ALGARVE INFORMATIVO #89

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ALGARVE INFORMATIVO 24 de dezembro, 2016

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EC TRAVEL É a melhor PME de Portugal na área dos «Serviços»

Estátuas Vivas de Natal em Lagoa | Turismo Gastronómico Sustentável ALGARVE INFORMATIVO #89 1 FormAlgarve quer combater emprego precário | Caravela Startup Algarve


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8 - FormAlgarve 16 - EC Travel 24 - Caravela Startup Algarve 44 - Turismo Gastronómico Sustentável 52 - Hélder Farroba 62 - Estátuas Vivas em Lagoa

OPINIÃO 6 - Daniel Pina 30 - Paulo Cunha 32 - José Graça 34 - Mirian Tavares 38 - Cristiano Cabrita 40 - António Manuel Ribeiro 42 - Augusto Lima

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Que venham mais anos assim!!! Daniel Pina chegada a altura para os habituais balanços de fimde-ano e admito que, desta vez, não tenho grande razões para ser rabugento. 2016 é o primeiro ano civil completo de edições da Revista Algarve Informativo e tem sido uma bela aventura. Uma aventura cansativa, pois não é fácil fazer uma revista semanal, ainda por cima um projeto jornalístico que, como se costuma dizer, é um «one man show». Com os contributos inestimáveis da família de cronistas que semanalmente partilham as suas opiniões e visões da atualidade com os milhares de leitores do Algarve Informativo, mas o grosso do trabalho é feito por um indivíduo que preferiu arriscar a solo do que trabalhar em regime de freelancer para outros órgãos de comunicação social. O blog do Algarve Informativo vai, igualmente, de vento em popa e deve terminar o ano de 2016 perto do milhão e 200 mil visualizações. Dizem os especialistas na matéria que, para um blog/site que não publica qualquer notícia de teor negativo, são números bastante positivos. Eu também partilho dessa opinião, modéstia à parte. E fica também provado que um órgão de comunicação social não precisa viver exclusivamente dos desastres, das tragédias, dos infortúnios, que nos rodeiam. Obviamente que todas essas notícias são importantes e não podem ser ocultadas, mas no Algarve Informativo não entram acidentes na EN 125, mortes, casos de violência doméstica, apreensões de droga, de armas, de produtos contrafeitos ou de pescado ilegal. É um projeto que, desde o início, se dedicou a divulgar o que acontece de bom neste nosso Algarve e, felizmente, não faltam notícias positivas para gerar milhares de visualizações diárias no blog, nem histórias felizes e casos de sucesso para preencher as páginas da revista semanal. Nada disto seria possível, contudo, sem publicidade e aqui fica o meu muito obrigado às câmaras municipais que apoiam o Algarve Informativo praticamente desde o arranque do projeto, bem como às empresas que se foram juntando à família de anunciantes desde então. Como se costuma dizer no meio futebolístico, “só faz falta quem cá está” e o resto é conversa. Cada um faz publicidade onde bem lhe apetece, do mesmo modo que um órgão de comunicação social isento e independente só faz os trabalhos que bem lhe apetece, de acordo com o seu estatuto editorial, com o perfil dos seus leitores e com o interesse jornalístico que o acontecimento tenha ou não.

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Convém esclarecer que esta «bicada» não tem como alvo as poucas câmaras municipais que não apoiam o Algarve Informativo. Sei perfeitamente que os orçamentos de comunicação não são iguais em todas as autarquias e também sei que alguns concelhos não têm uma vida cultural, desportiva, associativa e por aí adiante tão ativa que justifique fazer publicidade todas as semanas. Aliás, nem sequer pedi apoio a todas as câmaras municipais do Algarve e, como é fácil constatar, aqui não há misturas entre o departamento comercial e a redação, portanto, não se censuram notícias que digam respeito aos municípios que não fazem publicidade. É assim que deveria ser o jornalismo, embora, infelizmente, nem sempre assim aconteça no mundo real. A minha «bicada» vai essencialmente para as grandes superfícies comerciais do Algarve, que continuam a pensar que podem fazer o que bem lhes apetece da imprensa regional. Desculpem lá o «recado» mas a culpa é vossa, depois de me terem infernizado a vida durante dias por causa da porcaria da «Black Friday» e, mais recentemente, devido aos eventos alusivos ao Natal. A história é sempre a mesma: a imprensa regional não é um meio estrategicamente interessante para gastar dinheiro em publicidade, seja ela online ou em papel. O dinheiro dos grandes centros comerciais está reservado para as revistas de carater nacional. O problema é que essas «grandes» revistas nacionais não perdem tempo com as notícias do dia-a-dia desses centros comerciais, querem lá saber das «Black Friday’s» e «Natais» que vão acontecendo. E duvido muito que as agências de comunicação andem constantemente a chatear essas redações para saber se vão publicar esta ou aquela nota de imprensa. As redações da imprensa regional, todavia, são bombardeadas com esses telefonemas e e-mails porque, para publicar as notícias à borla, já somos estrategicamente um meio importante. Pronto, está o recado dado e não perco mais tempo com isso. A época é de festa e, voltando ao princípio da conversa, só posso estar contente com o primeiro ano a sério do «Algarve Informativo». Projetos para 2017 são muitos, assim como as palavras de agradecimento, mais uma vez, aos cronistas, aos anunciantes e, claro, aos leitores. Bom Natal e Feliz Ano Novo para todos! .

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Desidério Silva, presidente da Região de Turismo do Algarve, Ana Mendes Godinho, Secretária de Estado do Turismo e Miguel Cabrita, Secretário de Estado do Emprego

Secretários de Estado vieram ao Algarve para combater a precariedade do emprego sazonal Ana Mendes Godinho e Miguel Cabrita, respetivamente os Secretários de Estado do Turismo e do Emprego, vieram ao Algarve, no dia 16 de dezembro, para dar o pontapé de saída ao «FormAlgarve». O programa conjunto do Turismo de Portugal e do Instituto do Emprego e Formação Profissional visa diminuir a precariedade do emprego na região algarvia através de ações de formação que conduzam ao incremento dos contratos de longa duração. Texto:

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sede da Região de Turismo do Algarve foi palco, no dia 16 de dezembro, da apresentação do «FormAlgarve», um programa que surge da constatação de que a sazonalidade da atividade turística no Algarve tem contribuído decisivamente para os baixos níveis de qualificação e para a elevada precariedade do emprego da região. Em simultâneo, o Turismo de Portugal e o Instituto do Emprego e Formação Profissional entendem que a chamada «época baixa» deve constituir uma oportunidade para a melhoria da qualificação dos trabalhadores e que a redução desta sazonalidade passa, igualmente, pelo investimento na formação dos profissionais das atividades complementares ao turismo. Acreditando que a redução da precariedade e a formação contínua têm

um impacto positivo na produtividade dos trabalhadores e na competitividade das empresas, o programa assenta na concessão de um apoio financeiro à conversão de contratos de trabalho a termo certo ou incerto em contratos de trabalho sem termo e à renovação de contratos a termo certo por um período mínimo de 12 meses. Para tal ser possível, pretende-se dinamizar, durante a época baixa, um programa de qualificação de trabalhadores e promover o estabelecimento de relações contratuais mais estáveis que levem à melhoria da competitividade e da produtividade dos setores mais afetados pela sazonalidade da região do Algarve. O programa não é novo, mas sim uma evolução de outros como o «+Algarve» e «Formação Algarve», mas apresenta uma maior estabilidade legislativa; está

Desidério Silva, presidente da Região de Turismo do Algarve

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Ana Mendes Godinho, Secretária de Estado do Turismo

focado no estímulo ao estabelecimento de relações contratuais estáveis e no apoio à contratação sem termo; existe uma coresponsabilização dos operadores públicos de formação (IEFP e Turismo de Portugal); e há uma centralidade dos processos de RVCC na definição dos percursos formativos. Ao programa podem-se candidatar todas as empresas privadas com fins lucrativos, com sede no Algarve e cuja atividade principal esteja relacionada com a hotelaria, restauração, turismo, comércio e construção civil, entre outras. Durante a sessão de apresentação, Desidério Silva não tem dúvidas de que o «FormAlgarve» vem dar uma resposta mais capaz às necessidades do setor no que concerne à formação dos recursos humanos, fator primordial para se manterem os excelentes resultados ALGARVE INFORMATIVO #89

alcançados ao longo de 2016. De facto, o valor acumulado das dormidas de janeiro a outubro ultrapassou pela primeira vez a fasquia dos 17 milhões de pernoitas, mais 8,6 por cento do que no período homólogo do ano anterior, quando o total de 2015 foi de 16,6 milhões. Nos proveitos totais da hotelaria regional, a subida foi ainda mais acentuada, para cerca de 863 milhões de euros, um aumento de 19,1 por cento face aos dez primeiros meses de 2015, que terminou com cerca de 758 milhões de euros. Finalmente, até outubro, o Algarve também registou mais hóspedes do que em todo o ano anterior e alcançou um valor 9,8 por cento acima do verificado no período homólogo, ou seja, cerca de 3,8 milhões hóspedes em dez meses, contra 3,66 milhões de hóspedes em todo o ano passado. 10


Para o presidente da Região de Turismo do Algarve, a hospitalidade, a afabilidade e o saber-receber são mais-valias incontestáveis para o Algarve, mas é precisamente o capital humano que está mais pressionado face à sazonalidade da atividade turística. “Este programa tem a dupla virtude de contribuir para elevar o nível de qualificação dos profissionais do setor e atuar sobre a redução da precariedade desses mesmos trabalhadores. É com agrado que registamos a atenção governativa dedicada às questões da formação e da qualificação dos recursos humanos, pois é por esta via que se criam condições para um desenvolvimento sustentável de um destino”, frisou Desidério Silva. O responsável destacou ainda o esforço colocado na dinamização das Escolas de Hotelaria e Turismo, que são referências importantes para todo este setor da economia nacional e regional. “Se não tivermos pessoal competente e qualificado, o Algarve, que compete com centenas de outros destinos pelo mundo fora, perde dinâmica e qualidade. Os outros concorrentes não estão a dormir e nós temos que apostar na qualidade dos serviços que prestamos, dos nossos equipamentos hoteleiros e dos nossos recursos humanos”, defendeu Desidério Silva.

Algarve a crescer na época baixa Satisfeita pela concretização do «FormAlgarve» estava Ana Mendes

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Godinho, que também recordou os números recordes atingidos pela atividade turística nacional em geral, e pelo desempenho do Algarve em particular. “Desde cedo que percebemos que era preciso fazer alguma coisa para que o turismo deixasse de ser aquela atividade sazonal que todos conhecemos, muito associada à precariedade no emprego e a assimetrias na ocupação anual. Toda a nossa energia foi direcionada para tornar o turismo numa atividade sustentável ao longo de todo o ano e de todo o território nacional”, afirmou a Secretária de Estado do Turismo. Com Portugal a ter, até outubro, mais quatro milhões de dormidas em relação a 2015, a governante revela que mais de 65 por cento do crescimento registado no Algarve aconteceu durante a época baixa, sinal de que vale a pena trabalhar, por exemplo, no reforço da capacidade aérea para a região. “Tivemos mais 36 operações aéreas para o Algarve este ano, mais 110 mil novos lugares, e isto traz resultados. Também fomos ter com os operadores, ao invés de ficarmos à espera que eles viessem ter connosco, para garantir que tenham conhecimento do que se passa no Algarve durante todo o ano, e não apenas do tradicional «sol e praia». Houve igualmente uma grande aposta na diversificação da oferta, no golfe, walking, cycling ou birdwatching, mas também na cultura, com o «365 Algarve» a oferecer mil eventos entre outubro

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Miguel Cabrita, Secretário de Estado do Emprego

de 2016 e maio de 2017”, apontou Ana Mendes Godinho.

durante a época baixa”, disse Ana Mendes Godinho.

Contudo, apesar dos bons resultados, ainda há muito para fazer, na opinião da Secretária de Estado do Turismo, e a qualificação e valorização das pessoas é ponto-chave nessa agenda. “As escolas de hotelaria e turismo são fundamentais, a de Faro está a receber as intervenções que há muito tempo desejava e vamos ter uma nova escola em Portimão”, destacou, reforçando a aposta do «FormAlgarve» na promoção dos contratos duradouros. “Não queremos que isto seja um mecanismo expedito para encaixar as pessoas sem verdadeiramente as qualificar. Ao mesmo tempo, queremos as escolas de hotelaria e turismo viradas para o exterior, a trabalhar com o IEFP, para formar os recursos humanos da região

Pegando nos dados apresentados por Desidério Silva e Ana Mendes Godinho, o Secretário de Estado do Emprego, Miguel Cabrita, confirmou que o turismo tem contribuído, de forma decisiva, para a evolução positiva que se tem sentido no plano do Emprego. “Nunca podemos estar satisfeitos, mas o progresso dos principais indicadores foi muito relevante e até melhor do que era vaticinado no início de 2016. Estamos há vários meses abaixo dos 500 mil desempregados, um marco simbólico que foi ultrapassado, pela primeira vez, em 2009”, lembrou o governante, acrescentando que, ao contrário do que acontecia anteriormente, em setembro e

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outubro verificou-se ainda um recuo das taxas de desemprego. Em termos do Algarve, a taxa de desemprego, no terceiro trimestre, era de 7,3%, contra os 10,5% da média nacional, pelo que Miguel Cabrita acredita estar-se no bom caminho, embora os desafios a enfrentar sejam bastante complexos. “O «FormAlgarve» insere-se numa dimensão muito mais ampla da intervenção das políticas ativas de emprego e temos um compromisso bastante forte com as políticas de apoio, quer ao emprego, quer à formação profissional, embora os recursos sejam escassos”, notou Miguel Cabrita. “A seletividade é um dos pontos mais importantes da nossa reorientação das políticas de emprego no que toca, por exemplo, aos estágios e aos apoios à contratação, para se criar um emprego mais efetivo e sustentável e para um maior direcionamento para contratos mais prolongados”, acrescentou. Miguel Cabrita explicou que a existência de mais contratos sem termo é importante para as finanças públicas e para a Segurança Social, já que 60 por cento dos novos subsídios de desemprego se devem, precisamente, ao fim de contratos a termo. “Tivemos, na viragem do século, um conjunto de planos regionais de emprego na área do Porto, do Alentejo, da Península de Setúbal, com problemas muito específicos e dramáticos, mas que não deram os resultados desejados. A época baixa no Algarve é, felizmente, cada vez menos «baixa», fruto do trabalho dos empresários, da RTA e do Turismo de

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Portugal. Hoje, a região é bem mais dinâmica ao longo de todo o ano, mas os desafios da sazonalidade não desapareceram e isso reflete-se, como é natural, no emprego”, observa o Secretário de Estado do Emprego. Desenvolver respostas ajustadas às várias realidades regionais é um princípio subjacente ao «FormAlgarve», que vai aprofundar, assim, a experiência de programas anteriores. “Não partimos do zero, nem deitámos fora aquilo que existia. Avaliámos resultados e procurámos encontrar, com os diversos atores, respostas que correspondessem às expetativas de cada um e às políticas públicas que temos para o mercado de trabalho. Queremos que as empresas mantenham os trabalhadores e que estes, na época baixa, possam ser canalizados para a formação profissional”, indicou Miguel Cabrita. “É um dever do Estado procurar diminuir os riscos inerentes a uma região fortemente marcada pela atividade turística e pela sazonalidade. O «FormAlgarve» não tem a ambição de resolver todos os problemas do emprego e da formação na região, mas haverá um diálogo permanente com as entidades públicas e com os representantes do setor, e não existirão intermitências nem incertezas neste programa, para garantir uma resposta mais estrutural e prolongada ao longo do tempo” .

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EC TRAVEL É A MELHOR PME PORTUGUESA NO SETOR DOS «SERVIÇOS» Depois de ter ultrapassado, mais uma vez, o volume de negócio e os lucros do ano transato, a EC Travel termina 2016 da melhor maneira, ao ganhar o prémio de melhor PME de Portugal na categoria de «Serviços». Após receber o prestigiado galardão atribuído pela Revista Exame, muitas foras as entidades oficiais a endereçarem os parabéns a Eliseu Correia, mas o empresário foi rápido a «descer das nuvens» porque o objetivo é que 2017 seja ainda melhor do que o ano que agora finda. Texto:

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equipa da EC Travel ainda estava a recuperar dos festejos do 6.º aniversário, comemorado a 3 de dezembro, quando Eliseu Correia recebeu uma prendinha de Natal antecipada, ao saber que a empresa foi considerada pela Revista Exame como a melhor PME de Portugal na área dos «Serviços». Atribuído desde 1995, em 22 categorias, não há memória de que este prestigiante prémio alguma vez tenha rumado ao Algarve, confirmando assim a ascensão meteórica da jovem EC Travel numa difícil e competitiva atividade como o turismo. “Estar nas primeiras mil, no meio de um milhão e 200 mil pequenas e médias empresas, já era bastante bom. Ter subido, em 2015, para as primeiras 400, foi espetacular. Este ano, sabíamos que íamos ficar nas primeiras 200, o que era fabuloso. Agora, não estávamos à espera de sermos distinguidos como a melhor PME na área de «Serviços» a nível nacional”, admite Eliseu Correia.

Claro que nunca me passou pela cabeça alguma vez estar em cima daquele palco”, afirma Eliseu Correia. “Foi um bom momento, bom para quem gosta de nós, e mesmo para aqueles que não gostam. Ainda por cima, eu estou habituado a dar prémios e não a recebê-los”. Eliseu Correia confessa que as pernas ainda tremeram um bocadinho nos

Considerando que se trata de um reconhecimento justo do trabalho desenvolvido ao longo deste ainda curto percurso, o fundador e administrador não poupa elogios à sua equipa, mas também à família de colaboradores e pessoas espalhadas por todo o país que ajudam a EC Travel. “A sexta-feira (16 de dezembro) foi um dia impossível para mim, sabia que era verdade, mas ainda estava nas nuvens. Lembro-me de ver os prémios PME Exame desde o início, era um rapaz que gostava de acompanhar essas coisas, e pensava para mim mesmo que aquilo era algo espetacular.

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primeiros cinco metros em direção ao palco mal ouviu o seu nome ser chamado, ao olhar ao seu redor e compreender a exclusividade de empresários que se encontravam na sala, os melhores dos melhores. “O Francisco Pinto Balsemão é das pessoas mais empreendedoras e visionárias que passaram por Portugal e todo aquele cenário e envolvência mexeram, obviamente, comigo”, recorda, à

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conversa no seu escritório, em Olhão. “Naquela categoria estão mais de 800 mil empresas e ser considerada a melhor, em todas as vertentes económicas, é incrível. É ótimo para nós, mas também aumenta a nossa responsabilidade. Convém não esquecer que eu sou um rapazinho do Monte Negro e não me lembro de ninguém alguma vez ter trazido este troféu para o nosso Algarve”.

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Eliseu Correia está, porém, habituado a lidar com a responsabilidade e a superar as expetativas que surgem em torno da EC Travel, como se constata facilmente pelas galas de aniversário e dos «Algarve Travel Awards». “O impossível só é impossível enquanto não provarmos que ele é possível e, acima do prémio da melhor PME nas 22 categorias, existe o prémio da melhor PME do cômputo geral. O nosso objetivo, agora, é revalidar o «título», perceber quais são os critérios para vencer a categoria geral e dar tudo por tudo para que isso aconteça. Se isso não se concretizar, temos a consciência tranquila porque demos o nosso melhor”, aponta o entrevistado. Entretanto, está a terminar 2016, mais um ano de recordes, tanto ao nível da faturação como da rentabilidade da empresa, pelo que a caminhada para

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reconquistar o galardão até está bem encaminhada, já que o prémio agora alcançado diz respeito ao desempenho de 2015. “A ideia é manter a aposta na qualidade, em prestar o melhor serviço possível todos os dias do ano e em criar uma estrutura para que isso aconteça. Este ano queria abrir uma agência no Porto, tal não se concretizou por questões de timing, mas vai ser uma realidade em 2017, juntando-se assim às duas do Algarve e aos espaços de Lisboa e Funchal”, antevê, explicando ainda que a diversificação em curso do modelo de negócio da EC Travel não implica estar presente em todos os segmentos possíveis e imagináveis. “Estamos a incidir em algumas áreas específicas que atenuam a sazonalidade e que têm outro tipo de margem, mas com calma e ponderação. Sabemos bem qual o

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coração da nossa atividade e é a ele que vamos dedicar grande parte do nosso tempo”.

2017 ainda vai ser de crescimento, 2018 será o turning point Quanto a resultados financeiros concretos, a conversa é exatamente igual à de anos anteriores, pois o objetivo é, em primeira instância, repetir a performance de 2016. “Se crescermos, que seja de forma sustentável. Já passamos os 28 milhões de euros e, se aumentarmos 10 por cento, ultrapassamos a fasquia dos 30 milhões”, refere Eliseu Correia, reconhecendo que o desempenho da EC Travel não depende exclusivamente dos seus esforços, mas de toda a atuação do setor. E, neste aspeto em concreto, o empresário não tem papas na língua. “É imensuravelmente maior o volume de negócio que o Algarve tem tido nestes anos por mal dos outros concorrentes do que propriamente pela qualidade da estratégia de seja quem for, e isso um dia vai acabar. É bastante difícil fazer prognósticos porque tudo depende, atualmente, da segurança e estamos a tirar proveito dos atos de terrorismo e da instabilidade política que têm afetado outros destinos turísticos. Não me parece, infelizmente, que esse cenário mude já amanhã, mas também nada nos garante que não possamos ter o azar de sermos apanhados no meio disso tudo”, sublinha. Assim sendo, a manterem-se os índices de segurança de Portugal, é previsível 21

que a atividade turística continue a ter bons desempenhos no curto prazo, conforme apregoam tantos especialistas na matéria. “Quando as coisas estão muito bem, não há cão nem gato que não apareça a falar. Quando as coisas estão mal, não se vê ninguém a apresentar explicações ou sugestões. De qualquer modo, estou seguro que 2017 ainda será de crescimento, porque nenhum dos nossos concorrentes da orla do Mediterrâneo conseguiu inverter as situações delicadas que atravessam. Contudo, 2018 será um momento de viragem, a não ser que o Egito e a Turquia continuem a ser massacrados por infortúnios internos e externos. São economias que têm uma capacidade tremenda de sobrevivência e de adaptabilidade e vão voltar ao topo”, alerta. Por essa altura também se deverão sentir os reais efeitos da saída do Reino Unido da União Europeia, embora Eliseu Correia garanta que os britânicos vão continuar a rumar ao Algarve. “Eles preferem cortar na conta do bar do que não irem de férias, mas a qualidade dos produtos que vão adquirir é que será completamente diferente. As Canárias estão a rebentar pelas costuras. As Baleares também estão extremamente ocupadas nos mesmos picos de atividade que nós, portanto, não sobram muitas alternativas para quem pretende viajar para destinos seguros”, analisa, acrescentando que os europeus vão intensificar as suas viagens dentro do Velho Continente. “Basta lembrar o que aconteceu em ALGARVE INFORMATIVO #89


2010 após a erupção do vulcão na Islândia, quando milhares de voos foram afetados pela nuvem de cinzas. Quem era da Europa regressou a casa de comboio, autocarro ou automóvel, o que não foi possível para aqueles que precisavam viajar de avião”. Portugal tem sabido, então, aproveitar as oportunidades que lhe são servidas de bandeja, que caem do céu, mas nem tudo está bem, na opinião de Eliseu Correia, dando o exemplo do que sucede no Aeroporto Internacional de Faro. “Como é possível haver obras o Verão inteiro, a massacrar os turistas que chegam ao Algarve? Acho que os empresários e todos os algarvios mereciam maior consideração. Por muito que prestemos um serviço de excelência, por muito bom que seja o nosso clima, por magnificas que sejam as nossas praias e tudo o mais, a primeira e última imagem é que contam”, critica, lamentando igualmente a falta de mais rotas aéreas para as principais capitais europeias. “Cada vez que quero ir à Alemanha, no Inverno, praticamente tenho que dar uma volta ao mundo. Há mais rotas, é verdade, mas é preciso olhar para a frequência das mesmas, porque o mercado não vai reagir a uma rota semanal por falta de massa crítica suficiente para fazer a diferença. E desde setembro que devíamos estar em todos os pontos da Europa a promover o Algarve como o destino ideal para o Inverno e não se vê nada”.

redes sociais não estão a ser devidamente aproveitadas para divulgar e promover o Algarve alémfronteiras e defende, inclusive, a criação de uma marca «Algarve Inverno». “Estou seguro que as pessoas, quando estiverem cá e constatarem o preço do alojamento e que a região não é um deserto durante o Inverno, vão regressar nos próximos anos. Como é natural, os hotéis, restaurantes, bares, lojas de souvenirs, não podem estar fechados, mesmo que, para isso, lhes sejam concedidos incentivos fiscais”, frisa, acrescentando: “As estratégias só dão fruto quando são implementadas com consistência e continuidade, portanto, devia-se fazer um plano de marketing a cinco anos para o Algarve e que não dependesse de cores políticas e de quais são os partidos que estão no governo”. Quanto aos objetivos da EC Travel para 2017, são claros e simples: “Queremos uma EC igual a ela própria, a receber e a agradecer a ajuda de toda a gente e a continuar a ajudar cada vez mais gente. A nível de resultados, queremos continuar a ser os melhores e não os maiores. Pretendemos manter-nos como uma empresa credível, que reconhece o que está bem feito, que tem memória, que esteja no coração dos algarvios e que 2017 seja o melhor ano de sempre” .

Eliseu Correia entende também que as novas ferramentas tecnológicas e as

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Paulo Bernardo e Germano Magalhães lideram o Consórcio Caravela Startup Algarve

Caravela Startup Algarve quer atrair mais empresas de tecnologias limpas para a região O Secretário de Estado do Emprego veio ao Algarve, no dia 16 de dezembro, para assinar um acordo de colaboração entre o Instituto do Emprego e Formação Profissional, a Câmara Municipal de Loulé e o Consórcio Caravela Startup Algarve para dinamizar o Ninho de Empresas de Loulé. Nasce, assim, o Centro de Incubação e Aceleramento Empresarial de Loulé-Algarve, cujo objetivo é atrair empresas das novas tecnologias, nacionais e internacionais, e demonstrar que o Algarve possui todas as condições para ser um género de «Silicon Valley». Texto:

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Ninho de Empresas de Loulé - CACE, situado no Loteamento Industrial de Loulé, deu lugar ao Centro de Incubação e Aceleramento Empresarial de Loulé – Algarve, como resultado de um acordo assinado entre o Instituto do Emprego e Formação Profissional, a Câmara Municipal de Loulé e o Consórcio Caravela Startup Algarve, no passado dia 16 de dezembro. O intuito é fomentar o aparecimento de novas empresas na região, potenciando o desenvolvimento socioeconómico no Algarve, reduzindo o desemprego e diversificando e modernizando a atividade produtiva e empresarial.

A gestão fica entregue ao Consórcio Caravela Startup Algarve, constituído pelo Círculo Teixeira Gomes – Associação pelo Algarve, pela REGIOTIC – Associação Empresarial para as Tecnologias de Informação, Comunicação e Desenvolvimento do Algarve e pela Associação IBN QASI, que constituirá a equipa técnica e assegurará em permanência a capacidade de atendimento e aconselhamento no Centro. “Os CACE a nível nacional, fruto dos cortes orçamentais resultantes da presença da troika em Portugal, mantiveram-se abertos mas sem conteúdo humano que os pudesse dinamizar e foram sendo geridos graças à boa-vontade

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dos funcionários do IEFP, mas à distância. Como conhecíamos bem o espaço, tentamos perceber se podíamos colaborar nessa vertente e a nossa intenção foi bem recebida, quer pelo Instituto do Emprego, como pela Câmara Municipal de Loulé e pelo poder central”, explica Paulo Bernardo, um dos responsáveis da REGIOTIC. Ninho de Empresas de Loulé que, diga-se em abono da verdade, é dos melhores de Portugal, com uma taxa de ocupação na ordem dos 88 por cento, mas faltava uma estrutura de apoio e maior dinamismo na atração de outras empresas. “Os portugueses normalmente menosprezam aquilo que têm, mas aquele espaço é bom em qualquer parte do mundo e o que queremos é dar-lhe mais vida. Para além disso, a Caravela Startup Algarve deseja potenciar todos os parques empresariais da região”, reforça Paulo Bernardo. Com esse objetivo em mente, há que aproveitar fundos comunitários para promover o Algarve como uma região de negócios, mas também fazer uso da rede de contatos que todos os integrantes do consórcio possuem nos mais variados pontos do globo. “O nosso background está fortemente relacionado com as ALGARVE INFORMATIVO #89


novas tecnologias, estamos prontos para ir para o terreno já no dia 2 de janeiro, porque a estrutura está bem consolidada, e acredito que os resultados vão aparecer no muito curto prazo”, refere, por sua vez, Germano Magalhães, também da REGIOTIC. E um dos primeiros alvos a ser «atacado» pela Caravela Startur Up Algarve são os milhões de turistas estrangeiros que visitam todos os anos a região. “Não recebem nenhuma informação de que o Algarve, para além de ser bom para se passar férias, também é ótimo para se trabalhar e montar um negócio próprio. Esse vai ser um dos primeiros passos, mas também vamos atuar junto das universidades fora do Algarve e de Portugal que tenham cursos que se adequem com as atividades que podem funcionar na região, designadamente ligadas ao mar, à saúde, às novas tecnologias, às artes, entre outras”, acrescenta Paulo Bernardo. Ora, no entender da dupla de empresários, este é um momento único para se promover o Algarve enquanto polo empresarial, aproveitando-se a boleia dos excelentes resultados turísticos. Para além disso, o tipo de empresas que se pretende atrair nem carece de grandes infraestruturas físicas para funcionar, ou seja, a sua entrada na região não implica investimentos financeiros avultados. “O centro de incubação de Loulé possui quatro pavilhões preparados para receber atividades que exigem mais espaço, como ALGARVE INFORMATIVO #89

armazéns ou pequenas indústrias, mas as empresas de base tecnológica precisam, sobretudo, de boas ideias e de pessoas com capacidade para motivar as equipas que estão a desenvolver os seus negócios”, refere Germano Magalhães, revelando que este projeto já vinha a ser trabalhado, nos bastidores, há bastante tempo. Parece, assim, estarem finalmente reunidas todas as condições para esta incubadora de negócios ir para a frente e para isso também contribuiu a mudança de paradigma de crescimento do Algarve, considera Paulo Bernardo. “Durante muitos anos, o Algarve focou-se bastante na construção civil, que praticamente desapareceu, assim como a imobiliária pura e dura, e abriram-se portas para as pessoas começarem a pensar de outra forma. Veja-se que, atualmente, há um grande dinamismo em torno da agricultura no Algarve e, há uns anos, ninguém pensava nisso. Nós estamos a aproveitar uma oportunidade que surgiu e queremos fazer as coisas de maneira diferente do que tem sido feito até hoje”, salienta o empresário.

Mostrar que o Algarve não é só o Verão Mais empresas instaladas no Algarve traduz-se em mais postos de trabalho e numa maior atividade 26


O espaço onde ficará sedeado o Centro de Incubação e Aceleramento Empresarial de Loulé – Algarve

económica ao longo de todo o ano e esses são objetivos claros do Consórcio Caravela Startup Algarve. Uma missão na qual não estão à espera de receber apoios específicos do poder central, nomeadamente incentivos fiscais. “No entanto, existem alguns municípios algarvios com condições fiscais para as empresas e famílias mais benéficas do que outros, no que toca ao IMI, IRS e outros impostos e taxas. O Algarve até é atrativo nesse aspeto, mas as start ups necessitam, essencialmente, de coerência e estabilidade ao nível fiscal e que a justiça funcione”, indica Paulo Bernardo, ao passo que Germano Magalhães garante que o facto do Algarve estar na periferia da Europa não é um calcanhar de Aquiles para este tipo de empresas. “É uma questão

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minimizada pelas boas acessibilidades que existem dentro e fora da região e pela presença do Aeroporto Internacional de Faro. Depois, todo o ecossistema que nos rodeia é agradável, seja na parte do alojamento, das condições de segurança, da saúde e educação, da envolvente cultural. Não estamos a falar de empresas que precisem transportar mercadorias dentro do espaço europeu. Para ir a reuniões, apanhamos um avião no aeroporto de Faro ou fazemos via Skype ou Messenger”, justifica. As expetativas do Centro de Incubação e Aceleramento Empresarial de Loulé – Algarve são elevadas, por tudo o que foi ALGARVE INFORMATIVO #89


referido, nem que seja para criar “um ruído interessante” à volta do Algarve como um excelente local para se ter empresas. “Obviamente que isto não é estalar um dedo e ter, amanhã, 30 empresas a instalarem-se na região. Já falamos com vários contatos para transmitir estas mais-valias do Algarve e, por exemplo, a Fujitsu anda à procura de um espaço para instalar mais um centro de atendimento, a par dos que possui em Lisboa e Braga. O importante é que se perceba que o Algarve existe para além do Verão”, defende Paulo Bernardo. “Acreditamos que vamos conseguir fazer pelo Algarve aquilo que ainda não se fez antes, possivelmente por não haverem condições para isso”.

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A finalizar, a dupla lembra que o projeto poderá estar no auge do seu funcionamento daqui a 10 anos, porque é preciso semear, crescer e consolidar, e a região possui várias áreas empresariais que podem depois albergar estas firmas quando elas atingirem uma maior dimensão. “Isto gera mais emprego qualificado, que leva, por sua vez, a que se vendam mais casas e por aí adiante. O Algarve podia perfeitamente ter mais um milhão de habitantes que não havia problemas de maior, já que todas as infraestruturas estão dimensionadas para aguentar os picos de agosto”, conclui Paulo Bernardo .

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O preço de uma vida Paulo Cunha

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prendi muito nos dezoito meses em que eu e os meus camaradas de armas fomos obrigados a dar uma parte da nossa vida para que, pretensamente, Portugal estivesse mais protegido militarmente contra qualquer ameaça à sua soberania, dissuadindo assim qualquer tipo de agressões e ameaças. Aprendi o que quis, mas, sobretudo, aprendi muito do que não quis. Embora tivesse cumprido o «Serviço Militar Obrigatório» em tempo de paz, percebi que muitas mentes de alguns camaradas com quem convivi estavam em guerra. Em guerra com elas próprias. Conheci então, entre muitos, o preço de uma simples munição e o de um obus (projétil oco de carga explosiva), que em «semanas de campo» eram desbaratados em treinos para a manutenção da eficácia dos militares. Por isso entendo agora o porquê de muitos países investirem muito mais dos seus recursos na “morte” (como apregoada defesa da vida) do que na própria vida! Desde que o homem é homem que se conhecem registos históricos do uso da guerra para vários propósitos, diferenciando-o assim dos outros animais que só matam para se alimentarem. É, invariavelmente, o acesso às matérias-primas que leva os «senhores da guerra» a escudarem-se nas diferenças étnicas, territoriais, políticas e religiosas para alimentar guerras que geram em si um horror diário que não cessa de lançar sementes de ódio e de vingança a nível global. Em locais de culto e em ocasiões em que se celebra a fé, facilmente se ouve falar da importância da paz para as nossas vidas. São frases bonitas e cheias de verdade e sentido, proferidas por gente que, independentemente do credo ou religião, ama a vida… São pessoas de paz! Mas o que fazer quando, entre, e à custa dessas pessoas, milita gente que usa a religião como pretexto para exteriorizar todo o ódio, incompreensão e irracionalidade de que é feita? O que fazer quando o medo toma conta de democracias maduras e consistentes, fazendo renascer comportamentos ignóbeis, abjetos e hostis por quem não é igual e ALGARVE INFORMATIVO #89

pensa de forma diferente de nós, fazendo o todo pagar pela parte? O que fazer quando, em nome de ideologias estéreis e inconsequentes, se extremam posições entre concidadãos que conseguem trazer o horror da guerra para a civilidade das suas vidas? A guerra nunca foi, nem será apenas dos outros! Apesar do caráter regional de muitas que grassam por este mundo fora, as matanças de civis indefesos e de militares (que não passam de meros joguetes às mãos de interesses dúbios e incógnitos) têm efeitos nefastos e colaterais no equilíbrio social e comportamental da humanidade. Ao contrário de alguns, não sou daqueles que pensa que as guerras são um mal necessário para ajudar a reduzir o progressivo crescimento demográfico nos países em vias de desenvolvimento. São, nada mais, nada menos, do que um avolumar de atrocidades que colocam seres indefesos à mercê de monstros que, ao contrário das estórias infantis, fazem com que a nossa história venha a ter um final infeliz. Atrevo-me aqui referir que, cada vez mais, a vida humana vale cada vez menos, tal a forma desprendida, inconsequente e irracional com que muitos tratam os seus iguais, perdendo todo e qualquer respeito pela sua e pela vida dos outros. Preocupa-me ver a guerra a acontecer em quase todo o mundo; ver a guerra plasmada em todos os noticiários; ver a guerra a condicionar o destino do planeta terra e, consequentemente, o nosso destino; ver a generalização da indiferença pelas consequências da guerra. Como me perguntava a minha filha há uns anos: “Oh pai, os «senhores da guerra» não têm filhos? É que se têm, parece que não gostam deles!?” - hoje a pergunta parece-me cada vez mais pertinente e acertada na argumentação. É verdade, não foi preciso ter “ido à tropa” para em cada Natal eu lhe responder que uma das maiores prendas que me/nos poderiam dar é a paz no mundo. Uma frase feita, feita de muito querer. Porque, acreditando, querer é poder! . 30


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2016 foi só o começo… José Graça

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epois de anos de estagnação, o acordo obtido pelo Governo na concertação social permite um aumento de 15% do salário mínimo nacional (SMN) desde 2014, fixando-se no valor real de 649,83€ em 2017. Uma vitória significativa num ano marcado pela reposição de rendimentos dos Portugueses! Segundo a comunicação social, são cerca de seiscentos e cinquenta mil trabalhadores que registam um aumento de 24 euros por mês nos seus vencimentos, retirando os cerca de três euros deduzidos pela carga fiscal. Apesar do valor do SMN fixar-se em 557 euros, a PORDATA e a DGERT fizeram a análise do salário mínimo geral mensalizado (valor total recebido ao longo do ano dividido pelos doze meses), verificando-se uma evolução bastante relevante que vai dos 371,30 euros (2000) aos 618,30 Euros (2016), apenas suspensa entre 2011 e 2014. Este sucesso adquira maior significado devido ao “brutal aumento de impostos” de Gaspar, Luís, Passos e Portas naquele período, traduzindo-se numa redução exponencial dos rendimentos dos trabalhadores. O ano que agora cessa ficará, tal como 1966, na memória dos portugueses. Não apenas pela vitória da seleção nacional de futebol no Campeonato da Europa (coroada no fecho do pano pela conquista quarta Bola de Ouro de Cristiano Ronaldo) ou pela eleição por unanimidade e aclamação do exPrimeiro-Ministro António Guterres para SecretárioGeral da Organização das Nações Unidas, mas também pelas sucessivas conquistas dos cidadãos no plano interno, depois de quatro anos diabólicos marcados pela crise financeira e de valores. A vitória anunciada de Marcelo Rebelo de Sousa nas eleições para a Presidência da República, precedidas por anos e anos de campanha nos jornais, nas rádios e das televisões, foi apenas um dos momentos que antecipava um conjunto de boas notícias para os portugueses. E, sabedor como poucos das regras da comunicação política, Marcelo comportou-se como se fosse ele o líder do Governo, envolvendo-se nos processos governativos,

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empenhando-se nos esforços diplomáticos externos e partilhando aqui e além as pequenas vitórias de António Costa no plano europeu. Pequenas vitórias que proporcionam grandes vantagens em termos nacionais, como foram a não aplicação de quaisquer sanções pela ultrapassagem da meta do défice em 2015 ou a forma como contornámos a suspensão dos fundos estruturais da União Europeia. Sem qualquer impacto financeiro (digo eu!), outra das conquistas dos portugueses foi o levantamento da suspensão dos quatro feriados civis e religiosos, particularmente significativo do ponto de vista cívico nos casos da reposição do 5 de Outubro (data da implantação da República) ou do 1.º de Dezembro (Restauração da Independência), que ficam como uma marca indelével do Governo do Partido Socialista, com o apoio do BE, do PCP e d’Os Verdes, mas que também acabou por merecer o apoio dos setores mais patrióticos do CDS e dos monárquicos! No caso concreto do Algarve, registem-se os benefícios decorrentes do aumento da procura turística ao longo do ano, consagrada com os números apresentados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) referentes á procura na “época baixa”, sustentando uma aposta sustentada nos produtos de nicho (cultura, gastronomia, golfe, natureza, património, etc.), que vem complementar os grandes motivos de atração da região durante os meses de Verão. Estes números que nos mostram uma região pujante a puxar pela economia nacional (valores de crescimento do PIB regional superiores à média nacional em 2014 e 2015), motivam os agentes económicos e políticos regionais a serem mais assertivos na defesa dos interesses da região e dos investimentos públicos estruturais que ficaram engavetados sob a governação PSD/CDS. Juntos pelo Algarve, como já defendemos por diversas vezes, é a melhor solução para (man)termos um Algarve com rumo! . (Membro do Secretariado Regional do PS-Algarve e da Assembleia Intermunicipal do Algarve) 32


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Então é Natal Mirian Tavares

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atal de 2003. Uma amiga, muito querida, dá-me de presente um livro e na dedicatória escreve: "in un bivio è il mio volere/di seguir il mondo o il cielo". O livro, «O Amor de Madalena», é um sermão anónimo francês, do século XVII, que o poeta Rainer Maria Rilke encontra, por acaso, em uma pequena loja na Rue du Bac, em 1911. Decide traduzi-lo e se confessa apaixonado pelo texto que, mais do que um sermão, é um poema. Na apresentação do livro, feita para a edição catalã, Nicole D'Amonville Alegría tenta desvendar quem foi Madalena. E, em dado momento, diz-nos que, quando Cristo ressuscita no Gólgota, Madalena não o reconhece de imediato. Até que ele a chama: "Miriam", e ela se joga aos seus pés. Esta Madalena/Miriam, mais tarde associada à Sulamita, do Cântico dos Cânticos, é vista, neste sermão, como um exemplo supremo de amor. Daquela que amou a Cristo em seus três estados, amou-o morto, amou-o vivo e amou-o ressuscitado. Como aquela cujo "amor desencaminhado, deplora seus descaminhos e busca o justo caminho aos pés Daquele que é próprio caminho". E é deste amor, entre o mundo e o céu, in un bivio, que fala o livro. E numa das passagens mais bonitas diz: "Se é o amor que vos impulsiona, Madalena, o que temeis? Ousai tudo, empreendei tudo. O amor não sabe limitar-se, seus desejos são sua regra, seus enleios são sua lei, seus excessos são sua medida. Nada teme senão temer; e a sua reivindicação de posse é a audácia de tudo pretender, e a liberdade de tudo empreender".

aqueles que nos cercam. O Natal sempre me deixou com uma sensação estranha de nostalgia. Sensação que me acompanha desde que eu tinha uns três anos, como se o Natal fosse qualquer coisa que vinha do passado. Estar longe de casa, da casa dos meus pais, aumenta esta sensação e traz uma dose de tristeza. Porque tenho gravada a memória de muitos natais em família, dos bolos, das conversas, das prendas sob a árvore da casa dos tios. De qualquer forma, gosto de pensar que a cada Natal podemos sempre renovar a nossa esperança, acreditarmos que talvez seja possível ver (e ter) um mundo melhor. Espero que este Natal seja menos nostálgico e mais cheio de alegria e, sobretudo, de amor. Mesmo para aqueles que não acreditam em Deus nem na presença entre nós do seu filho. O amor não tem religião nem equipa de futebol – é um sentimento que deve ultrapassar fronteiras e que nos dá a verdadeira dimensão daquilo que somos e de tudo o que nos rodeia e que impulsiona a nossa fé: nas pessoas, no mundo, em nós mesmos. Feliz Natal a todos e muita, muita força para olhar para frente e prosseguir, teimosamente, acreditando que podemos escolher, e construir, um futuro melhor .

É uma boa leitura para o Natal, pois é disso que se trata, ou que devia se tratar, esta altura do ano: do amor. Do amor entre todos, do amor possível, da partilha de doçura com os amigos e com a família. Da partilha de nós mesmos com ALGARVE INFORMATIVO #89

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O turismo algarvio, Marcelo e o terrorismo Cristiano Cabrita

REGIONAL

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stamos a chegar ao fim do ano e é tempo de efectuar uma análise séria e ponderada sobre o Algarve. O Turismo do Algarve fez esta semana um balanço positivo sobre 2016. De facto, a região tem sabido promover-se e vai, segundo aquela instituição, terminar o ano com «mais dormidas, hóspedes e proveitos, mais passageiros e mais voltas de golfe», do que o ano anterior. Este é um ponto positivo que deve ser sublinhado. Aliás, diria que é até (muito) surpreendente, tendo em conta as paupérrimas condições estruturais existentes no sul do país. De facto, este Governo, à semelhança dos anteriores, não dá indicações de pretender inverter a actual inércia. Como é que queremos competir com outros destinos quando diariamente nos deparamos com a inexistência de acessibilidades ferroviárias e rodoviárias? Como é que abordamos a promoção turística quando existe falta de médicos e quando os Centros de Saúde operam em condições precárias? Quando é que entendemos de uma vez por todas que as portagens na Via do Infante representam uma «barreira» económica para residentes e

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turistas? Quando é que o Hospital Central do Algarve sai do papel? Quando é que se resolvem os problemas da orla costeira? Enfim, fica a reflexão.

NACIONAL Em jeito de balanço sobre o contexto político nacional, diria que existe um vencedor claro. Marcelo Rebelo de Sousa. O Presidente da República é um brilhante estratega como há muito não se via para os lados de Belém. Condiciona como quer o PSD e António Costa. Determina rumos e afirma posições. Com a sua popularidade sabe que, quando chegar o momento certo, pode apertar o «laço» ao PrimeiroMinistro, que ninguém exercerá contestação. Talvez por isso ocupe, muitas vezes, e a seu bel-prazer, o espaço político de Costa. Sem qualquer tipo de oposição, acrescente-se. Da mesma maneira, vai «guiando» subtilmente o seu PSD para o lado que mais lhe interessa. Além disso, tem uma arma muito poderosa para exercer o poder numa república constitucional semipresidencial como a nossa: domina como poucos o Direito, em

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particular a Constituição. E isso faz a diferença. Deve-se também acrescentar que é um homem que consegue (sem esforço) chegar às pessoas. A todas as pessoas e não apenas às elites. Poucos tiveram esse dom. Talvez Soares, no período de lua-de-mel logo a seguir ao 25 de Abril e depois de ter sido eleito, pela segunda vez, em 1991. Se quiser ficará a próxima década no Palácio de Belém. Se quiser…

INTERNACIONAL O terrorismo voltou a atacar a Europa. Depois de Paris, Bruxelas e Nice (não esquecendo Londres e Madrid) o terror chegou agora à Alemanha. O ataque a Berlim tem várias leituras. Em primeiro lugar, é necessário entender que esta realidade, infelizmente, veio para ficar. Ou seja, os cidadãos europeus têm que se habituar a conviver com este novo contexto pós 11 de Setembro. O mundo está mais complexo, as dinâmicas de poder alteraram-se e as ameaças transnacionais, como o terrorismo, encontraram um campo onde podem explorar a sua verdadeira natureza. Sejamos sinceros, o terrorismo em solo europeu, apesar dos esforços das autoridades policiais, não vai desaparecer num futuro próximo. Em segundo lugar, dizer que estes ataques são o reflexo de uma certa organização que está enraizada no submundo das sociedades europeias. Não é visível à primeira vista, mas está lá. A mobilidade, a logística e a destreza dos ataques perpetuados no último ano são indicativos deste novo contexto. Fala-se muito em «lobos solitários». Eu discordo

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desta análise. Existe uma estrutura já montada com contornos muito complexos que ainda não foram devidamente esmiuçados. Em terceiro lugar, verifica-se um certo descrédito em relação à Estratégia Global da União Europeia sobre Política Externa e de Segurança. A questão dos refugiados e os ataques terroristas em solo europeu dizem-nos que um dos principais pilares deste Estratégia – a segurança da União – não está a ser implementado. Nada de novo se pensarmos em termos históricos nas dificuldades que os países europeus sempre tiveram em articular uma política conjunta na área da defesa, da segurança e da política externa. Em quarto lugar, é importante ter em linha de conta o impacto que estes ataques vão ter no contexto político interno europeu. Em França, François Hollande não se vai recandidatar, precisamente devido ao impacto negativo que os ataques terroristas tiveram. Na Alemanha, com eleições no próximo ano, espera-se que os partidos de centrodireita assumam uma postura menos flexível sobre a política de circulação de pessoas e bens no espaço europeu. E, muito importante, não devemos perder de vista a ascensão da extrema-direita e do partido populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD). Aproximam-se tempos difíceis. Aproveito esta ocasião para formular a todos os leitores os votos sinceros de um Santo Natal e de um Próspero Ano de 2017 .

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O meu conto de Natal António Manuel Ribeiro

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oje não vou falar dos efeitos psicológicos e pirotécnicos que ensombram o mundo, esse frio de aço no rosto dos poderosos que desdenham dos olhares patéticos que fogem à tragédia e encontram pela frente a câmara de filmar que os traz aos nossos sofás. É habitual. Hoje a minha crónica, cuja regularidade semanal começou em Setembro, versa um menino que veio ter comigo num sonho uma destas noites, uma criatura pequenina que ajeitou o meu cobertor fofo e assim me fez chegar ao despertar. Está um gelo na rua. Esse menino tinha a alcunha familiar de Branquinho, pele leitosa, cabelo de fios dourados e olhar azul de tanto céu. Era um curioso, como todas as crianças sadias da sua idade, traquinas, diziam, mas o regalo da família. Esperava o momento, sentia-se pela casa, os adereços e os cheiros a prometerem guloseimas, presentes, diferença, a alegria do Natal. Branquinho esperava que a noite caísse para que sua avó materna procedesse ao ritual de acender o candeeiro a petróleo, subia a mecha apagada, cortava com uma tesoura a parte queimada ressequida e depois riscava um fósforo, o líquido inflamável subia pela tira e a luz enchia de claridade a cozinha entristecida. Sobre a mesa coberta de linóleo aos quadrados, uma folha branca e lápis de cor esperavam pelos rabiscos certeiros que traçavam lutas entre cristãos e mouros, colinas e um castelo, bandeiras, lanças, escadas de assalto e espadas no ar, prolongando a história do último livro de quadradinhos que o pai lhe trouxera. O frenesim, esse enxame de abelhas suaves que lhe remexiam o estômago ao longo do dia e subiam desordenadas pelo corpo, começara quando o pai, depois de chegar do trabalho o levou até à encosta junto às oliveiras e o ensinou a raspar sem quebrar finas placas de musgo para envolver o presépio. Havia uma estrela, fitas na árvore do pequeno pinheiro a cheirar a resina, bolas coloridas e ovelhas e pastores e três reis magos a seguir a estrela que o pai pendurava sobre a árvore para adorarem um menino, o menino Jesus: na missa do galo cantava-se em seu louvor. Fizesse frio, como fazia, ou a chuva e o vento andassem em discussão no breu da noite, a família levava Branquinho à missa do galo e nada dificultava a excursão à igreja no alto da vila: Branquinho sabia que a hora estava a chegar. Usando o canivete manhoso que o pai lhe entregara, que nem a folha de uma cana conseguia separar,

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Branquinho entretinha-se à procura de uma colónia robusta de musgo mas tudo lhe saía aos pedaços, o pai benévolo a sorrir e a abanar a cabeça mostrando-lhe como se fatiava o macio do barro para soltar uma placa fofa inteira. O presépio era sinal certo de que o Pai Natal estava a caminho. Nunca o vira mas por ele tudo lhe era prometido e assegurado, até o castigo de nada receber se não comesse o puré de favas que a avó se esmerava a condimentar com fiapos de presunto, favas semeadas pelo pai, colhidas e guardadas para o Inverno do faval alto e viçoso no meio do qual simulara emboscadas com os primos depois da escola. Batalhas sempre ganhas por astúcia, reconhecidos que eram os contornos da sua floresta de faveiras. Branquinho rabiscara numa folha uma lista de presentes para esse velho de barbas brancas e fato vermelho. Sem ninguém por perto, curioso, abeirava-se do pesado fogão de ferro negro da cozinha que exalava um calorzinho a madeira pelo dia inteiro e espreitava para cima, ficava escuro o estreito corredor que se erguia para surgir sobre o telhado da casa. E cogitava como seria possível um velhote gordito, como a barriga da avó, descer por ali com um saco de presentes. Onde ficaria o trenó? Prometera a si mesmo que este ano não adormeceria como o irmão mais novo logo a seguir à ceia de Natal e ficaria à espera de ouvir um ruído, o roçagar de um saco a raspar a parede, o senhor pai Natal a deslizar, aterrar e ir às filhós que a avó empilhava numa travessa ao lado das fatias douradas que preferia. Prometeu e cumpriu, esforçou-se na almofada inquieta, o irmão já dormia a falar uma linguagem de palavras que não reconhecia, enquanto no escuro do quarto ouvia os ruídos da noite que desconhecia, movimentos invisíveis que faziam disparar o coração. O soalho rangia, seriam bichos? O vento esfolava pelos arbustos do jardim uma corrida à apanhada, seriam fantasmas? E as renas, quantas seriam, porque vinham caladas, voavam? Ouviu um sininho e um toque húmido no nariz, estava escuro demais para ver o vulto, que vulto? Abriu os olhos do sonho repentino, era manhã e o pequeno amigo siamês de quatro patas limpava o pêlo abanando o guizo preso à coleira – não era rena e ele adormecera. Ergueu-se sozinho sem ruído, abriu a porta e viu o chão largo da cozinha sem soalho visível plantado de embrulhos de cores garridas, grandes e pequenos, fitas, sossego e silêncio na casa transformada. Falhara outra vez agradecer ao homem de vermelho tanta felicidade .

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Há mais Chefes que Índios Augusto Lima

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rofissão sem vocação dá nisto! Portugal, esta pérola à beira mar plantada, ainda é um poço de contradições obscuras, de luvas e cacetadas, de meias falas e sonegações, onde impera o Adamastor da corrupção, do abuso da autoridade, da burocracia e de tanta outra porcaria. O sistema está mal, não funciona e, pelo andar da carruagem, não se antevê para breve luz ao fundo do túnel. E se penso que não me vou surpreender, que já vi de tudo, eis que me surpreendo com a facilidade com que as pessoas fazem mal e, pior do que isso, julgando que fazem bem. Somos conhecidos por sermos desenrascados, mas alguns ultrapassam em muito o bom senso do jeito que deveria ser de momento. Há mais chefes que índios, digo-vos eu. Todos querem ser chefes, todos sabem de tudo, todos, salvo seja, percebem de tudo. Há gente boa, gajos porreiros, que acumulam cargos de tudo mais alguma coisa. Eles são chefes de economato, chefes de controlo de custos, chefes de cozinha, chefes de pastelaria, chefes de sushi (sushi man chefs), chefes de sala, chefes de bar, chefes de marketing, eu sei lá. Há mais gente a mandar mal que gente a fazer bem e é isto o retrato um pouco por todo o lado e em todos os círculos laborais deste nosso Portugal à beira mar plantado. Muitos destes verdadeiros hooligans profissionais pensam que podem atender clientes de telemóvel na orelha apoiado no ombro, pensam que podem obrigar pessoas a trabalhar sem noção de ética e rigor profissional, de assassinar uma profissão, de colocar em risco laboral a empresa, o trabalhador e as vidas de ambos. E sabem que mais: – aparentemente podem, aparentemente sim, ou verdadeiramente talvez, apesar de não legitimamente, já que conseguem quase sempre (a grande maioria das vezes) passar por entre os pingos da chuva e dormirem descansados sobre um travesseiro tarimbado em impunidade, que permite patrões ardilosos e sistemas inoperacionais roubar salários e comprometer vidas, sustentos, caracteres e desvirtuar o trabalho e trabalhadores que são pessoas.

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Vivemos num mundo de incertezas de inversão de valores, de desonestidade e de animais que se julgam gente e, pior, que se acham chefes disto e daquilo. Para ilustrar tudo isto uma história que demonstra o estado da nação. Num restaurante, supostamente capaz, um patrão que era chefe de tudo aquilo, juntou-se um dia a um outro patrão que também achava, achava e era chefe de tudo quanto tinha. E depois de beberem um vinho cheio de sulfitos, quase carrascão ou para lá disso, mas que ambos concordavam que era bom porque eram também chefes de vinhos entendidos em castas e terroirs, decidiram unir os seus espólios de modo a economizarem nas compras e nos gastos. Decidiram contratar um Chefe de cozinha daqueles instantâneos, que viram numa noite de copos de vinho sulfuroso na caixinha mágica. Mas havia um senão, o homem era caro, pedia um ordenado mensal maior do que poderiam imaginar. Mas porra, o gajo até tinha um bigode catita, um sorriso imaculadamente brilhante e uma farda cheia de pins, uma pinça no bolso e uma daquelas braceletes que lhes davam a eles quando iam para o engate nos dancings. Bolas, como não contratar!? Fácil foi a decisão na hora de despedir os chefes de cada um dos restaurantes e como ainda não dava para suportar os encargos, despediram também os cozinheiros que mais ganhavam, por acaso aqueles que mais sabiam trabalhar e salvavam a casa na hora dos desacertos que os Chefes provocavam. Quando o tal novo Chefe chegou (mesmo antes de conhecer as cozinhas e os seus colegas, começou a exigir uma série de coisas que tinha ouvido falar que eram Top) e se viu no meio da arena, exclamou: – Só estes ajudantes? Eu não faço nada, só mando! E paguem já o que me devem senão meto-os no tribunal! E pronto, os dois artolas juntaram mais um título de chefe – Chefe da estupidez. E que bem lhes serviu o chapéu . * Presidente da Associação de Cozinheiros e Pasteleiros do Algarve

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DIETA MEDITERRÂNICA É TRUNFO RUMO A UM TURISMO GASTRONÓMICO SUSTENTÁVEL Arrancou, no início de dezembro, na Eslovénia, o projeto MEDFEST, apoiado pelo programa INTERREG Mediterranean e que pretende fazer frente ao desafio da sazonalidade e da diversificação dos destinos turísticos tradicionais do «sol e mar» com produtos novos e sustentáveis baseados na herança culinária do Mediterrâneo. Em Portugal, o projeto é coordenado pela Associação In Loco e o objetivo é criar um destino de turismo gastronómico sustentável com base na Dieta Mediterrânica. Texto:

Fotografia:

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slovénia, Itália, França, Espanha, Portugal, Croácia, Grécia e Chipre uniram-se em torno do projeto MEDFEST, suportado pelo programa INTERREG Mediterranean, com o intuito de aproveitar a gastronomia da orla mediterrânica para criar destinos turísticos sustentáveis que não dependam exclusivamente do binómio «sol e mar». Isto porque a motivação principal de muitos turistas e visitantes deixou de resumir-se ao «ver & consumir» e evoluiu para atividades de «experienciar & vivenciar». Assim sendo, expressões intangíveis como a paisagem ALGARVE INFORMATIVO #89

cultural, as comunidades, a criatividade, a música, a comida e o estilo de vida assumem um peso cada vez mais preponderante rumo ao turismo sustentável e que deixe de ser encarado como «predador» dos recursos naturais dos vários países e regiões. Dentro desses valores, o MEDFEST incide essencialmente sobre a gastronomia e o objetivo é criar ou melhorar, no espaço mediterrânico, estratégias para o desenvolvimento do turismo gastronómico sustentável de pequena escala e desenvolver 44


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Artur Filipe Gregório (à esquerda) durante uma ação de promoção na Feira da Dieta Mediterrânica de Tavira

experiências culinárias sustentáveis, ligando os espaços costeiros com o interior rural. A Identidade Cultural Mediterrânica e a sua herança culinária, traduzida na forma de utilização dos produtos e ingredientes produzidos sazonalmente pelas comunidades locais, inspirada nos saberes tradicionais e desfrutada em locais plenos de conteúdo e significado, desempenha então um papel único, estimulando as ligações de cooperação entre operadores locais e a relação entre desenvolvimento territorial e turismo sustentável. Em Portugal, o projeto vai ser coordenado pela Associação In Loco e o tema escolhido é a Dieta Mediterrânica, um estilo de vida reconhecido como Património Cultural Imaterial da ALGARVE INFORMATIVO #89

Humanidade pela UNESCO e cujo regime alimentar associado é classificado pela Organização Mundial de Saúde como sendo de excelência. “O Algarve é um território que foi profundamente transformado pela indústria do turismo, do ponto de vista cultural, social, económico, etc, etc. No entanto, cada vez mais os agentes do setor estão a apostar num turismo que seja sustentável, que tenha uma articulação de forças que permita repercutir-se ao longo do tempo, envolvendo as comunidades e possibilitando a conservação dos recursos”, explica Artur Filipe Gregório, da In Loco, confirmando que o turismo gastronómico é um dos grandes motivadores para a deslocação de pessoas de um país

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para outro e para o contato com outras culturas e comunidades.

uma rede em funcionamento”, considera Artur Filipe Gregório.

A gastronomia é, na opinião do entrevistado, um facto social total que combina, de forma bastante harmonioso, os produtos locais, a agricultura, a paisagem, o clima, a cultura e a sociedade, e que em Portugal esse fenómeno é ainda mais evidente. “A gastronomia portuguesa é extremamente rica e está cada vez mais a descobrir a sua identidade cultural, porque a Dieta Mediterrânica tem mobilizado as pessoas e as instituições de uma forma tremenda. É um estilo de vida que faz parte do mais profundo que nós temos, daquilo que somos, de como vivemos”, enfatiza o coordenador do projeto, dando o exemplo de que a Rota da Dieta Mediterrânica rapidamente ultrapassou as fronteiras do Algarve e inclui parceiros de vários pontos do país e, inclusive, do outro lado da fronteira, da vizinha Espanha. “A lógica da RDM não é focar num único território, mas sim trabalhar mais intensamente onde esses recursos e memórias estão mais presentes, e vai ser uma plataforma espetacular para, em cima dela, se abordar a questão do destino turístico gastronómico sustentável. No fundo, temos uma vantagem face aos outros países parceiros, porque já temos

A primeira fase do MEDFEST é estudar e decidir os projetos-piloto a dinamizar por cada país, que podem incidir sobre localidades ou zonas mais pequenas ou em espaços geográficos mais amplos, como é o caso de Portugal, onde a Dieta Mediterrânica é transversal a várias regiões. E, sendo a sustentabilidade um dos objetivos estruturais do projeto, ele nunca pode pensar

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Foto de família dos oito países que fazem parte do MEDFEST, na apresentação do projeto na Eslovénia

apenas no típico turista do Verão algarvio, pois procura, precisamente, combater a sazonalidade e fomentar uma maior ligação entre o litoral e o interior. “Queremos pegar em produtos que, atualmente, não são tão conhecidos e transformá-los em produtos turísticos que sejam procurados ao longo de todo o ano e por diferentes tipologias de clientes. Isto não significa apenas os visitantes com maiores posses financeiras, mas também aqueles que estão interessados em descobrir os destinos de mochila às costas, porque conseguimos encontrar uma boa relação qualidade/preço para vários níveis”, frisa Artur Filipe Gregório. Outra questão a ter em conta é que, apesar do foco principal do MEDFEST ser a gastronomia tradicional, ALGARVE INFORMATIVO #89

nomeadamente a que faça parte da Dieta Mediterrânica, a cozinha associada às mediáticas estrelas Michelin não está colocada de parte. “Já houve um grande divórcio entre estes dois universos, mas verifico que há muitos Chefes, ou Cozinheiros, que conseguem oferecer pratos que são de excelente qualidade e que traduzem os valores culturais do território. Criam comunidades de produtores para assegurar a qualidade das matérias-primas e inspiram-se nos recursos e nas espécies tradicionais, observando-se uma maior complementaridade entre a cozinha internacional e de autor com as raízes profundas das regiões”, salienta o entrevistado. “Não oferecem só pratos, mas sim experiências gastronómicas”. 48


Afirmar a cozinha portuguesa Ora, como não se define um destino gastronómico sustentável por decreto e de um dia para o outro, será constituído um grupo de trabalho que envolva os atores locais e que, em Portugal, vai aproveitar a experiência acumulada do «Slow Med» e da Rota da Dieta Mediterrânica. Deste grupo de trabalho fazem parte a Região de Turismo do Algarve e a Escola Superior de Gestão Hoteleira e Turismo da Universidade do Algarve, enquanto parceiros associados desde o início da candidatura do projeto, a que se juntaram posteriormente a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve, a Universidade do Algarve, a Direção Regional de Cultura do Algarve, a Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve, a Associação dos Industriais Hoteleiros e Similares do Algarve, as Escolas de Hotelaria e Turismo do Algarve, a Associação de Turismo do Algarve, a Associação de Comércio e Serviços da Região do Algarve e a Associação Portuguesa das Agências de Viagem e Turismo. “A ideia é cada um conjugar e articular a sua missão e visão sobre o setor nesta plataforma que é o MEDFEST. Toda a gente sabe o que é a cozinha chinesa, francesa, italiana, tailandesa, mas ninguém sabe que existe a cozinha portuguesa, onde a Dieta Mediterrânica é claramente um trunfo muito grande, porque nunca se conseguiu trabalhar em conjunto para se criar essa identidade”, lamenta Artur Filipe Gregório. 49

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nacionais a visitar locais onde estas experiências estão a resultar bastante bem, num programa de intercâmbio entre as regiões”, adianta o coordenador de projeto.

Constituído o grupo de trabalho, vão ser imensas as atividades a dinamizar nos próximos três anos, desde a capacitação dos operadores locais, promoção e investigação, até à identificação dos critérios para se definir a tão almejada sustentabilidade. “É preciso criar um sistema de avaliação e monotorização que permita, com rigor, qualidade e simplicidade, avaliar se as medidas e estratégias estão a dar um contributo válido para a região ou não. Vamos também levar operadores ALGARVE INFORMATIVO #89

A par de tudo isto, é essencial elaborarem-se produtos e pacotes de experiências específicos em torno da gastronomia e Artur Filipe Gregório está confiante que os resultados serão rápidos em aparecer. “Teremos, muito provavelmente, atividades com visibilidade pública mais cedo do que os outros países do projeto porque possuímos uma estrutura montada e uma rede de empresas que está a trabalhar muito bem em conjunto. Numa parceria devem ser otimizados os papéis que cada um assume e a In Loco tem a seu cargo a coordenação e organização do trabalho dos vários intervenientes. Temos o mesmo espírito de servir a causa pública do que uma câmara municipal ou um ministério, mas somos mais ágeis em termos de funcionamento, pelo que as expetativas são elevadas. A Dieta Mediterrânica serve de fio condutor para todo o trabalho de base de apoio aos agricultores, de valorização do património cultural, da organização dos produtores”, finaliza o entrevistado . 50


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Hélder Farroba Um D’Artagnan de cadeira de rodas O panteão de campeões nacionais algarvios conta com mais um nome, Hélder Farroba, o expoente máximo da esgrima em cadeira de rodas em terras lusitanas. Acabado de chegar do Campeonato do Mundo disputado na Hungria, o olhanense regressou de imediato aos treinos sob as indicações do professor Marco Rojo, responsável pela Esgrimalgarve, e pensa já nos próximos desafios, nomeadamente a participação no campeonato nacional da vizinha Espanha. Uma história de coragem, de persistência, de luta contra os obstáculos, um pouco à imagem do famoso D’Artagnan, que também lutou contra tudo e contra todos de espada em mão, em defesa do seu rei. Neste caso, Hélder Farroba empunha com mestria o florete, a representar as cores do Algarve e de Portugal. Texto:

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sta peça podia contar apenas a história do jovem Hélder que, aos 16 anos, sofreu um acidente de comboio e perdeu ambas as pernas. Como se deve adivinhar, o trágico acontecimento virou de avesso a vida do olhanense, todos os sonhos de menino e adolescente desvaneceram-se de um momento para o outro, acordou para uma realidade completamente diferente, numa cadeira de rodas, num país que continua a não apoiar devidamente os seus filhos e filhas que padecem de alguma deficiência física ou motora, numa sociedade que, muitas vezes, prefere olhar para o lado, porque é mais fácil ignorar estes homens e mulheres do que tentar ajudá-los a ter uma vida mais digna, com mais qualidade.

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Sem grandes dificuldades ou truques de palavreado, podia-se deixar as pessoas de olhos lacrimejantes com a história do adolescente que teve que se tornar homem mais depressa para enfrentar a vida, para suprir os obstáculos que aparecem no quotidiano e que começam com o simples andar nas ruas de um Portugal que só recentemente se lembrou que nem todas as pessoas têm a mesma facilidade para subir ou descer escadas, para atravessar uma estrada, para utilizar transportes ou frequentar espaços públicos. Depois, há os outros obstáculos, menos visíveis, de quem sobrevive com uma pensão de invalidez que não chega aos 300 euros mensais e que não

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consegue arranjar trabalho porque a maioria dos portugueses ainda olha com pena para estas pessoas que, «coitadinhas», tiveram uma infelicidade na vida, mas daí a contratá-las para as suas empresas vai um longo passo, mesmo que esses homens e mulheres estejam perfeitamente habilitados para desempenhar uma série de funções. Nada disso. Preferimos falar do Hélder Farroba, hoje com 44 anos, praticante de esgrima em cadeira de rodas há sete anos e que esteve em Eger, na Hungria, de 16 a 20 de setembro, a representar Portugal no Campeonato do Mundo da modalidade. Uma proeza que já tinha feito em 2009, numa prova mais perto de casa, em Valência, daí ter sido uma participação menos complicada. Desta vez, porém, a ida do olhanense ao maior evento mundial da modalidade não foi nada fácil, pois o apoio da Federação Portuguesa de Esgrima resume-se ao equipamento que iria utilizar. Assim, acabou por ser o Município de Olhão e outras entidades públicas e particulares que, sensibilizados para a causa, asseguraram a viagem e estadia deste espadachim filiado na Esgrimalgarve. Por isso, rumamos à Escola EB 2,3 Dr. Alberto Iria para assistir a mais um treino sob as indicações do professor Marco Rojo, após o qual Hélder Farroba fez uma avaliação positiva da sua experiência na Hungria, apesar de não ter conseguido ganhar nenhum combate. “Calhei com grandes 55

atiradores, com o vice-campeão do mundo de espada, com o número um mundial de florete e com um húngaro que é dos melhores da modalidade neste momento. Ganhei muita experiência nesta prova que contou com 300 atletas de 32 países e agora é ir para a frente e pensar nos próximos combates”, refere o único português que marcou presença nessa importante prova. Curiosamente, Hélder Farroba tem praticado mais desporto desde que sofreu o acidente que o deixou paraplégico do que antes desse fatídico dia e, a par da esgrima, joga também andebol. Antes disso, andou pelo basquetebol em Quarteira e pelo atletismo, lançamento do disco, do dardo e do peso, em Vila Real de Santo António. “Um dia, o professor Marco Rojo encontrou-me e perguntou-me se queria tentar a esgrima, gostei e, ao fim de dois anos já era campeão nacional. Quando era miúdo jogava só à bola e basquetebol com os amigos da rua, depois do acidente, já pratiquei todo o tipo de desporto que há para deficientes”, indica, reconhecendo que, no início, nem sabia que existia em Portugal desporto adaptado.

O eterno tormento da falta de apoios Hélder Farroba experimentou a esgrima e foi paixão à primeira vista, ALGARVE INFORMATIVO #89


Hélder Farroba com o Treinador Marco Rojo

com a vantagem acrescida de treinar mais perto de casa. E engane-se quem pense que é uma modalidade pouco exigente, aliás, só de assistir a alguns minutos do treino fica-se cansado, havendo ainda o problema do calor que o fato de proteção provoca. “Mas, quem faz por gosto, não se cansa e o objetivo é ir mais longe na esgrima. Até agora tenho estado só com o florete mas, nas competições internacionais, o esgrimista precisa jogar pelo menos com duas armas. O professor ainda não decidiu se avanço para a espada ou para o sabre”, refere o entrevistado, que também pretende ingressar rapidamente no circuito espanhol da esgrima em cadeira de rodas. Entretanto, a transição de desportos coletivos como o basquetebol e o ALGARVE INFORMATIVO #89

andebol, em que o importante é o coletivo, para a esgrima, onde se combate sozinho contra outro adversário, não causou grandes problemas para Hélder Farroba. “É um desporto muito gentil, de cavalheiro, tem que se pensar bastante no que se vai ou não fazer e tentar adivinhar o que o outro vai fazer. Não é um desporto de força, mas sim de agilidade e estratégia, tática”, descreve, explicando que, na vertente em cadeira de rodas, é usada uma base para os atletas estarem fixos numa posição. “Dali não saímos, a única coisa que se mexe é o corpo, daí ser essencial ter agilidade e velocidade de movimentos. São ataques tão rápidos que, às vezes, nem sabemos de onde apareceram”.

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A par dos treinos do ginásio da Escola EB 2,3 Dr. Alberto Iria, Hélder Farroba faz «ponta» em casa, um exercício onde se colocam quatro alvos na parede e, depois, se afina a mira com o florete ou a espada. O próximo passo é aprimorar a condição física, até porque, no dia seguinte, ia iniciar igualmente a prática do andebol em cadeira de rodas. Ou seja, o olhanense é daqueles que prefere ocupar a maior parte do dia com atividades físicas do que ficar em casa a lamentar-se do seu infortúnio e a pensar em coisas que não deve. “Aqui estou distraído e quero ver se arranjo mais atletas, porque a esgrima adaptada ainda está pouco desenvolvida no nosso país. Fui agora convidado para realizar um estágio na Polónia, mas ainda não sei se consigo ir, porque apoios não há para nada em Portugal. Eu e o professor tivemos que andar a bater porta a porta para reunir verbas para ir ao Campeonato do Mundo na Hungria e quero deixar o meu sincero obrigado a todos os que ajudaram a que isso acontecesse”, agradece, falando em cerca de quatro mil euros entre viagens, estadias, inscrições e alimentação. Menos despesas há no dia-a-dia porque a associação possui o material necessário para os treinos, mas o principal problema de Hélder Farroba prende-se com a sua cadeira de rodas, porque a modalidade exige modelos específicos. “Não posso ir para um campeonato com uma cadeira qualquer, tive que fazer algumas 57

adaptações à minha, mas o ideal era ter uma nova”, desabafa, com uma chave de fendas nas mãos depois de ter feito mais um pequeno ajuste. “Uma cadeira não custa cinco tostões mas, por agora, vou-me desenrascando com esta, porque estou desempregado e recebo uma pensão de invalidez que não dá para nada. Se fosse um futebolista tinha mais facilidades para arranjar apoios, mas Portugal é assim. No campeonato do mundo vi países que levavam 20 ou 30 atletas”, conta. “Vi pessoas da minha idade e até mais velhos e pareciam umas máquinas a competir, fiquei maravilhado”. Como a hora do treino se aproximava do fim, deixamos Hélder ALGARVE INFORMATIVO #89


Farroba a concluir os últimos exercícios e fomos conversar com Marco Rojo, professor de esgrima há cerca de 15 anos, depois de ter feito todo o percurso como atleta de alta competição. Sempre de olho atento aos seus pupilos, o instrutor explica que a Esgrimalgarve foi a evolução natural do clube de esgrima que existia na Escola EB 2,3 Dr. Alberto Iria desde 2000 e que, por questões legais, teve que transformar-se numa associação sem fins lucrativos para ter acesso a alguns apoios e contratos-programa. E foi Marco Rojo que descobriu Hélder Farroba há cerca de oito anos, num episódio algo caricato. “Tinha feito a formação de esgrima em cadeira de rodas e não tinha atletas. Um dia vi o Hélder a passar na rua, fui atrás dele no meu carro, expliquei-lhe o que estávamos a fazer e perguntei-lhe se queria experimentar”, recorda, frisando que a presença do olhanense no Campeonato do Mundo da Hungria também foi fora do habitual. “Ao Mundial vai a elite de cada país e o Hélder é um campeão nacional num país sem campeonato e é o único atleta português que treina esgrima com regularidade. Por isso, sempre que há provas, ele ganha com naturalidade, daí ter ido à Hungria”. Neste contexto, Marco Rojo entende que a prestação do seu aluno foi exatamente o que tinham antecipado, não tendo conseguido vencer nenhum combate por não ter a tal rotina competitiva. “Bastava olhar para os atletas inscritos para ver as suas carreiras desportivas, com uma série de ALGARVE INFORMATIVO #89

provas internacionais no currículo, duas ou três provas por mês. O Hélder tem uma competição mais a sério de cinco em cinco anos, está tudo dito”, indica o instrutor. “Como ele só consegue treinar comigo, habituou-se ao meu estilo de esgrima, ao meu jogo, às minhas ações e reações. Eventualmente é mais fácil ele vencer-me do que a outro atleta qualquer”, admite. De qualquer modo, a ida à Hungria serviu para dar mais experiência competitiva a Hélder Farroba mas também para abrir portas e horizontes, com polacos, alemães, espanhóis e ingleses a manifestarem vontade para ajudar o olhanense a progredir na modalidade. “A seleção polaca convidou o Hélder, outro atleta e um treinador a estagiar com eles e oferecem o alojamento e a alimentação, só a viagem é que fica por nossa conta. Os espanhóis também nos convidaram para participar no seu campeonato e, como o coordenador de esgrima em cadeira de rodas é de Málaga e as provas são de Madrid para cima, nós encontramo-nos em Sevilha ou algures pelo caminho para reduzir os custos”, adianta Marco Rojo. “Em Portugal, se treinar uma equipa de futebol que esteja no último lugar da quinta divisão, arranjo apoios de toda a gente. Se tiver aqui um campeão nacional ou um vicecampeão do mundo, tenho que bater a 500 portas para receber um apoio”, lamenta.

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Apoios que chegam, felizmente, da Conserveira do Sul desde 2000, mas as restantes ajudas são mais pontuais e para eventos concretos, como foi agora a ida de Hélder Farroba à Hungria. “Mas esta queixão não é só minha, é de todos os que trabalham com modalidades menos visíveis. No hóquei em patins e o ciclismo têm apoios, na canoagem são capazes agora de conseguir porque ganharam uns campeonatos, no ténis de mesa, como não passaram dos quartos-de-final, se calhar vão ter mais dificuldades outra vez. O futebol abarca tudo”, observa o treinador, confirmando que a situação

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de Hélder Farroba é ainda mais sensível. “Vive de uma pensão de invalidez de 280 euros por mês, mas tem uma força de vontade enorme. É um guerreiro, muito lutador e dedicado e um bom exemplo para motivar pessoas que estejam em condições semelhantes. O Hélder merecia ser mais conhecido e ele não quer caridade, quer conquistar as coisas e ter um trabalho onde mostre o seu valor” . A caminho do centenário: Entrevista publicada no número 27 da Revista Algarve Informativo, a 4 de outubro de 2015

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Estátuas Vivas de Natal regressaram a Lagoa

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epois do sucesso da primeira edição, a Câmara Municipal de Lagoa voltou a trazer estátuas vivas ao centro da cidade, nos dias 16 e 17 de dezembro, para rejúbilo de centenas de pessoas que não esconderam o apreço pela autenticidade e qualidade destes artistas. Com origem no antigo teatro grego, trata-se de uma performance em locais públicos onde um artista de rua imita uma estátua e que se tornou habitual avistar no quotidiano das grandes metrópoles. Na tarde de sexta-feira, manhã de sábado, observavam-se, assim, na Rua 25 de Abril e no Largo 5 de Outubro, 10 artistas que encarnavam personagens baseadas em temáticas tão díspares como a gastronomia e a literatura, o barroco e o religioso, o histórico e a natureza. Ao longe, perfeitamente imoveis, assemelhavam-se a estátuas de pedra, que ganhavam vida quando se olhava mais de perto e com maior atenção, levando muitos transeuntes, residentes e visitantes estrangeiros, a tirarem fotografias de recordação. A segunda edição das «Estátuas Vivas no Natal» foi repleta de magia e de cumplicidade entre os participantes e o público, num evento que pretendeu divulgar e dignificar a criação artística nesta arte performativa e, simultaneamente, animar o centro de Lagoa e dinamizar o comércio local nesta época natalícia . Texto:

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