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ESQUIVA
ESQUIVA
¹ O Pensador de Angola – A Mãe Pensador, símbolo usado pelo Projeto Capoeira Angola Estudos e Práticas – ProCAEP. ² Tabela ilustrativa da formação de bateria no ProCAEP. ³ Tabela com corridos de domínio público e o estudo da linguística.
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Na antiguidade os mais velhos eram chamados de polímatas, pessoas que guardam consigo infinitos conhecimentos na sua oralidade. A fala é maneira de cura e quem fala confirma o poder da palavra. A uma sagrada tradição, sagrado magistério e sagrada escritura ancestral no mestre Jorge Ferreira de saber proferir exatamente o que quer dizer e fazer.
É comum ser perguntado para o mestre, até mesmo para alunos e professores, o porquê do nome Projeto, mas também por quê este símbolo. E é ensinado por ele que:
“Projeto Capoeira Angola Estudos e Práticas (ProCAEP) = Projeto quer dizer projetar-se/lançar-se ao infinito, construídas através do Estudo de si mesmo acerca da Prática da relação natural expressadas na Capoeira Angola, sempre na busca da Cultura de Paz” .
“O símbolo é chamado de ‘O Pensador de Angola – A Mãe Pensador’ que representa o ser humano em sua totalidade, o pensar de corpo todo, sem distinção de gênero. Estando contido dentro de um círculo, tem a representação da cabaça.”
“Entrar na Roda da Capoeira é mesmo que entrar na Roda da Vida, peço licença aos grandes Mestres e Mestras para entrar nessa Roda. Em toda e qualquer coisa que vá se falar de Capoeira e, da minha vida, tenho que fazer a Saudação inicial e final.”
Por um talento natural, muito engenhoso, de um olhar do capoeira a ser observador da natureza humana, sua característica no ensino da Capoeira Angola é especial, pois trabalha a prática filosófica que se fundamenta no estudo de si mesmo, e na prática do corpo através de treinos de movimentação (ginga, meia-lua, aú, rabo de arraia, esquiva, cabeçada, chapa de frente e de costas, rolê, ponte, bananeira e etc.); da musicalidade seja instrumental (berimbaus gunga, médio e viola, pandeiro, agogô, reco-reco e atabaque); e de cantos (ladainhas, saudações, quadras e corridos), na junção de todos os elementos encontradas na Roda de Capoeira Angola percebidas no modo de jogo, transmitindo respeito, cautela e boas risadas ocorridas durante a celebração, e, assimiladas por meio de agradecimentos e reflexões nas Rodas de Diálogo no final de toda e qualquer atividade. Sobre isso, a também à importância do trabalho com a confecção de instrumentos musicais. Toda habilidade do Mestre Jorge F. foi aprendida através da observação dos mais experientes. Além de produzir, ele ensina começando dentro da mata, conhecendo a matéria prima que faz os instrumentos da bateria, o tempo de tirar, a importância de deixar viva e replantar, a história de cada um, e as leis que existem em prol da preservação ambiental. Os seguintes instrumentos:
✓ Berimbau: a vara do berimbau, o saquinho do caxixi, a semente pra chiar, a pedra boa pra tocar, a baqueta pra tocar, e, os tipos e tamanhos da cabaça
pra o som ecoar. ✓ Pandeiro: que tipo de madeira usar, o coro bom e de que bicho, as etapas de tratar o couro cru, e o manuseio para esticar e colocar no formão, afinando com parafusos e sol; ✓ Agogô: que tipo de “coco” é usado e a combinação de sons; ✓ Reco-reco: seu tamanho, os cortes específicos para saída de som e a baqueta de tocar; ✓ Atabaque: a madeira boa pra fazer as taliscas, tamanhos, o tipo de forma pra fechar e selar, e, o couro de que bicho pra tratar e afinar.
Contudo, as concepções acerca da confecção de instrumentos musicais – não basta
ter habilidade manual, mas, também, uma sensibilidade no ouvido muito boa. Está é a arte final – palavras do Mestre Jorge Ferreira. Em relação aos tipos de toques e variações que cada instrumento tem, a brincadeira fica ainda mais gostosa quando ele coloca todo mundo pra tocar. Geralmente acontece desse modo, todos em uma grande roda e aí começa, cada um com: um berimbau em mãos e outros com o pandeiro, agogô, reco-reco e atabaque. Vale ressaltar que além dos toques explicados logo a baixo, o mestre também ensina os toques de ‘santa maria’, ‘cavalaria’, ‘iúna’, ‘jogo de dentro’ dentre outros e, os variados tipos de toques de variações que tem cada berimbau, lembrando que pode mudar de lugar pra lugar. Transmite o Mestre alguns dos toques da capoeira angola tocados em seu Projeto,
“são três berimbaus cada um com tamanho e toques diferentes, façam o som com a boca e repita com a mão, mas olhe bem direitinho o que estou fazendo e escutem ainda melhor”.
“primeiro é importante saber o que é o ‘som chiado’, o ‘som dom’ e, o ‘som dim’, além disto, o que é virola, dobrão ou seixo: Virola – é o arame do berimbau; Dobrão ou seixo - é a pedrinha com o que se toca para fazer o som. Observação: existe os sons acima do dobrão e abaixo do dobrão; Som Chiado – é o toque acima do dobrão. Para fazer este toque, encoste o dobrão levemente na virola.
Observação: neste toque a cabaça do berimbau está colada na barriga; Som Dom – é o toque abaixo do dobrão. Como se faz? o dobrão não toca a virola e está fora da barriga;
Som Dim – é o toque acima do dobrão. Para sair o som, encoste o dobrão bem pressionado na virola. E neste a cabaça está fora da barriga. Inclusive, para executar todos estes toques, você vai precisar de uma baqueta para bater/tocar na virola”.
“o Berimbau Gunga toca ‘angola’: toque dois(2) chiados (thix – thix); agora toque um(1) (dom); por último toque um(1) (dim)”. * Toque do Gunga: thix – thix – dom – dim.
“o Berimbau Médio toca ‘são bento pequeno’: que é o toque invertido do gunga, como é isso? - toque dois(2) chiados (thix – thix); agora toque um(1) (dim); e termine tocando com um(1) (dom)”. * Toque do Médio: thix – thix –dim – dom.
“o Berimbau Viola toca ‘são bento grande’ : e é mais fácil ainda, toque dois(2) chiados (thix – thix); agora toque um(1) (dim); e finalize tocando com dois(2) (dom-dom)”. *Toque da Viola: thix – thix –dim – dom – dom.
“Pandeiro: faça dois(2) (tum-tum) com o polegar na pontinha do pandeiro; agora com a mão toda, bem aberta, no meio dele, faça uma vez(1) (ta); e volte para a pontinha do pandeiro de novo e, faça um(1) (tum)”. *Toque do Pandeiro: tumtum – ta – tum.
“Agogô: se toca com um pauzinho, batendo nos coquinhos, assim (tum-tá-tum) ou (grande-pequeno-grande)”.
“Reco-reco: parece um sapo cantando, tocado num pedaço de bambu com uma vareta, ai você faz assim, como se fosse raspando (cima-baixo- cima) ou (umdois-três), sempre começado de cima para tocar. O que é cima? Será o lado do instrumento que está mais próximo do seu corpo”.
“Atabaque: existem duas formas de tocar dentro do ProCAEP, a primeira é com uma mão só, de sua escolha a direita ou a esquerda, e se toca por parte: 1º. toque duas(2) vezes (tum - tum) com a mesma mão. A observação deste toque é que você toca com as pontas de todos os dedos na borda do instrumento; 2º. ainda com a mesma mão que fez os dois primeiros toques acima, faça agora um(1) toque (tá), no meio do atabaque, com a mão toda aberta; 3º toque uma(1) vez (tum), ainda com a mesma mão, na borda do atabaque.
A segunda forma de tocar é com as duas mãos, também tocada por parte, o negócio é ter coordenação: 1º. com a mão direita toque um(1) (tum). Seguidamente, sem espaço de tempo, toque um(1) (tum) com a esquerda; 2º. faça agora um(1) toque (tá), no meio do atabaque, com a mão direita toda aberta; 3º. toque uma(1) vez (tum), ainda com a mão direita, na borda do atabaque”. Quem quiser trocar da mão direita para a esquerda, pode, e é só seguir a mesma sequência de toques. *Toque do Atabaque: tundum – ta – tum.
Além dos ensinamentos sobre os toques, ele também ensina os tipos de poesias, que sejam cantadas em uma ladainha, uma louvação, uma quadra, um corrido, e a resposta dos corridos, como também a entrada do canto em cada toque. Para melhor entender o que são esses termos utilizados para identificar os tipos de poesias que são cantadas, o mestre explica com detalhes cada um. As músicas apresentadas pelo mestre são todas de domínio público:
➢ Iê: é o grito de liberdade que se dá no início de uma ladainha; no início da louvação e, nas respostas de cada frase respondida na louvação; e também para terminar uma roda de capoeira. ➢ Ladainha: é um tipo de canto que pode ser um relato histórico, um lamento um desafio, reflexões... ela geralmente traz estrofes compostas por quatro linhas com rimas, podendo formar vários versos. ➢ Louvação: é um canto que vem depois da ladainha, e, é tudo aquilo o que você pode e quer saudar, todos prosseguidos de resposta de (Iêêê e, repete o que foi saudado pelo cantador). Exemplo: Cantador – Iê, maior é Deus
Resposta da louvação – Iêêê, maior é Deus camará Cantador – A natureza
Resposta da louvação – Iêêê, a natureza camará ➢ Quadra: é um verso formado por quatro frases rimadas, que pode ser usada numa roda de capoeira e que é seguida de corrido.
Ex: Quadra seguida de corrido Cantador – Vinha passando no caminho Uma cobra me mordeu
Chamei por São Bento Grande Mas São Bento Pequeno apareceu
Corrido
Cantador – Essa cobra lhe morde
Resposta do corrido – Ô senhor São Bento Cantador – Cuidado com a cobra
Resposta do corrido – Ô senhor São Bento ➢ Corrido: é cantado depois da louvação, e por ter a sua própria métrica na hora da sua construção, ele tem forte influência no ritmo da bateria e do jogo. Ele é seguido por frases curtas, como também serem cantadas em versos mais longos.
Mas todos precisam responder depois que o cantador terminar com o improviso, ele faz a deixa para a resposta. É importante manter o corrido sendo cantado por várias vezes, como um mantra e, quando trocar, ser um que tenha haver com o anterior, ligado por algum conectivo.
Ex: Corrido curto
Cantador – Aiaiaiai São Bento me chama
Resposta do corrido – aiaiaiai Cantador – São Bento chamou
Resposta do corrido – aiaiaiai Ex: Corrido longo Cantador – Salve a Rainha sereia do mar
Não deixa o meu barco virar
Não deixa o meu barco virar
Salve a Rainha sereia do mar
Resposta do corrido – Salve a Rainha sereia do mar Não deixa o meu barco virar
“Agora que eu quero ver, tocar, criar, cantar, ouvir tudo o que estais fazendo e ver o jogo acontecendo” – completa o mestre, fazendo um elo destes elementos para início do encantamento em sua metodologia de ensino.
“ô menino, pega aí um instrumento que tu sabe tocar e começa a dizer o que tu fez hoje ou o que tem na lembrança, no seu tempo, mais junto com o instrumento...”.
Professor Nivaldo Neri, mais conhecido por Abu, 35 anos morador da Várzea, compôs uma quadra seguida de corrido.
Viajando pelo mundo perguntaram de onde eu vim Que o meu o jogo era bonito, mas não veio da Bahia Desde desse dia eu sempre canto com orgulho e com amor Pra mostrar a todo mundo o que a minha terra me ensinou
De onde eu venho sou bem querido Sou do recife
Sou da Várzea do Capibaribe (improviso) Maracatu coco de roda é do Recife (Resposta) Sou da Várzea do Capibaribe (Improviso) Capoeira bem jogada (Resposta) Sou da Várzea do Capibaribe (Improviso) Tem ciranda e caboclinho
Paulinha, aluna, 9 anos, moradora de Salgadinho, compôs um corrido.
O abacaxi é um fruto da terra
Tem coroa, e não é rei
(Resposta) O abacaxi é um fruto da terra (Improviso) É um fruto da terra, é um fruto da terra
Fátima Marinho, aluna, 65 anos, moradora do Engenho do Meio, compôs um corrido.
Roda pião na minha mão Eu quero ver meu pião no chão
(Resposta) Roda pião na minha mão (Improviso) O movimento vai girar
É interessante que o Mestre possibilita brincando, a maneira mais simples de criar poesias dos acontecimentos cotidianos, perpetuando a prática ancestral de muito tempo. Abrindo um parágrafo para falar especialmente da formação da bateria que o Mestre Jorge F. faz. Uma vez lhe perguntaram por que são 7 (sete) instrumentos musicais. E ele respondeu:
“o número 7 significa a renovação do que é cíclico, por isso nunca tem fim. E tudo o que vem, passa primeiro por mim e pelo Gunga. A partir daí direciono as energias” .
Esta resposta se vale de muito mistério e sabedoria. Demostra perfeitamente que nada é tido por acaso. A perfeição de tudo o que é feito, faz com que seja um lugar de responsabilidade e comprometimento do bom funcionamento e a manutenção do bem viver.
1º Reco-reco 2º Agogô 3º Pandeiro 7º Berimbau Gunga 4º Berimbau Médio 5º Berimbau Viola 6º Atabaque
Ainda falando sobre música, é bastante presente em suas características de ensino a identificação do que se canta nos corridos, ladainhas e quadras, as palavras em Tupi, em Quimbundo e Yoruba, fazendo com que possam saber o que estão dizendo, como a origem etimológica da palavra, observe:
Imbiriba é pau é madeira Imbiriba é pra tocar
(Corrido de domínio público)
Traduções do tronco linguistico Tupi antigo -Ybyryba = Imbiriba; -Yby = arvore; -Ybyrá = madeira, pau, vara de cerca, estaca unida para defesa; -Tiba = coleção, grande quantidade, acumulo, coletivo; -Yba = Fruta do pé; -Ýba = pé de planta ou arvore, haste, caule, bastão de ritmo, cabo de instrumento, principio, origem, guia, arrimo/regente de canto, dança; -Yua = espécie ou gênero de arvore; -Bira/Buia = empinado, ereto, erguido, levantado; -Ybyra-güi-bá = vara fina; -Ybyrá-kyti-aba = instrumento.
(Sales, Arquivo de vídeo: Capoeira Tupi, 2019). Lemba ê lemba Lemba do barro vermelho Lemba do vermelho barro Lemba do barro vermelho
(Corrido de domínio público)
-Lemba é o nkisi da procriação e da paz. No panteão dos povos de língua quimbundo originários do Norte de Angola é tido como um espírito feminino que promove a procriação. (Barros, Tese de Doutorado, 2007)
-Cajado de Lemba é um tipo de apoio que o nkisi utiliza em sua personificação em rituais de religiões da matriz africana. -Cajado de Lemba entendido como o tempo. (Tradição Oral)
-Lemba são povos da África Meridional, na qual acreditam ser descendentes dos Judeus, o que foi comprovado por DNA. (fanpage/centro cultural escola de bambas, 2019) Ô iaiá Meu senhor mandou chamar Ô iaiá Ô iaiá no mercado popular Ô iaiá
O iaiá Meu senhor mandou chamar O iaiá Diga a ele que vou já O iaiá
Ô iaiá Meu senhor mandou chamar
(Corrido de domínio público)
-Ìyá = iaiá - que quer dizer mãe ou mãezinha, provem do yoruba.
(Beniste, Dicionário Yorubá –Portugês, 2011)
Além desses corridos, ele comenta as coincidências que encontrou nas brincadeiras contidas no estado de Pernambuco, no Coco de Roda, no Maracatu Rural, entre outras, e como por exemplo na brincadeira do Cavalo-Marinho na Loa cantada - vadeia mano, vadia todos, vamos vadiar, vadeia mano, vadeia, deixa o senhor vadiar, eu vou vadiar na barra, (responde) eu vou vadiar, você não vai, (responde) eu vou vadiar... – o mestre completa
dizendo – “os meninos não me deixam mentir, de vez em quando marco uma vadiação com outras brincadeiras pra eles verem que está tudo enraizado”. Seus ensinamentos demostram uma memória celular e que é resgatada por meio das atitudes mais simples como também na forma de sentar, de andar, e a capacidade de compreender os significados e sentidos que o corpo traz de experiência quando estão influenciados pelas músicas que são tocadas na capoeira angola, através dos movimentos
ele observa que “ o tombo do magúi (mergulhão) do cavalo-marinho parece muito com a tirada de rasteira da capoeira angola, até a interpretação de como surgiu é parecida, não é igual, mas parte do mesma intenção, no cavalo-marinho esse movimento é a forma de pegar o facão com as mãos pra cortar a cana, na capoeira é a forma de tirar a perna da/do camarada que queria passar a rasteira ou o facão de cortar a cana em mim, ai eu tiro com meu pé pra não cair ou não passarem o facão em mim. E no passo do frevo tem um bocado, vamos pegar um simples, o passo do tubarão, tem a mesma preparação que a cabeçada da capoeira angola, só muda o que faz depois, que é passar a sombrinha de uma perna pra outra por baixo como floreio ou dar mesmo a cabeçada”. Falando só de capoeira angola, existem movimentos básicos e avançados que são
apresentados o porquê desse nome – ’chapa de frente’ é um movimento que lembra o empurrão, é um mecanismo de defesa muito comum, pois parte do mesmo princípio tanto para seres humanos quanto para animais, em exemplo o chute de um canguru, no caso dele se faz com as duas pernas, já no caso do ser humano se faz com uma perna só; ‘meia-lua’ é um movimento que forma um semicírculo, caso desenhado no chão com a ponta do pé vê-se desta forma, e lembra a um arco-íris; ‘cabeçada’ é um movimento inspirado nos animais que tem como defesa a cabeça, é ao mesmo tempo uma arma de ataque bem eficaz. Para uma boa explicação, a uma observação importante, que é imaginar alguém a sua frente e tentar executar o movimento abaixo:
“chapa de frente: primeiro o pé direito está atrás e o pé esquerdo na frente; agora levante a perna direita que está atrás, projetando-a para frente como se fosse empurrar alguma coisa, para frente. Faça esse empurrão com o pé e, deixe a perna deste chute bem esticada para manter o movimento bem bonito. Ele tem um alcance do tórax”.
Além destes movimentos, existem outros que compõem o que é capoeira angola, identificada geralmente pelos planos médio e baixo, sendo diferenciada de outras formas de capoeira, como também por nomes distintos. Outra característica muito importante é o
respeito que se tem para com o chão (a terra), “saudar o chão faz parte do nosso natural, se toca o chão para ficar mais protegido e para neutralizar alguma energia, e cada um faz o seu símbolo de proteção” , revela o mestre.
Na transmissão de saberes do Mestre Jorge Ferreira, ele ensina sobre a importância de conhecer as características de outros tipos de jogos, observados através de toques e, na formação da bateria de outros grupos/escolas/projetos/etc., dizendo que “independente do que
você aprendeu das movimentações na capoeira angola, é importante saber das outras formas de capoeiras que existem e como saber entrar e sair delas. Jogue o jogo que você aprendeu. Mas estejam bem atentos a
tudo em outras casas
” . Como por exemplo vale sempre perguntar: ‘Qual a formação de bateria? Quais os toques de cada instrumento e, a ordem de entrada, como e em, que momento se toca cada, dependendo do que vai ser cantado? Qual a ordem de graduação da corda? Quais os termos utilizados como códigos de identificação utilizados por eles? Se na hora do jogo pode ser comprado ou não o jogo?’ dentre várias inquietações é valido perguntar, pois são essenciais para não se estar fora das normas de cada ambiente visitado, isto porque a capoeira é muito diversificada. ‘Sendo arte, a capoeira se modifica e preserva
em sua própria estrutura o conceito mais arcaico e Bantu de movimento: para os Bantu, especialmente os Congo, viver é um processo emocional, de movimento. Viver é movimentar, e movimento é aprender’ . (BARROS, 2002). Outra forma de contribuir no conhecimento do outro é a realização de cortejos, faz parte da tradição, os capoeiristas percorrerem as ruas da região com o objetivo de saudar e chamar a sociedade para atuar junto a uma causa, que seja só de acompanhar, de fé, de respeito, de celebrar algo, os encontros de identidade, como também a afirmação de tudo o que existe no, e do presente, mas também do passado e do futuro. Esta celebração em especifico, já reuniu crianças que tem muita curiosidade e, idosos que andam e fazem suas preces com um rosário nas mãos. Os dias são variados, mas são realizados geralmente em datas de muita importância. Como já mencionada antes, a Ação Memorial Cultural ProCAEP voltada para educação patrimonial com mesas redondas, exposições fotográficas e audiovisuais, visitas mediadas, ações educativas, oficinas e palestras. É um museu itinerante, do tipo vivo, que conta com a participação dos capoeiristas do Projeto no seu funcionamento, seu objetivo é de estar mais próximos das histórias de outros olhares para a capoeira, como bem (re)encontradas, pelas zonas da mata sul, norte e sertão pernambucano, através do desenvolvimento das atividades acima, na forma de dialogar com outras manifestações culturais e pessoas não praticantes, o reconhecimento por suas lembranças de parentes e amigos de quem já praticou capoeira, e, outros sem ter ligações diretas com personalidades praticantes da região metropolitana do Recife. Tendo como resultado depoimentos de
pessoas que se dizem ter ‘dançado capoeira’. Vale ressaltar que essa iniciativa se dar por uma metodologia do tempo no processo do presente, esse molde faz com que ressurjam e permaneçam as reminiscências tornando-as reais e realizadas. Estes encontros extra espaço físico e sistemático, onde outros capoeiristas vivenciam a prática o contato com outras maneiras de expressões e celebrações, é uma força tarefa de fazer com que pessoas queiram agora, poder afirmar também que são capoeiristas. Este seu método de transmissão é estruturado principalmente pela tradição oral, pelas observações, pelas pesquisas territoriais, textuais e bibliográficas, por essa ótica, a educação capoeirística e de natureza do Mestre Jorge F., enquanto conhecimento abrange o estudo de qualquer processo, situação e/ou contexto que ocorra esta transmissão de saberes, habilidades, significados e outros aspectos sobre sua metodologia. A singularidade no que tange a transmissão do conhecimento do mestre, estabelece, sobretudo, na aprendizagem individual, em declarações dos praticantes, é percebido que tem um grande melhoramento da respiração, na coordenação e no convívio social. De mesmo modo os não praticantes reportam suas reminiscências através do observar, em poder ver a ação acontecendo, em poder participar lembrando, de já ter visto essa prática em algum lugar. Ao mesmo tempo praticantes e não praticantes, de forma estruturada, aprendem a partir de trocas de sabres, participando e ouvindo ativamente na troca das experiências. A forte presença da prática coletiva faz com que a reflexão individual esteja em constante questionamento, ficando evidente que “ouvir a sua respiração”, “a respiração
do outro no treino e no jogo”, “receber bem todas as pessoas”, “imitar o outro tocar”,
“ouvir a si mesmo o que tem a dizer”, “ouvir o que o outro tem a dizer” “fui dançar coco e
ouvi os corridos que a gente canta na capoeira” “brinquei cavalo-marinho e vi as capoeiras” e “compartilhar momentos” são as principais formas de aprender.
Como bem relatado a tamanha consciência de sua prática, o autoconhecimento sobre sua própria natureza, e da natureza de tudo que faz parte celular do ProCAEP, é esta a maneira que o Mestre Jorge Ferreira busca através de sua metodologia de ensino transmitir a futuras gerações, preocupando-se do qual legado deixará. Em síntese, a compreensão dos processos, situações, e estratégias, de forma particular as suas maneiras de compartilhar, é tão singular, que favorece reflexão quando ele diz: “O ato/ação de ensinar
(fazer conhecer por um signo) dilata o presente; transmitir (fazer chegar alguma coisa a alguém) preserva o passado; e aprender (aprender pelo espírito / adquirir conhecimentos para si) harmoniza o futuro, a orquestração da vida.”