8 minute read

de viabilização de empresas - Jorge Urbano Gomes O transporte aéreo de mercadorias e a Convenção

Recebido o requerimento e os documentos que o devem acompanhar, o juiz nomeia, imediatamente, o administrador judicial provisório, nomeação que é, em princípio, efectuada aleatoriamente, por sorteio, podendo o juiz nomear administrador judicial indicado pela empresa, quando a avaliação da situação de viabilidade da mesma carecer de especiais conhecimentos. A nomeação a que nos referimos anteriormente obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra a empresa, suspendendo-se as pendentes com igual finalidade, até à sentença de homologação ou não homologação do processo, impedindo ainda a empresa de praticar actos de especial relevo, sem obter autorização por escrito do administrador judicial provisório. A partir daqui o processo entra numa fase de pronúncia dos credores, com vista à homologação do acordo de viabilização, levantando a letra da lei algumas dúvidas sobre a eficácia do modo de publicitação do processo aos credores. Acresce a tudo isto que o prazo de vigência da Lei se encontra previamente fixado, decorrendo de 28 de Novembro de 2020 a 31 de Dezembro de 2021. Podendo ser colocadas várias interrogações a este processo, mormente na questão procedimental do mesmo e eficaz protecção dos credores, estamos em crer que este instituto poderá significar uma importante ajuda para o desejado restabelecimento da economia e manutenção de emprego, num ano de 2021 que não se avizinha fácil.

O transporte aéreo de mercadorias e a Convenção de Montreal: questões relacionadas com a competência dos tribunais

Advertisement

Marta Borges Managing Partner Advogada, sócia da Rocha Gonçalves & Associados, soc. adv, RL mab@advogadosporto.com

A questão coloca-se quando estamos em face de transportadoras aéreas não sediadas em nenhum estado membro da UE, ou que não possuam aí qualquer estabelecimento estável; não bastando para o efeito a existência de agentes comerciais, os quais não têm poder de representação legal e judiciária dessas transportadoras aéreas.

Há muito que tenho vontade de escrever sobre este tema, não só porque tenho a nítida impressão que não lhe é dada a devida atenção, mas também porque sinto necessidade de alertar para alguns riscos que daí advêm. Com a atual crise pandémica, muito se tem falado sobre o transporte aéreo, não só pela crise económica e estrutural em que vivemos atualmente, como pelo impulso que as mercadorias vieram trazer a este modo de transporte, em total contraciclo com os passageiros, com o incremento das mercadorias transportadas e pelas adaptações necessárias dos meios que estavam essencialmente afetos e direcionados para os passageiros – os aviões. Na primeira vaga, foram as máscaras e os produtos desinfetantes. Agora serão as vacinas. Isto para não falar no aumento exponencial de pequenas encomendas que o comércio online veio acrescentar. Atualmente está em vigor, na maioria dos países à escala global, a Convenção de Montreal de 1999, que regula o contrato de transporte aéreo internacional de mercadorias. Todos nós sabemos que o transporte aéreo é essencialmente internacional, com diversas interligações transnacionais, pelo que todos temos a ganhar com alternativas legislativas de caráter internacional, como o é a Convenção de Montreal, mais ainda se for uma convenção de âmbito global. Na verdade, esta forma legislativa, se é que a podemos chamar assim, traz-nos vantagens claras à regulação das relações comerciais internacionais, ao criar uma posição uniforme da aplicação do direito a uma determinada situação concreta, desde que enquadrável na esfera espacial de aplicação da Convenção, garantindo

uma harmonia internacional de soluções e de previsibilidade, facilitando assim o conhecimento do regime jurídico aplicável. O mesmo seria dizer que, à partida, nenhum problema se colocaria ao caso concreto, já que, pelo menos em termos substantivos ou materiais, se teria de ir buscar a solução à Convenção. Sempre que estamos em face de contratos com cariz extranacional, torna-se não só importante averiguar qual a lei aplicável ao caso concreto, assim como saber que tribunais são competentes em caso de litígio. O artigo 33.º n.º 1 da Convenção de Montreal estipula que em caso de sinistro ou danos às mercadorias, a ação pode ser intentada perante o tribunal da sede da transportadora, do seu estabelecimento principal ou do estabelecimento em que tenha sido celebrado o contrato, ou ainda perante o tribunal do local de destino da mercadoria. Até aqui tudo parece estar de acordo e em sintonia. A questão coloca-se quando estamos em face de transportadoras aéreas não sediadas em nenhum estado membro da UE, ou que não possuam aí qualquer estabelecimento estável; não bastando para o efeito a existência de agentes comerciais, os quais não têm poder de representação legal e judiciária dessas transportadoras aéreas. Vejamos um caso prático, em que um transitário contrata um serviço de transporte aéreo de Portugal para os EUA, com uma transportadora com sede nos EUA, sem qualquer estabelecimento estável na UE. As mercadorias sofrem danos durante o transporte. Neste caso, e apesar a origem do transporte ter sido Portugal, os tribunais portugueses não serão competentes para julgar o caso, mas tão só os tribunais do Estado da sede da transportadora ou do local de destino da mercadoria, que no caso concreto seriam os tribunais americanos. O problema aqui é que o carregador e provavelmente cliente do transitário será português e, portanto, a sua relação contratual com o transitário poderá ser dirimida pelos tribunais portugueses; já no que diz respeito ao contrato de transporte, apenas serão competentes os tribunais americanos. Esta disrupção (que não ocorre no caso dos passageiros, já que estes podem, igualmente, intentar a ação no tribunal da sua residência habitual e permanente à data do acidente) distorce a livre concorrência, pois permite que algumas indemnizações não venham a ser pagas, ou fiquem dependentes da boa vontade das transportadoras aéreas não sediadas na UE. Entendemos o alcance da restrição do n.º 1 do art. 33.º da Convenção de Montreal, o qual apenas se aplica ao transporte de mercadorias, por forma a salvaguardar os interesses do transportador aéreo, evitando que meros acordos comerciais, designadamente os contratos de agência, pudessem resultar num sem número de ações em tribunais de vários ordenamentos jurídicos, os quais poderiam inclusive entender da não aplicação das Convenções Internacionais em vigor, por, por exemplo, esses ordenamentos não as terem aprovado ou ratificado. Não podendo as transportadoras aéreas possuir estabelecimentos em todos os locais onde exploram os seus serviços aéreos, tal solução não deveria ser impeditiva ou constituir verdadeiros obstáculos à efetivação de um direito de indemnização consagrado legalmente, através das convenções internacionais em vigor na matéria. O que nos leva à questão da problemática do tribunal internacionalmente competente em situações transnacionais de transporte aéreo de mercadorias, o qual não pode ser descurado pelas partes envolvidas na contratação deste modo de transporte. O abandono de mercadorias constitui um desafio crescente no atual contexto económico, sendo o transitário muitas vezes o elo da cadeia para o qual se viram as atenções na hora de cobrar os custos associados. As mercadorias abandonadas ou não recolhidas são aquelas em relação às quais o destinatário não tenha manifestado, após um período razoável (normalmente de acordo com o “tempo livre” acordado), qualquer intenção de as levantar, incluindo situações em que o consignatário esteja em parte incerta ou em que se tenha recusado a tomar posse da mercadoria. Este assunto foi objeto de análise pelo Conselho Consultivo Jurídico (Advisory Body Legal Matters, ABLM) da FIATA, do qual a APAT faz parte, que lançou no início do mês de dezembro um Guia de Melhores Práticas. Neste artigo vamos debruçar-nos sobre a primeira parte do Guia, relativa às estratégias preventivas. Neste assunto, como em quase todos, a prevenção é o melhor remédio. Este trabalho parte da constatação inicial de que muitas das situações podem ser mitigadas de forma substancial à partida, na fase de reserva e redação do

FIATA Guia de Melhores Práticas relativas à mercadoria abandonada Parte 1

contrato, através da implementação de procedimentos de due diligence adequados: Due Diligence: identificar a contraparte, a carga e a rota. Os transitários devem perguntar-se: será que sabem verdadeiramente com quem estão a contratar? Que tipo de carga é? A rota é indicadora de algum risco acrescido? Considerações contratuais: atenção à redação do contrato, designadamente a saber se estão a atuar em nome próprio ou por conta do cliente, uma vez que esta distinção terá impacto na sua responsabilidade contratual por quaisquer custos. Com efeito, o transitário/ NVOCC contrata com o armador em nome próprio, é o carregador, a parte no contrato de transporte, pelo que, em caso de mercadoria abandonada, o transitário/NVOCC terá responsabilidade contratual perante o transportador marítimo por quaisquer custos associados. Não obstante o direito de retenção do transportador marítimo, frequentemente o que se verifica é que estes tentam imputar aos transitários os custos relativos às mercadorias abandonadas, designadamente através da aplicação da

Ana Camacho Soares Responsável Regional Centro e Sul da APAT

... muitas das situações podem ser mitigadas de forma substancial à partida, na fase de reserva e redação do contrato, através da implementação de procedimentos de due diligence adequados...

“Merchant Clause”. O ABLM considera que não é legítimo aos transportadores imputarem responsabilidade aos transitários que atuem apenas como agentes e aconselha a procura de aconselhamento jurídico nestas situações. Assegurar controlos de gestão eficazes ao longo de todo o processo. É também destacada a importância de ter registos adequados, que podem constituir auxiliares dos transitários na rápida identificação dos riscos, de modo a permitir uma intervenção rápida para minimizar os possíveis custos. Os registos podem ajudar a identificar padrões e riscos comuns. Tais dados podem incluir pontos de risco e rotas comerciais, clientes pouco fiáveis e tipos de carga com maior probabilidade de serem abandonados. Isto ajudará a identificar situações que apresentem risco acrescido, permitindo a tomada de decisões em conformidade. Deve ser estabelecido um contacto precoce com agentes locais e correspondentes no porto de descarga, que estarão em melhor posição de fornecer orientações sobre como minimizar o risco. Além disso, devem ser acompanhados de perto: as datas de chegada e o tempo livre associado, juntamente com outros aspetos fundamentais do transporte como a entrega de conhecimentos de embarque. No próximo artigo analisaremos as recomendações sobre o que fazer quando o transitário é confrontado com uma situação de mercadoria abandonada.

This article is from: