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entrevista com Noah Alef
from _edição 01
by _bardifaud
_Noah Alef para MenStyle
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Rhaiffe Ortiz
Com um milhão de seguidores na rede social TikTok conquistados em apenas um ano, o jovem de 21 anos Noah Alef já é gerenciado por Anderson Baumgartner, que trabalha com modelos como Sasha Meneghel, Carol Treintini e Alessandra Ambrósio, e diz ser reconhecido ao caminhar pelas ruas como “aquele indígena do TikTok”. Noah começou a trabalhar como modelo e “TikToker” no começo da pandemia - antes, era empacotador em uma fábrica de camisas e ajudante de pintor. Sonhou desde os 14 anos com a carreira de modelo, mas não acreditava em seu potencial pela falta de representatividade na indústria. Uma de suas missões como profissional é trazer representatividade para a comunidade Pataxó através dos seus trabalhos, tanto como modelo, como pelos vídeos que posta. Nós, do grupo bardi, entrevistamos Noah pensando em incluir o povo indígena na construção desta edição sobre a América Latina - por ser um grupo importante para a constituição cultural e étnica do país e do continente (apesar de entendermos que cada povo tem suas diferenças, e um indígena não representar todos). Menos conhecidos, reconhecidos e/ou valorizados do que os europeus ou estadunidenses, acreditamos ser importante darmos espaço e estarmos abertos para suas vozes.
_de onde surgiu a ideia de entrar para o TikTok?
NA: A ideia surgiu no começo da quarentena. Vi alguns amigos gravando e me despertou a vontade de começar a gravar também, mas eu tinha um celular com a qualidade da câmera muito ruim. Quando consegui comprar um celular melhor, comecei as gravações. No começo, era de brincadeira, nem sabia que iria tomar essa proporção.
_você já chegou a 1M de seguidores no TikTok. Em que momento você percebeu que sua carreira “estourou”?
NA: Eu comecei a ver que estava sendo reconhecido quando pessoas chegavam até mim na rua e falavam: “Olha! Aquele indígena do TikTok!”. Pediam para tirar fotos, elogiavam meus vídeos, e foi assim que comecei a entender a proporção [do trabalho que tenho feito].
_quais são suas principais inspirações para seus trabalhos?
NA: Minha inspiração são as minhas raízes, sou eu mesmo. Eu sempre tento fazer tudo com a minha personalidade, acho que é o melhor jeito de correr atrás dos meus objetivos.
_como sua família e sua comunidade recebem seu conteúdo e seu sucesso?
NA: Eles gostam muito. Minha família sempre me apoiou, em todas as minhas decisões. Eles até compartilham meus vídeos e tudo que sai em relação a mim, são meus maiores fãs.
_como é, para você, trazer sua cultura, infelizmente há muito tempo menosprezada, através da moda e dos vídeos?
NA: Eu fico muito feliz por poder representar minhas raízes na moda. Não temos lugar de fala há muito tempo, e espero poder contribuir mudando um pouco disso. Recebo muitas mensagens de indígenas me desejando sucesso e agradecendo por abrir essa porta para outros virem, tanto na moda quanto nas mídias sociais.
_de acordo com sua equipe e com outras entrevistas, você considera a moda nos seus trabalhos uma forma sutil de inserir elementos da sua cultura e questões que enfrenta. Como surgiu a ideia de usar a moda para trazer atenção aos problemas coletivos sofridos pela comunidade indígena? E quais destes problemas você mais sente que precisam ser ressaltados/mais gostaria de destacar para seus seguidores e para os leitores da nossa revista?
NA: Exatamente! Como eu havia falado, temos poucas pessoas para nos representar, mas hoje as coisas estão mudando e espero que seja daqui pra melhor. Acredito que, com nós indígenas nas campanhas, desfiles e revistas, as pessoas começarão a olhar mais para os povos originários e se sensibilizarão com os problemas que as comunidades estão sofrendo. Gostaria de destacar sobre o desmatamento que nossa natureza vem sofrendo e os ataques de garimpeiros aos povos isolados, como o povo Yanomami, entre outros.
_nos seus vídeos, você cita alguns dos comentários de ignorância recebidos, como “não poder ser indígena por usar celular”. Como sua identidade cultural, tão presente no seu conteúdo, foi recebida pelos espectadores de início? E na sua carreira de modelo?
NA: Muitos têm a ideia do indígena dos primórdios. Acham que, por usarmos a tecnologia, por exemplo, ou por morarmos em zonas urbanas e em Ocas, deixamos de ser quem somos. Nós nascemos indígenas, não viramos ou deixamos de ser por estarmos em outros espaços. O pessoal que me segue gosta bastante e elogia, seja quando estou brincando e fazendo as dancinhas, ou me colocando em relação a algum assunto sobre os povos indígenas. Recebo muitas mensagens de carinho.
_quais elementos da sua cultura e suas tradições, tanto como Pataxó quanto baianas, ou aprendizados na sua trajetória, você acha interessante apresentar aos seus seguidores?
NA: Eu gosto muito do calor humano que temos. Gostamos de tratar todos como pessoas próximas. Somos bem acolhedores e bem receptivos.
_você diz em entrevistas que há alguns anos jamais imaginaria que chegaria ao nível atual devido à sua etnia. Como você enxerga sua representatividade quase revolucionária em redes e meios tão crescentes, num país tão preconceituoso, para outros indígenas?
NA: Há alguns anos, eu sonhava em trabalhar como modelo, mas não me via trabalhando na área por não ver pessoas como eu. Hoje em dia, as coisas estão melhorando. Espero que através de mim, muitos outros possam vir. Recebo muitas mensagens de indígenas e espero que todos consigam chegar onde quiserem. Os preconceituosos que nos engulam: INDÍGENAS NO TOPO!
_em entrevistas com outros artistas pataxós, foram citadas as dificuldades em receber reconhecimento artístico nas criações em formato não-branco* ou não-sudestino*, tendo que se moldar em padrões estrangeiros para que esse reconhecimento aconteça. Como é isso para você e como sua arte é recebida na indústria da moda e da publicidade? Há algum conteúdo que você gostaria de criar ou desenvolver mas não pôde até o momento por algum motivo semelhante?
NA: Neste trabalho, eu tenho bastante liberdade para mostrar minha personalidade e minhas origens. Nas redes sociais, exploro o que tiver vontade. Já na moda, a vejo como uma plataforma que permite um trânsito livre de ideias, reúne diversidade de conceitos, então sempre pude me colocar nesse trabalho respeitando e mostrando minhas origens e minha personalidade.
_você tem alguma recomendação de filme, livro, criador ou qualquer tipo de conteúdo, além dos que você mesmo produz, para que possamos conhecer melhor ou entender a sua realidade e comunidade?
NA: Eu recomendo que assistam o Especial Falas da Terra. Lá, vocês verão indígenas de diversas etnias e entenderão um pouco sobre cada povo. Recomendo também seguirem algumas lideranças e ativistas, como Sônia Guajajara, Ailton Krenak, Alice Pataxó, Tukumã Pataxó e Suhyasun Pataxó.
*não-branco e não-sudestino foram termos usados aqui no sentido de denotar aqueles que fogem do padrão branco e/ou europeu demandado, reforçado e estimulado tanto pela indústria quanto pela mídia.

_outros influencers indígenas para acompanhar:
@cunhaporanga_oficial @tukuma_pataxo @daiaratukano @alice_pataxo @cristianwariu @kerexu_oficial @uyrasodoma @katumirim
