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Os Desafios da Inexperiência

Minha inspiração para escrever crônicas havia desaparecido completamente. Nada vinha à minha mente, então procurei uma jovem articulista que, além de linda, tinha uma inteligência fora do comum. Seus artigos eram impecáveis em ideias, desfecho e conclusão, carregavam uma clareza impressionante. Decidi pedir a ela que me socorresse nesse item, que assumisse meu lugar com a minha crônica mensal. Ela aceitou prontamente, mas logo admitiu:

— Eu nunca escrevi uma crônica antes, mas vou tentar.

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— Isso não será um problema para você – respondi confiante, acreditando que ela faria isso facilmente. Afinal, um gênio é um gênio!

Passaram-se alguns dias e, apesar de sua afirmação, a crônica não se materializava. Ela podia ter sentido dificuldades diante da nova tarefa, mesmo conhecendo muito bem outros tipos de artigos em prosa. Essa demanda a teria pegado de surpresa.

Recebi uma mensagem dela no WhatsApp e pensei que seria a matéria.

— Olha, não estou conseguindo escrever. Poderia me ajudar? – Pediu ela.

— Claro! Você precisa capturar a sutileza e a rudeza, bem como a inteligência e a estupidez da vida cotidiana, e mostrar esses contrastes de forma mais lúdica e cômica possível.

Ela apenas respondeu com uma exclamação longa:

— Huummm!... Como se faz isso? Onde se en-

contra isso?

Foi aí que eu atentei para um detalhe até então despercebido. A bela e incomparável Cassandra Keller foi criada em uma casa abastada, ladeada de luxos e mimos. Seus pais, por excesso de zelo, nunca a deixavam fazer nada além de estudar. Todo o seu conhecimento do mundo vinha dos livros que ela devorava como uma válvula de escape. O prestativo motorista da família, Dantas Neves, a levava e a trazia dos magazines de grife, e ela nunca esteve por si só um instante, nunca experimentou a sensação de estar perdida em uma rua repleta de pedestres vindo e indo. Ela, em tempo algum, provou o gosto real da vida na cidade, o sabor de um pastel de feira, um churrasquinho de esquina.

Agora, aos 20 anos, Cassandra está na faculdade em uma cidade longe das casas de seus pais, enfrentando a vida por sua conta e risco, testando seus limites de inexperiência, com o medo habitual do desconhecido. Tudo é tão novo na vida dela que um simples ato cotidiano a surpreende. Na primeira semana, ela escreveu para seus pais, entusiasmada e feliz por ter andado em um ônibus circular, que estava lotado de estudantes da faculdade. Aquilo era algo grandioso e exótico para ela, como ela disse na sua mensagem: “Mãe, eles compartilham o mesmo veículo, é fantástico, parece uma festa sobre rodas.”

Agora ela está ansiosa para ver como é aquele mesmo ônibus lotado de trabalhadores suados, voltando para casa depois de um dia de trabalho. Ela se choca com toda normalidade.

Retomando nosso assunto, ela não conseguia escrever sobre o contraste da sutileza e a rudeza da vida que nunca viveu. Por isso, ainda não havia material factual para sua inspiração.

— Ok, o que faço com esses fatos comuns a todos, mas estranhamente incomum para mim? Você sabe que eu nunca fui a uma padaria para comprar pão, eu nunca desconfiei que o leite viesse de vacas, sempre achei que vinha da caixinha. O que faço agora? –Perguntou ela tão surpresa com a vida simples.

— Ora, ora! Escreva sobre suas surpresas diante desses fatos novos e estranhos para você.

— Sim, vou fazer, mas tudo é estranho.

Ela tentou, mas não conseguiu escrever nenhuma linha e, sem saber por onde começar, acabou desistindo temporariamente. Foi então que percebi que ela estava em um camarote imaginário, assistindo ao show da vida real. Embora pudesse ver e sentir todas as coisas com mais intensidade, algo a impedia de escrever a crônica de sua vida.

— Sim, eu sei o que é –respondi meio desolado. Mas foi ali, naquele exato momento, que percebi que a escrita ia além das palavras em si, sendo uma expressão da alma e das experiências vividas. Ela não poderia fazê-lo, pois os fatos estavam acontecendo.

— E aí? O que está me faltando? – perguntou ela.

— Tempo.

Só para maiores Gonçalves Dias

por Tarcísio Alves

Antônio Gonçalves Dias (Aldeias Altas, 10 de agosto de 1823 – Guimarães, 3 de novembro de 1864) foi um poeta, advogado, jornalista, etnógrafo e teatrólogo brasileiro. Um grande expoente do romantismo brasileiro e da tradição literária conhecida como “indianismo”, é famoso por ter escrito o poema “Canção do Exílio”, o curto poema épico I-Juca-Pirama e muitos outros poemas nacionalistas e patrióticos. Foi um ávido pesquisador das línguas indígenas e do folclore brasileiro. No dia 3 de novembro de 1864 morreu o grande poeta Gonçalves Dias. Depois de uma longa viagem da França para o Brasil, que já durava 53 dias, gravemente enfermo, ele estava prestes a realizar o seu objetivo: chegar ao Maranhão e rever amigos e familiares, antes de morrer. Era o único passageiro a bordo do velho veleiro “Ville de Boulogne”, que tinha 12 tripulantes. Porém, já na costa maranhense, o barco colidiu com um banco de areia e

Canção do exílio

Minha terra tem palmeiras Onde canta o Sabiá, As aves, que aqui gorjeiam, Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas, Nossas várzeas têm mais flores, Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite, Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá.

Caldense

Fundado em 1986 jornal caldense/facebook.com.br www. issuu.com/caldense

WhatsApp: 33 98405-0007 partiu ao meio. Na confusão do naufrágio, o poeta, debilitado e sem mobilidade, foi esquecido pela tripulação em sua cabine, e morreu afogado. Seu corpo e os manuscritos inéditos que trazia consigo jamais foram encontrados.

Doação : O Caldense é um projeto de resgate de nossa história, de elevar nosso povo. Você pode contribuir com este projeto. Faça um PIX de qualquer valor para: 33 98405 0007 Caixa Econômica.

Minha terra tem primores, Que tais não encontro eu cá; Em cismar – sozinho, à noite –Mais prazer encontro eu lá;

Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá.

Não permita Deus que eu morra, Sem que eu volte para lá;

Sem que desfrute os primores Que não encontro por cá; Sem qu’inda aviste as palmeiras, Onde canta o Sabiá.

Preço por exemplar: Gratuito

Diretor: Jornalista José Matias /MTb 10846

Revisor: Tarciso Alves /MTb 8422

Diagramação: José MatiasColaboração voluntária : Tarciso Alves,/

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