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Algarve debateu Economia Circular
REPORTAGEM
Algarve discutiu Economia Circular
Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina

João Pedro Matos Fernandes, Ministro do Ambiente e da Transição Energética e Francisco Serra, Presidente da CCDR Algarve
A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve (CCDR Algarve) promoveu recentemente um seminário sobre Economia Circular com o intuito de juntar todos os intervenientes/parceiros e promover um forte momento de divulgação e apresentação de iniciativas/trabalhos em decurso no Algarve. O seminário inseriu-se no contexto da implementação da Agenda Regional de Transição para a Economia Circular do Algarve, enquadrada pelo Plano de Ação para Economia Circular, e entre os oradores destacaram-se membros do Governo, representantes da Comissão Europeia, da AMAL – Comunidade Intermunicipal do Algarve e da Região de Turismo do Algarve, de diversos centros de investigação da Universidade do Algarve, bem como muitos parceiros das áreas da economia e do ambiente. “A Economia Circular constitui, hoje, um tema prioritário da política pública nacional e internacional, porque uma sociedade sem desperdício assenta em práticas de produção e consumo sustentáveis. O que, há uns anos, poderia configurar uma utopia, é atualmente uma urgência para todos”, garantiu Nuno Marques, vice-presidente da CCDR Algarve na sessão de abertura.
De acordo com Nuno Marques, a “transição para uma economia mais circular, em que o valor dos produtos, materiais e recursos, se mantém na economia o máximo de tempo possível e a produção de resíduos se reduz ao mínimo, é um contributo fundamental para os esforços da União Europeia para desenvolver uma economia sustentável, hipocarbónica, eficiente em termos de recursos e competitiva”. “Prevê-se que a Economia Circular promova a inovação e a criatividade, impulsione a competitividade das empresas e dos estados, a criação de emprego local e oportunidades para integração e coesão social. A redução do consumo de energia e de recursos naturais contribuirá para evitar os danos irreversíveis a um ritmo que excede a capacidade de renovação”, frisou o dirigente, lembrando que Portugal possui um plano de ação para a Economia Circular há menos de um ano e todo o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido para a sua implementação visa a criação de agendas regionais de transição “que devem ser um ponto de partida para a colaboração, estimulando a troca de conhecimento, a formação de redes colaborativas – empresariais, científicas ou outras – projetos conjuntos e definição de mecanismos de investimento coordenados”.

Nuno Marques, vice-presidente da CCDR Algarve
A representar os autarcas algarvios na sessão de abertura do seminário esteve Jorge Botelho, presidente da AMAL e da Câmara Municipal de Tavira, que reconheceu que muitas associações empresariais, sociais e ambientais não têm encontrado, na administração pública e outros agentes com responsabilidade, o parceiro ideal para se aprofundarem estratégias sobre reutilização, redução, recuperação ou reciclagem. “Aumenta a população e, se continuar a aumentar o consumo de recursos, seguramente que o Planeta não terá grande vida. Há um caminho enorme a percorrer e as autarquias estão naturalmente preocupadas com este assunto. Defender a descentralização e a corresponsabilização daquilo que é a decisão de base local para alcançarmos resultados nacionais, implica um grande envolvimento de todos, uma parceria dos agentes locais e nacionais e, acima de tudo, da sociedade civil”, salientou Jorge Botelho.

Jorge Botelho, presidente da AMAL
O processo de alteração de comportamentos gerará investimentos enormes em investigação e desenvolvimento, mas também em capacidade instalada para se colocarem em práticas as políticas, pelo que “haverá muitas ilusões e desilusões, mas no fim conseguiremos atingir o objetivo, pois não há outro caminho possível”. “Temos de investir, envolver parcerias e os atores e tomar medidas que efetivamente cheguem ao terreno, porque há muitas coisas que estão no papel e que, por um motivo ou outro, não se concretizam. Os municípios estão neste processo, em pequenas escalas, é certo, sabemos que a taxa de carbono penaliza brutalmente os governos neste equilíbrio que deve existir para a sustentabilidade do planeta, sabemos que todos nós devemos dar o nosso contributo”, afirmou Jorge Botelho, razão pela qual a AMAL encomendou um Plano de Adaptação às Alterações Climáticas na região do Algarve, “para podermos discutir a alteração do clima, o efeito na linha de costa e nos fenómenos extremos a que estamos a assistir”, justificou o edil tavirense.
Papel importante neste processo terá, certamente, a Universidade do Algarve, porque o conhecimento e a inovação são essenciais para vencer os desafios que o planeta tem pela frente. “Espero que, daqui a 200 ou 300 anos, se continue a estudar história, o que significa que ainda cá estaremos, e vai-se olhar para o Século XX como um período vertiginoso, o século do limiar, em que, a partir de determinado momento, passamos para a sociedade do «pronto-a-vestir», da «chiclete», em que é mais barato comprar novo do que reparar”, observou Paulo Águas, reitor da UAlg. “Hoje vive-se muito melhor do que há 50 ou 100 anos atrás devido à galopante utilização de recursos naturais que a tecnologia tem permitido a custos baixos. Contudo, se continuarmos neste caminho, vamos deparar-nos com um precipício que devemos evitar. Vamos passar para um paradigma em que o desenvolvimento económico não pode estar assente na exploração dos recursos naturais, sobretudo dos não renováveis”, indicou o representante da academia algarvia.

Paulo Águas, reitor da Universidade do Algarve
Depois de uma jornada de dois dias de muito trabalho, Francisco Serra, presidente da CCDR Algarve, assumiu que “todos queremos caminhar para uma sociedade sem desperdício, assente em práticas de produção e consumo sustentáveis”, destacando ainda que o seminário sobre a Economia Circular no Algarve serviu para sedimentar os primeiros passos para a construção de uma Agenda Regional com entidades públicas e privadas que junte todos os intervenientes e parceiros; e induzir um estímulo na região para prosseguir a concretização e a futura implementação desta agenda, que, “mais do que um documento, pretende promover um processo de catalisação da colaboração de todos, criar condições para estimular troca de conhecimento e estabelecer comunicação em rede entre todos os atores”.
Francisco Serra recordou que a Organização Mundial tem, no programa «OnePlanet», como prioridade para 2019 aproximar o tema da Economia Circular para os stakeholders do turismo e sublinhou a relevância da criação do Observatório Regional sobre essa matéria. “Demos nestes dois dias resposta a muitas questões e levantámos ainda mais perguntas. Precisamos, por exemplo, de trabalhar muito para o bom cumprimento do Protocolo de Gestão de Resíduos de Construção e Demolição, é necessário um diagnóstico real com mapeamento, assegurar a sua rastreabilidade e quantificação. No setor agroalimentar, agroflorestal e biotecnologia verde, abordámos os resíduos - desde as embalagens de fitofármacos aos plásticos -, a ecocondicionalidade e a transformação de resíduos a produtos. Outras áreas temáticas ainda a explorar devem ser equacionadas como as Compras Públicas Ecológicas, a Energia, o Mar, o Ordenamento do Território, a Mobilidade de Pessoas e Bens, o Combate ao Desperdício Alimentar”, defendeu o presidente da CCDR Algarve.

O Ministro do Ambiente e da Transição Energética não dúvida de que os 300 anos da Modernidade assentes num modelo de economia linear se traduziram num crescimento que gerou maior bem-estar para a população, pelo que não será com “um clique que vamos desmontar aquilo que construímos ao longo deste tempo”. “Em 2050 vamos ser 10 mil milhões de habitantes no Planeta Terra, portanto, a economia mundial tem que crescer, mas regenerando recursos e sendo hipocarbónica”, apontou João Pedro Matos Fernandes. “Se vem do Sol por dia tanta energia como aquela que a espécie humana consome num ano, se formos espertos, vamos resolver o problema da energia. Já o problema das matérias-primas não tem solução, não há Terra 2.0. Só temos um fornecedor, a biosfera, pelo que teremos cada vez mais que incluir no discurso e nas ações a «eficiência material». Temos mesmo de usar poucos recursos”, alertou o Ministro.
Conceber os produtos de modo a que todos os seus componentes possam ser reaproveitados no final do seu ciclo de vida também faz parte da Economia Circular e o governante revelou que a Europa apenas possui 9 por cento das matérias críticas de que necessita para os seus mais ambiciosos projetos económicos. “Aquilo que já extraímos da natureza muito provavelmente é bastante superior ao que vamos voltar a precisar de extrair, nos próximos tempos, se formos eficientes no seu uso e se o conseguirmos reintroduzir no ciclo de produção”, acredita João Pedro Matos Fernandes. “Quando formos 10 mil milhões de habitantes, não vamos ter o atual bem-estar se continuarmos a ser donos de tudo aquilo que usamos. Não preciso de um escadote lá em casa para mudar uma lâmpada que se funde de três em três anos. Não preciso comprar uma máquina de lavar roupa ou louça, mas ciclos de lavagem. Isso significa deixarmos de vender bens para passarmos a vender serviços que têm bens lá dentro”, aconselhou.