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JULIA MARTINI

25 ANOS, 4 ANOS DE PATINS, JULIA MARTINI / @JULIAAMARTINI

Como você começou sua jornada no patins? Existe alguma história específica que tenha te inspirado a começar?

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Quando pequena, patinava apenas na brincadeira mesmo. Quando fui fazer faculdade em Floripa, um dia peguei um patins emprestado para andar nas ciclovias e achei o máximo. Logo, comprei um (bem simples) e era um lazer nos meus horários de folga patinar nas ciclovias da beira-mar, isso em 2017 e 2018, e patinava apenas linha reta, normal. Foi em 2020, quando decidi comprar um patins novo e melhor na Go Roller (depois de terem roubado meu antigo), que eu realmente comecei a andar mais. Mas o momento que iniciou mesmo minha história na patinação foi na pandemia. A pandemia chegou e foi um baque para todos. No meu caso, foi bem impactante, sempre fui muito ativa e me fazia muita falta sair de casa. O patins nesta época foi a minha válvula de escape, era o momento mais esperado e o melhor momento do meu dia. Me relacionei com um patinador profissional nesta época, e o amor que eu via nele pelo patins me inspirava e me inspira. Foi neste momento também que tive proximidade com o mundo e o esporte da patinação, e foi onde eu comecei a entender o patins como um esporte mesmo, e assim, fiquei apaixonada, me encontrei ali. E bom, dali em diante, foi só ladeira abaixo rsrs. O patins é viciante, sempre tem algo novo para a gente aprender, iniciei na modalidade do street e curti muito também. Enfim, o patins para mim é muito mais que um esporte, é um remédio. Eu sou uma pessoa que leva a patinação na vida com muita constância, patino se posso todos os dias e com muito tesão. Meu foco não é ser melhor que ninguém, mas sim, ser melhor que eu mesma todos os dias, e isso naturalmente leva ao desenvolvimento de habilidades no esporte, e principalmente, a sustentabilidade.

Sabemos que a motivação é uma peça fundamental para se destacar em qualquer esporte. Quais são suas principais motivações para continuar praticando patins?

A minha maior motivação é a paixão, como disse, levo o esporte da patinação como algo divertido, como um momento de muito prazer. Não crio expectativas e nem me comparo a ninguém, apenas faço meu rolê com muita constância e amor. O resto tem fluído.

Além do patins, quais são suas principais paixões ou interesses na vida pessoal? Como você equilibra suas atividades fora do esporte com o treinamento e competições?

Aí está um grande ponto. Tem outra grande paixão na minha vida, que é o café. Atualmente, eu estou tentando lidar com muitas demandas e atividades paralelas. Estou fazendo hoje um mestrado na UFES na área de fermentação de cafés e faço parte de um centro de pesquisa em cafés chamado Coffee Design. Trabalho em uma torrefação e rede de cafeterias aqui de Vitória-ES, chamada Terrafé. Atuo com serviços a distância de engenheira química (minha formação), em uma indústria chamada MM Química. Sou representante da Go Roller, onde dou suporte de patinação aqui na região onde moro e, por fim, atualmente lancei minha marca de roupas, a Roller Coffee, uma marca que junta as minhas duas grandes paixões. E apesar de todas essas demandas, o patins ainda está diariamente na minha vida. Vou e volto patinando ao trabalho, e todo fim de dia eu tenho o compromisso de lei que é ir à pista patinar. O patins já é uma atividade diária, como escovar os dentes, minha pílula que tomo todos os dias para ficar bem. Atualmente, o meu foco não é competir, a não ser que a competição seja próxima a mim. Eu tenho muito mais uma vontade de fomentar o esporte, dar visibilidade, ter minha marca e ter o poder de colocar este esporte em evidência, apoiar atletas. Mostrar ao fim às pessoas que o patins salva, que o patins é remédio, que o patins é um esporte sério, que o patins é muito mais que uma brincadeira de criança. Poder ser um exemplo, para mim é gratificante ver alguém podendo experimentar tudo de bom que a patinação, o esporte, faz de bem nas nossas vidas.

O cenário feminino no patins tem evoluído nos últimos anos. Como você vê essa evolução e quais são as maiores conquistas alcançadas pelas atletas femininas até agora?

Com certeza. Eu acho que a visibilidade do patins tem crescido muito nos últimos anos. E tem muitas mulheres fodas crescendo na cena. Ultimamente, temos tido muitas conquistas de mulheres brasileiras em campeonatos, as mulheres têm se destacado, ganhado competições. Dou exemplo da Nicoly Machado e Tais Colares, atuais campeãs sul-americanas no Street.

A representação das mulheres no esporte é de extrema importância. Como as marcas têm apoiado o cenário feminino no patins e quais ações você acredita que ainda precisam ser tomadas?

Temos visto grandes marcas do mercado apoiando as atuais mulheres que têm grande destaque, a grandes marcas como a USD, Razors. O meu ponto neste caso é que a quantidade de atletas se destacando não é correspondente à quantidade de marcas interessadas em apoiar o esporte. Por isso, eu acredito que hoje, o incentivo também deveria ser não apenas no esporte, mas também no empreendedorismo. Para que mulheres possam crescer no esporte, a melhor coisa é termos mulheres empreendendo também neste nicho, para que seja sustentável, para que a conta feche.

Quais foram os desafios que você enfrentou ao longo da sua jornada como atleta de patins feminino e como você os superou?

Acho que meu grande desafio sempre foi e é, lidar com minha alta carga de demandas da vida e ainda sim, querer fazer com que o esporte fizesse parte dela. A minha superação, como disse, foi ressignificar o meu espaço no esporte. Hoje, eu sei que com minha alta carga de demandas, não posso ser uma atleta renomada. Já que, o trabalho de preparação de um atleta de alta performance é duro, leva tempo e dedicação. E na minha vida, eu levo ele de forma constante, leve, continuo sendo uma profissional do patins. Porém, em outras áreas. Posso não ser a atleta que vai ganhar um campeonato brasileiro, mas posso sim ser a atleta que incentiva e apoia meninas a serem.

Sabemos que muitas vezes a pressão social e as expectativas podem afetar os atletas. Como você lida com a pressão e o estresse em sua carreira no patins?

Como a minha carreira no patins sempre foi muito mais influência, acredito que as pressões foram sempre muito mais do mostrar, fazer vídeos, sendo que eu só queria mesmo patinar, sabe? E eu sempre lidei colocando como prioridade o continuar patinando. Naturalmente, o patinar já era minha solução, meu alívio.

Quais são seus maiores objetivos no patins para o futuro próximo e a longo prazo? Existe algum sonho ou conquista específica que você deseja alcançar?

Olha, eu tenho muita vontade de participar de campeonatos. Aqui no Espírito Santo, sinto que o patins está crescendo agora como um esporte e tenho muita vontade de ganhar um campeonato estadual. Porém, meu grande foco e sonho, como já comentei, é fazer com que minha marca cresça e que eu possa um dia incentivar, apoiar, patrocinar patinadoras, patinadores, campeonatos. Fazer com que a cena do patins cresça e se fortaleça como um esporte forte e sério.

O patins pode ser uma atividade inclusiva e divertida para pessoas de todas as idades. Quais são os conselhos que você daria para aquelas mulheres que desejam começar a praticar patins, independentemente da idade?

Seria que, vale a pena. No início sempre vai ser um pouquinho mais difícil para pegar o jeito, é muita coisa para pensar ao mesmo tempo, porém, depois de um tempo, você pega o jeito. E a sensação de patinar, é incrível, vale muito a pena. Uma dica que sempre dou é usar desde o início equipamentos de proteção. Pois, no início é natural ter mais quedas, e as proteções evitam lesões que acabam desmotivando e gerando traumas em muita gente. Equipamentos de proteção são essenciais para a evolução e sustentabilidade no esporte da patinação. Como sua família tem apoiado sua jornada como atleta de patins? Eles sempre te apoiaram nessa escolha ou enfrentaram algum tipo de resistência no início?

Quando comecei, já era maior, morava sozinha. Logo, minha família nunca foi um ponto que ajudou/atrapalhou. Na verdade, eles no começo tinham um pouco de receio em me machucar, mas eles confiavam e sabiam que sempre usava os equipamentos de proteção certinho. E minha família sempre foi de não interferir em minhas escolhas, já que, minhas escolhas, minhas consequências também. Se errar, se machucar, levanta, reflete sobre o erro, aprende e tenta de novo.

Por fim, como você acredita que o patins pode impactar positivamente a vida das mulheres e quais benefícios você pessoalmente obteve com a prática do esporte?

Acredito que o patins é uma prática esportiva libertadora. Nos benefícios, tem os pontos óbvios de melhora da saúde por conta de fazer um exercício físico, melhora na disposição, energia, autoestima. Mas, o patins acredito que traz mais que isso, ele nos traz companhia, nos faz fazer conexões, amizades. E, acredito, que principalmente, nos ensina a acreditar que somos capazes, no nosso potencial. A sensação de realizar uma manobra, depois de tentativas e quedas, é tão, mas tão revigorante. Que faz a gente levar essa confiança para a vida. No caso das mulheres acredito ser muito mais impactante pelo ponto de a estrutura da sociedade naturalmente nos fazer ser inseguras, duvidar da nossa capacidade, e assim, posso dizer com certeza, que mulheres são fodas, e têm um espaço muito grande dentro da patinação. Estar nessa cena, é muito motivante, ver mulheres se destacando é muito gostoso. Lugar de mulher é onde ela quiser, e estar mostrando nossa força dentro dos esportes radicais, é em si, muito impactante na vida de qualquer mulher.

FOTÓGRAFO: MILENA WOODEN - @TRANSCLICANDO

MANOBRA: SALTO GREBADO EM QUARTER

Como você descobriu sua paixão pelo patins e o que te motivou a se tornar um atleta profissional nesse esporte?

Eu vim de uma comunidade muito carente em Itaquera, zona leste de São Paulo. Nos anos 2000, tive meu primeiro contato com os patins por meio de um amigo do bairro, que possuía um par simples desses que eram vendidos na maioria dos supermercados aqui do Brasil no final dos anos 90. Na época, eu tinha 11 anos de idade e nós dividíamos o mesmo par de patins, cada um utilizando um pé, já que tínhamos números de calçados diferentes. Foi somente mais tarde, quando esse mesmo amigo me ajudou a comprar um par de patins usados, que finalmente comecei a andar com meu próprio par nos pés, sempre que eu queria. E assim se passaram mais de 20 anos, não é mesmo?

Quais foram os principais desafios que você enfrentou ao longo de sua jornada como atleta profissional de patins e como você os superou?

Os desafios? Nós vivemos o esporte, mas não temos o suporte necessário, o que sempre foi uma dificuldade conciliar estudos, trabalho e manter um alto nível no patins. Porém, adoramos viajar, gravar vídeos e curtir com amigos, algo que o patins nos proporcionou. Para contextualizar, resumindo a história do patins street nos anos 90 e 2000, tivemos o auge do nosso esporte, com uma indústria bilionária. No entanto, nos anos seguintes, enfrentamos uma decadência. Acredito que, após 2019, estamos em ascensão novamente. Sou da fase em que o patins representava resistência, mas hoje o cenário está mudando, e a nova geração está recebendo apoio de patrocinadores e dos pais, o que é muito importante. Temos patinadoras com menos de 13 anos sendo campeãs mundiais, e outro jovem de 17 anos que ficou em segundo lugar no campeonato mundial na Argentina. Portanto, acredito que estamos vivendo a melhor fase de nosso recomeço no Brasil. Além disso, tive o desafio de romper o ligamento do joelho, mas superei isso em apenas 9 meses e voltei às pistas novamente, com muita determinação e amor pelo esporte.

Quais são os lugares mais extraordinários que você já teve a oportunidade de explorar e praticar patins? Existe algum local em particular que você sonha em conhecer e andar de patins?

De vários lugares, até hoje, a viagem dos sonhos que não sai da minha mente foi para Lima, Peru. Fiquei lá por três meses, patinando e me divertindo com a incrível galera local, que tinha uma energia surreal. Confesso que foi difícil voltar para o Brasil. Agradeço ao meu patrocinador da época por ter me proporcionado as melhores férias. O pôr do sol em Miraflores é lindo.

Você já participou de competições ou eventos relacionados ao patins?

Se sim, poderia contar-nos sobre alguma experiência marcante?

Eu prefiro falar sobre o presente. Nos últimos 20 anos, muitas coisas aconteceram, mas vou me concentrar em memórias mais recentes. Recentemente, gravei o Campeonato Sul-Americano de Patins Freestyle, uma competição de patins street. Além disso, hoje em dia, tenho minha própria produtora audiovisual, que foi área que o patins me fez ter curiosidade. Presenciei um campeonato brilhante, com a participação de pessoas de vários países. A nova geração do patins está se destacando e se fortalecendo cada vez mais. Estamos nos organizando para uma possível entrada nas Olimpíadas no futuro. É empolgante ver como o esporte está evoluindo e se tornando reconhecido em âmbito internacional.

Além das manobras mais técnicas, qual é a manobra que você considera a mais emocionante e que proporciona uma experiência única ao praticar patins?

Para mim, fazer grind em correntes é uma experiência verdadeiramente emocionante e única no mundo do patins. É uma manobra que exige habilidade, equilíbrio e coragem, pois você desliza pelas correntes com destreza, desafiando a gravidade e superando os obstáculos. A sensação de deslizar suavemente sobre as correntes é indescritível, é como se você estivesse flutuando no ar, sentindo a adrenalina correndo pelas veias a cada movimento. A cada tentativa, a emoção é renovada, e você se sente conectado com a energia do ambiente ao seu redor. A combinação de desafio, liberdade e a sensação de dominar a gravidade tornam essa manobra uma verdadeira obra de arte sobre rodas. É um momento em que o tempo parece parar, e você se sente em total sintonia com o patins, criando uma experiência inesquecível que é impossível de ser reproduzida em palavras. Para mim, fazer grind em correntes é a essência do patins street, a magia que nos mantém apaixonados pelo esporte, e a motivação para continuar explorando novas possibilidades e desafiando os limites do que é possível fazer sobre rodas. É uma experiência que me faz sentir vivo, livre e inspirado, e é por isso que sempre busco essa sensação inexplicável ao praticar patins.

Como você equilibra a pressão de competir em eventos de alto nível com a necessidade de se divertir e manter a paixão pelo patins?

Sempre mantendo a paixão pelo esporte, há mais de 10 anos tenho aplicado a regra de diversão em primeiro lugar, tenho me dedicado a isso. Mesmo que eu tenha participado de competições, meu foco sempre foi a diversão em primeiro lugar. Eu competia, mas não era o meu principal objetivo

FOTÓGRAFA : KALLEO HIPÓLITO

MANOBRA: SOUL GRIND - CORRENTE