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7. Principais Factores do Absentismo e Desempenho Escolar

8.

CONCLUSÕES E IMPLICAÇÕES EM TERMOS DE POLÍTICAS

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A primeira ronda do inquérito da ALDE fornece dados representativos, a nível nacional, sobre a assiduidade e progressão escolar das raparigas e rapazes no ensino primário, destacando factores da procura e oferta que, por um lado, facilitam e, por outro, dificultam estes resultados escolares. Recorre-se aqui à teoria dos sistemas socioecológicos, com o seu enfoque nas relações, para testar hipóteses sobre as influências interligadas de factores familiares, escolares e comunitários na participação de uma criança na escola primária em Moçambique. Os resultados apresentados neste relatório sustentam o quadro subjacente e mostram que centrar-se apenas nos factores escolares ou familiares não é suficiente para resolver os problemas do sistema, os quais se reflectem no alto nível de absentismo e baixos níveis de aproveitamento escolar. Os dados apresentados apontam também para a necessidade de promover a comunicação e a colaboração conjunta entre diferentes actores (encarregados de educação, escola e comunidade) na abordagem das limitações da procura – assim como da oferta – para o alcance de melhores resultados para as crianças da escola primária. Alguns dos principais pontos de vista das políticas encontram-se resumidas abaixo:

A fraca progressão escolar e a vasta distribuição por idade (dos quatro aos 22 anos de idade) da amostra da população alvo da ALDE são indicadores de

ineficiências herdadas do sistema do ensino primário. Dezassete por cento de todos os alunos do ensino primário são adolescentes (13-18), que já deviam estar no ensino secundário. A progressão escolar deteriora-se rapidamente desde o início do ensino primário (8-9 anos), com quase um em cada cinco jovens de 11 anos (18%) ainda a frequentar a primeira classe. A análise confirma que quanto mais velha for a criança, menor é a probabilidade de ter bom desempenho, sendo que a probabilidade de alcançar os seus pares mais avançados diminui a cada ano. Isto pode levar à perda de motivação (mencionada por muitos encarregados de educação como uma das razões da fraca assiduidade), falta de habilidades e conhecimentos adequados à idade, o que, por sua vez, pode resultar em desistência escolar. As intervenções políticas devem centrar-se nos primeiros anos de escolaridade, com particular incidência na segunda classe, onde se observa um dos níveis mais elevados de repetição de ano.

Resolver o absentismo dos alunos é o primeiro passo crítico para melhorar a

progressão escolar. Com base no método de verificação pontual observacional, em média, uma criança frequentou a escola apenas 61% do tempo (com uma mediana de 3,4 observações por criança). Cerca de uma em cada três (32%) crianças faltou à escola um dos dois dias que antecederam a entrevista. Conforme definido pelo quadro conceptual e demonstrado pela análise multivariada, o absentismo dos alunos contribui directamente, e de forma independente, para o baixo nível de escolaridade. Prevenir e reduzir o absentismo e aumentar a motivação dos alunos para a aprendizagem são condições prévias necessárias para melhores resultados escolares, tanto para as raparigas como para os rapazes.

As raparigas requerem mais apoio académico e social a partir do início da

puberdade do que os rapazes. De acordo com a análise apresentada neste relatório, em média, as raparigas apresentam maior probabilidade do que os rapazes de terem um bom desempenho depois de considerarem todas as outras características. Contudo, entre os 12 e 13 anos, as raparigas começam a ficar um ano atrasadas em relação aos seus pares masculinos. Além disso, as raparigas estão sub-representadas na categoria de idade adolescente (13-18), o que levanta questões e reforça as preocupações sobre os percursos das raparigas adolescentes para além e fora da escola primária. A puberdade é um momento crítico no desenvolvimento e progressão escolar das raparigas, por isso a escola, a família e a comunidade precisam de trabalhar em conjunto para encorajar e apoiar a continuação da educação escolar das raparigas.

A riqueza do agregado familiar, medida através do índice de da família, é uma

barreira independente às oportunidades de os alunos terem bom desempenho escolar de acordo com a sua idade, mas está enraizada nas desigualdades

estruturais do país. Os resultados contribuem para a literatura dos países de baixos rendimentos que encontra uma forte associação entre a riqueza da família e os resultados escolares. As respostas qualitativas dos encarregados de educação proporcionaram uma visão da complexa interacção entre a pobreza e as más condições das escolas: a falta de carteiras obriga os alunos a estudar sentados no chão, o que por sua vez leva à falta de roupa limpa (uniforme) para vestir no dia seguinte, e como resultado faltam à escola. Devido à falta de alimentação adequada, uma criança pode ter dificuldades de concentração e falta de motivação para aprender. Embora o papel da protecção social seja lidar com os riscos ligados ao rendimento e com as vulnerabilidades, o sector da educação pode desempenhar um papel importante na garantia do fornecimento de condições básicas para uma sala de aula, infraestruturas escolares (por exemplo, acesso à água) e programas de alimentação escolar.

A fraca comunicação entre os pais e as escolas impede o envolvimento e apoio

dos encarregados de educação no desempenho escolar da criança. Pode-se alcançar uma melhor assiduidade e progressão escolar quando as decisões sobre a escola são tomadas num processo participativo, que envolve a escola, os pais e a comunidade, e os alunos (Kraft e Dougherty, 2013). No estudo, os encarregados de educação indicam níveis extremamente baixos de comunicação entre os professores e pais, especialmente no Norte do país. As autoridades educativas devem tomar medidas para melhorar a comunicação e o envolvimento entre a direcção da escola, os professores, a família e a comunidade, a fim de tomarem decisões que sejam importantes para as crianças.

Um ambiente escolar inclusivo e seguro é condição essencial para a

aprendizagem. É motivo de grande preocupação que a violência física (socos, pancadas, etc.) seja a razão mais comum das queixas das crianças contra outros alunos e professores (17% e 7%, respectivamente). A violência nas escolas não deve ser tolerada, e as autoridades e comunidades educativas podem desempenhar um papel importante na resolução deste problema. A política do sector da educação tem de reconhecer a questão como uma área política que requer acções urgentes.

Os recursos materiais escolares são importantes, mas a gestão escolar

também pode fazer a diferença. Num país como Moçambique, a falta de instalações básicas, espaços de aprendizagem equipados e recursos de ensino, tais como carteiras para os alunos se sentarem, livros escolares, mapas e outros materiais de instrução, é uma realidade que afecta centenas de escolas, particularmente no Centro e Norte. Os resultados mostram que quaisquer recursos escolares que criem um ambiente de aprendizagem básico têm um impacto importante não só na assiduidade, mas também na qualidade do sistema no geral, medida aqui pelo nível de sucesso escolar dos alunos. Mas não são suficientes para assegurar melhores resultados na escola primária. A gestão escolar – captada através de visitas de supervisão realizadas pelas autoridades distritais – demonstra ter um efeito significativo na melhoria da assiduidade, controlando todos os outros factores. Embora não seja um substituto de melhores investimentos em infraestruturas escolares e/ou apoio aos professores, a monitoria mais frequente das escolas é uma medida política viável e de alcance imediato ou a curto prazo. As instalações básicas de água e saneamento são fundamentais para

assegurar a assiduidade escolar e o desempenho escolar de todas as crianças,

particularmente das raparigas. Os resultados, particularmente importantes no contexto da COVID-19, mostram a importância de garantir não só o acesso, mas também a privacidade das instalações sanitárias. A privacidade é uma condição essencial para as raparigas adolescentes, dadas as suas necessidades de

segurança e serviços de higiene menstrual, para além da cobertura sanitária. Os resultados sugerem que, para além dos benefícios práticos para todas as crianças, um melhor acesso à água e às instalações sanitárias poderia também resolver problemas emocionais e físicos fundamentais subjacentes ao absentismo das raparigas.

Os professores com mais experiência apresentam maior probabilidade de

assegurar uma progressão adequada à idade dos alunos na escola primária. A importância de uma abordagem abrangente para a progressão profissional dos professores em Moçambique tem sido analisada noutros estudos (Bassi, Medina Pedreira e Nhampossa, 2019). Pode defender-se que os anos de experiência são uma medida agregada não só das capacidades e conhecimentos pedagógicos dos professores, mas também das competências psicossociais que lhes permitem assegurar melhores resultados para nos alunos. Os resultados apontam para a importância relativa dos anos de serviço perante as qualificações. Isto sugere que as políticas centradas na retenção de professores experientes e nos incentivos ao trabalho não devem ser negligenciadas.

A aprendizagem formal na pré-escola pode aumentar os resultados escolares

na escola primária. Com excepção de algumas iniciativas piloto, em Moçambique não existe educação pré-escolar pública. Por conseguinte, não é surpreendente que apenas 5,4 por cento dos encarregados de educação informem sobre a frequência dos seus filhos em tais programas. O estudo mostra que o ensino préescolar tem um efeito positivo significativo na redução do absentismo recorrente e na progressão escolar da criança, mas o efeito não é independente da riqueza familiar e da distribuição regional. A implantação da educação pré-escolar a preços acessíveis no ciclo de educação básico através de programas acelerados de Verão ou outras iniciativas de baixo custo deveria ser uma prioridade máxima da política de educação nos próximos anos.

A disparidade regional no nível de absentismo e de desempenho escolar reflecte o fosso socioeconómico nas regiões Norte e Sul, e demonstra as

ligações directas entre o desenvolvimento económico e humano do país. As mudanças das crianças nas províncias do Norte e do Centro para terem sucesso na escola primária são inferiores às dos seus pares do Sul (cidade de Maputo, província de Maputo e Inhambane). A deterioração de todos os resultados educativos medidos ao longo do vector geográfico (do Sul ao Norte) é espantosa. As diferenças regionais continuam a ser gritantes, depois de se terem em conta várias características socioeconómicas familiares e escolares. Como substitutos das oportunidades socioeconómicas, as disparidades regionais reflectem uma distribuição desigual dos investimentos públicos em infraestruturas e serviços, e oportunidades limitadas do mercado de trabalho para os jovens, o que aniquila as suas aspirações de educação. Resolver o problema de distribuição desigual dos recursos é uma tarefa política urgente que vai para além do sector da educação e é vital para evitar uma maior deterioração do envolvimento produtivo dos jovens.

Acções políticas recomendadas

As evidências apresentadas neste relatório sugerem que a acção política deve ser sistemática, abrangente e sustentável, em apoio tanto à procura como à oferta de serviços de educação. Três grandes áreas políticas merecem a atenção imediata dos decisores políticos no sector da educação em Moçambique. Os “pedidos” incluem mas não se limitam ao seguinte:

MELHORIA DA GOVERNAÇÃO E GESTÃO DE ESCOLAS

> Reforçar as visitas de inspecção regulares das direcções de educação (pelo menos três visitas por ano lectivo).

> Aumentar os incentivos de trabalho para reter professores experientes e desenvolver medidas que os encorajem a ocupar cargos nos locais mais difíceis.

CLIMA ESCOLAR E COMUNICAÇÃO ENTRE OS PAIS, A COMUNIDADE E A ESCOLA

> Introduzir medidas de responsabilização que imponham uma comunicação regular e directa entre a escola (professor) e os encarregados de educação. > Aumentar a capacidade dos conselhos de escola para melhorar ainda mais a comunicação entre as escolas e as comunidades. > Dar mais atenção pedagógica e apoio às raparigas, especialmente as da faixa etária dos 11 aos 13, ou seja, que estão a entrar na puberdade, a fim de assegurar que continuem a registar “bom desempenho” e progressão escolar. > Fornecer informação a profissionais da educação e orientação a raparigas adolescentes, especialmente as que entram na puberdade, sobre a boa gestão da higiene menstrual (GHM) para assegurar que tenham conhecimentos práticos e se sintam compreendidas e apoiadas dentro do ambiente escolar. > Assegurar que os rapazes e as raparigas se sintam seguros e protegidos nas escolas, reforçando os valores universais de respeito (incluindo o respeito baseado no género), não-violência e responsabilidade, proporcionando-lhes formação adequada e sensibilizando os professores.

No respeito pelos princípios da confidencialidade e da protecção da criança, estabelecer um mecanismo transparente de resposta escolar às queixas dos alunos.

FINANCIAMENTO ESCOLAR

> Introduzir uma fórmula justa de alocação de recursos que apoie as escolas que mais necessitam, particularmente as das zonas rurais e das províncias do Norte, a fim de assegurar que as crianças que estão em maior risco de ficar para trás tenham igual acesso a condições escolares adequadas. > Assegurar que sejam também alocados recursos para materiais escolares básicos para cada criança para uso domiciliar e escolar (ou seja, livros de texto; lápis; cadernos, etc.) para melhorar a qualidade do ensino, bem como a motivação para os trabalhos de casa. > Alocar mais fundos para o Apoio Directo às Escolas (ADE) e programas de alimentação escolar baseados na orientação geográfica - ou seja, às províncias identificadas pela ALDE como estando extremamente atrasadas em termos de resultados de educacionais e de assiduidade dos alunos. > Acelerar a construção ou reabilitação de salas de aula resilientes com equipamento adequado, assim como instalações de água e saneamento (WASH) que garantam a privacidade (instalações separadas para rapazes e raparigas com portas e fechaduras no local). > Expandir a educação pré-escolar, especialmente através da ampliação dos do Programa Piloto de Preparação Escolar Acelerada, para áreas com o mais baixo nível de assiduidade e desempenho escolar. Estas medidas, juntamente com muitas outras em que o MINEDH se empenhou como parte do Plano Estratégico do Sector da Educação de dez anos, são passos realistas e concretos para dar a cada criança em Moçambique uma oportunidade igual de concluir o ensino primário. A ALDE oferece uma oportunidade única de monitoria das mudanças e fornecimento de feedback sobre o progresso.

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