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Falta quase tudo para maior parte das crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade

Por: Milânia Ribeiro

Recentemente, Pesquisa da UNICEF apontou que 76,6% de crianças e adolescentes vivem em situação de pobreza multidimensional em Sergipe, isto é, não têm acesso à educação, informação, trabalho infantil, água, moradia, saneamento e renda. Situação vivida por Josefa Ribeiro, 54 anos, mãe de cinco filhos, lavradora, que começou a trabalhar muito cedo na roça, e junto com seu marido teve dificuldade para criar seus filhos, pois faltava dinheiro para suprir necessidades básicas diárias.

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Atualmente, Josefa Ribeiro vive com apenas um salário-mínimo e conta com a ajuda do Bolsa Família, para arcar com as despesas da casa e os estudos de suas filhas. O benefício também ajuda a sua filha mais velha, que é lavradora e tem o auxílio como única renda para se sustentar e criar seu filho de 4 anos.

Em relação à educação, os dados oficiais, da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua, revelou que 13,9% de crianças e adolescentes são privadas do direito à alfabetização, isso significa que aproximadamente 3 milhões das crianças não sabem ler e escrever. Essa circunstância causa a exclusão social, a ausência de direitos e, futuramente, menos oportunidades no âmbito profissional.

Para tentar reverter esse quadro, as escolas públicas do setor estadual e municipal estão aplicando projetos de aprendizagem como gincanas e cantos de leitura, além da iniciativa “Busca Ativa Escolar”, que é uma ação trabalhada pelo Governo de Sergipe, por meio da Secretaria de Estado da Educação e da Cultura (Seduc) junto aos municípios, com intuito de combater a evasão escolar. Por meio do projeto, os profissionais das escolas, do conselho tutelar e os assistentes sociais vão ao endereço do aluno para saber o motivo da ausência às aulas e matricular essas crianças. Segundo o governo do estado, em 2022 foram 1.831 crianças e adolescentes de 4 a 17 anos rematriculados através desta plataforma.

Para a pedagoga Maria Cristina da Cunha, diversos fatores contribuem para o atraso na aprendizagem, como a falta de acompanhamento da família, transporte e a frequência irregular nas escolas. Fatores que levam à evasão escolar, assim como o trabalho infantil, pois muitas crianças e adolescentes vulneraveis deixam de ir à escola para trabalhar nas feiras e nas ruas.

Nesse sentido, a pesquisa da UNICEF apontou que 4,6%, ou seja, 1 milhão de crianças e adolescentes de 10 a 13 anos sofrem do trabalho infantil. Para fortalecer o combate diário a esse tipo de exploração, a Secretaria de Assistência Social e

Cidadania do Estado (Seasc) iniciou Salas de Atendimentos Virtuais que são realizadas por meio de diálogo entre um técnico estadual e um representante municipal que, juntos, buscam o fortalecimento e desenvolvimento de estratégias de prevenção ao trabalho infantil, para garantir ao grupo infantojuvenil o direito de brincar, estudar e participar de vivências que são próprias da infância e contribuem decisivamente para o seu desenvolvimento, afima a Seasc.

LUTA CONTRA A POBREZA

Segundo a professora Maria da Cunha, a situação financeira das famílias interfere muito na vida escolar dos alunos e muitos pais não têm dinheiro para pagar um plano de internet, que é uma ferramenta muito usada na aprendizagem dos alunos, principalmente no período do covid 19, em que as aulas foram na modalidade remota.

Em relação à informação, os dados da UNICEF apontaram que 12,9%, isto é, 2,8 milhões de crianças e adolescentes são privados do acesso à internet e à televisão. Essa situação é vivida por Andréa Cristina, mãe de três filhos que, para suprir tal necessidade, buscou a banca escolar, alternativa que só foi possível porque o pai da criança arca com a mensalidade, já que trabalha com reciclagem e não tem uma renda fixa mensal, apenas o Bolsa Família.

Diante dos dados da Pnad Contínua, fica evidente a triste realidade enfrentada por 56,5% de crianças e adolescentes de 0 a 17 anos, isto significa que aproximadamente 12,4 milhões de indivíduos jovens vivem em um domicílio cuja renda familiar se encontra acima da linha de pobreza monetária, ou seja, renda de até 497 reais per capita, Andréia Cristina relatou que, por não ter renda fixa, enfrenta dificuldades para obter alimentos, mas nunca chegou a passar fome. Quando falta comida, busca ajuda no bairro onde mora ou na igreja espírita,

João de Angelos. “Ainda assim, a ausência de dinheiro para comprar alimento é muito sofrida, principalmente quando meu filho de 4 anos me pede nescau, e não tenho dinheiro para comprar”, completou Andreia Cristina.

Para Silvia Voci, Coordenadora do Observatório de Segurança Alimentar do Estado de Sergipe (OSANES/ UFS), a falta de comida na mesa de crianças e adolescentes pode causar diversos problemas de saúde e prejudicar a aprendizagem e o rendimento escolar. Essa situação pode implicar a capacidade futura de romper o ciclo intergeracional da pobreza e pode ter o desenvolvimento biopsicossocial comprometido.

Dados do último inquérito da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan) destinada à vigilância da segurança alimentar e nutricional (Vigisan), revelou que a fome atinge 30% dos domicílios sergipanos, ou seja, dos 450 avaliados, 135 lares não têm o que comer. Quando somada à insegurança alimentar apenas em domicílios com crianças menores de 10 anos, a taxa sobe para 54,6%, afetando cerca de 245 domicílios e prejudicando a qualidade de vida das crianças afetadas pela fome.

Já em relação à moradia, a pesquisa revelou que 3,7% , em outras palavras, mais de 800 mil crianças e adolescentes vivem em moradias precárias, com 4 ou mais pessoas por dormitório ou paredes inadequadas, como madeira aproveitada. Além disso, 49,1% não têm acesso ao saneamento. Inclusive, cerca de 10 milhões de jovens não têm acesso a banheiro e esgoto, enquanto 7,5% não têm acesso à água, privando aproximadamente 1,6 milhões de crianças de fazer atividades básicas diárias, como escovar os dentes e tomar banho.

Cenildes Pereira trabalha na Secretaria de Saúde de Lagarto, e relatou que na pandemia da Covid-19, saía para distribuir materiais higiênicos e encontrava famílias vulneráveis vivendo em moradias precárias sem saneamento e água. “Eu fazia vaquinha junto com a equipe da saúde, na qual tirava dinheiro do nosso bolso para ajudar aquelas famílias a comprar alimento, e pagar água, além de ajudar com cestas básicas e orientar essas pessoas a procurar o CRAS”, Continua Cenildes.

O Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) é um órgão público presente nas cidades brasileiras, e tem como objetivo principal prestar serviços de assistência social para famílias em situação de vulnerabilidade. Através do centro, as famílias podem preencher o cadastro com os documentos necessários para aderir o cadastro único, receber o Bolsa Família e doação de cestas básicas, além de contar com a garantia no acesso aos direitos sociais, com assistencialismo.

A coordenadora do Osanes Silvia Voci, acredita que as ações do CRAS ajudam a garantir os direitos básicos, mas esses atos apenas não resolvem o problema, seria preciso ampliar o emprego, diminuir a informalidade, conter a inflação e fomentar a produção de alimentos, da agricultura familiar para abastcimento interno.