “Atleta da Paz” – uma referência à Luta pela Paz, como é chamada a ONG onde aprendeu a lutar. Aos 18 anos, Roberto foi convocado pelo Exército e pretendia aproveitar a oportunidade para obter uma renda e ajudar em casa.

No dia em que deveria se apresentar no pelotão, porém, também precisava lutar em um torneio em São Paulo.

Escolheu o boxe. Perdeu na estreia. Já fazendo sucesso com as meninas, não desistiu. Voltou no ano seguinte, em 2007, e foi campeão. Ganharia de novo em 2008 e 2009, já como atleta da seleção brasileira. Ironia do destino, foi o boxe que o fez chegar ao Exército, como terceiro sargento e atleta de alto rendimento.

Se os primeiros anos foram complicados, morando em uma casa superlotada em Santo André (SP), recebendo “quinhentos e poucos” reais, agora as coisas começam a melhorar. Depois de cinco anos na reserva do veterano Myke Carvalho, Roberto, 26 anos, ganhou nos treinos a vaga de titular na categoria até 69 kg – posição ainda mais consolidada com o ouro no Pan-Americano de Santiago (Chile), em 2013. Com isso, obrigou o paraense a baixar de peso e assumir o posto que era de Esquiva.

Patrick e Michel chegaram à seleção um pouco mais tarde, em 2011. Mais velho, Michel, 23 anos, lembra do amigo “todo remelento” brincando nas vielas do Vidigal.

Desde os 10 anos, o novo titular da categoria até 81 kg da seleção brasileira treina com Raff Giglio, técnico que “descobriu” Esquiva Falcão e que comanda o Instituto Todos na Luta, hoje localizado no alto do morro. Lá, os simpáticos garotos da seleção dão exemplo. “Quando treino no morro, a molecada fica admirada”, diz Patrick, que perdeu o pai aos 3 anos. “Eles veem que eu viajo, participo de competições internacionais, veem que não é impossível, que com o boxe dá para melhorar de vida.”

Aos 21 anos, o jovem tem rendimentos suficientes para que a mãe, que criou outros dois filhos, não precise mais trabalhar como doméstica. Ágil, tem o raro dom de se segurar sem dificuldade na categoria mais leve do boxe amador, de até 49 kg. “Patriquinho” foi sparring de Julião Neto (52 kg) em Londres-2012, ganhou experiência, e já é o número 2 do mundo. “A comunidade reconhece o nosso trabalho, vê que somos boa referência para a molecada”, diz. “Antes o Vidigal era notícia só pelo tráfico, hoje não mais.”

O presidente da CBBoxe, Mauro Silva, diz que o boxe brasileiro era um até 2008 e é outro desde o início de 2009. Não coincidentemente, a data corresponde à chegada do polêmico dirigente paulista ao cargo (confira na página 37). Graças ao apoio da Petrobras, que começou a patrocinar a entidade em 2011 e atualmente injeta R$ 3,2 milhões por ano na modalidade, não faltam recursos. A engrenagem, afinal, começou a rodar. O primeiro título mundial veio em 2010, com David Lourenço, no juvenil. No mesmo ano, Roseli Feitosa sagrou-se campeã no feminino. Everton Lopes ganhou o Mundial de 2011 e David, os Jogos da Juventude. Mas a consagração veio em 2012, com três medalhas nos Jogos de Londres: prata para Esquiva e bronze para Yamaguchi e Adriana Araújo. Os Mundiais dos últimos dois anos ainda renderam prata para Robson Conceição e bronze para Everton Lopes e Clélia Costa. O sentimento geral, agora, é de “se eles podem, por que eu não posso?”, como disseram três boxeadores à reportagem. Os resultados fizeram a Petrobras manter o patrocínio. A CBBoxe trabalha com um orçamento que se aproxima dos R$ 7 milhões para 2015.

O Plano Brasil Medalhas, do governo federal, permitiu a contratação de novos profissionais de preparação física, fisioterapia, nutrição e psicologia. A casa apinhada em Santo André deu lugar a um lar aconchegante em Santo Amaro, onde Robson, Roberto, Michel e Patrick têm um quarto cada um. São sete minutos a pé até o CT. O Campeonato Pan-Americano do ano passado é a prova concreta da evolução. A delegação de nove atletas rendeu oito medalhas ao Brasil (quatro de ouro, uma

boxe

A medalha no Mundial faz de Clélia a única titular incontestável da seleção. A um ano e meio da Olimpíada, a baiana Adriana Araújo é favorita na categoria até 60 kg, mas sabe que qualquer resultado ruim será pretexto para que perca a vaga para a paraense Taynna Cardoso, formada em Jundiaí (SP). Como em outros torneios internacionais existem dez categorias de peso, as seis atletas da seleção foram para o Campeonato Pan-Americano, em setembro de 2014. Todas faturaram medalhas. A partir de agora, porém, a briga por apenas três vagas olímpicas se afunila. Grazieli de Jesus é a reserva de Clélia, enquanto a campineira Flávia Figueiredo e a veterana paulistana Andreia Bandeira travam briga sem favoritas na categoria até 75 kg.

No masculino, a lista mais conservadora de possíveis medalhistas era encabeçada por três nomes quando esta reportagem começou a ser apurada: Everton Lopes, Robson Conceição e Robenilson de Jesus. Desde que os irmãos capixabas Esquiva e Yamaguchi Falcão se profissionalizaram, no fim de 2013, os baianos assumiram a linha de frente do boxe amador brasileiro. Em 18 de dezembro, porém, a promotora Golden Boy comemorou o acerto com o novo menino de ouro: Everton, campeão mundial em 2011 e bronze em 2013.

No comando da seleção brasileira masculina de boxe desde 1996, quando chegou de Cuba, João Carlos Barros, nascido na Guiné Bissau, acompanhava Patrick em uma luta na China quando recebeu, pelo WhatsApp, a foto de Everton assinando contrato em Las Vegas (EUA). “Fiquei chateado, claro”, diz. “Foram recursos, dinheiro, esforços, tudo jogado no lixo.” Afinal, o baiano vinha sendo talhado para virar campeão olímpico. Ele era o exemplo finalizado de que não será por falta de apoio que o boxe deixará de colaborar com a meta brasileira de chegar ao top 10 no quadro de medalhas em 2016. Entre soldo da Marinha, salário da Confederação Brasileira

Para Patrick, o boxe trouxe, além de uma carreira promissora, o reconhecimento. “No morro, a molecada fica admirada”

a confederação de boxe trabalha com um orçamento que se aproxima dos r$ 7 milhões para 2015. o plano brasil medalhas, do governo federal, permitiu a contratação de novos profissionais de preparação física, fisioterapia, nutrição e psicologia

boxe

Michel Borges, também criado no Vidigal, é o novo titular da seleção na categoria até 81 kg

de prata e três de bronze) e o título geral com sobras, deixando Cuba para trás. Como comparação, haviam sido só três medalhas no Pan anterior, em 2010. No Chile, só Juan Nogueira (91 kg) não foi ao pódio, mas saiu de Santiago invicto – foi impedido de lutar, por lesão, depois de vencer na estreia. Na época, Myke Carvalho estava machucado e o paulista Lucas Martins competiu em seu lugar, faturando a prata. As categorias mais pesadas, porém, passam por crise, a ponto de a Associação Internacional de Boxe Amador (Aiba) e o Comitê Olímpico Internacional (COI) proibirem que o país-sede utilize no pesado (até 91 kg) e no superpesado (mais de 91 kg) algum dos seus cinco convites para os Jogos do Rio-2016. Na categoria de cima, Cosme Nascimento foi dispensado e o veterano Rafael Lima, 31 anos, deve voltar à seleção para disputar os eventos pré-olímpicos.

Na época em que o boxe brasileiro vivia literalmente no amadorismo, Rafael era parte de um racha que ninguém fazia questão de disfarçar. De um lado, os paraenses.

De outro, os baianos. Moravam na mesma casa, mas queriam “um arrancar a cabeça do outro” nos treinos, como contam os atletas hoje. Da turma de Belém, restaram outros dois veteranos, que agora convivem em harmonia com baianos, paulistas e cariocas: Myke Carvalho (31 36

istoÉ2016 feVereiro/Março 2015

anos), que vai para sua quarta Olimpíada, e Julião Neto (33 anos). Sem grandes resultados recentes, os dois confiam na experiência no Rio. Os baianos, enquanto isso, vivem fase de protagonismo. Com Robson Conceição fica a maior pressão por resultado. Afinal, aos 26 anos e com o vice-campeonato mundial de 2013 no currículo, o soteropolitano chegou à liderança do ranking mundial da categoria até 60 kg e se tornou astro da World Series of Boxing (WSB), primeira incursão bem-sucedida da Aiba no chamado semiprofissionalismo – o boxeador recebe para lutar, mas não deixa de estar apto a participar de eventos amadores, como os Jogos Olímpicos.

Robenilson vem comendo pelas beiradas. Na seleção desde 2006 (precisou de sete meses de treinos até a primeira convocação), ficou a uma vitória da medalha na categoria até 60 kg nos Jogos de Londres, perdendo do então campeão mundial. Foi à forra de forma surpreendente em novembro passado. Chamado de última hora para lutar contra Javid Chalabiyev, do Azerbaijão, atual campeão do mundo, o baiano não se intimidou. Era segunda-feira e o brasileiro tinha acabado de chegar da Finlândia, onde fizera quatro lutas na categoria acima (60 kg) e vencera um torneio ganhando do campeão europeu.

Na sexta-feira, tinha atingido os 56 kg em Bariloche

assistente De FotograFia: FeLipe gaBrieL/ proDução: cintia sanchez graFFiti: simpLes e ricarDo BranDão

(Argentina), depois de seu voo atrasar 24 horas, e no sábado atropelou Chalabiyev. A luta era válida pela Aiba Pro Boxing (APB), agora a mais importante liga semiprofissional, que paga cerca de US$ 3 mil de cachê para cada atleta. Se conquistar mais uma vitória, Robenilson lutará para ser o primeiro dono de cinturão e o primeiro brasileiro a se garantir na Olimpíada de 2016 sem necessidade de convite.

Everton também teve a chance de lutar pela APB, mas recusou porque o contrato continha uma cláusula que obriga o boxeador a ressarcir a Aiba, caso se profissionalize. Em dezembro, depois de receber R$ 180 mil do Plano Brasil Medalhas apenas em 2014, anunciou sua decisão de abandonar o boxe amador. Como cumpriu o plano esportivo prometido ao governo, não teve que ressarcir o erário. “É uma decisão pessoal, temos que respeitar”, diz Mauro Silva, tentando esconder que ficou contrariado. Todos, afinal, aguardavam a profissionalização depois de 2016, quando é esperada uma debandada. No lugar de Everton na seleção brasileira ficará Joedison Teixeira, o Chocolate, baiano criado em São Paulo, que já vinha lutando com mais regularidade. Campeão pan-americano juvenil em 2012, venceu os Jogos Mundiais de Combate em 2013, na Rússia, o Leszek Drogoz Memorial (Polônia) e o Festival Olímpico (México) no ano passado, quando também se sagrou campeão brasileiro.

Jovem, Chocolate chega à seleção já acostumado às novas regras do boxe amador. Agora não há mais protetor facial e o vencedor de uma luta é aquele que ganhar mais rounds a partir da análise subjetiva dos árbitros – igual ao boxe profissional. Como explica o treinador da seleção, no novo modelo, a técnica perde espaço para a força, na medida em que “tocar” o rosto do adversário, para marcar pontos, deixou de ser relevante. Importante agora são a potência, a velocidade e a precisão do golpe, para impressionar os juízes. Desde a implantação das novas regras, em 2013, o boxe tem visto muitas lutas polêmicas. Na APB, há exemplos de combates em que dois árbitros discordaram sobre o vencedor em todos os cinco rounds. O problema, porém, deve virar solução na Olimpíada.

A torcida e o chamado “fator casa” têm pesado na decisão dos árbitros e podem influenciar a favor do Brasil em 2016. Se a tese será comprovada na prática, ninguém sabe. Mas Roberto, Michel e Patrick já estão pensando em como lotar o Pavilhão 6 do Riocentro com o pessoal da comunidade. Torcida não vai faltar.

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UM POLÊMICO PRESIDENTE AtletAs e treinAdores, sob AnonimAto, criticAm A fAltA de trAnspArênciA do presidente dA cbboxe, mAuro silvA

Ninguém tem coragem de criticar publicamente o presidente da CBBoxe, Mauro silva. Nem de longe, porém, isso significa que atletas e treinadores estejam satisfeitos com o trabalho do dirigente à frente da entidade. Mas, ao barrar uma medalhista olímpica na seleção, em 2013, o cartola deixou claro que a corda vai sempre romper do lado do esportista, seja ele quem for.

Minutos depois de ficar com o bronze olímpico em Londres-2012, Adriana disparou contra Mauro. Disse que “o povo brasileiro precisa saber o que se passa na seleção”, reclamou ter sido humilhada pelo dirigente e afirmou que as críticas dele a fizeram se esforçar mais pela medalha. A resposta foi o corte do time brasileiro, sem explicações plausíveis. À época, tomou-se como verdade que o entrevero fora causado por uma disputa política entre Mauro e o baiano Luiz Dórea, técnico de Adriana. o Ministério do Esporte interveio e, a portas fechadas, exigiu que Adriana fosse reincorporada à seleção, o que aconteceu em 2014. Desde antes da olimpíada, porém, nenhum novo atleta da Federação Baiana chega ao time. Arisson tavares, reserva de Michel, só alcançou a equipe depois de se filiar a sergipe, federação com a qual a CBBoxe tem ótimo trâmite.

A principal crítica de atletas e treinadores (feita sempre na condição de anonimato ou por intermédio de terceiros) é que a seleção não é representada, necessariamente, pelos melhores atletas do País. Não há uma seletiva, de forma que os critérios para a montagem da equipe são altamente subjetivos e nada transparentes. o paraense Rafael Lima alega sofrer perseguição desde 2010. A reportagem o procurou para uma entrevista, mas não foi atendida. É comum que atletas da seleção não participem dos principais eventos do País, ficando de fora inclusive do Campeonato Brasileiro. Assim, os boxeadores preteridos pela CBBoxe não têm sequer a chance de mostrar que são melhores do que os que estão no Ct de santo Amaro.

Por causa disso, sem considerar Rafael silva e Chocolate (ambos chamados agora), só dois líderes do ranking e três campeões nacionais são titulares da seleção. Entre os preteridos, três baianos.

Não são poucos os que deixam a seleção sentindo-se perseguidos, caso de Roseli Feitosa, campeã mundial em 2010. Foi pega no doping em 2013, já cumpriu a pena, mas, ao que tudo indica, não terá outra chance. De fato, um argumento contra Mauro faz pensar. Nos últimos quatro anos, o Brasil teve três campeões mundiais (contando David Lourenço, no juvenil) e três medalhistas olímpicos. só Adriana, por imposição do Ministério do Esporte, está na seleção brasileira.

Para o presidente, quem critica o modelo só está “pensando nele próprio”. o dirigente mostra-se absolutamente contra seletivas e cobra que o atleta que deseja entrar na seleção “vá ao Brasileiro e mostre lá que é bom”. Contrastado com o baixo número de campeões nacionais na seleção, comparou com o futebol: “Uma coisa não tem a ver com outra. senão era só colocar a camisa do Brasil no time do Cruzeiro”. sobre o suposto boicote aos baianos, disse apenas que “não responde o assunto Adriana” e que a crítica era “insana”.

agraDecimentos: nike, caju BrasiL, scaLa, hope, hering, pierre carDin e c&a

natação

por Mariana Queiroz BarBoza fotos eMiliano capozoli

Luz própria

recordista mundial em piscina curta e sul-americana em piscina longa, a pernambucana etiene medeiros tem tudo para tirar a modalidade da sombra dos homens

A nadadora em São Paulo, pouco depois de conquistar o ouro no Mundial de piscina curta, no fim de 2014

istoร 2016 fevereiro/MArรงo 2015

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Décimo quinto.

Esse foi o melhor resultado da natação feminina do Brasil na Olimpíada de Londres, em 2012, quando Joanna Maranhão encerrou os Jogos como semifinalista nos 200 m Medley. Na mala de volta da equipe com apenas quatro mulheres, nenhuma medalha dividia espaço com a frustração. “a natação feminina vinha regredindo em vez de evoluir”, diz Fernando Vanzella, coordenador técnico da atual seleção. a trajetória era de fato descendente. Se em atenas-2004 o grupo teve um resultado histórico e chegou a três finais, em pequim-2008 elas alcançaram apenas uma final. Quatro anos depois, a equipe chegaria ao fundo do poço com a 15ª colocação.

Enquanto isso, os homens continuavam dando bons resultados: Thiago pereira, com uma prata nos 400 m Medley, e Cesar Cielo, com um bronze nos 50 m livre.

Segundo Vanzella, a natação feminina “vivia na sombra da masculina.” Era hora de brilhar sozinha. a solução encontrada pela Confederação Brasileira de Desportos aquáticos (CBDa) foi dividir as duas seleções. O técnico alberto Silva ficou com a masculina e Fernando Vanzella tornou-se o coordenador da equipe feminina com o objetivo de identificar os problemas e melhorar a qualidade dos treinamentos. Ele criou uma equipe multidisciplinar, com psicóloga e médica ginecologista de plantão, e colocou como parte do planejamento viagens internacionais para clínicas, treinamentos de altitude e visitas a países onde a natação feminina é mais avançada, como a Holanda. Em dois anos, começaram a aparecer os resultados. O mais impressionante deles superou, pela primeira vez, um feito só conseguido por Maria Lenk nos 200 m peito, em 1939. No fim de 2014, a pernambucana Etiene Medeiros, de 23 anos, quebrou um recorde mundial e conseguiu o ouro nos 50 m costas no Campeonato Mundial de piscina Curta, em Doha, no Catar. “Fiquei realmente surpresa com o recorde”, diz Etiene. “Queria uma medalha, lógico, mas, às vezes, a gente treina tanto, batalha tanto, que perde a noção do que é capaz.” Ela nunca tinha alcançado o tempo de 25s67, nem durante os treinos no Sesi Vila Leopoldina, na zona oeste de São paulo.

Em Doha, somados os desempenhos femininos e masculinos, o Brasil obteve a primeira colocação no quadro geral de medalhas. antes de cada competição, a equipe era embalada pelo grito de guerra: “1, 2, 3, vai, Brasil, 1, 2, 3, vai, Brasil, 1, 2, 3, vai, Brasil”, puxado por João de Lucca, que treina nos Estados unidos, e Fernando Ernesto, do Corinthians. a disputa, no entanto, ocorreu em piscina curta, com 25 metros (metade da configuração olímpica), que tem menos prestígio que a piscina longa. “Nem sempre um atleta que vai bem numa, vai bem na outra”, afirma

Vanzella. “Na piscina curta, é preciso ter um fundamento de virada muito bom em nado submerso. Na longa, tem que ter o nado mais aprimorado.” Como o técnico avalia que Etiene vai bem nas duas e já tem bons fundamentos de saída e virada, o plano agora é intensificar o nado livre. para isso, ela treina na piscina nove vezes de segunda a sábado e faz cinco dias de preparação física por semana, com a cabeça em sua primeira Olimpíada, em 2016, no rio de Janeiro.

“Hoje sou a melhor nadadora nos 50 m livre, 50 m costas, 100 m borboleta e 100 m costas”, diz Etiene.

“Tenho um leque de provas para tentar um índice para o rio. Espero alcançar pelo menos um.” Duas semanas depois de Doha, Etiene caiu na piscina longa para o último torneio do ano. Nos 50 m costas e nos 50 m livre, estabeleceu dois novos recordes sul-americanos com 27s37 e 24s74, respectivamente, no Open de Natação, disputado no rio de Janeiro. assim, ela já tem índice para o Mundial de Kazan, na rússia, em julho, também disputado em piscina longa.

Durante a sessão de fotos e a entrevista para a 2016, Etiene tinha a companhia de um “roadie”, como ela gosta de brincar com o irmão, numa referência aos assistentes de palco dos rockstars. Jamison (pronuncia-se Jãmison, não Jeimison) busca toalha, se oferece para comprar remédio e fotografa os bastidores com uma câmera Gopro.

“Não fui fazer a unha nem nada”, diz a atleta. “Só tenho tido tempo para dormir.” O irmão de 25 anos costuma se revezar com os pais aposentados, também chamados Jamison e Etiene, nos cuidados da irmã. a família vive no bairro de imbiribeira, próximo à praia de Boa Viagem, em recife, mas a nadadora, que saiu de casa em 2011 e mora em São paulo há dois anos, quase nunca está sozinha.

“Não ligo de fazer as coisas para ela. Sou a estrutura por trás. Enquanto ela está aqui treinando, vou ao banco, à lavanderia”, diz o irmão. “Se minha mãe estivesse aqui, faria o mesmo. Somos muito unidos.”

Quando criança, Jamison também fazia aulas de natação para acompanhar a irmã, que, numa trajetória comum aos nadadores, começou no esporte por recomendação médica. Vivia no hospital por causa da asma. De uma escolinha no bairro, os dois foram para o Sport Club recife e passaram a se destacar.

Com 17 anos, aflito com o vestibular, Jamison escolheu abandonar a natação, mas não as águas.

Bacharel em ciências náuticas, agora ele trabalha num regime em que fica 28 dias embarcado como Oficial da Marinha Mercante e outros 28 em casa – ou na casa da irmã. ainda que Etiene seja a primeira atleta profissional da família, o esporte sempre foi levado a sério pelos Medeiros. “Meu pai não é militar, mas tem jeito de militar”, afirma Jamison. “Lá em casa não tinha aquela desculpa do tipo ‘eu não vou

“hoje sou a melhor nadadora nos 50 m livre, 50 m costas, 100 m borboleta e 100 m costas”, diz etiene, que busca obter logo os índices para disputar a olimpíada de 2016

treinar hoje porque tenho que estudar’. Tinha que dar um jeito de conciliar os dois.” a rigidez do pai contrastava com a tranquilidade de Etiene na piscina. apresentando bons resultados, ela chegou à seleção em 2008, com apenas 17 anos. No ano seguinte, participou do Mundial de roma. “Foi quando vi que era isso mesmo que queria fazer da vida”, diz. Os treinos seguiram intensos até que, em Barcelona, em 2013, ela ficou em quarto nos 50 m costas. Essa é a melhor marca da história da natação feminina brasileira em mundiais de piscina longa. Diferentemente do que ocorre com os velocistas homens, que criaram tradição na natação brasileira com Gustavo Borges, Fernando Scherer, Cesar Cielo e, mais recentemente, Matheus Santana, as mulheres ainda dão as primeiras braçadas na elite. uma das razões para essa defasagem, diz a nadadora, é estética. Nem todas as meninas estão dispostas a transformar o corpo em nome do esporte. “Vi muitas colegas desistirem quando viram o ombro ficar mais largo”, diz Etiene. “Existem várias garotas lindas que são grandes, mas elas realmente têm um sonho. E quando se tem um sonho, isso aí é o de menos.” para Fernando Vanzella, essa preocupação perdeu espaço com uma istoÉ2016 fevereiro/MArço 2015

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Na página ao lado, etiene treina na piscina do Sesi-SP. A atleta é fã de redes sociais e faz sucesso no instagram, onde posta desde fotos da infância até imagens de momentos de lazer ao lado do namorado (à direita)

nova tendência. “Hoje, a natação exige que o músculo seja mais funcional do que grande”, afirma. “as japonesas, por exemplo, são pequenas e nadam bem.”

Etiene garante que nunca ligou muito para isso. ao longo do ciclo de 2014, o acompanhamento mensal de uma nutricionista baixou seu índice de gordura corporal de 18% para 10%, excelente para uma velocista, e a fez ganhar dois quilos de massa magra. Formada em gastronomia, Etiene se especializou na preparação de pratos light, baseados em carboidratos típicos da culinária nordestina, como macaxeira e inhame.

Ela perdeu peso e aumentou a força e a resistência. para a natação feminina chegar ao mesmo patamar da masculina, técnico e atleta concordam: falta visibilidade. “Nosso país sempre teve representantes masculinos e isso fez com que o nível se elevasse.

No feminino, era uma expoente aqui, outra ali, não chegavam às medalhas”, diz Vanzella. “a Etiene mostra que isso pode mudar.” No mesmo grupo de 20 nadadores do Sesi, subdivididos entre velocistas, meio-fundistas e fundistas, outras atletas se destacam. Daynara de paula foi para Londres e pequim.

Jéssica Cavalheiro foi medalhista nos Jogos pan-americanos de Guadalajara, em 2011, e ana Marcela Cunha está no topo das maratonas aquáticas.

O caminho até o alto rendimento reservou a Etiene uma ironia que nem seu pai, quando exigia dela a

máxima dedicação ao esporte, poderia ter imaginado. Hoje, ao lado de 230 atletas, ela representa a Marinha brasileira. No ano passado, depois de ser convidada pelas Forças armadas, a pernambucana completou um curso básico de formação militar, com ensinamentos sobre disciplina e uso do uniforme, e se tornou terceiro sargento. Dentro do programa Olímpico da Marinha, ela tem direito a salário de r$ 2.700 e benefícios como assistência médica e acesso à infraestrutura militar. “Quando o país decidiu sediar grandes eventos esportivos, como a Olimpíada, os Jogos Mundiais Militares funcionaram como primeiro evento-teste”, diz o Comandante Francisco José Marques peixoto. “Como antes as competições eram distantes do Brasil, nosso foco não era na área esportiva e o desempenho era sofrível. por isso passamos a convocar atletas de elite.” O programa foi impulsionado pelo primeiro lugar, inédito, conquistado nos Jogos Militares do rio, em 2011 – na edição anterior, em Hyderabad, na Índia, o Brasil havia terminado na 33ª posição. No total, foram 114 medalhas, numa competição que envolveu grandes potências olímpicas, como China e Estados unidos. Nos próximos jogos, que acontecem em outubro, na Coreia do Sul, Etiene deverá representar o país. Será mais uma chance de mostrar ao mundo que o que reluz no futuro da natação feminina é ouro.

HiStóriA receNte

os principais resultados da natação feminina brasileira nos últimos dez anos

ouro nos 50 m costas no munDial De Piscina curta De Doha, em 2014 etiene meDeiros tempo: 25s67

4º lugAr NoS 50 M coStAS No MuNdiAl Aquático de BArceloNA, eM 2013 ETiENE MEDEirOS tempo: 27s83 PrAtA NoS 400 M Medley NoS JogoS PAN-AMericANoS de guAdAlAJArA, eM 2011 JOaNNa MaraNHãO tempo: 4m46s33 PrAtA NoS 100 M BorBoletA NoS JogoS PAN-AMericANoS de guAdAlAJArA, eM 2011 DayNara DE pauLa tempo: 59s30 PrAtA NoS 50 M livre NoS JogoS PAN-AMericANoS de guAdAlAJArA, eM 2011 GraCiELE HErrMaNN tempo: 25s28 BroNze NoS 200 M Medley NoS JogoS PAN-AMericANoS de guAdAlAJArA, eM 2011 JOaNNa MaraNHãO tempo: 2m15s08 5º lugAr NoS 100 M BorBoletA No MuNdiAl Aquático de roMA, eM 2009 GaBriELLa SiLVa tempo: 56s94 PrAtA NoS 100 M coStAS NoS JogoS PAN-AMericANoS do rio de JANeiro, eM 2007 FaBÍOLa MOLiNa tempo: 1m02s18 PrAtA NoS 100 M livre NoS JogoS PAN-AMericANoS do rio de JANeiro, eM 2007 FLaVia DELarOLi tempo: 55s84 BroNze NoS 50 M livre NoS JogoS PAN-AMericANoS do rio de JANeiro, eM 2007 FLaVia DELarOLi tempo: 25s52 BroNze NoS 200 M livre NoS JogoS PAN-AMericANoS do rio de JANeiro, eM 2007 MONiQuE FErrEira tempo: 2m01s38 BroNze NoS 100 M BorBoletA NoS JogoS PAN-AMericANoS do rio de JANeiro, eM 2007 GaBriELLE SiLVa tempo: 1m00s50 BroNze NoS 200 M BorBoletA NoS JogoS PAN-AMericANoS do rio de JANeiro, eM 2007 DaiENE DiaS tempo: 2m13s35 5º lugAr NoS 400 M Medley NA oliMPíAdA de AteNAS, eM 2004 JOaNNa MaraNHãO tempo: 4m40s00

istoÉ2016 fevereiro/MArço 2015

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atletas do vasco da Gama durante o Campeonato Brasileiro de remo de 1960, na Lagoa rodrigo de freitas (abaixo).

Na página ao lado, o gol uruguaio que acabou com o sonho do Brasil de conquistar a Copa do mundo em casa, em 1950. Nunca o maracanã ficou tão silencioso quanto naquele dia

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istoÉ2016 fevereiro/março 2015

Tradição carioca história

pOR Flávia RibeiRo

O papel crucial do esporte na formação do Rio de Janeiro, que completa 450 anos enquanto se prepara para sediar o maior evento de sua história NeNhuma cidade brasileira tem uma ligação tão antiga com o esporte quanto o rio de Janeiro. a cidade, que completa 450 anos no próximo dia primeiro de março, descobriu essa vocação a partir do século XiX, com a vinda da Família real para o Brasil. dom Pedro ii era um entusiasta de atividades físicas, mas foi duque caxias quem fundou o clube de corridas do rio, em 1847, inaugurando assim o turfe em terras brasileiras. Somente em 1911, entretanto, os primeiros clubes hípicos foram oficializados no País: a Hípica Paulista (SP) e o clube Esportivo de Equitação do rio. No início do século XX, a relação do carioca com o esporte sofreria uma mudança brusca, que acompanhou a passagem do império para a nascente república. “Nesse momento, o Barão de coubertin tinha recuperado a ideia de olimpíada na Europa e, com isso, mudou a lógica da modernidade”, diz o historiador antônio Edmilson Martins rodrigues, professor da PUc-rio e da Uerj.

“Logo depois, houve a reforma urbana de Pereira Passos no rio e cada vez mais foi se criando uma nova forma de estar e andar na cidade.” Segundo rodrigues, a proximidade com a praia, a floresta e a lagoa criaram, desde o início, uma cultura do esporte ao ar livre na capital fluminense. até meados do século XX, atividades esportivas não eram muito bem vistas entre membros da elite. Expor os músculos, afinal, era coisa de homens que sobreviviam de trabalhos braçais, como estivadores e lavradores. Fora os escravos. Para esses, havia a capoeira, prática que nos últimos dois séculos passou de modalidade de luta dos oprimidos a esporte de crianças e adultos de todas as classes sociais. “Não se pratica a ginástica do corpo. a do sentimento basta. Nesse particular, ninguém supera o jovem desse tempo”, escreveu o historiador Luiz Edmundo, revelando o perfil da juventude carioca da década de 40 do século passado. “Tipos como o do atleta José Floriano Peixoto, são olhados, por todos, com espanto”.

história

Zeca Peixoto, como ficou conhecido, era filho caçula do Marechal Floriano Peixoto, presidente do Brasil de 1891 a 1894. Fugiu do colégio Militar no rio aos 15 anos para se juntar a um circo e tornou-se um dos maiores nomes do esporte brasileiro das duas primeiras décadas do século XX, praticante de modalidades como boxe, tiro esportivo, remo, natação, futebol, ginástica acrobática, halterofilismo e luta greco-romana. Zeca chegou a excursionar pela Europa com o grupo de Paul Pons, francês conhecido como colosso, primeiro campeão mundial de luta greco-romana da história. Entre 1904 e 1909, Pons esteve pelo menos três vezes no rio de Janeiro, promovendo campeonatos e apresentações que só colaboraram para aumentar o sucesso do halterofilismo no século que nascia. Em 1906, aconteceram as primeiras competições de levantamento de peso na cidade.

Uma nova mentalidade surgia, apontando para maiores cuidados com a saúde, a higiene e o físico. o resultado foi a enorme diversificação dos esportes, até então concentrados no hipismo, no tiro e no remo, modalidade de enorme sucesso naquela virada de século. “rema, rema, rema remador, quero ver depressa o meu amor”, cantava Emilinha Borba no carnaval de 1964.

Pois já se remava por esporte no rio de Janeiro havia pelo menos 113 anos. Foi em 1851 que se disputou a primeira regata de que se tem registro no Brasil, na Enseada de Botafogo. Naquele ano, foi fundado o Grupo dos Mareantes, em Niterói. de lá até 1897, quando nasceu a União de regatas Fluminense, outros 26 clubes surgiram. Entre eles, o club de regatas Botafogo (1894), o club de regatas Flamengo (1895) e o club de regatas Vasco da Gama (1898). No alvorecer do século XX, nenhum esporte tinha mais prestígio. as primeiras competições organizadas no rio de Janeiro foram de remo, hipismo, halterofilismo, lutas, tênis, críquete e tiro esportivo – que, por sinal, rendeu as três primeiras medalhas olímpicas do País, em 1920, na antuérpia, com um ouro de Guilherme Paraense, uma prata de afrânio da costa e um bronze por equipes.

Em 1912, o primeiro torneio de basquete aconteceu num ginásio no centro. Em 1938, foi fundada a primeira liga de vôlei do Estado. Mas, àquela altura, o esporte que já havia conquistado corações e mentes dos brasileiros era o mesmo o futebol. ao contrário do senso comum, há indícios de que tudo começou no rio de Janeiro, 20 anos antes de charles Miller voltar para São Paulo, após uma temporada na inglaterra, com bolas, uniformes, chuteiras e um livro de regras na bagagem.

Em 1874, em plena praia da Glória, um grupo de marinheiros ingleses fez uma partida de apresentação para a Princesa isabel. Seis anos depois, no colégio Paixão, 46

istoÉ2016 fevereiro/março 2015

o operário francisco Carregal (com a bola) posa com o time do Bangu. equipe foi uma das primeiras a aceitar negros no plantel, em 1905. No alto, o imperador Dom Pedro ii, grande incentivador do esporte brasileiro

em Petrópolis, os alunos teriam começado a praticar o esporte, seguidos, no ano seguinte, pelos jovens do colégio anchieta, em Nova Friburgo. Em 1894, se jogava bola em Bangu, com incentivo de um escocês. desde meados do século XiX já havia clubes esportivos na cidade, sempre criados por estrangeiros. o Paysandu cricket club e o rio cricket and athletic association, por exemplo, foram fundados em 1872. Na virada do século, o futebol já fazia parte do cotidiano dessas associações, tanto que a primeira partida oficial disputada no rio aconteceu em 1901, na sede do rio cricket. Esses dois clubes, juntamente com Fluminense Football club, Football athletic club, américa Football club, Bangu atlético club, Botafogo Football club (atual Botafogo de Futebol e regatas) e Sport club Petrópolis fundaram, em 1905, a Liga Metropolitana de Futebol. ao longo das três primeiras décadas do século, a evolução do futebol no rio foi acompanhada pela luta de homens negros e de classes operárias por um lugar ao sol. a escravidão havia acabado em 1889, mas a

Zeca Peixoto, filho do presidente floriano Peixoto, foi um multiatleta que mudou a cara do esporte carioca no início do século XX

segregação permanecia forte em todos os setores da sociedade. Um dos primeiros clubes a aceitar negros em seu time foi o Bangu, em 1905. Mais importante: aceitava negros pobres e operários. “o que distinguia o Bangu do Botafogo, do Fluminense, era o operário. o Bangu, clube de fábrica, botava os operários no time em pé de igualdade com os mestres ingleses. o Botafogo e o Fluminense, não, nem brincando, só gente fina”, escreveu jornalista Mario Filho em seu livro o negro no futebol brasileiro, de 1947. o investimento no esporte ainda era algo bastante raro. Emm 1924, apenas atletismo, remo e tiro foram para a olimpíada de Paris, e sem atletas cariocas, já que uma campanha do jornal o Estado de São Paulo é que permitiu que algum dinheiro fosse captado para enviar os representantes nacionais. Em 1928, o País nem sequer mandou delegação a amsterdã. das copas do Mundo, por outro lado, o País nunca ficou de fora. Esteve em todas desde a primeira, no Uruguai, em 1930, quando um racha entre federações do rio e de São Paulo fez com que a seleção brasileira fosse formada exclusivamente por atletas que jogavam em clubes do rio, com representantes de Flamengo, Fluminense, Botafogo, Vasco, américa, São cristóvão, americano (de campos) e Ypiranga (de Niterói). Em 1950, o Brasil foi sede de uma copa do Mundo pela primeira vez, com a final no rio. o Maracanã foi construído no local onde funcionava o derby club do rio de Janeiro, fundado em 1885. com isso, a cidade se expandiu de forma mais efetiva para além da Praça da Bandeira, povoando ainda mais a confluência de Tijuca, isabel e andaraí. E o rio se fortaleceu como referência futebolística Foi também a época em que o carioca passou a frequentar mais a praia, espaço de moda, lazer e esporte.

Já se jogava futebol de areia pelo menos desde os anos 1930, mas a partir de meados da década de 1940 as modalidades praianas se popularizaram. o frescobol foi inventado em 1945, em frente ao hotel copacabana Palace. o surfe chegou ao arpoador também nos anos 1940. Nos anos 1950, foi a vez do vôlei de praia começar a ocupar espaço nas areias da cidade. de lá para cá, a prática de atividades físicas ao ar livre só cresceu. o carioca se alonga, corre e pedala na rua, nada no mar, rema na Lagoa rodrigo de Freitas, surfa e ocupa as praias com esportes individuais e coletivos. Nos últimos anos, com a escolha do rio para sede dos Jogos olímpicos de 2016, a cidade se encontra, novamente, em plena transformação e ebulição. desta vez, em função do esporte.

2015: 2015:

o ano decisivo

O ANO DECISIVO PARA para preparação

por marcel gugoni

2016 2016

Campeonatos mundiais, Jogos pan-Americanos, eventos-teste, entrega das obras olímpicas e finalização de patrocínios: é muito a fazer em pouco tempo. Está na hora do sprint para a olimpíada do rio O esfOrçO decisivO. O sprint final. a dOr excruciante que será recOmpensada pela medalha de OurO. É assim que atletas, treinadores, organizadores

e demais envolvidos com os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos do Rio de Janeiro encaram o ano de 2015. Na preparação para que tudo esteja pronto e perfeito no dia 5 de agosto de 2016, data de abertura dos Jogos, este novo ciclo do calendário tem peso dobrado. “É o que eu sinto para 2015: um Panamericano com uma estratégia diferente para cada modalidade, campeonatos mundiais e eventos-teste acontecendo, todos pensando na Olimpíada”, afirma Marcus Vinícius Freire, diretor executivo de esportes do Comitê Olímpico Brasileiro (COB). Para o dirigente, um dos maiores responsáveis pelo projeto que busca trazer o maior número de medalhas da história do País, 2015 é o ano para definir boa parte da delegação brasileira que vai aos Jogos.

Os resultados esportivos são apenas parte da história.

A maior medida de sucesso do Brasil estará na capacidade (ou não) de organizar os Jogos. Para isso, os chamados eventos-teste são cruciais. E eles já começaram. Em agosto do ano passado, a Regata Internacional de Vela, realizada na Marina da Glória, uma das instalações que fazem parte do complexo de Copacabana, foi colocada à prova. Velejadores de dez categorias se reuniram durante sete dias para avaliar o local em condições meteorológicas semelhantes às do período dos Jogos de 2016. Em agosto de 2015, uma vez mais, as embarcações vão para as águas de Copacabana, pelo Aquece Rio, marca oficial dos eventos de preparação. “Temos programados 45 eventos-teste, 23 sob responsabilidade direta da marca Aquece Rio”, diz Agberto Guimarães, diretor-executivo de esportes do Comitê Rio 2016. “Ainda faltam 44 até agosto de 2016.”

Convenhamos, é uma enormidade.

Com o calendário praticamente fechado para o ano inteiro, a pergunta que Guimarães e seus pares buscam responder é: o Rio está preparado para realizar todas as provas ao mesmo tempo?” Os “Jogos-para-valer” concentram em 16 dias 41 competições praticamente simultâneas nas 4 grandes regiões olímpicas, onde estão sendo montados os estádios, as arenas e o parque olímpico. Ele garante que sim. Um sistema de monitoramento ajuda a sincronizar tantas demandas diferentes. A área de Guimarães é responsável, entre outras funções, por garantir que cada arena esportiva e local de treino siga as recomendações negociadas com as respectivas confederações esportivas nacionais e internacionais. “No judô e no vôlei, a quadra e o dojo têm sua rede e seu tapete em tamanho específico”, exemplifica. As marcas aprovadas, as quantidades necessárias para as competições e o número de equipamentos para treino são discutidos individualmente.

Os eventos-teste colocam todo esse esforço em conjunto. “É quando simulamos situações para saber como funcionários e voluntários lidam com o inesperado”, explica Guimarães. “Se eu atrasar cinco minutos para encerrar um evento, tenho que manter todas as áreas avisadas, porque isso tem impacto no transporte, na segurança, na logística e em outros eventos.” A programação para 2015 inclui ainda a participação de observadores e equipes multidisciplinares do comitê organizador nos campeonatos mundiais de cada categoria e em outros grandes torneios, como os Jogos Pan-Americanos de Toronto (Canadá), os Jogos Militares de Mungyeong (Coreia do Sul) e a Universíade de Gwangju (Coreia do Sul). A agenda está cheia para os organizadores.

Para os atletas, a hora de pegar pesado também é agora.

“Os anos mais importantes da preparação para o atual

ciclo olímpico são, justamente, 2014 e 2015”, diz Antonio Carlos Gomes, superintendente de alto rendimento da Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt) e diretor da Academia Brasileira de Treinadores, órgão do COB para formar técnicos e preparadores. É neste momento, diz ele, que o atleta vai “mostrar a cara do que vai fazer em 2016”. Os campeonatos mundiais de 2015 reunirão os atletas de alto rendimento das modalidades olímpicas que buscam índices para competir nos Jogos. O pódio e as medalhas nessas competições serão o aspecto mais visível da carga pesada de treino e preparação a que todos se submeteram nos anos anteriores. É uma questão de estratégia. “A periodização de treinamento, hoje, é uma ciência que levamos muito a sério”, diz Freire, do COB. O calendário esportivo anual de cada modalidade ganha mais competições mundiais e locais, e isso torna o trabalho de especialistas como Gomes mais parecido com um jogo de xadrez. É ele quem prioriza as competições para os representantes do atletismo, cuja prioridade, ao contrário do que possa parecer, é o campeonato mundial, em Pequim (China), e não os Jogos Pan-Americanos.

Tudo depende do objetivo principal. Para quem busca Olimpíada, competições locais e regionais são secundárias. A meta do Brasil para os Jogos de 2016 é terminar entre os dez maiores medalhistas no quadro geral. Em Londres, o País conquistou 17 medalhas. No Rio, precisará obter pelo menos 8 a mais, num total de 13 modalidades. “Teremos que fazer um pouco de milagre”, diz Gomes, reconhecendo o desafio que tem pela frente.

A maior parte das medalhas que faltam está nos esportes individuais, nosso calcanhar de Aquiles. No atletismo, com algo perto de 140 medalhas em jogo, o Brasil não levou nenhuma em 2012. No esporte paraolímpico, o ano de 2015 também será de trabalho frenético. Ou, como diz Andrew Parsons, presidente do Comitê Paraolímpico Brasileiro (CPB), de “preparação extensiva”. A maior

2015:

O ANO DECISIVO PARA

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os CAmpEonAtos mundiAis dE 2015 rEunirão os AtlEtAs dE Alto rEndimEnto dAs modAlidAdEs olímpiCAs quE busCAm índiCEs pArA CompEtir nos Jogos. AgorA, A EstrAtégiA é dignA dE um Jogo dE xAdrEz

julho

ProvaS De foGo em 2015 mês a mês, os principais campeonatos internacionais que serão decisivos para os Jogos olímpicos do rio

janeiro Handebol: Campeonato mundial masculino _Doha (Catar)__15/1 a 1/2

fevereiro Ciclismo: Campeonato mundial de Pista _Saint-Quentin-en-Yvelines (frança)__ 18 a 22

março Sem atividades

abril Tênis de mesa: Campeonato mundial _Suzhou (China)__ 26/4 a 3/5

maio Multimodalidade: 60 Jogos mundiais militares do Conselho internacional do Desporto militar _mungyeong (Coreia do Sul) __29/5 a 5/6

Multimodalidade: Universíade _ Gwangju (Coreia do Sul) __3 a 14 Multimodalidade: Jogos Pan-americanos _Toronto (Canadá) __10 a 26 Esgrima: Campeonato mundial _moscou (rússia) __13 a 19 Ciclismo: Campeonato mundial BmX _ Heusden-Zolder (Bélgica) __21 a 25 Maratonas Aquáticas: Campeonato mundial _Kazan (rússia) __ 25/7 a 1º/8 Nado Sincronizado Campeonato mundial _Kazan (rússia) __25/7 a 1º/8 Saltos Ornamentais: Campeonato mundial _Kazan (rússia) __25/7 a 2/8 Polo Aquático: Campeonato mundial _ Kazan (rússia) __26/7 a 8/8 Tiro com Arco: Campeonato mundial _ Copenhagen (Dinamarca) __26/7 a 2/8

agosTo Multimodalidade: Jogos Parapanamericanos _Toronto (Canadá) __7 a 15 Natação: Campeonato mundial _Kazan (rússia) __2 a 9 Badminton: Campeonato mundial _ Jacarta (indonésia) __10 a 16 Canoagem: Campeonato mundial Sprint _milão (itália) __19 a 23 Atletismo: Campeonato mundial _ Pequim (China) __22 a 30 Judô: Campeonato mundial _astana (Cazaquistão) __25 a 30 Remo: Campeonato mundial _ aiguebelette (frança) __30/8 a 6/9 Ciclismo: Campeonato mundial mTB _ andorra (espanha) __31/8 a 6/9

seTembro junho Futebol: Copa do mundo feminina _ Canadá __6/6 a 6/7 Vôlei de Praia: Campeonato mundial _Holanda__ 26/6 a 5/7 Pentatlo Moderno: Campeonato mundial adulto _Berlim (alemanha) __ 28/6 a 6/7 Vela: Campeonato mundial de Laser e Laser radial_Kingston (Jamaica) __ 29/6 a 8/7 _Campeonato mundial de Nacra 17 aarhus (Dinamarca) - 29/6 a 5/7

Vela: Campeonato mundial de 470 - Tel aviv (israel) - 5 a 13 Ginástica Rítmica: Campeonato mundial - Stuttgart (alemanha) - 7 a 13 Luta Olímpica: Campeonato mundial Las vegas (eUa) - 7 a 13 Tiro Esportivo: Campeonato mundial Prato - Lonato (itália) - 9 a 18 Tae kwon do: Campeonato mundial Chelyabinsk (rússia) - 16 a 23 Canoagem: Campeonato mundial Slalom - Londres (reino Unido) - 16 a 20 Ciclismo: Campeonato mundial estrada - richmond (eUa) - 19 a 27

ouTubro Boxe: Campeonato mundial masculino da aiBa - Doha (Catar) - 5 a 18 Vela: Campeonato mundial de rSX _al musay (omã) - 17 a 24 Ginástica Artística: Campeonato mundial - Glasgow (escócia) __24/10 a 2/11

novembro Vela: Campeonato mundial de 49er e 49er fX - Buenos aires (argentina) - 17 a 22 Campeonato Mundial de Finn Wellington (Nova Zelândia) - 20 a 30 Levantamento de Peso: 2015 Campeonato mundial - Houston (eUa) 20 a 29 Ginástica de Trampolim: Campeonato mundial - odense (Dinamarca) - 25 a 28

deZembro Handebol: Campeonato mundial feminino_Copenhagen (Dinamarca) __6 a 21

parte dos campeonatos mundiais paraolímpicos ocorreu no ano passado, mas em 2015 há duas provas importantes no calendário – justamente dos dois esportes mais trazem medalhas para o Brasil: atletismo e natação. O Parapanamericano é prioridade para todas as demais neste ano. “É um teste de altíssimo nível”, diz Parsons.

O mesmo sprint é visto nas quatro grandes áreas que recebem obras olímpicas. Nesses locais, a corrida é para deixar tudo pronto no prazo. Sob um sol escaldante do fim de dezembro, o prefeito da cidade do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, apresentou o balanço de 2014 com uma visita ao canteiro do Parque Olímpico da Barra da Tijuca, na zona oeste. Segundo ele, a meta é inaugurar dois locais por mês a partir de agosto de 2015. “Estamos num caminho bom para fazer as entregas todas dentro do prazo”, disse. “Obviamente isso não significa que estejamos

Após A sétimA visitA às obrAs E dEpois dE sEvErAs CrítiCAs, o Coi pArECE EstAr sAtisfEito Com o AndAr dA CArruAgEm no rio. o momEnto, no EntAnto, não é pArA rElAxAr nEm dEsACElErAr tranquilos e relaxados.” Entre todas as construções, ele reconheceu apenas um atraso de três semanas nas obras do velódromo, também na Barra.

Em abril de 2014, o Comitê Olímpico Internacional (COI) reclamava dos atrasos, ecoando as críticas da Associação de Federações Olímpicas Internacionais. Em agosto, o Comitê Rio-2016 havia informado a conclusão de 24% das obras. Guimarães minimizou o caso. “A razão para a demora é que trabalhamos desde a fundação da obra”, disse. “Na Barra, por exemplo, elas demoraram para ficar prontas.” Agora é hora de “montar os pré-moldados como um bloco de Lego”, diz o executivo do Rio-2016. Essa parte é, de fato, mais veloz. Mas o prazo é curto. As confederações internacionais e o próprio COI já demonstram mais confiança ao ver as paredes subindo. Em outubro passado, o COI encerrou a sua sétima visita ao Rio e se mostrou, ao menos publicamente, otimista e satisfeito. A presidente da comissão de coordenação que visitou a cidade, a ex-atleta marroquina Nawal El Moutawakel, disse que “apesar do prazo bastante apertado, a comissão olímpica brasileira vai

entregar com sucesso os Jogos”. Para isso, o COI e as confederações ficarão de olho nos eventos-teste, que, um a um, colocarão as arenas à prova.

Já as cotas de patrocínio estão praticamente cruzando a linha de chegada, embora ainda haja oportunidades pelo caminho. Os organizadores divulgaram um faturamento acima do esperado, num total de R$ 2,6 bilhões em patrocínios locais até o fim de 2014. São 19 cotas para diferentes empresas de variados setores – Sadia, Batavo, Bradesco, Claro, Embratel e Nissan estão entre os parceiros. Mas algumas gigantes ainda estão de fora, como empresas de combustíveis e companhias aéreas. Ainda é possível ver esses contratos firmados? Em 2015, sim, mas nada que chegue perto das cotas de quem já está nos Jogos. O COI também tem seus chamados parceiros mundiais, com quem mantêm não só aportes financeiros como investimentos para fornecimento de equipamentos e outros produtos para os Jogos. A Coca-Cola, a mais antiga parceira do COI, supre bebidas a todos os locais olímpicos.

O que não falta, ainda, é oportunidade para mostrar a marca e, ao mesmo tempo, apoiar um atleta. “A Olimpíada, no patrocínio direto ao atleta, é normalmente a parte mais vazia”, afirma Márcio Flores, diretor executivo do Grupo M, empresa de marketing esportivo. Neste ano, ainda é possível investir em nomes que podem estar no Rio em 2016. Segundo Flores, as empresas não devem olhar o esporte olímpico com a mesma lente de cifras milionárias do futebol. “Na Olimpíada, desenvolver um atleta e deixar um legado no esporte é mais importante do que ganhar dinheiro rápido no curto prazo”, diz. Segundo ele, há patrocínios a atletas que podem começar em R$ 1.000 por mês, para permitir a sequência e o foco nos treinos, e chegar a R$ 600 mil ao ano para times de elite.

Ainda assim, essa verba representa uma fatia mínima do valor de uma cota nos Jogos. Acessível, portanto, ao marketing de médias empresas.

E se as ativações com a marca olímpica são defendidas com unhas e dentes pelo COI, há muito espaço para outras ações de companhias que não são patrocinadoras oficiais do evento. Os chamados hospitalities são só uma dessas possibilidades. Em Londres, empresas levaram parte do público a museus, pagaram a viagem de famílias para ver os Jogos, ofereceram hospedagem a partir de promoções e lançaram campanhas de marketing boca a boca com retorno alto de visibilidade. O cardápio é amplo para muitas empresas, inclusive para as que buscam reforçar o relacionamento com outras companhias. Há um raio no entorno das áreas esportivas que somente os patrocinadores e parceiros oficiais podem explorar. O resto está liberado. “Em Londres, foram 150 hospitalities.

No Rio, até agora, só cinco ações do tipo foram fechadas”, diz Flores. “Em termos de oportunidades, sem dúvida, 2015 é o ano do esporte brasileiro.” istoÉ2016 fevereiro/março 2015

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paraolímpicos

por Camila Brandalise fotos emiliano Capozoli

Como a AACD, uma das principais entidades de apoio a pessoas com deficiência no Brasil, se tornou um celeiro de talentos do esporte paraolímpico

Para-atletas se alongam antes de treino na piscina da Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), em São Paulo.

A natação é uma das três modalidades competitivas que fazem parte do programa da entidade

DA reAbilitAção

Ao ouro

istoÉ2016 fevereiro/mArço 2015

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paraolĂ­mpicos

Carmelita tinha 28 anos quando fiCou paraplégiCa ao ser esfaqueada no pesCoço pelo próprio noivo. Caroline era apenas um bebê quando uma meningite a obrigou a amputar a perna direita. aos 33, suzete desCobriu um tumor no braço esquerdo que a fez perder o membro. há 22 anos, marCelo foi atingido por uma bala perdida durante um tiroteio perto de Casa e se tornou Cadeirante.

JoyCe teve as pernas imobilizadas depois que um ponto de ônibus desabou e atingiu sua Coluna.

Todas as histórias acima, com diferenças e particularidades, acabam se encontrando no esporte. Os personagens são para-atletas que podem relatar suas vidas de duas maneiras: com dor, a partir do momento em que tiveram algum membro amputado ou paralisado, ou com glória, pelas vitórias e pódios conquistados. Eles preferem a segunda opção.

Os problemas que limitam as ações do corpo são marcantes, mas não essenciais. Tanto que as palavras mais usadas por eles são “esforço”, “objetivo” e “conquista”. Hoje, todos são atletas de natação e tênis de mesa da Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), um dos principais responsáveis pela formação de novos talentos no Brasil.

Nenhum deles se considera vítima do acaso. Pelo contrário: são pessoas ativas, vibrantes, que redescobriram talentos a partir de uma tragédia.

O projeto AACD Esporte surgiu em 2013 justamente para fazer florescer o potencial dos pacientes. Antes, a associação já apoiava aqueles que demonstravam alguma habilidade, mas a iniciativa se fortaleceu de fato após a criação de um grupo específico para os para-atletas. A reabilitação desportiva faz parte do tratamento de quem procura a AACD, a mais respeitada instituição do tipo no Brasil. Os que demonstram mais aptidão são convidados a se dedicar às modalidades em treinos específicos, depois de estarem reabilitados. “Nossa intenção não é manter esses atletas, e sim iniciá-los para que possam crescer na carreira fora da entidade”, afirma Vincenzo Roma, diretor do projeto. Dentro da AACD, o poder reconstrutor do esporte já é conhecido de longa data. Para dirigentes, pacientes e especialistas, não há dúvidas quanto aos benefícios físicos e psicológicos.

“As modalidades paraolímpicas nasceram como ferramentas de motivação para as pessoas com deficiência encontrarem novo significado para a vida”, afirma Ciro Winckler, professor de Educação Física da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coordenador técnico do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB).

Suzete (abaixo), 42 anos, nada por hobbie, mas mesmo assim já disputou competições nacionais. Caroline (na página ao lado), de apenas 19 anos, acaba de terminar o ensino médio e pretende focar todo o esforço no esporte. o potencial existe: apesar da pouca idade, ela já conquistou 98 medalhas

paraolímpicos

marcelo (à esquerda) encontrou no tênis de mesa a motivação para se reabilitar após ser atingido por um tiro na coluna

oS númeroS DA AACD 1950

8

ano de fundação da AACD

unidades em são Paulo.

As outras sete ficam no Rio Grande do sul, em Minas Gerais, em Pernambuco, no Rio de Janeiro e na Paraíba

Em funcionamento há 65 anos, a instituição mantém 15 unidades espalhadas pelo País

7.000 2.400 30.000 pessoas atendidas diariamente em todo o Brasil

colaboradores trabalham na instituição, que conta ainda com 1.600 voluntários

A AACD existe desde 1950 com o objetivo de reabilitar pessoas com alguma deficiência física, tanto crianças quanto adultos. Da equipe fazem parte médicos, terapeutas e professores – são cerca de 2.400 colaboradores e 1.600 voluntários atuando nas 15 unidades da entidade no Brasil. A maioria delas fica na Grande São Paulo, onde o projeto AACD Esporte tem espaços especiais, como o Centro Olímpico Ibirapuera, para os treinos de natação, e o Lar Escola São Francisco, para o tênis de mesa. Para os nadadores, há uma piscina de 50 metros de comprimento e 25 metros de largura disponível às segundas, quartas e sextas à noite. Já os mesatenistas treinam em quatro mesas às segundas e quartas-feiras, no fim da tarde. Há ainda treinos de bocha e aulas de capoeira, cujos grupos ensaiam para apresentações da própria entidade ou de fora. O financiamento é mantido por doações e por renda proveniente de serviços de saúde prestados nos hospitais da instituição. Segundo

pessoas participaram do programa AACD Esporte e de terapias especiais em 2013

3 esportes de circuitos competitivos fazem parte da programação da entidade atualmente: natação, tênis de mesa e bocha

r$ 355 milhões Foi o total de gastos da entidade em 2013 (contra

r$ 346 milhões arrecadados)

o último balanço financeiro, de 2013, foram arrecadados R$ 346 milhões, contra R$ 355 milhões gastos.

“Normalmente, a instituição fecha o ano no vermelho”, afirma o diretor de esportes, Vincenzo Roma.

Carmelita Maria dos Santos, 35 anos, não sabia nem nadar quando ficou paraplégica, em 2007. Durante uma briga com o noivo, levou uma facada profunda na região entre o pescoço e o ombro esquerdo. “Pelo diagnóstico inicial, eu deveria mexer só os ombros, mas recuperei todos os movimentos da cintura para cima”, diz.

Na AACD, ela fez fisioterapia aquática e foi indicada para a natação. “Eu achava que não conseguiria, tinha medo.” Hoje, a atleta diz perceber que a limitação estava mais na mente do que no corpo. Em 2013, participou de uma competição regional. Ainda um pouco descrente, não pensava em conquistar nada.

Saiu de lá com duas medalhas de ouro: uma nos 50 metros costas e outra nos 50 m livre. “Minha autoes-

tima melhorou 100%”, diz Carmen, como costuma ser chamada. A história tem outro final feliz. Há um ano, ela conheceu o atual marido, com quem é casada desde julho de 2014.

Nos treinos, Carmen tem a companhia inestimável de Suzete Cristina Yazaki Yamashiro, 42 anos. Em 2006, um tumor ósseo extremamente agressivo forçou os médicos a amputarem seu braço esquerdo. Suzete compensa a deficiência com o membro superior direito, especialmente “trabalhado” na piscina, e usa a força do impulso das pernas para se movimentar com velocidade na água. Praticante de exercícios físicos há muitos anos, nada por diversão, mas mesmo assim coleciona medalhas. Na primeira competição do Circuito Caixa Loterias, o mais importante do País, em 2011, só queria completar a prova. Saiu com o bronze. “Foi uma surpresa incrível”, diz a atleta, prova viva de que o potencial para grandes resultados está presente mesmo em quem nunca pensou em competir de verdade.

Não é o caso de Caroline Barbarino, 19 anos. Os ombros largos e o quadril estreito denunciam que, apesar da pouca idade, ela é veterana nas piscinas. Com apenas um ano e sete meses, a jovem contraiu uma meningite que, primeiro, tirou-lhe os movimentos das pernas.

Depois, a doença acabaria por forçar a amputação do membro inferior direito. A natação começou aos 10 anos, como forma de diversão e reabilitação. Quatro anos depois, ela já competia como atleta. Coleciona 98 medalhas desde então. Uma das mais recentes, de prata, foi conquistada nos Jogos Parapan-Americanos Juvenis de Buenos Aires, em 2013. Carol acabou de terminar o Ensino Médio e, agora, pretende dirigir todos os esforços ao esporte. “Meu objetivo é estar na Paraolimpíada de 2016 e, para isso, vou treinar de manhã e de tarde”, diz. Fã do campeão olímpico Cesar Cielo, conta, orgulhosa, que se destaca nas mesmas modalidades que o ídolo: 50 e 100 m livre. Esse tipo de motivação, essencial para as pessoas que procuram a entidade, é justamente o que a AACD espera despertar em todos os seus pacientes. Supervisora de esporte adaptado da associação, Edna de Morais Garcez, de 61 anos, trabalha na área há três décadas e diz que nunca deixa de se surpreender com o poder transformador do esporte.

“São pessoas que começaram a treinar com medo de pular na piscina e hoje são atletas de ponta, medalhistas”, diz. “É muito gratificante vê-los crescer tanto.”

Para Patrícia Silvestre de Freitas, professora da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e coautora do livro “Introdução à Educação Física Adaptada Para Pessoas com Deficiência”, ainda que casos como da AACD mostrem a evolução do esporte paraolímpico no

País, o processo de reabilitação tem muito a melhorar.

“A disciplina sobre o assunto no curso de Educação Física surgiu há menos de 20 anos”, explica. “Muitas universidades ainda não têm a matéria no currículo.”

A especialista reconhece, no entanto, que uma importante mudança nesse sentido já ocorreu. “Muita gente já entende que um corpo, mesmo não sendo perfeito, pode fazer exercícios e se sair muito bem”, diz.

Destaque entre os esportistas da AACD, a mesatenista Joyce Fernanda de Oliveira, 24 anos, é um exemplo vivo da afirmação de Patrícia. Única brasileira no ranking mundial – ocupa o nono lugar -, já tem vaga garantida nos Jogos Parapan-Americanos de Toronto, em agosto. Começou a treinar em 2004, dois anos depois de um ponto de ônibus cair sobre seu corpo e deixá-la paraplégica. Participou de inúmeras competições sem levar medalha, mas nunca pensou em desistir. Até que conseguiu uma vaga no Parapan do Rio de Janeiro, em 2007. Foi um momento de decisão: dessa vez, teria de viajar sozinha. “Você quer ir mesmo assim?”, ouviu da mãe. A resposta afirmativa veio sem nenhum pingo de dúvida. “Já tinha 17 anos, precisava aprender a fazer tudo sozinha porque era a carreira que tinha escolhido para mim”, diz Joyce. Desde então, foi sempre convocada para representar a seleção brasileira.

Em 2013, recebeu o convite para morar em Brasília e treinar com os atletas que deverão participar dos Jogos de 2016, no Rio de Janeiro. Se conquistar o ouro em Toronto, terá a vaga paraolímpica garantida.

Dona de personalidade agitada – externada pela fala rápida –, Joyce precisou desenvolver uma técnica especial para se acalmar antes de encarar as adversárias.

Na meia hora que antecede os jogos, ela faz exercícios de respiração e concentração. “Me ajuda a não ficar nervosa, coisa que sempre fui e só piorou depois que me tornei mesatenista”, diz, rindo. Em São Paulo, onde treinava pela AACD, a jovem deixou amigos que se espelham em seu sucesso para continuar medalhando.

Marcelo Silveira Bueno, 34 anos, é um deles. Enquanto mostra a tatuagem de duas raquetes e uma bolinha que tem na mão direita, relembra como a colega o ajudou a não desistir. “Todo ano eu dizia que ia parar de jogar porque não conseguia medalha”, afirma. “Ela me deu uma dura, disse que era para parar de reclamar e treinar mais.” Seguiu o conselho da colega e, em 2013, conseguiu melhorar o rendimento. Ganhou medalha de bronze no campeonato nacional e hoje tem bolsa de R$ 925 para treinar. “Não consigo imaginar minha vida sem o esporte. Viajei, fiz amigos e aprendi a ser mais independente.” Nessa luta diária por reabilitação, independência e medalhas, a AACD é campeã. istoÉ2016 fevereiro/mArço 2015

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A CORRIDA DAS CIDADES negócios

POR ELAINE ORTIZ

ILUSTRAÇÃO LUCIANA OLIVEIRA

Como municípios e clubes de todas as regiões do País buscam atrair as delegações olímpicas para seus centros de treinamento e por que essa disputa ajuda a espalhar os benefícios dos Jogos do Rio

NÃO É SÓ O RIO DE JANEIRO que está na corrida para aprontar tudo a tempo para a Olimpíada. A um ano e meio da abertura do evento, a disputa de dezenas de cidades brasileiras para receber delegações do mundo todo em seus Centros de Treinamento (CT) se intensifica. Essa verdadeira maratona começou cinco anos atrás, quando o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) realizou a seleção entre mais de 5,5 mil municípios. Depois de uma filtragem que levava em conta especialmente a infraestrutura local, apenas 167 CTs em 18 estados das 5 regiões brasileiras ganharam o direito de apresentar propostas para as 204 nações que disputarão medalhas em 2016. Desde então, está aberta a temporada de visitações e intercâmbio entre clubes e comitês olímpicos. Poucos, porém, já definiram onde ficarão seus quartéisgenerais. Agora, na reta final, o tempo é curto e a briga é maior.

A escolha dos Centros de Treinamento pode ter papel crucial no desempenho dos atletas. Na Copa do Mundo do Brasil, em 2014, a Federação Alemã de Futebol, em parceria com empreendedores locais, construiu na Bahia seu próprio CT. A justificativa, na época, foi a de diminuir o cansaço com deslocamentos, já que a equipe disputaria os três jogos da primeira fase em Salvador, Fortaleza e Recife. O resultado, todos sabem, foi o tetracampeonato. Para a Olimpíada, a delegação da Alemanha tem visitado equipamentos disponíveis na região sul do País. Em janeiro, o time de natação treinou em Palhoça (SC), no Complexo Aquático da Unisul. No ano passado, representantes visitaram a Sociedade de Ginástica Porto Alegre (Sogipa). A definição ainda não ocorreu.

Os motivos que levam clubes e cidades a se interessarem são muitos – e semelhantes: melhorias nas sedes e aparelhagens, incentivo à prática esportiva local, intercâmbio com atletas de alto rendimento e

ginástica artística

Ginásio do Minas Tênis Clube, em Belo Horizonte (MG), uma das casas da delegação olímpica britânica fora do Rio

divulgação espontânea, que impacta positivamente no turismo e gera receitas para os cofres públicos e privados. É o caso de Minas Gerais, um dos estados que mais firmou contratos até agora. Quatro comitês (de várias modalidades esportivas) e três delegações se instalarão em cidades mineiras. A Associação Olímpica Britânica (BOA) e a Associação Paraolímpica Britânica (BPA) ficarão baseadas em Belo Horizonte. O Conselho Olímpico da Irlanda e o Conselho Paraolímpico da Irlanda, em Uberlândia.

A delegação brasileira olímpica de canoagem treinará em Lagoa Santa. Já a delegação olímpica de atletismo da China e as delegações olímpica e paraolímpica do Canadá poderão se basear em Juiz de Fora.

Minas investiu cerca de R$ 50 milhões nas reformas do Centro de Treinamento Esportivo da Universidade Federal de Minas Gerais, além de R$ 600 milhões em obras de mobilidade urbana e intervenções de infraestrutura, segurança, transporte e saúde pública, executadas para a realização da Copa do Mundo. “Em matéria de infraestrutura esportiva, Minas Gerais tem excelentes equipamentos”, diz Anna Pimenta, assessora de relações internacionais da Secretaria de Estado de Turismo e Esportes do Estado. “Nós também apresentamos às delegações estrangeiras toda uma estrutura de apoio, como hotéis, segurança e trabalho conjunto entre as várias instâncias públicas e privadas.”

A Associação Olímpica Britânica estima que 350 atletas do País competirão nos Jogos, numa delegação total de 750 pessoas – que inclui treinadores, fisioterapeutas e outros profissionais. Segundo a entidade, 70% dos esportistas transitarão entre a base em Belo Horizonte (Minas Tênis Clube, UFMG e Minas Náutico) e a Vila Olímpica no Rio de Janeiro. Além disso, uma equipe de 200 funcionários de apoio e parceiros também utilizará a base mineira. Segundo Alex Ellis, embaixador do Reino Unido no Brasil, a escolha pela capital mineira foi unânime. “As semelhanças climáticas em relação aos locais de competição no Rio de Janeiro, o maior número de instalações de qualidade, a competência dos anfitriões e a experiência em 62

ISTOÉ2016 FEVEREIRO/MARÇO 2015

cuidar de atletas de elite foram decisivos”, diz.

A principal casa dos britânicos será o Minas Tênis Clube. A negociação teve início ainda em 2012, antes da realização dos Jogos de Londres, quando o comitê fez a primeira visita ao clube octogenário. “Eles se encantaram com a nossa estrutura física e solicitaram que, mesmo que recebêssemos propostas de outros países, déssemos preferência a eles”, diz Izabel Cristina Rohlfs, chefe do Departamento de Integração das Ciências do Esporte, responsável por toda a negociação. Entre os pilares do acordo assinado em abril do ano passado estão o intercâmbio esportivo entre equipes e a doação de equipamentos no valor de 45 mil libras esterlinas. “A parceria não está firmada apenas na questão financeira e de prestação de serviços, mas principalmente no legado que envolve os Jogos Olímpicos”, diz Izabel. “Temos muito a aprender em termos de gestão, e já estamos aprendendo.”

Outra delegação que já tem sede de treinamento definida é a dos Estados Unidos, que ficará no Clube de Regatas Flamengo, no Rio. O time americano deve ter mais de mil pessoas nos Jogos de 2016, incluindo 575 atletas. Entre 300 e 500 membros da equipe, segundo as estimativas do clube, usarão a sede da Gávea. Pelo acordo, o Comitê Olímpico dos Estados Unidos (Usoc) poderá usar dois ginásios, academias de musculação, campo de futebol e espaço de lutas, que será totalmente reformado. O clube não revela os valores que serão investidos pelos americanos para melhorias em equipamentos nem quanto será destinado em verbas de marketing e intercâmbio técnico. “A presença da delegação mais importante do mundo terá um retorno incomensurável em termos intangíveis”, diz o vice-presidente de esportes olímpicos do Flamengo, Alexandre Póvoa. Para os Estados Unidos, a escolha do clube é um bom negócio não somente pela estrutura do Flamengo, como também pela localização – a 40 minutos de distância da Barrada Tijuca, onde será disputada a maior parte das competições, e também do Complexo do Maracanã.

FOTO: ESTÚDIO NITRO

v AM (1) PA (3) RR (1) CE (3) MA (1) RN (1) PB (1) PE (1) DF (6) GO (6) MT (1) MG (16) ES (8) RJ (33) SP (49) PR (12) SC (12) RS (12)

> MAPA DOS CTS COMO ESTÃO DISTRIBUÍDOS OS CENTROS DE TREINAMENTO QUE RECEBERÃO AS DELEGAÇÕES OLÍMPICAS EM 2016 SUDESTE

SUL

CENTRO OESTE

NORDESTE

NORTE

106 equipamentos, em 4 estados: Espírito Santo (8), Minas Gerais (16), Rio de Janeiro (33), São Paulo (49)

36 equipamentos, em 3 estados: Paraná (12), Rio Grande do Sul (12), Santa Catarina (12)

13 equipamentos, em 3 estados: Distrito Federal (6), Goiás (6), Mato Grosso (1)

7 equipamentos, em 5 estados: Ceará (3), Maranhão (1), Pernambuco (1), Rio Grande do Norte (1), Paraíba (1)

5 equipamentos, em 3 estados: Amazonas (1), Pará (3), Roraima (1)

Tão importante e volumosa quanto a delegação dos EUA é a da China. Em 2008, em Pequim, a equipe foi a maior da história dos Jogos Olímpicos, com 639 atletas em 38 modalidades. Receber os chineses é o que querem quase todos os clubes brasileiros. O governo do Estado de São Paulo confirmou que parte da delegação da China utilizará o Complexo Esportivo Constâncio Vaz Guimarães (Ibirapuera), a raia olímpica da USP e o Centro Olímpico de Treinamento e Pesquisa. Serão aproximadamente 400 atletas de 16 modalidades.

No total, o investimento em reformas e na construção do Completo Paraolímpico Brasileiro (feito em parceria com o governo federal) supera os R$ 250 milhões.

Na Copa do Mundo, o Estado de São Paulo recebeu 15 das 32 seleções participantes. Para a Olimpíada, conta com 49 dos 179 locais para treinamento, espalhados por 18 cidades. Como também será uma das sedes do futebol, receberá ainda 1,4 mil voluntários. Além da China, Itália e Rússia estão interessadas nas instalações paulistas, mas as negociações estão em andamento. No litoral, mais um destaque para o Estado: Santos foi escolhida para abrigar o Congresso Internacional de Ciência, Educação e Medicina do Esporte, que ocorrerá entre os dias 28 e 31 de julho de 2016. A previsão é de que o evento movimente 4 mil visitantes de 70 países diariamente.

O maior congresso científico de esporte no mundo é realizado tradicionalmente antes dos Jogos Olímpicos, sempre no País-sede.

A disputa pelas delegações e eventos da Olimpíada é benéfica para o País, pois ajuda a espalhar pelo território o clima e os investimentos dos Jogos, como demonstram experiências anteriores. No Reino Unido, o número de pessoas que passaram a praticar esportes após a Olimpíada de 2012, em Londres, aumentou em 1,7 milhão. Pelo menos 14,2 bilhões de libras esterlinas foram em investidas em parcerias comerciais no país em dois anos, muito acima do objetivo inicial de 11 bilhões de libras esterlinas em quatro anos.

“Parte do benefício econômico veio do turismo, com o aumento de 1,3 milhão de turistas internacionais em Londres em 2013”, diz o embaixador Ellis. Isso equivale a 6% de alta sobre o ano anterior, justamente o ano dos Jogos. É um recorde histórico que faz de Londres a cidade mais visitada do mundo. Os 600 centros de treinamento disponíveis na capital britânica à época foram fundamentais nesse processo, já que permaneceram como legado aos cidadãos. Não há motivos para que o mesmo não ocorra no Brasil.

Trilhas

O RIO DOS PEQUENINOS

Turismo, aventura e o visual do Rio de Janeiro num mesmo passeio. O negócio é botar os pequenos para andar e suar um pouquinho.

A recompensa é enorme. Algumas das trilhas da cidade são plenamente acessíveis a eles, e cada uma guarda uma surpresa. A do Morro da Urca, boa para crianças a partir dos 5 anos, parte da pista Cláudio Coutinho e dura cerca de 40 minutos até o topo, com a companhia de pássaros e micos. Uma vez lá em cima, é possível descer de volta pela trilha ou pegar carona no Bondinho do Pão de Açúcar – se a trilha for feita no fim da tarde e a descida acontecer depois das 19h, a entrada no bondinho é gratuita. A da Pedra Bonita, com grau de dificuldade semelhante, termina numa vista belíssima. De brinde, é possível observar os voos de asa delta e parapente.

A da Cachoeira das Almas é longa: cerca de cinco horas, ida e volta. Mas o nível de dificuldade é baixo. Passa-se por rios que cortam a Floresta da Tijuca e, no fim, o prêmio é um banho delicioso de cachoeira. A do Parque da Catacumba é curtinha, 15 minutos, e leva ao Mirante do Sacopã. Programa para toda a família. Só não se pode esquecer o protetor solar, o repelente, um tênis confortável, água e um lanchinho.

UMA LISTA DE PROGRAMAS IMPERDÍVEIS PARA CRIANÇAS DE TODAS AS IDADES SE DIVERTIREM NA CIDADE MARAVILHOSA 00

POR FLÁVIA RIBEIRO

Planetário da Gávea

Os olhos de uma criança brilham quando ela pisa em balanças especiais e descobre qual seria seu peso em cada um dos planetas do sistema solar, na lua ou até mesmo no Sol. Esse é um dos 60 experimentos interativos do Museu do Universo, uma das atrações do Planetário da Gávea, onde também se aprende brincando sobre fases da lua, marés, buracos negros, nebulosas, estrelas e viagens espaciais.

Mas a grande atração acontece toda quartafeira, a partir das 18h30: observação do céu por telescópios, com orientação de astrônomos.

A atividade é gratuita, mas a entrada para o Museu do Universo custa R$ 11 (estudantes e idosos pagam meia).

Endereço: Rua Vice-governador Rubens Berardo 100

ISTOÉ2016 fevereiro/março 2015

Jardim Botânico

Mais de 9 mil plantas de 1.500 espécies formam um ambiente de sonho para passeios em família pelo Jardim Botânico do Rio de Janeiro, que inclui ainda pérgulas, caramanchões e grandes árvores que garantem sombra no verão carioca. Criado após a chegada da família real portuguesa ao Brasil, o Jardim Botânico abriga ainda vários animais, como camaleões, macacos-prego e preguiças, que sempre atraem os olhares da criançada – a começar por um laguinho cheio de tartarugas na entrada.

Para completar o dia, um parquinho localizado nas ruínas da antiga fábrica de pólvora oferece brinquedos de madeira e uma grande caixa de areia para as crianças brincarem. Entrada a R$ 7 (gratuita para crianças até 7 anos e para idosos acima de 60 anos).

Endereço: Rua Jardim Botânico 1008

Lagoa Rodrigo de Freitas

Museu Aeroespacial

O Avião T6D-1959 pertenceu ao ex-líder da Esquadrilha da Fumaça Coronel Antonio Arthur Braga. O Boeing 737-200 FAB VC 96 transportou oito presidentes da República. E ambos estão em exposição, junto a outras 80 aeronaves, nos cinco hangares que formam o Museu Aeroespacial. Teco-tecos, aviões que combateram na Segunda Guerra Mundial e tantos outros remetem a uma época de pioneirismo na conquista do espaço aéreo. Há ainda uma réplica do 14-Bis, o avião com que Santos Dumont levantou voo e fez história, em 1906. Uma metralhadora usada em um combate aéreo em 1914, quando o primeiro avião alemão da história foi abatido, é um dos destaques da exposição de armas, junto a outras peças de artilharia das duas grandes guerras.

Endereço: Avenida Marechal Fontenelle 2000, Campo dos Afonsos

Parque Madureira

Inaugurado em 2012, o Parque Madureira se tornou um dos principais centros de entretenimento do subúrbio carioca. Caminhos arborizados, quadras poliesportivas, campo de futebol com grama sintética, mesas de pingue-pongue, brinquedos e ciclovia são garantia de diversão para crianças e adultos. Mas a grande atração é a pista de skate, com 3.850 metros quadrados, considerada a mais completa da América Latina. Outro destaque é a queda d’água artificial, um refresco nos dias mais quentes. No espaço, há inda uma arena de teatro, a Praça do Samba e a Praça do Conhecimento, que oferece cursos e computadores com acesso à internet.

Endereço: Rua Soares Caldeira 115

Parque Lage

Entrar numa gruta (artificial) cujas paredes internas são formadas por aquários repletos de peixes é uma aventura irresistível para crianças de todas as idades. O lugar tem também parquinho, espaço para piqueniques e trilhas. Uma delas – indicada só para os mais resistentes e não recomendada para os pequenos – leva até o Corcovado, cruzando parte do Parque Nacional da Tijuca. Para quem quer só relaxar, a dica é fazer um lanche no café do lindo palacete que se localiza na Escola de Artes Visuais, dentro do parque, cercado por esculturas e pinturas.

Todo o espaço, que foi um engenho de açúcar nos tempos do Brasil colônia, é limpo e bem conservado, e a entrada é gratuita.

Endereço: Rua Jardim Botânico 414

Quinta da Boa Vista

São 155 mil metros quadrados de área verde que já foram residência de ninguém menos do que Dom João VI, após a vinda da família real para o Brasil, em 1808. E é programa para dois dias inteiros de diversão. Num deles, a pedida é alugar triciclos, andar de pedalinho pelos lagos, jogar bola e fazer um piquenique na grama.

Pode incluir também a visita ao palácio onde morou a família real até 1821, transformado no Museu Nacional. Outro dia pode ser dedicado só ao Jardim Zoológico, com mais de 2 mil animais, entre répteis, mamíferos e aves, distribuídos por 138 mil metros quadrados.

Endereço: Quinta da Boa Vista, São Cristóvão - Rio de Janeiro

Com um visual de tirar o fôlego, a Lagoa tem como destaque de entretenimento uma ciclovia de 7 quilômetros. As bikes podem ser alugadas, assim como quadriciclos para uma diversão em família. Além da ciclovia, há uma pista só para crianças no Parque dos Patins. Do outro lado, próximo ao Parque da Catacumba, pedalinhos em forma de cisne, com dois a seis lugares, embelezam a lagoa e encantam as crianças. A área conta ainda com diversos quiosques, cada um dedicado a um tipo de culinária. No quiosque em frente à Igreja Matriz Santa Margarida Maria, há brinquedinhos e trocador para os bebês. No lado do Parque da Catacumba, há um espaço dedicado a trilhas, arvorismo e tirolesa, com circuitos para crianças pequenas e outros para os maiores e os adultos.

Endereço: Avenida Epitácio Pessoa e Borges de Medeiros, sem número

Parque do Flamengo (Aterro)

No Aterro do Flamengo, espaço é o que não falta para quem gosta de andar de bicicleta, skate, pular corda ou se equilibrar sobre um slackline.

Grande complexo de lazer que se estende do Aeroporto Santos Dumont à Praia de Botafogo, o Parque Brigadeiro Eduardo Gomes, conhecido como Aterro do Flamengo, oferece 1,2 milhão de metros quadrados de atrações para crianças e adultos. Projetado por Burle Marx, abriga o Museu de Arte Moderna, o Monumento aos Pracinhas, a Marina da Glória e o Monumento a Estácio de Sá. Além disso, é cercado por quiosques e restaurantes. E o melhor: aos domingos e feriados, o trânsito é fechado nas avenidas internas entre 7h e 18h.

Endereço: Avenida Infante Dom Henrique, sem número

ISTOÉ2016 fevereiro/março 2015

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Conquistas que entraram para a história POR VERA LYNN

AFRÂNIO DA COSTA

ILUSTRAÇÃO OLIVER QUINTO

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GÊNIO DO ESPORTE E DO DIREITO AFRÂNIO DA COSTA CONQUISTOU A PRIMEIRA MEDALHA OLÍMPICA DO BRASIL AO SUPERAR O AMERICANO QUE EMPRESTOU UM REVÓLVER PARA QUE A EQUIPE BRASILEIRA PUDESSE COMPETIR. DEPOIS, FOI SER MINISTRO DO SUPREMO

AFRÂNIO DA COSTA NASCE EM MACAÉ, NO RIO, NO DIA 14 DE MARÇO DE 1892, 4 ANOS ANTES DA PRIMEIRA OLIMPÍADA DA ERA MODERNA.

FILHO DE UM PROEMINENTE ADVOGADO, DECIDE DESDE CEDO SEGUIR A CARREIRA JURÍDICA.

EM 1920, COM O AMIGO GUILHERME PARAENSE, ORGANIZA A DELEGAÇÃO BRASILEIRA QUE VAI COMPETIR NOS JOGOS DA ANTUÉRPIA, NA BÉLGICA.

EM UM DIÁRIO, ESCREVE O SEGUINTE: “À NOITE, PROCUREI APROXIMAR-ME DOS AMERICANOS. DOIS FAMOSOS CAMPEÕES, LANE E BRACKEN, JOGAVAM UMA PARTIDA DE XADREZ. FUI ‘PERUAR’O JOGO E ÀS FOLHAS TANTAS ARRISQUEI UMA OPINIÃO DA PARTIDA. ACHARAM BOA…DAÍ POR DIANTE ENTRARAM EM FRANCA CAMARADAGEM”.

FORMA-SE PELA FACULDADE LIVRE DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS DO RIO, EM 1912, AOS 20 ANOS. NESSA MESMA ÉPOCA, COMEÇA A PRATICAR TIRO.

ARTICULADO E CULTO, SE TORNA O LÍDER NATURAL DA EQUIPE E TRABALHA QUASE COMO UM DIRIGENTE. NA BÉLGICA, A DELEGAÇÃO BRASILEIRA TOMA UM SUSTO: TODAS AS ARMAS E MUNIÇÃO SÃO ROUBADAS. INABALÁVEL, É AFRÂNIO QUEM MEXE COM OS BRIOS DA EQUIPE E IMPEDE QUE O BRASIL DESISTA DE DISPUTAR A OLIMPÍADA.

SENSIBILIZADOS COM A HISTÓRIA DO ROUBO CONTADA POR AFRÂNIO, OS AMERICANOS EMPRESTAM AOS BRASILEIROS DUAS PISTOLAS COLT E 2 MIL BALAS.

COM O MATERIAL EMPRESTADO, AFRÂNIO CONQUISTA A PRATA NA PROVA DE PISTOLA LIVRE, NA DISTÂNCIA DE 50 METROS. É A PRIMEIRA MEDALHA DA HISTÓRIA OLÍMPICA DO BRASIL. SUPREMA IRONIA: LANE FICA COM O BRONZE, LOGO ATRÁS DE AFRÂNIO. NA SEQUÊNCIA DO CAMPEONATO, O BRASIL CONTINUA BRILHANDO. GUILHERME PARAENSE É OURO NO TIRO RÁPIDO DE 25 METROS (À FRENTE DE BRACKEN). NA DISPUTA POR EQUIPES, O TIME NACIONAL, LIDERADO POR AFRÂNIO E GUILHERME, FATURA O BRONZE.

AFRÂNIO VOLTA A INTEGRAR A DELEGAÇÃO OLÍMPICA BRASILEIRA EM LOS ANGELES-1932.

DESTA VEZ, OFICIALIZADO COMO CHEFE DA EQUIPE DE TIRO.

FORA DO ESPORTE, TEM CARREIRA BRILHANTE. JUIZ DE DIREITO EM BRASÍLIA, ATUA DURANTE MAIS DE 20 ANOS COMO MINISTRO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

MORRE NO DIA 26 DE JUNHO DE 1979, AOS 87 ANOS, CONSAGRADO NO MEIO ESPORTIVO E JURÍDICO.

EXCLUSIVO: O VELEJADOR ROBERT SCHEIDT FALA SOBRE A RIO-2016, APOSENTADORIA E FRAUDES NO BOLSA ATLETA

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A NOVA CARA DO BOXE

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A RESSURREIÇÃO DE DIEGO HYPOLITO O GINASTA QUE QUASE PERDEU TUDO PARA A DEPRESSÃO DÁ UMA IMPROVÁVEL REVIRAVOLTA NA CARREIRA

ATLETAS COMO CLÉLIA COSTA, BRONZE NO MUNDIAL, CHEGARÃO A 2016 COM CHANCES INÉDITAS DE LEVAR O BRASIL A UMA POSIÇÃO DE DESTAQUE DENTRO DA NOBRE ARTE

MOMENTO DE DECISÃO POR QUE 2015 É UM ANO CRUCIAL NA PREPARAÇÃO PARA OS JOGOS DO RIO E MAIS: ETIENE MEDEIROS, O TORPEDO DA NATAÇÃO O CELEIRO DE TALENTOS DA AACD

www.istoe2016.com.br FEVEREIRO/MARÇO 2015 Edição 15 • Ano 6 VENDA PROIBIDA EXEMPLAR DE DISTRIBUIÇÃO GRATUITA E PARTE INTEGRANTE DA REVISTA ISTOÉ

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