Jornal Brasil de Fato / RS - Número 41

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ATIVISMO ROMARIA DA TERRA VAI DEFENDER O PLANETA COMO “NOSSA CASA COMUM”

PÁGINAS 4 E 5

GESTÃO APESAR DO GOLPISMO DO 8/1, NOVO GOVERNO

NO DESAFIO DAS RUAS

Fórum Social Mundial marca a largada dos movimentos populares em 2023 na batalha para recuperar um país devastado

RIO GRANDE DO SUL 30 de janeiro de 2023 distribuição gratuita brasildefato.com.br /brasildefators brasildefato.rs @BrasildeFatoRS
NEM
DIA
8
NÃO PAROU
UM
PÁGINA
Foto: Jorge Leão Foto: Ministério da Saúde/Divulgação

EDITORIAL

Destruindo a destruição

▶ A primeira tarefa de um governo que assume um país é construir aquele programa que defendeu na campanha e pelo qual foi eleito. Sim, em regra. Mas não após o governo de Jair Messias Bolsonaro.

Passados quatro anos do mais letal mandato da história da República, a primeira missão é destruir a destruição. Quem assume suas ruínas deve travar a marcha da devastação social, ambiental, econômica, política, sanitária e moral de um governante que se preparou somente para aniquilar. Como ele mesmo confessou, logo na largada de sua gestão, em março de 2019:

- O Brasil não é um terreno aberto onde nós iremos construir coisas para o nosso povo. Nós temos que desconstruir muita coisa, revelou ao discursar em jantar com expoentes da ultradireita em Nova York.

O resultado é o que estamos colhendo agora. A começar pela tentativa de parar o Brasil no dia seguinte à derrota do mandatário, seguida pela pregação aberta do golpe de Estado com a leniência ou algo pior das forças que tinham o dever legal de barrar o processo, a sabotagem da transição, tudo culminando com a imundície que emporcalhou os Três Poderes da República no dia 8 de janeiro.

Este último fato colocou o governo atuando 24 horas ao dia. Em um front brecando a ameaça de uma nova ditadura, em outro tratando de levar o país em frente, trocando pneu com o carro em movimento, atendendo emergências como a barbárie perpetrada contra o povo Yanomami num esforço para recuperar a terra arrasada, herança trágica de quem fugiu para o exterior.

Os tempos que teremos por diante exigirão muito de nós. Os atores, estrategistas e financiadores do golpismo já mostraram que não consideram nenhum limite. Serão quatro anos nos quais a participação popular e a mobilização terão que ser intensas e permanentes, cobrando compromissos dos muitos movimentos, associações, sindicatos, centrais e ONGs afinados com o projeto de um Brasil progressista, inclusivo, diverso e generoso.

Sob esse aspecto duas iniciativas que enfocamos nesta edição – o Fórum Social Mundial e a Romaria da Terra – sinalizam que o campo popular-democrático do Rio Grande começa 2023 ciente das suas responsabilidades.

OPINIÃO

A fome é inconstitucional

▶ O problema é a fome, não os números. A repercussão sobre a fala da ministra Marina Silva no Fórum Econômico de Davos é um exemplo de como se pode tirar o foco daquilo que é o essencial. Ela disse que cerca de metade da população brasileira estaria em situação de fome, e estava, obviamente, se referindo à insegurança alimentar e não à fome especificamente, mas foi duramente atacada por setores da mídia tradicional.

Podemos divergir em relação aos números ou às metodologias de cálculo, mas não há dúvida de que o Brasil voltou ao mapa mundial da fome e isso não pode ser naturalizado ou minimizado.

As imagens chocantes do povo Yanomami, literalmente abandonado para morrer de fome, de doenças e de contaminação por mercúrio, expropriado das suas terras e das condições mínimas de subsistência, dizem muito mais sobre a fome do que os relatórios. Claramente, sofrem uma estratégia deliberada de extermínio humano em favor dos interesses de mercado.

A fome realmente aumentou nos últimos anos, mas há quem insista em reduzir o problema a uma questão metodológica.

AS IMAGENS

CHOCANTES DO POVO YANOMAMI, LITERALMENTE ABANDONADO PARA MORRER DE FOME, DE DOENÇAS E DE CONTAMINAÇÃO POR MERCÚRIO, EXPROPRIADO DAS SUAS TERRAS E DAS CONDIÇÕES MÍNIMAS DE SUBSISTÊNCIA, DIZEM MUITO MAIS SOBRE A FOME DO QUE OS RELATÓRIOS.

Para os velhos defensores do Estado mínimo, os direitos negados constituem necessidades humanas não atendidas, que podem se transformar em ganhos para o mercado, e essa é uma das razões pelas quais defendem insistentemente a redução e a precarização das políticas públicas. Mas não vivemos num Estado mínimo. Independentemente das crenças, preferências ou ideologias de cada um, o Brasil está constituído como um Estado social e, neste país, a fome, além de ser desumana, é claramente inconstitucional.

A Constituição Federal, de 1988, é taxativa ao determinar que a alimentação é um direito social, assim como a saúde, a educação, a moradia, a renda básica, a previdência, entre outros. Logo, precisa ser garantida a todos, independente de terem ou não condições de pagar por isso, e se houvesse hierarquia entre os direitos, a manutenção da vida deveria, sem dúvida, preceder aos demais. Negar acesso aos direitos, em algumas situações, é uma arma que serve para matar, e os Yanomami são a prova, ainda viva, disso.

Não é possível continuar aceitando a manutenção dos privilégios fiscais para os setores mais ricos da sociedade, na forma de renúncias, nas facilidades para sonegar tributos ou mesmo na forma de subtributação das altas rendas e grandes patrimônios. A fome é inconstitucional, pois decorre de um direito não atendido, e a tributação dos super-ricos é a forma constitucional mais direta para enfrentar esta tragédia social. Além, é claro, da implementação de políticas de desenvolvimento sustentável e distributivo.

* Presidente do Instituto Justiça Fiscal (IJF)

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CHARGE | Santiago
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DÃO REAL PEREIRA DOS SANTOS *

ANÁLISE POLÍTICA

Os 30 dias de derrota provisória do fascismo

Quais os mais importantes movimentos de gestão política do governo que o presidente Lula realizou no seu primeiro mês de mandato?

▶ Para entender, de uma parte, as margens de segurança que ele operou e, de outra, para dimensionar seus aspectos simbólicos e os seus efeitos concretos sobre a vida política do país, é preciso - em primeiro lugarindicar o "estado da arte" que Lula encontrou no país.

Quero dizer, com esta preliminar, que mais importante do que as medidas do presidente é preciso deixar claro qual foi a subjetividade política sobre a qual se firmaram as propostas bolsonarianas. Estas foram bem recebidas nas massas populares, de forma alheia aos conceitos das "classes dominantes" sobre como exercer racionalmente o seu poder político e apresentar os complexos programas econômicos que são disputados no espaço político, para oferecer a redenção nacional "dentro da ordem".

COMO ANUNCIOU, BOLSONARO “VEIO PARA DESTRUIR”

Bolsonaro fez um governo distópico que cumpriu o que prometeu durante a sua campanha eleitoral. Prometeu matar e torturar, anunciou que "veio para destruir" e naturalizou a misoginia, o racismo, o

sexismo ("este apartamento usei para comer gente!"); combateu a globalização a partir de concepções da extrema direita mundial ("Trump, eu te amo!"); e dividiu os seres humanos, que compõem a nossa miscigenação étnica, entre os que são pesados em "arrobas" - como são pesados os bois que vão para o matadouro - e os que são balanceados como brancos de uma nação "pura", medidos por outras gravidades de identidade social.

Além de tudo isso, que não parece pouco, seu governo defendeu que o ideal seria, como opção estratégica, que fôssemos um "pária mundial", na voz do seu psicopático ministro de Relações Exteriores. Dito isso, temos o contexto mais geral daquilo que parece loucura, mas era sobretudo a emergência de um tipo de fascismo político, que já era "societal", como mostrou Boaventura, antes de apresentar-se plenamente como política e crueldade a partir do Estado.

DIVISÃO SERVIU ÀS CLASSES DOMINANTES

A divisão extrema, realizada no país, em todo período de campanha bolsonarista e durante a sua gestão demoníaca, trouxe à tona verdades concretas, que estavam adormecidas no inconsciente das massas - acima das divisões entre classes sociais, que já nos permite concluir o seguinte: a má consciência real, de vastos setores populares que estariam "objetivamente" no nosso camponeste momento históricofoi o dado político mais forte que atraiu as classes dominantes para o bolsonarismo, e não ao contrário.

Não foram as classes do-

minantes - adictas da democracia liberal "contida" ou de ditaduras militares - que forjaram o lastro de massas do bolsonarismo. Foi principalmente o fascismo "popular", que estava contido no inconsciente dos explorados e excluídos que, provocado pelo "líder", abriu para as classes dominantes a oportunidade de domesticação de Bolsonaro, para que ele se tornasse, com Guedes, o epígono das reformas.

Bolsonaro, arremedando Mussolini, "desprezou a arrogância dos intelectuais" (qualquer um que defenda a humanidade dos outros); sobretudo cultivou a ideia da morte, como aríete para arredar qualquer problema que bloqueasse a sua grandiosidade resolutiva.

Sua capacidade de responder, sem censura civilizatória, com o trágico e o apocalíptico - sempre no limite entre o que é pura ficção e o duramente real - esteve na sua própria existência, também como tragédia e mistificação. O que é simbólico e duramente real parecem repetir, sempre, que “se eu morrer vai tudo por água abaixo”.

LULA COMEÇA BEM, COMBINANDO REALISMO DEMOCRÁTICO COM A MUDANÇA HUMANISTA, PARA UM PAÍS ASSEDIADO PELA

MAIOR BARBÁRIE JAMAIS VISTA NA SUA HISTÓRIA"

(TARSO GENRO)

Da nossa parte, foi um arrogante equívoco pensar que o alcance dessas políticas estava nos limites do "cercadinho" palaciano, quando - na verdade - todo o país era um enorme campo cercado, com diversas modulações de gado ruminando a violência e os seus recalques. Até um certo momento tal predisposição para a barbárie foi trabalhada pela mídia tradicional como um modo legítimo de mandar e governar. A questão era matar Lula e destruir a esquerda!

PACTUAÇÃO DE UMA SAÍDA

ALTIVA PARA A QUESTÃO DA

TUTELA MILITAR

Neste novo campo da irracionalidade radical, ensejada de "baixo" para cima - das massas para as elitesrecomeçou também a vicejar a razão democrática, que sempre sobreviveu no iluminismo, ao lado da irracionalidade, da industrialização da morte, dos massacres coloniais, que sempre ganharam expressões simbólicas de resistência, na América Latina e no mundo, através de líderes referenciais na democracia política, como Allende, Mandela, Kemal Ataturk, Lula, Lumumba e Jacobo Arbenz, para citar alguns mais próximos da nossa experiência de formação da nação.

Os movimentos na política externa, a criminalização dos genocídios do bolsonarismo na saúde públi-

ca, a frontal impugnação do genocídio indígena, a expansão de uma política ambiental sadia a partir da Amazônia, a ampliação da frente política a sua máxima possibilidade coerente, bem como a pactuação de uma saída altiva e respeitosa, para questão da tutela militar do Estado.

Estas atitudes de gestão política do Estado, combinadas com a guerra contra a fome (adaptando o orçamento público para o cumprimento desta missão urgente) mostram que Lula começa bem, combinando realismo democrático com a mudança humanista, para um país assediado pela maior barbárie jamais vista na sua história.

SEM ANISTIA AOS FASCISTAS E BANDIDOS

Para Adorno e Horkheimer, o fascismo é um complemento simétrico da racionalidade moderna, mas para nós - no momento - ele pode ser um despejo jogado na sarjeta da democracia, cuja derrota final ainda está em disputa. Mas Lula, conosco, já começou.

Fazer da tolerância, combinada com a firmeza inteligente - curtida com o realismo das características dos novos tempos - significa colocar a estratégia democrática como centro da disputa pelo futuro. Para isso ser provável, sem perdão e sem anistia, fascistas e bandidos - exclua-se os ingênuos e os idiotas inofensivos - não podem ser perdoados.

TARSO GENRO - ESPECIAL PARA O BRASIL DE FATO RS
Foto: Ricardo Stuckert
Lula com os Yanomami: frontal impugnação do genocídio indígena
Foto: Guilherme Santos / Sul21 EDIÇÃO N O 41 - 30 DE JANEIRO DE 2023 - WWW.BRASILDEFATORS.COM.BR 3

LUTAS SOCIAIS

45ª Romaria da Terra defende terra

Edição deste ano vai acontecer em assentamento da reforma agrária de

REDAÇÃO

▶ Terra e pão é o tema da próxima Romaria da Terra, a 45ª edição, marcada para o dia 21 de fevereiro, terça-feira de Carnaval. Vai acontecer no assentamento Integração GaúchaIrga, em Eldorado do Sul, distante 17 quilômetros de Porto Alegre.

Todos os anos, desde 1978, a Romaria atrai milhares de romeiros e romeiras de diferentes lugares a se encontrarem para recordar e celebrar os mártires das lutas sociais que tombaram na defesa dos mais pobres.

“A Romaria da Terra volta seu olhar para a temática da terra e do pão porque o planeta Terra não é mercadoria, ele é nossa casa comum, é território de todos os povos, precisa ser cuidado com amor e respeito”, diz Luiz Antônio Pasinato, da coordenação da Comissão Pastoral da Terra/RS. Ele lembra que a celebração “novamente volta seu olhar para um assentamento da reforma agrária, que expressa a luta e a organização dos movimentos do campo".

“MEMÓRIA, FÉ E ESPERANÇA”

Ele detalha um pouco mais as razões da escolha do assentamento de Eldorado do Sul para receber a Romaria: “o assentamento Integração Gaúcha possui uma experiência importantíssima de práticas agroecológicas, na produção do arroz agroecológico, frutas e hortaliças que são comercializadas em feiras orgânicas e mercados da região metropolitana”. E acrescenta que “produzir alimentos de qualidade livres de agrotóxicos é uma missão que exige op -

ção e vocação dos agricultores e agricultoras camponesas”.

O evento existe, segundo nota, “para reavivar a memória, a fé, a esperança, o cuidado, a solidariedade com os pobres da terra, fortalecer as lutas sociais e melhoria das condições de vida do povo do campo e da cidade”.

“Nossas causas são muitas: quilombolas, povos originários, sem terra, jovem da roça e da cidade, mulher camponesa e urbana, agricultores ecologistas”, cita frei Wilson Dallagnol, da coordenação da Romaria.

“DEUS NÃO TEM PARTE COM QUEM NÃO REPARTE”

Dallagnol enumera o que chama os “Dez Mandamentos do Romeiro pela Terra”: 1) Na terra onde os trabalhadores são expulsos, Deus é expulso também; 2) A riqueza dos pobres está na união e na luta por seus direitos; 3) Deus não tem parte com quem não reparte; 4) Quem não vive para servir não serve para viver; 5) Queremos terra na terra, já temos terra no céu; 6) O mundo será melhor quando o menor que padece acreditar no menor; 7) Cada um de nós é um profeta; 8) Só há Igreja viva onde há comunidade; 9) Só há Igreja viva onde se luta pela justiça; 10) Para Deus, o homem e a mulher são iguais.

Neste ano, a Romaria é organizada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), Via Campesina, MST, Conselho Indigenista Missionário Sul (Cimi), Comissão das Pastorais Sociais e Cooperativa dos Trabalhadores Assentados da Região de Porto Alegre (Cootap).

PROGRAMAÇÃO

19 e 20 de fevereiro - Acampamento dos Povos, no Assentamento Integração Gaúcha, Eldorado do Sul;

21 de fevereiro - Romaria da Terra

7h - Acolhida dos Romeiros e Romeiras no centro da cidade de Eldorado do Sul;

8h15 - Abertura da Romaria com falas, cantos e mística de louvor;

9h - Caminhada até o assentamento Integração Gaúcha com estações de reflexão sobre denúncia da fome, concentração da terra, dos

venenos, anúncio da ecologia, da solidariedade, dos direitos dos povos, cozinhas comunitárias, da conquista da terra;

11h - Celebração da missa;

12h - Almoço com partilha dos alimentos dos romeiros e prato de carreteiro servido pelos assentados;

13h - Momento cultural e falas das movimentos sociais, entidades, fila do povo, lançamento de livro;

15h30 - Mística de encerramento e envio dos símbolos (cruz e vela) para Diocese que sediará a próxima romaria.

Pão, elemento que integra o lema da edição deste ano
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Romeiros querem terra na terra pois “já temos terra no céu”

terra e pão

Eldorado do Sul

teRRA que vAi AcOlheR Os ROMeiROs nA sceu dA lutA Pel A RefORMA AGR áRiA

▶ A luta pela terra e por justiça social foi um dos pilares que uniu milhares de sem terras na busca de uma vida melhor e mais digna. Em 18 de setembro de 1989, mais de 1500 famílias ocuparam a fazenda Bacaraí, em Cruz Alta, Noroeste do Rio Grande. O local não cumpria sua função social, ou seja, não havia produção nem moradia em uma vasta propriedade. No acampamento, as famílias já discutiam formas de como cultivar a terra que imaginam obter. Dois anos mais tarde, a persistência deu certo e elas conquistaram seu pedaço de chão.

Diversas áreas foram sorteadas para fins de assentamento e uma delas, com 1409 hectares, estava no município de Eldorado do Sul, na Grande Porto Alegre. Foi destinada ao grupo nomeado “Integração Gaúcha”, composto por famílias oriundas de diversos municípios gaúchos, como Três Passos, Aratiba, Lagoa Vermelha, Constantina, Ronda Alta, Bagé, Criciumal e Canoas.

Oitenta e nove delas conquistaram o assentamento a que batizaram como Integração Gaúcha ou Irga. É onde acontecerá a próxima Romaria da Terra.

PRODUÇÃO ORGÂNICA CERTIFICADA

Com a proposta de buscar o trabalho cooperado, nos primeiros cinco

anos elas trabalharam de forma coletiva. No entanto, após esse tempo, formaram-se grupos menores que passaram a realizar um trabalho mais individualizado. No assentamento, a luta continuou. Foi necessário conseguir financiamentos para, então, iniciar as atividades agrícolas, produzir os alimentos de subsistência, e também construir suas moradias.

Hoje, 64 famílias produzem principalmente hortifrutis orgânicos para comercializar em feiras ecológicas, tendo uma relação direta com os consumidores e consumidoras. A produção das famílias é certificada pela Cooperativa Central de Assentamentos do Rio Grande do Sul (Coceargs) através de um sistema de Certificação Participativa de Conformidade Orgânica –OPAC. São vistoriadas, uma vez por

ano, pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

Outras seis famílias trabalham com o plantio de arroz orgânico, certificado pela Coceargs, no sistema designado OPAC de certificação social, totalizando 90 hectares de terra cultivada. Elas colhem em torno de 10 mil sacas de arroz orgânico anualmente.

O assentamento construiu uma comunidade e, hoje, além de oferecer trabalho para os seus moradores, conta com minimercados, espaços de lazer e de educação. Os filhos dos assentados frequentam duas escolas do campo, uma com sete educadores, contemplando 56 educandos do 1º ao 5º ano do ensino fundamental, e outra de educação infantil, dispondo de 13 educadoras e 50 educandos desde o berçário até a pré-escola.

Os PRiMeiROs PA ssOs AcOnteceRAM AindA sOb A

ditAduRA dOs GeneRAis

De 1978 a 2023, a caminhada mantém sua trajetória de compromisso com os mais pobres

▶ O longo percurso da Romaria da Terra começou em tempos sombrios. Era 1978 e o Brasil vivia sob a ditadura implantada em 1964 quando aconteceu a primeira das procissões. Foi uma das primeiras manifestações sociais de vulto a abrir caminho em pleno autoritarismo. Aconteceu em Caiboaté, em São Gabriel, Campanha gaúcha. Reuniu apenas 400 romeiros que debateram o tema “A salvação do índio está na consciência do branco”, matéria que, em 2023, continua ocupando o centro dos debates.

Já em 1982, ainda sob o regime militar, o encontro se deu em Encruzilhada Natalino, município de Ronda Alta, que, então, abrigava o maior acampamento de sem terra do país.

Trinta e três mil romeiros acorreram à caminhada conduzida sob o lema

“Povo unido jamais será vencido”. Cresceu ainda mais no ano seguinte - 40 mil participantes - quando o mote foi “Água para a vida e não para a morte”. Discutia-se então a ameaça representada pelas barragens do rio Uruguai ameaçando afogar terras, vidas e memórias no Norte do estado.

A edição seguinte inovou ao ser realizada, pela primeira vez, na Região Metropolitana de Porto Alegre, mais exatamente na Vila Santo Operário, em Canoas, onde milhares de sem teto reivindicavam um lugar para morar. Somou 50 mil manifestantes motivados pelo bordão “Terra e trabalho para que todos tenham vida”.

O recorde de romeiros ocorreria em 1985, último ano da ditadura, quando juntou 70 mil pessoas em Tenente Portela, na região Noroeste. Aquela 8ª

Em 1982, mais de 30 mil romeiros estiveram em Encruzilhada Natalino

edição teve como temática “Os jovens e os sem terra em busca de pão e vida”.

Nos anos que se seguiram o evento transitou por todas os quadrantes do Rio Grande, abordando os mais variados assuntos como agricultura fa-

miliar e camponesa, organização popular, função social da propriedade, reforma agrária, agroecologia, preservação da natureza, papel das mulheres na sociedade, quilombos e quilombolas entre muitos.

O assentamento Integração Gaúcha transformou a vida de dezenas de famílias que produzem hortifrutigranjeiros e arroz livres de venenos
Romaria: o evento existe para reavivar a memória e a solidariedade com os pobres da terra No assentamento, 64 famílias produzem alimentos orgânicos
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Fotos: Arquivo CPT

OUTRO MUNDO É POSSÍVEL

Fórum Social Mundial 2023 convoca sociedade ao resgate da democracia e da participação

Ampla representação de setores sociais e populares e ministros do governo Lula participaram dos quase 200 debates realizados em Porto Alegre

MARCELO FERREIRA

PORTO ALEGRE - RS

▶ Após 22 anos da realização do primeiro Fórum Social Mundial, Porto Alegre voltou a sediar o encontro que reúne uma diversidade de expressões da sociedade para dizer que “outro mundo é possível”.

De 23 a 28 de janeiro, centenas de atividades reuniram variados setores organizados do país, num intenso momento de articulação, construção coletiva de propostas e estratégias, e de diálogo das organizações e movimentos sociais com o governo eleito.

“Representou a retomada da agenda propositiva da sociedade civil internacional para com os temas fundamentais que assolam a humanidade nestes últimos anos”, avalia Mauri Cruz, do Conselho Internacional do FSM. Ele conta que foram realizadas quase 200 atividades autogestionadas, quatro mesas de convergência e seis mesas do Seminário Internacional, com quatro mil pessoas credenciadas e estimativa de mais de 10 mil participantes.

Estiveram em debate temas centrais como luta antirracista popular e periférica, respeito aos direitos das mulheres e reconhecimento de seu protagonismo, combate à fome e às desigualdades e proteção ambiental. Bem como a

retomada das pautas dos direitos sociais, a construção de políticas inclusivas e universais e a necessidade do empoderamento popular através da implantação de mecanismos de democracia participativa capaz de partilhar o poder de forma efetiva.

Além de amplas representações sociais, o evento contou com a presença de três ministros do governo Lula, que aprofundaram a proposta de reconstrução coletiva do país: Marina Silva, do Meio Ambiente; Márcio Macedo, da Secretaria-Geral da Presidência; e Gilberto Carvalho, secretário nacional de Economia Solidária.

MARCHA DA DIVERSIDADE E CULTURA PELA TRANSFORMAÇÃO

A alegria estava estampada nos rostos das milhares de pessoas que participaram da tradicional marcha do Fórum. Na faixa de abertura, a diversidade do povo brasileiro: indígenas, quilombolas, ambientalistas, sindicalistas, agricultores familiares, parlamentares, artistas, trabalhadoras e trabalhadores.

Ao som dos tambores que marcavam os passos rumo ao novo Brasil que começa a ser construído, a caminhada subiu a Borges de Medeiros, até a Praça da Matriz, onde estão os Três Poderes. Com faixas, cartazes, bandeiras, camisetas ou bonés, as lutas de cada movimento presente eram expostas à população que passava pelas ruas ou aguardava o ônibus nas paradas.

Durante os seis dias de Fórum, a cultura não ficou de fora. Foram realizadas exposições, produção de grafite e muralismo, batalha de rimas, shows de Hip Hop e espetáculos de teatro e dança. Encerrando o evento, em grande estilo, o Festival Social Mundial levou uma série de artistas ao palco no Parque da Redenção.

“Porto Alegre, mais uma vez, demonstrou sua vocação para acolher todos os movimentos internacionalistas que lutam por liberdade, democracia, igualdade e justiça socioambiental, retomando as edições do FSM e contribuindo para manter acesso o sonho de um outro mundo possível, urgente e necessário”, comenta Mauri.

Fotos: Tânia Rêgo / Agência Brasil
Mesas e debates reuniram mais de 10 mil participantes Marina Silva denunciou o genocídio dos Yanomami Mulheres indígenas, uma das presenças do FSM
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Olívio Dutra, como sempre, participou

Vinte anos de comunicação popular e luta pela democracia

Lançado em 25 de janeiro de 2003, no FSM, Brasil de Fato completa duas décadas de contribuição para um país mais justo

NICOLAU SOARES SÃO PAULO

Era janeiro de 2003. O Brasil comemorava a primeira eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT); na Argentina, Nestor Kirchner se preparava para conquistar seu primeiro mandato presidencial, na esteira do desastre econômico neoliberal. Na Bolívia, o Movimento Al Socialismo de Evo Morales e seus cocaleros se fortaleciam em um país que, poucos meses depois, teria suas ruas tomadas por protestos contra a privatização do gás natural, no episódio que ficou conhecido como "A Guerra do Gás". Os Estados Unidos pressionavam a comunidade internacional para apoiar a invasão ao Iraque, que se consumaria dois meses mais tarde.

Enquanto isso, em Porto Alegre (RS), 100 mil pessoas se reuniam para a terceira edição do Fórum Social Mundial, entre 23 e 28 de janeiro. Foi no sábado, dia 25,

que 7 mil delas lotaram o Auditório Araújo Viana, no Parque Farroupilha, para um evento histórico: o lançamento do Brasil de Fato, iniciativa pioneira de jornalismo organizada por movimentos populares brasileiros.

A mesa de abertura mostra a importância do momento: lá estavam o escritor uruguaio Eduardo Galeano, a médica cubana Aleida Guevara, filha do Che, o linguista estadunidense Noam Chomsky, a argentina Hebe de Bonafini, líder das Mães da Praça de Maio, o fotógrafo Sebastião Salgado e o teólogo Leonardo Boff, entre outros nomes da esquerda nacional e mundial.

PATRIMÔNIO DOS TRABALHADORES

Primeiro editor a liderar o projeto, o jornalista e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) José Arbex se recorda da empolgação do dia.

"Foi um negócio impressionante. Sete mil pessoas dentro do salão e outro tanto fora vendo pelo telão. Um negócio absurdo. Eu cheguei pro Stedile [João Pedro, liderança do MST] e falei 'opa, parece que agora vai'. Havia um entusiasmo de todo mundo", lembra.

Avaliando os 20 anos de existência do jornal, Arbex considera o projeto estratégico para a esquerda brasileira, uma vez que "é uma alternativa concreta em relação ao que diz a grande imprensa e que tem essa história acumulada".

"Isso aí é um capital fundamental, insubstituível do ponto de vista da formação de uma opinião crítica no Brasil. O Brasil de Fato é uma conquista dos trabalhadores brasileiros. É assim que ele tem que ser encarado, é assim que ele tem que ser defendido, e é assim que ele tem que continuar. Um patrimônio dos trabalhadores brasileiros", defende.

"Terceiro Ato": da posse ao golpismo, filme do BdF mostra bastidores de um Brasil em disputa

Os 20 anos do BdF foram marcados com lançamento do seu primeiro documentário no Fórum Social Mundial 2023

REDAÇÃO

▶ O Brasil de Fato lançou no Fórum Social Mundial 2023, no dia 27 de janeiro, o documentário "Terceiro Ato", uma produção que marca os 20 anos de um dos principais veículos de comunicação popular do país.

Com direção do repórter José Eduardo Bernardes, o documentário retrata os

acontecimentos que marcaram o emblemático mês de janeiro de 2023, desde a posse histórica do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) até os atos golpistas protagonizados por apoiadores de Jair Bolsonaro (PL) - que destruíram as sedes dos Três Poderes da República.

"Assim como a posse foi histórica, também o dia 8 de janeiro entrou para a história,

obviamente de uma maneira triste, que se relaciona com um Brasil que a gente vai ter daqui a diante, um Brasil em disputa", pontua Bernardes.

A produção do Brasil de Fato traz entrevistas exclusivas com ministros de Estado do atual governo, como Flávio Dino (Justiça e Segurança Pública), Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação Social), Paulo Teixeira (Desenvolvi-

mento Agrário) e Esther Dweck (Gestão e Inovação).

O filme dá voz também às personagens que participaram da entrega da faixa presidencial, como o garoto Francisco Carlos do Nascimento e Silva, o influenciador e ativista anti capacitista Ivan Baron, e a catadora e diretora da Central de Cooperativas de Materiais Recicláveis do DF e Entorno (Centcoop-DF) Aline Sousa.

O FILME PODE SER ASSISTIDO NO CANAL DO BRASIL DE FATO NO YOUTUBE: HTTPS://WWW.YOUTUBE.COM/@AGENCIABRASILDEFATO

CELEBRAÇÃO
Brasil de Fato 20 Anos - Mesa do lançamento no FSM 2003, em Porto Alegre Fotos: Leonardo Melgarejo (fundo), Ana Haddad, Pedro Stropassolas e Joka Madruga No dia 25/01/2023, 7 mil pessoas lotaram o Auditório Araújo Viana, para o evento histórico Foto: Leonardo Melgarejo
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NOVOS TEMPOS

Quebra-quebra ganha manchetes, mas não trava as ações do governo

Atuação inclui avanços sociais e ambientais, mais bloqueio de privatizações, nova diplomacia e freio no armamentismo

Depredação, violência, crimes, investigações, prisões. No primeiro mês do governo Lula, após a cerimônia inédita na entrega da faixa presidencial, a tentativa de golpe do dia 8 de janeiro invadiu todas as manchetes. Mas o governo não parou.

Apesar da agressão, já no dia seguinte, ao lado da pauta da punição aos golpistas, a vida continuou com a retomada de todas as tarefas mesmo que nem todas tenham recebido a atenção da mídia. Por conta disso, elencamos uma série de ações já definidas para tirar o Brasil do atoleiro. Veja algumas delas:

AUMENTO DO PISO SALARIAL DOS

PROFESSORES

O piso passa a ser de R$ 4.420,55 nas escolas públicas para carga de 40 horas semanais.

IMPOSTO ZERO SOBRE COMBUSTÍVEIS

Uma medida provisória desonerou os impostos federais que incidem sobre gasolina, diesel, gás de cozinha e outros combustíveis. Parte vale até o fim de fevereiro, outra parte vale até o fim de 2023. Antes, em meio ao saco de bondades de última hora à cata de votos para sua reeleição, Bolsonaro zerara os impostos, mas somente até 31 de dezembro do ano passado.

DESMATAMENTO ZERO NA AMAZÔNIA

No discurso de posse, Lula acenou para o fim do desmatamento e o caminho para um modelo sustentável. Revogou decreto assinado pelo ex-presidente que estimulava o garimpo ilegal na Amazônia. Restabeleceu o Fundo Amazônia, suspenso desde 2019, iniciativa que banca ações

para proteger a floresta. O fundo aplicou cerca de R$ 1 bilhão na Amazônia. Com Bolsonaro, a Noruega, maior contribuinte do fundo, cortou as remessas.

BRASIL DE VOLTA AO MUNDO

O governo abre portas antes fechadas na América e na Europa. Após visitar Argentina e Uruguai, Lula agendou visitas aos Estados Unidos e à China. Também vai a Portugal e à África. Reaproximou o Brasil da França. Como resultado da virada, a Alemanha já anunciou doação de R$ 1 bilhão para projetos ambientais e sociais.

TRANSPARÊNCIA

O governo anterior decretou sigilo de 100 anos sobre os mais diversos documentos, entre eles as despesas dos seus cartões corporativos. Com o apoio técnico da Controladoria-Geral da União (CGU) estão sendo derrubados os segredos de Bolsonaro.

INTERVENÇÃO NO GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL

Uma decisão para apurar

eventuais omissões ou conivência nas falhas verificadas diante do quebra-quebra no Palácio do Planalto, Congresso e Supremo.

PRIVATIZAÇÕES

Foram revogados os processos de privatização de oito estatais, entre elas a Petrobras e os Correios.

INJÚRIA RACIAL É RACISMO

Presidente sancionou a lei 14.232, de 2023, que tipifica como crime de racismo a injúria racial. Pena aumenta de um a três anos para dois a cinco anos de reclusão.

ATENDIMENTO EMERGENCIAL AOS YANOMAMI

Em Roraima, o povo Yanomami teve suas terras invadidas pelo garimpo criminoso durante o período Bolsonaro. Seus rios foram contaminados com mercúrio, comprometendo a pesca e a sobrevivência, expondo homens,

mulheres e crianças a uma situação de grave desnutrição e muitas doenças.

R$ 2 BILHÕES PARA HOSPITAIS

Governo e santas casas e hospitais filantrópicos firmam compromisso para regulamentar repasse de R$ 2 bilhões às entidades sem fins lucrativos que prestam serviços ao SUS.

CESSAR FOGO

Decreto revogou a facilitação da compra de armamento e munições. Até então os chamados CACs - caçadores, atiradores ou colecionadores - poderiam ter até 30 armas de fogo cada um. Agora, poderão ter três. Para comprar uma arma será preciso demonstrar a necessidade de tê-la e não simplesmente desejar comprá-la.

TORNIQUETE NO GARIMPO ILEGAL

Uma megaoperação deve retirar milhares de garim-

peiros da reserva Yanomami. Já foi determinada a proibição da circulação aérea e fluvial dos intrusos na terra indígena Raposa Serra do Sol.

CRIAÇÃO MINISTÉRIODO DOS

POVOS INDÍGENAS

O primeiro da história e chefiado por uma indígena, e do Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos. Recriadas pastas como Transportes, Desenvolvimento Social, Desenvolvimento Agrário e Esporte. E a Cultura retomou seu status de ministério.

CIVIL NO MINISTÉRIO DA DEFESA

Antes nas mãos de militares, o Ministério da Defesa volta a ter um civil como titular.

CONVIVÊNCIA

Lula aboliu decreto que poderia impedir futuramente a convivência nas escolas de alunos portadores de deficiência com as demais crianças.

Lula assina decretos que criam o Conselho de Participação Social e o Sistema de Participação Social Interministerial
EDIÇÃO N O 41 - 30 DE JANEIRO DE 2023 - WWW.BRASILDEFATORS.COM.BR 8
Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
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