Edição Outubro

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Direcção: Catarina Veloso e Inês Linhares Dias Edição nº24 - Outubro de 2015

ATUALIDADE: Eleições 2015

“Liberdade Já!”

«Um governo de gestão “é um Executivo que serve para actos de administração diária e corrente, (...)» » página 16

Entrevista: Catarina Burnay «(...) São as aulas em que percebo que os alunos estão interessados, (...)» » páginas 04 a 06

«(...) Luaty anunciou finalmente o fim da greve de fome (...)» » página 17

ATUALIDADE: Ucrânia «(...) as imagens da violência a que os protestantes foram sujeitos invadiram as redes sociais» » páginas 19 e 20

Sociedade | Lifestyle | Desporto | Moda | Séries | Cinema | Gaming | Música | Literatura


editorial

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Ficha Técnica Directora: Catarina Veloso Vice-Directora: Inês Linhares Dias

Redacção Ana Silvestre Andreia Monteiro Catarina Félix Dina Teixeira Diogo Barreto Guilherme Tavares Inês Amado Joana Santos Madalena Gil Maria Borges Maria Manuel de Sousa Mariana Pereira Martins Patrícia Fernandes Sandra Vasconcelos Tatiana Santos

Colunistas Alexandra Antunes, Literatura Catarina Veloso, Moda Diogo Oliveira, Desporto Francisco Marcelino, Música Inês Linhares Dias, Política Joana Ferragolo, Lifestyle João Torres, Cinema Maria Tavares, Tendências Miguel Freitas, Música Mitchel Molinos, Vídeojogos Omar Prata, Produção Escrita Pedro Pereira, Cinema Sónia Araújo, Saúde Susana Santos, Actualidade

Equipa Youtube Duarte Sá Carvalho Inês Camilo

Design Catarina Veloso Daniela Trony Miguel Brito Cruz Ilustração Capa: Isabela Pimentel Contacto: jornal.pontivirgula@gmail.com

Num mês, passámos de instabilidade europeia para instabilidade nacional. Por cá, numa altura em que tantos se dedicam à futurologia, já se falou num governo com os dias contados, em golpe de Estado e até mesmo de revolução. Este é, naturalmente, um assunto que o Pontivírgula segue, nesta edição de Outubro, e que irá continuar a seguir. É este o contexto em que criamos esta edição, conscientes de que é em alturas de instabilidade que o jornalismo se afirma como parte essencial do exercício de civismo. É por isso que tentamos, como sempre, trazer uma selecção de temas que achamos relevantes, procurando dar-lhes o tratamento digno, que estes merecem. Com os olhos postos no país, mas nunca descurando o que de mais importante se passa no mundo, nesta edição, dedicamos a nossa atenção aos que merecem ser ouvidos. Num artigo do Miguel Freitas, damos voz a Luaty Beirão, activista angolano que foi preso juntamente com outras 14 pessoas, por reflectir e debater política. Eu proponho uma passagem pela Ucrânia, país onde impera um conflito que tem caído no esquecimento da consciência europeia, e destacamos um problema estrutural dos EUA, que já silenciou tantas vidas, no artigo “Armas e Massacres, uma relação proporcional” da Inês Amado (assunto abordado também pela Sandra Vasconcelos no blog do Pontivírgula). A Susana Santos decidiu abordar um fenómeno biológico que é tão frequentemente censurado: o período. Em tempos conturbados, é necessário realçar o que de bom se faz. Temos, por isso, para além das habituais sugestões dos nossos colunistas, uma reportagem da Ana Silvestre acerca do Sintra Press Photo, uma exposição que celebra o fotojornalismo e um artigo da Mariana Pereira Martins, que esteve no Amsterdam Music Festival. Ainda que estejamos sempre a observar o que se passa lá fora, estamos também atentos ao que se passa cá dentro, por isso, olhamos para a nova direcção da Associação de Estudantes da FCH e damos a conhecer a outra faceta da professora Catarina Burnay, numa entrevista conduzida pela Andreia Monteiro e pelo Guilherme Tavares.

Jornal redigido com o Novo Acordo Ortográfico, salvo quando indicado.

Boas Leituras Inês Linhares Dias *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico



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Entrevista à professora catarina burnay

Professora há 13 anos na Universidade Católica Portuguesa, Catarina Duff Burnay, é alguém que vive dividida entre dois mundos: a comunicação e a música. Mulher de sonhos e ambições, deixa aqui o testemunho do seu percurso de vida, desde as aventuras em palco até à sua experiência como professora. A prova viva de como um futuro profissional não implica deixar para trás sonhos e gostos. Cabe-nos reciclar as aprendizagens da nossa vida e aplicá-las no quotidiano, onde cada momento serve de desculpa para uma música. Pontivírgula: Vamos fazer uma breve viagem ao passado. Comecemos em 1980, na Academia de Música de Santa Cecília. Que lugar teve a música na sua vida?

A música faz parte do meu dia-a-dia. Eu estudei na Academia de Música de Santa Cecília, que é um colégio de ensino integrado. Estudei aí até vir para a Universidade Católica, para o ano 0, academicamente. Musicalmente, finalizei o Conservatório de Canto. Continuei a viver com a música, tenho um grupo que se chama “Sons em Cena” em que nos dedicamos aos musicais da Broadway e West End, que neste momento está mais “adormecido”, e dou aulas de canto numa escola de música. Portanto, a música sempre esteve presente na minha vida e continua com a minha filha, de 7 anos, que estuda no mesmo colégio, desde os três anos. Semanalmente [a música] contribui com a questão da disciplina, do rigor. Portanto, a música ajuda-me a ser mais sensível a determinadas questões e a ser mais organizada com o meu trabalho. Isto porque sempre trabalhei em duas áreas diferentes em simultâneo, mesmo quando estive aqui no ano 0 continuava a ter aulas na Academia e tinha meia hora para chegar de um lado ao outro, logo a minha vida sempre foi dividida entre duas áreas. Prof. Catarina Burnay:

© FCH, Universidade Católica Portuguesa

Pontivírgula: No meio de tudo isto, como

“(...) tenho um grupo que se chama “Sons em Cena” em que nos dedicamos aos musicais da Broadway e West End, (...)”

surge a iniciativa de tirar a licenciatura de Comunicação Social e Cultural nesta casa? Prof. Catarina: A minha variante é comunicação cultural, logo fazia todo o sentido com o meu passado e formação ligada à música; sempre em ligação com a área da música ou uma área artística, dado que o meu objectivo era ir para Barcelona tirar um mestrado em História da Arte e ficar ligada a essa área. As voltas da vida levaram-me a ficar em Lisboa e a frequentar o primeiro mestrado em Ciências da Comunicação na Faculdade de Ciências Humanas.


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Entrevista à professora catarina burnay

© Youtube

Pontivírgula: Que histórias ganhou com o mundo da música? Prof. Catarina: Primeiro, é a minha história de vida, só isso é uma grande história. Não é que seja boa ou má, mas é a minha. Depois tenho outras histórias de experiências de palco que também me ajudam na história de ser professora. Quando comecei a dar aulas, em 2002, tinha 25 anos e dava aulas a alunos de 5º ano, que tinham 22-23 anos, logo tínhamos pouca diferença de idade e acho que a experiência de palco me ajudou também a construir a minha história como professora. E depois tenho as histórias das aventuras das idas a palco, pois quem experiencia o palco, quer seja a cantar ou representar, tem sempre algo para contar.

“(...) quem experiencia o palco, quer seja a cantar ou representar, tem sempre algo para contar.”

Pontivírgula: Porquê uma tese sobre “A Açorianidade na Ficção da RTP-Açores”? O que a levou a tratar esse tema? Prof. Catarina: A área da ficção, dentro dos estudos televisivos, é a minha área de especialidade, de investigação e trabalho. No mestrado, já tinha trabalhado sobre o momento de viragem do panorama audiovisual português, na altura em que a TVI passou a ter mais audiências do que a SIC, exatamente devido à aposta na ficção nacional, para além dos formatos de entretenimento, como o Big Brother. E no meu doutoramento tentei aprofundar a ligação entre a apresentação, produção e reprodução de identidade, neste caso da identidade açoriana. Portanto, a capacidade da ficção ser espelho da identidade, neste caso de uma área mais delimitada, duma área geográfica, que também tem cambiantes muito próprios. Existe a expressão “Açorianidade”, nós [Lisboetas] não temos a “Lisboatidade”. Podemos ter a “Portugalidade” mas não com características tão específicas ou, até, não reconhecíveis. Daí a minha vontade, atendendo que a RTP Açores tinha muita produção ficcional, em perceber a relação entre essa ficção e a construção da identidade açoriana.


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Entrevista à professora catarina burnay Pontivírgula: Como surgiu a oportunidade de ser professora na Universidade Católica Portuguesa? Prof. Catarina: Como disse, fiz cá o curso, a licenciatura de 5 anos. Quando acabei, no ano 2000, abriu o primeiro mestrado em Ciências da Comunicação. Acabei por ficar cá e a Prof.ª Dr.ª Isabel Ferin, em 2002, convidou-me para assisti-la numa disciplina nova que ia abrir, Públicos e Audiências. Nesse ano, a professora saiu para a Universidade de Coimbra, portanto vi-me sozinha com essa cadeira nas mãos e, lá está, a experiência de palco ajudoume nesse momento e estou cá há 13 anos. Pontivírgula: Conte-nos um episódio,

enquanto professora, que a tenha marcado significativamente. Prof. Catarina: Não consigo nomear um episódio.

Há episódios que continuam a acontecer todos os anos e são muito gratificantes. São as aulas em que percebo que os alunos estão interessados, em que há grandes debates e reflexões e saio das aulas a sentir que é aquilo que gosto de fazer. Não sei se o faço bem ou mal, mas é aquilo de que gosto. Também há aqueles momentos em que recebo e-mails dos alunos que acabaram os cursos a agradecerem e sinto que os toquei e que contribuí, de alguma forma, para a formação desses alunos. Para mim esses são os episódios mais marcantes. Pontivírgula: Considera que a profissão de

“E a música está lá sempre: está aqui no meu gabinete onde trabalho, está no carro, agora partilho-a com a minha filha, o que é mais entusiasmante. “ Pontivírgula: Como está presente a música na sua vida, nos dias de hoje? Prof. Catarina: Está presente semanalmente, porque dou aulas de canto, porque continuo a cantar, porque também tenho uma presença ativa no colégio que me formou, na Academia de Música de Santa Cecília. E a música está lá sempre: está aqui no meu gabinete onde trabalho, está no carro, agora partilho-a com a minha filha, o que é mais entusiasmante. Sem dúvida alguma que a música faz parte do meu dia-a-dia.

professora mudou a sua forma de ser? Prof. Catarina: Mudou

muito. Aprendi a ser mais tolerante, mais paciente, a ouvir, porque acho que um professor também tem obrigação de contribuir para a formação cívica dos seus alunos e para o seu desenvolvimento como pessoas e às vezes é preciso ouvir. Eu acho que a vida é tão corrida que nós não ouvimos. Claro que o facto de ser coordenadora de curso também me faz ouvir com mais frequência, acho que é preciso ouvir e é preciso também saber escolher as palavras para, de alguma forma, tocar as pessoas. Portanto, penso que isso tem contribuído diariamente para a minha formação enquanto pessoa.

Pontivírgula: O que é mais desafiante? Ser professora do curso de Comunicação ou ser professora de canto? Prof. Catarina: São públicos diferentes, mas o desafio é igualmente existente. É um desafio diário lidar com estes dois públicos de jovens, com idades ligeiramente diferentes, mas ambos estão, ainda, a caminhar. Daí eu também dizer que é desafiante para mim própria perceber como posso contribuir para que esse caminho dos alunos, mais novos ou mais velhos, se possa ir fazendo.

Andreia Monteiro e Guilherme Tavares *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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Sangue Novo na FCH

A nova equipa da Associação de Estudantes da Faculdade de Ciências Humanas (AEFCH) tomou posse, no passado dia 19, e é agora liderada por Joana Ferragolo, aluna de Comunicação Social. A Cerimónia de Tomada de Posse mais concorrida dos últimos anos contou com a presença de alunos, professores e outros convidados. A Direcção da Faculdade fez-se representar pelo Professor Doutor Henrique Joaquim, vogal da Direcção. Num acto simbólico, a nova Presidente recebeu das mãos da Ex. Presidente, Sara Plácido, o dossier representativo da liderança da Associação de Estudantes.

A nova Presidente disse, no seu discurso, que assumir a liderança da AEFCH é um “enorme orgulho e responsabilidade” e que a nova equipa irá “manter uma postura de total transparência e abertura”. Após o balanço do ano anterior feito por Sara Plácido, a nova Presidente assegurou que “o importante não é o que nos diferencia da AE anterior, é o trabalho que deixamos feito”. A terminar o discurso, a nova Presidente afirmou que “a Lista A toma posse com o intuito de dar à AEFCH o estatuto que merece”.

© Fotografia Cedida por Joana Ferragolo

Diogo Oliveira *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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Ex-alunos: Experiências Patrícia Fernandes

Futuro? É o que quiseres Após três anos de estudo e dedicação a vários projetos tanto na música, como na escrita jornalística, bem como na direção deste jornal que estão a ler, decidi que não era suficiente. No final da minha licenciatura, quando todos sonhavam em finalmente estar de férias e aproveitar todo o merecido descanso, eu decidi ser diferente. Meti na cabeça que o melhor para mim seria arranjar um estágio durante o verão. Sim, naquela altura do ano com que os estudantes passam um ano inteiro a sonhar. Mas, eu ansiava pela minha independência e por novas experiências, pois sempre acreditei que um ser humano não é finito, não se fecha em si só e tem sempre algo mais para aprender. Admito que dedicar um ano ao jornalismo (embora de forma amadora) me deixou um sentimento de fulfillment (desculpem a ousadia de utilizar uma expressão tão pouco portuguesa) e de dever cumprido. Mas eu estava zangada com o jornalismo, com a falta de reconhecimento, com a falta de oportunidades e, especialmente, com a exploração indigna de futuros profissionais e de jovens apaixonados e sonhadores. Zangas à parte, eu sentia realmente falta de explorar o meu lado mais criativo (muito alimentado durante o meu affair de três anos com as Artes Visuais no secundário) e surgiu a oportunidade de estagiar numa agência de Marketing Digital. Para minha sorte, a agência era a 10 minutos de minha casa, e tinha o apoio dos meus amigos e família, mas o melhor… Eles queriam trabalhar comigo!

“Mas eu estava zangada com o jornalismo, com a falta de reconhecimento, com a falta de oportunidades (...)”

© Fotografia Cedida por Patrícia Fernandes

Em setembro completei os três meses de estágio, através de um protocolo entre a Universidade Católica e a Fullsix Portugal. Estagiei na área de Social Media e não podia ter ficado mais feliz! Trabalhei com mais de 13 marcas, todas elas muito diferentes entre si e esta experiência não podia ter sido mais gratificante, não só em termos pessoais e, agora, profissionais. A minha relação com a Fullsix Portugal está firme e a crescer, e cheia de potencial. Qual é a conclusão? Façam o que vos fizer felizes. Mesmo que isso fuja completamente à área que estudaram e em que acharam que iriam trabalhar toda a vossa vida. Vão ter dias em que questionam o momento insano, em que acharam que era giro estagiar no verão, vão ter outros dias em que vão adorar o vosso trabalho e que acham que tudo vale a pena, vão perder o vosso dia de aniversário em reuniões e trabalhos, vão chegar tarde a compromissos com família e a vossa vida social vai passar a ser noturna mas, no fim, a vossa felicidade, o vosso sentimento de realização e conforto vão compensar! Têm o poder de decidir o vosso futuro, não esperem. Patrícia fernandes


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Erasmus: Experiências Marta Durán e Marta Gonçalves

Porquê fazer intercâmbio em Macau? A comida é o que mais difere dos nossos costumes europeus. Temos de confessar que nem sempre tem sido fácil adaptarmo-nos aos noodles de manhã e à noite, nem à expectativa que trazíamos pelo que a cozinha chinesa nos oferece em Portugal. Onde é que está a galinha frita com amêndoas? E o pato à Pequim? Intercâmbio na Ásia tem inúmeras vantagens, como viajar por lugares paradisíacos por baixo custo. Passou um mês e uns dias e já fomos a Singapura e à Malásia! Aproveitamos feriados, conciliamos com os fins-de-semana e planeamos ir ao máximo de sítios nos arredores.

© Fotografia Cedida por Marta Durán e Marta Gonçalves

Porque não existe melhor forma de conhecer diferentes formas de estar, costumes e línguas como viajando, literalmente, até ao outro lado do mundo. Assim que aterrámos, reparámos nas diferenças: a temperatura, o ar quase irrespirável por causa da humidade, a luz que em nada se assemelha com a de Lisboa e os neons por todo o lado. As marcas da colonização são visíveis nas placas de sinalização, na voz automática que indica a próxima paragem no autocarro, no nome das ruas. Na prática nada aqui se assemelha ao nosso Portugal e se encontrarmos alguém já com idade tenra que saiba dizer umas palavras em português é uma sorte. O alojamento é no campus da universidade. É um mundo como nunca vimos igual. Tem ginásio com sauna, piscina, campos de ténis, um centro comercial, uma biblioteca de perder de vista e um shuttle que nos transporta de uma ponta à outra da faculdade. E, o melhor de tudo, é que economicamente fica mais em conta do que fazer erasmus em alguns países da Europa!

Para manter os amigos, familiares e conhecidos a par de tudo o que se passa com as “Martas” em Macau, criámos um blog, onde contamos as nossas histórias e partilhamos fotografias. Podem seguir-nos através de martasaroundasia.blogspot.com. A aventura na China vai ainda a meio e com ela pretendemos tirar o máximo proveito dos vários benefícios que tem uma experiência destas: alargar horizontes, conhecer pessoas de vários cantinhos do mundo e realizar algumas das nossas viagens de sonho.

“As marcas da colonização são visíveis nas placas de sinalização, na voz automática que indica a próxima paragem no autocarro, no nome das ruas.” Marta Durán e Marta Gonçalves *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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PSICOLOGIA E tu ? Atreves-te a fazer a diferença?

© Imagem Cedida pelo GApA

O voluntariado vai além do ajudar os outros. Quais as razões que te levariam a praticar Não se resume à luta pelos direitos humanos, é voluntariado? Todos nós temos instinto para também um encontro com a nossa identidade a defesa de alguma causa, mesmo que nem enquanto indivíduos. sempre reflictamos sobre isso. O excesso de informação a que hoje temos acesso entorpece-nos a mente, não nos permite perceber o verdadeiro significado da palavra voluntariado. Eu partilhei, tu partilhaste, ele partilhou e crê-se já se ter feito muito – ou mesmo tudo – para aquela causa. Alguns talvez até nem se dêem ao trabalho de partilhar porque não é algo que lhes toque. Ou talvez apenas partilhem para ficarem bem vistos nos seus círculos de amigos, ou para publicarem nas redes sociais. Quando tomamos a decisão de exercer trabalho de voluntariado estamos a dar um importante passo para que a necessária mudança de mentalidades na sociedade de hoje seja possível, tornando-nos cidadãos activos e não apenas passageiros deste mundo.

Tens um horário muito preenchido e não te dá mesmo jeito nenhum? Acredito que muitas das pessoas que hoje praticam voluntariado utilizaram, em tempos, exactamente a mesma desculpa. Hoje são pessoas muito diferentes, mais alegres e, certamente, com um enorme sentimento de realização e de cumprimento de um dever cívico. Então? Deixa-te de desculpas! Do que estás à espera para procurar o trabalho de voluntariado com que te possas identificar? Há imensas instituições e iniciativas de trabalho de voluntariado, dentro da nossa Universidade (Programa de Voluntariado CATÓLICA ACTIVA) ou fora, em projectos e programas de entidades públicas e privadas.

O voluntariado pressupõe uma entrega a Inicialmente, apenas terás de escolher a uma causa, às pessoas com quem partilhamos área em que pretendes actuar. Depois, terás os nossos dias e um acreditar constante. Exige, de realizar a tua inscrição e esperar pelo início no fundo, a parte humana da pessoa. Mas, da tua nova missão de vida! humildemente, também se reconhece o seu lado egoísta: o voluntariado preenche-nos enquanto Preparado? seres humanos. Tatiana Santos *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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Estagiar: Sim ou Não? Chegamos a um ponto da licenciatura em que é natural que surjam dúvidas, questões e que muitos de nós não saibam que rumo seguir. Os estágios durante e após a licenciatura dão-nos, muitas vezes, as luzes de que precisamos para nos elucidar quanto à área profissional com que nos identificamos mais. Servem também para pormos em prática e conciliar aquilo que aprendemos na licenciatura, o que muitas vezes nunca temos a oportunidade de experimentar. Mas o “Como?”, “Quando?” e “Onde Procurar?” são perguntas que muitas das vezes deixam os alunos sem saber o que fazer, onde procurar, ou como conciliar com as aulas, caso seja necessário. A chave está em encontrar um estágio que permita alcançar um equilíbrio entre as aulas, o estudo e o trabalho. Ao início, podemos até nem conseguir encontrar um estágio que nos encha as medidas ou que seja aquilo que procuramos. No entanto, muitas das vezes o que não parece apelativo ou adequado para nós acaba por nos surpreender, e podemos vir a descobrir novas áreas com que nos identificamos mais. Quanto maior for a experiência profissional de cada um, mais fácil será ingressar no mercado de trabalho. É uma mais-valia ter um estágio, seja de que vertente for, no currículo. Se tiverem a oportunidade de fazer um estágio fora do país, melhor ainda, porque é uma regalia ter uma experiência no estrangeiro, o que torna o currículo mais enriquecedor.

“A chave está em encontrar um estágio que permita alcançar um equilíbrio entre as aulas, o estudo e o trabalho.”

© Fotografia Cedida por Joana Pires Roque

É certo que nem todas as empresas dão a devida atenção aos seus estagiários e os põem de facto com “a mão na massa”: muitos deles limitam-se a fazer trabalhos chatos que os empregadores deixam para eles, como tirar cafés e fotocópias. Se isso acontecer, não deixem de se queixar e fazer valer os vossos direitos. Não tenham medo de chamar a atenção e relembrar o porquê de estarem ali, afirmem que têm ambição de aprender e trabalhar: essas atitudes vincadas até são bem vistas. Infelizmente, este tipo de casos não é assim tão raro e, antes mesmo de começarem a estagiar, devem ter a certeza para o que vão, porque muitas pessoas aproveitam-se da vossa vontade e sede de saber mais sobre a entrada no mundo competitivo que é o mercado de trabalho. No fundo, tenham vontade e não percam o interesse de se informarem sobre as empresas que estão a recrutar. Não tenham medo de arriscar e perder umas horas do dia ou do fim-de-semana a enriquecer-vos enquanto profissionais que um dia serão, porque de facto há oportunidades que nos abrem muitas portas e que são o começo de uma vida profissional e que nos ensina muito, mesmo muito. Joana Pires Roque


ATUALIDADE

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ELEIÇÕES O Pontivírgula analisa algumas das principais frases e ideias das Eleições Legislativas 2015. É um jornal feito por alunos, é verdade, mas também gostamos de ser professores e, por isso, avaliamos as frases de 0 a 10, com base nas suas repercussões políticas, na eficácia comunicacional, no efeito surpresa e na forma como chega, ou não, às massas.

“Que cada um de nós seja a senhora de cor-de-rosa, no dia 4 de Outubro, dizendo na cara do primeiro-ministro o que quer para o futuro do país.” - António Costa, Secretário-Geral do Partido Socialista O Secretário-Geral do Partido Socialista aludiu ao célebre episódio em que uma pensionista, vestida de cor-de-rosa, confrontou Pedro Passos Coelho durante uma arruada – passeio pelas ruas muito popular entre os políticos. Percebe-se a ideia de Costa: o PS pretendia que os eleitores, com a cruz no boletim, seguissem o exemplo da senhora de cor-de-rosa e confrontassem a liderança de Pedro Passos Coelho. É daqueles aproveitamentos que parecem óbvios e populistas mas que têm um poder enorme, não só pela simplicidade da mensagem como pela tentativa de aproximar todas as “senhoras de cor-de-rosa” à ideia do Partido Socialista.

Nota Pontivírgula: 8/10

“Esta discussão entre os dois [coligação Portugal à Frente e PS], a ver quem consegue fazer pior, só exige uma solução: nem um nem outro merecem governar o país porque as suas propostas são para atingir os mesmos do costume, os reformados, os que menos têm e menos podem e precisam de proteção social.” - Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP Declaração forte do Secretário-Geral do PCP. Não é uma posição surpreendente nem que rompa com as mensagens habituais mas, em período de pré-campanha, ganha outro significado. Se o ataque à direita é natural, o ataque directo ao PS já pode ser considerado uma demarcação clara entre as ideias do PCP e dos socialistas. Jerónimo de Sousa procura “colar” o Partido Socialista à coligação de direita, tentando mostrar ao eleitorado de centro-esquerda que um voto no PS é um voto no ataque aos reformados. Numa interpretação mais alargada (e gozando do privilégio de estarmos a escrever no pós-eleições), pode dizerse que Jerónimo, com esta mensagem, colocou em causa um possível entendimento com o PS para um eventual governo de esquerda – possibilidade que agora sabemos não ser tão certa quanto isso. Mensagem inteligente no curto prazo e numa perspectiva eleitoralista, mas arriscada no longo prazo e num cenário de negociação pós-eleitoral.

Nota Pontivírgula: 6/10

“Se a coligação de direita não tiver maioria, fique bem claro que não será pelo BE que conseguirá formar Governo.” - Catarina Martins, porta-voz do BE Catarina Martins reitera que a direita não contará com a ajuda do Bloco de Esquerda para governar. É uma posição firme, que soa bem aos ouvidos do eleitorado de esquerda e que não fere o eleitorado de direita. Postura esperada, embora nem sempre os partidos assumam estas posições antes das eleições. Mensagem segura e sem grande risco associado.

Nota Pontivírgula: 7/10


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ELEIÇÕES “Hoje o Estado social está de melhor saúde - e recomenda-se - do que em 2011. Pagámos as dívidas dos outros, arrumámos a casa.” - Pedro Passos Coelho, Presidente do PSD Nestas legislativas, a principal arma de arremesso da coligação de direita foi o fardo deixado pelo anterior governo. Segundo a PàF, esse fardo foi herdado, aligeirado e ultrapassado pela coligação. Esta estratégia é indissociável do “fantasma” de José Sócrates e pretende mostrar à população que as medidas austeras aplicadas pelo governo foram inevitáveis, em grande parte por culpa da anterior governação socialista. Mensagem eficaz.

Nota Pontivírgula: 8/10

“Com o PS não há, nem haverá, qualquer corte de pensão - nem hoje nem amanhã - porque nós garantiremos a todos os pensionistas aquilo que a Constituição garante: a integridade da pensão a que têm direito.” - António Costa Nesta declaração, Costa arriscou. Faz uma promessa eleitoral que coloca o PS “na corda”. Costa podia ter sido mais prudente e tentado deixar a questão das pensões como uma forte intenção, não sendo tão categórico. Mensagem arriscada e que pode acarretar cobranças no futuro. No entanto, há duas questões que devem ser valorizadas: por um lado, a audácia da mensagem, sobretudo numa fase em que muito se critica a pouca substância das mensagens políticas. Por outro lado, esta mensagem tem força na forma como agrada à população em geral. Uma promessa deste género é suficiente para garantir votos.

Nota Pontivírgula: 7/10

“Hoje, assinala-se o dia em que o Governo PSD/CDS foi derrotado. Tem grande derrota e perde maioria absoluta e a possibilidade de formar Governo, a menos que haja do Presidente da República uma entorse no que diz respeito aos resultados eleitorais.” - Francisco Lopes, membro do comité central do PCP O PCP, para além de insistir na perda da maioria absoluta da coligação, aponta baterias para outra questão importante: pressão em Cavaco Silva. Com a inexistência de uma maioria absoluta e com a possibilidade de um entendimento alargado à esquerda, o PCP procura inibir, desde logo, a acção do Presidente da República. Defende, numa primeira análise, que a vitória nas eleições é insuficiente para que a coligação assuma as rédeas da governação e, numa segunda análise, que o aval de Cavaco a este cenário seria “uma entorse no que diz respeito aos resultados eleitorais”. Declaração muito bem pensada.

Nota Pontivírgula: 9/10

“Para que haja estabilidade é necessário que não ganhemos por poucochinho. Como já disse uma vez, quem ganha por poucochinho, só pode fazer poucochinho. - António Costa As mensagens com linguagem mais coloquial e ao alcance de todos funcionam, geralmente, de forma muito eficaz. Não é inovador e, cada vez mais, os líderes políticos têm uma preparação exaustiva neste campo. Criar uma ligação entre a mensagem e o receptor, com o objectivo de aproximar também o emissor, é uma técnica que parece simples mas requer treino. Costa apelou à votação maciça (leia-se maioria absoluta) no Partido Socialista, sob o argumento de só poder fazer muito, ganhando por muito.

Nota Pontivírgula: 9/10


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ELEIÇÕES

“Se há uma coisa que as pessoas não apreciam nas noites eleitorais, é toda a gente dizer que ganhou. (...) A coligação Portugal à Frente venceu as eleições. Vencemo-las com clareza e com uma significativa distância em relação ao segundo classificado.” - Paulo Portas, presidente do CDS-PP Nesta declaração da noite eleitoral, o líder do CDS contraria a síndrome de “vitória geral”. Paulo Portas foi inteligente e assertivo na forma como desvalorizou os motivos de festejo dos outros partidos. Reforçou que os portugueses deram uma vitória clara à coligação PSD-CDS e ainda juntou uma “bicada” ao PS, falando da “significativa distância em relação ao segundo classificado”. Portas foi hábil e escolheu o momento certo para desvalorizar os resultados dos adversários.

Nota Pontivírgula: 8/10

“Este homem de verdadeira confiança e determinado, abnegado, corajoso, sério e patriota, que foi o homem do leme na condução desta nau chamada Portugal, que nestes quatro anos dobrou o Cabo das Tormentas e que hoje esse Cabo das Tormentas, como outrora aconteceu, pode ser chamado Cabo da Boa Esperança. Mas o homem do leme, Pedro Passos Coelho, foi acompanhado de outro homem extraordinário, um homem patriota, inspirador, empreendedor, intuitivo, dedicado e eloquente, Paulo Portas.” - Teresa Leal Coelho, cabeça de lista do PSD pelo distrito de Santarém Esta mensagem não é mais do que um elogio desmedido e que tira a si própria todo o poder que podia ter. É certo que um elogio a Passos e Portas vindo de um membro do PSD já não seria, por si só, uma mensagem imparcial. Pior se torna quando este elogio é de tal forma excessivo que perde a pouca força que já tinha.

Nota Pontivírgula: 3/10

“É indiscutível que o PS tem uma pesada derrota. E é também indiscutível que o BE é o grande vencedor da noite.”
 - Fernando Rosas, antigo deputado do Bloco de Esquerda Outra mensagem que reclama vitória mas esta tem outras cambiantes. Fernando Rosas aponta para a derrota do PS, deixando a PàF de lado. Esta estratégia tem duas leituras que até podem complementar-se: numa primeira análise, maximizar um mau resultado do PS é a tentativa de perfilar o BE como um partido mais próximo do PS na posição de maior força da oposição. Numa segunda análise, podemos associar estas declarações à tentativa de ter uma maior margem de manobra nas negociações à esquerda no póseleições. Quanto mais forte o Bloco se mostrar, mais voz terá num eventual acordo partidário de esquerda.

Nota Pontivírgula: 9/10


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ELEIÇÕES “As declarações que já ouvimos do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda têm esse picante porque no fundo dizem que a direita perdeu e não pode governar e esperam que seja o PS a fazer o trabalho sujo. E depois se o PS não o fizer em nome da estabilidade governativa lá estão eles para criticar (...). Isso é uma atitude de uma grande hipocrisia. - António Vitorino, antigo ministro do PS Posição interessante de António Vitorino. Os dois maiores partidos já acusaram, diversas vezes, PCP e BE de jogarem num “baloiço”, isto é, o apoio e a colagem ao PS flutua conforme os seus interesses imediatos. António Vitorino define esta flutuação como “atitude de grande hipocrisia”, na medida em que não reconhecem legitimidade à direita para governar mas, como não têm poder eleitoral para fazer oposição, esperam pelas investidas do PS. Concorde-se ou não com António Vitorino, a mensagem é extremamente inteligente e afecta as negociações pós-eleitorais entre os partidos de esquerda.

Nota Pontivírgula: 9/10

“Eu vou ser eleito deputado no distrito de Coimbra contra todas as sondagens, contra muitos desejos que não querem que eu seja eleito.” - Marinho e Pinto, líder do PDR Já é conhecido o estilo acutilante e agressivo de Marinho e Pinto. O antigo bastonário da Ordem dos Advogados gosta de apostar na ideia de que corre sozinho contra todos. É uma postura que já funcionou mas que parece já estar um pouco desgastada no agora líder do PDR. O estilo agressivo é elogiado por muita gente, mas o papel de “inimigo público” parece já não funcionar a 100%.

Nota Pontivírgula: 4/10

“O PS não conseguiu apresentar uma alternativa que levasse as pessoas a dizer ‘para pior já basta assim, deixem-nos cá estar porque estes já sabemos o que é que fazem’. Isso é que falhou.” - Miguel Sousa Tavares, comentador Para Sousa Tavares, o PS apresentou uma alternativa frágil, que não foi mais do que “pior” do que os que já lá estavam. No fundo, Sousa Tavares alude à preferência da população pelo “mau conhecido” do que pelo “mau desconhecido”. Para o comentador, uma das maiores bandeiras do projecto socialista, a confiança, é derrotada precisamente pela...falta de confiança dos portugueses nessa alternativa.

Nota Pontivírgula: 8/10

“Morte aos Traidores” - PCTP/MRPP O partido de Garcia Pereira apostou na agressividade, mas existem limites. A Comissão Nacional de Eleições não encontrou “matéria que possa constituir qualquer tipo de crime”, referindo que esta frase não ultrapassou “o nível de uma metáfora”. Não obstante, a posterior decisão do partido em retirar esta frase, fala por si. A disputa eleitoral deve ser uma luta ideológica e não deve apelar à violência, ainda que num sentido metafórico.

Nota Pontivírgula: 1/10

Diogo Oliveira *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


ATUALIDADE

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Resultados das Eleições Legislativas de 2015-10-30

Dia 4 de Outubro foram realizadas as eleições legislativa e Governo toma posse dia 30 de Outubro Na manhã do dia 4 as urnas para a eleição do Ao final do dia fazia-se com vários partidos a

de Outubro abriam Governo português. contas às eleições, reclamarem vitória.

Com o maior número de votos conseguidos, a coligação Portugal à Frente obteve 36,8% dos votos (38,3% se contarmos com os votos conseguidos pelo PSD da Madeira). Nas percentagens seguiu-se o Partido Socialista de António Costa a arrecadar 32,4% dos votos; o Bloco de Esquerda de Catarina Martins obteve 10,2%; 8,3% para a Coligação Democrática Unitária, de Jerónimo de Sousa e ainda 1,4% dos votos para o Pessoas-Animais-Natureza, de André Silva. A análise destes resultados mostra claramente que não há maioria absoluta para nenhum partido, o que significa que embora a PàF de Passos Coelho tenha vencido as eleições, terá dificuldade em fazer valer as suas propostas na Assembleia da República. Depois da indigitação, a 22 de Outubro, de Passos Coelho como Primeiro-Ministro de Portugal, o Governo tomou posse no dia 30 de Outubro. Durante o discurso de tomada de posse, Cavaco Silva sublinhou a legitimidade deste governo por ter sido “a força que ganhou as eleições” e por não lhe ter sido apresentada uma proposta “estável, coerente e credível” por parte de outras forças partidárias. O actual Presidente da República frisou o seu desejo de que Portugal se mantenha na União Europeia, referindo várias vezes os apoios cedidos pela UE. No seu discurso, Pedro Passos Coelho reforçou a ideia de vontade de dialogar com as diferentes forças políticas, desde que salvaguardando sempre o desejo pelo “bem-estar dos portugueses”. Ao longo do discurso, o PrimeiroMinistro listou alguns dos feitos alcançados pela coligação nos últimos quatro anos de governo, afirmando ainda que lutará no sentido de não deixar que seja “a classe média a pagar o preço”. O PM deixou também um pedido aos partidos de esquerda, para que estejam abertos a negociação e que não sigam “ambições políticas pessoais”, pondo em causa os sacrifícios dos portugueses.

© TVI24

O novo Governo deverá apresentar o seu programa no dia 10 de Novembro. O PS já afirmou que é praticamente impossível o programa passar, já que as forças de esquerda (PS, BE e CDU) terão, alegadamente, chegado a um acordo. O acordo será tornado público no mesmo dia em que a PàF apresentará o seu programa. A primeira prova de uma possível coligação à esquerda fez-se notar com a eleição de Ferro Rodrigues como Presidente da Assembleia da República. É a primeira vez na história da política portuguesa que este cargo é desempenhado por um político que não tem ligações ao partido vencedor das eleições legislativas. Caso a proposta não seja aceite, o Governo passará a ser um governo de gestão até ser formado um novo governo. Um governo de gestão “é um Executivo que serve para actos de administração diária e corrente, até à tomada de posse do novo Governo a eleger. Isto exclui, por princípio constitucional, a prática de medidas de fundo, novas nomeações e a aprovação de projectos ou decretos de lei.”, segundo o Jornal de Notícias. Diogo Barreto *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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“LIBERDADE JÁ!”. Após 37 dias, Luaty termina greve de fome. Luaty Beirão e outros 14 ativistas encontram-se presos desde finais de Junho. Sucedem-se manifestações de apoio aos prisioneiros em Angola, Portugal, Cabo Verde, entre outros. Os 14 activistas e Luaty – rapper que colabora frequentemente com os Batida, assinando com o nome de Ikonoklasta – foram acusados de se juntarem para preparar um golpe de estado que destronasse José Eduardo dos Santos, quando na realidade discutiam apenas política angolana e debatiam o livro de Gene Sharp, “From Dictatorship to Democracy”, estão a aguardar julgamento numa prisão em Luanda. A 21 de Setembro, Luaty Beirão decidiu começar uma greve de fome, após 90 dias de prisão, limite legislativo angolano para detenções provisórias. Posteriormente, Nelson Dibango e Albano Bingobingo, jovens do mesmo grupo, juntaram-se a Luaty no seu protesto, sendo que este último também terminou a greve a 20 de Outubro, depois de ter sido alvo de várias formas de tortura. Esta forma de protesto radical chamou a atenção da esfera mediática. Através de Noel Kututwa, vice-diretor da Amnistia Internacional para a região sul de África. Esta entidade demonstrou a sua posição, afirmando que “As autoridades devem libertar imediatamente e incondicionalmente os ativistas, que são prisioneiros de consciência, e devem parar de intimidar ativistas de direitos humanos”. A organização afirma também tratar-se de uma clara violação dos direitos humanos dos presos em questão. A 27 de Outubro, Luaty anunciou finalmente o fim da greve de fome, que se prolongava há 37 dias. Segue-se agora uma nova batalha, lutando para recuperar as energias e o peso perdido, encontrando-se com 62 quilogramas, menos 23 em relação ao dia em que teve início esta sua forma de protesto. Luaty terá de lutar também pela sua inocência, sendo que o julgamento está marcado para 16 de Novembro, no Tribunal de Cacuaco.

“A 27 de Outubro, Luaty anunciou finalmente o fim da greve de fome (...)”

© Sapo

Filho de João Beirão, primeiro diretor da Fundação Eduardo dos Santos, homem próximo do Presidente angolano, Luaty não segue a direção política do pai, manifestando-se frequentemente contra o governo de Angola. Aos 18/19 anos viajou para Inglaterra, onde estudou Engenharia Eletrotécnica e depois para França, estudando Economia. No entanto, ao regressar em 2009, nunca trabalhou em nenhuma destas áreas. Ao invés, fez vários serviços de tradução e, principalmente, dedicou-se à música, com o projeto Batida, e não só. Mostrando desde cedo interesse pela esfera política e pelo ativismo, a primeira manifestação da sociedade civil contra o regime angolano coincidiu com a sua primeira de várias detenções relacionadas com o protesto. Participou em várias manifestações pacíficas reprimidas pelo governo angolano e discursou em palco, acusando frequentemente as ações do regime. Com os recentes desenvolvimentos neste caso, que já deixou correr muita tinta, o regime angolano sofre agora pressões internacionais pela libertação dos 15 ativistas. Porém, segundo declarações proferidas por Manuel Vicente, VicePresidente angolano, (visto que José Eduardo dos Santos se encontrava indisposto), durante um discurso ao Parlamento no dia 15 de Outubro, o governo angolano não permitirá intervenções externas no que toca a assuntos do país. Têm sido recorrentes as manifestações em Lisboa, com forte presença da Amnistia, sendo que se pede, entre outras coisas, uma ação pró-ativa do governo português, tendo em conta as ligações históricas entre Angola e Portugal, mas também o facto de Luaty possuir dupla nacionalidade, angolana e portuguesa. Miguel Freitas


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Sócrates

Correio da Manhã e Sábado impedidos de publicar por providência cautelar de Sócrates A defesa do ex-Primeiro Ministro interpôs uma providência cautelar para impedir que o jornal Correio da Manhã (CM) e a revista Sábado publiquem notícias sobre a Operação Marquês. A acção judicial foi interposta nas Varas Cíveis de Lisboa, tendo sido aceite por uma juíza daquele tribunal. Isto obrigou as direcções editoriais a analisar em conjunto com a administração do grupo Cofina, empresa proprietária do CM e da Sábado, sobre o que fazer perante esta acção.

“(...) “acatar a ordem judicial mas vai contestá-la em sede judicial” (...)”.

Apesar da situação, o director-adjunto do CM, Eduardo Dâmaso, garantiu, em declarações ao Observador, que o jornal vai “acatar a ordem judicial mas vai contestá-la em sede judicial”. O responsável acrescenta que entende que as matérias relacionadas com José Sócrates têm interesse público, por isso não vão desistir de continuar com as investigações. Para além disso, foi essa linha de investigação que permitiu descobrir a casa de Paris do ex-Primeiro Ministro antes de existirem inquéritos judiciais, de se revelarem negócios, entre outros assuntos. A defesa do exPrimeiro Ministro interpôs uma providência cautelar para impedir que o jornal Correio da Manhã (CM) e a revista Sábado publiquem notícias sobre a Operação Marquês. A assessoria de imprensa da defesa de Sócrates assegurou ao Observador que a acção judicial não visa impedir a publicação de notícias sobre o processo, mas sim “impedir a devassa da vida privada do Engenheiro José Sócrates que é feita diariamente pelo jornal Correio da Manhã”. Pedro Delile, advogado de Sócrates, sublinhou que “o que vier a ser feito não se dirige especificamente ao Correio da Manhã, mas a qualquer jornal que esteja nessas circunstâncias”. Mariana Pereira Martns

Fim da Política do Filho Único na China As famílias chinesas vão passar a poder ter dois filhos, numa tentativa de impulsionar a economia do país. Desde 1980, há 35 anos, as famílias chinesas viviam na política de filho único, como forma de controlo do crescimento da população. Nos dias de hoje, a população é maioritariamente envelhecida e a economia está em forte desaceleração. Investigadores alertam para um desequilibrio de género, que trará problemas de relacionamento a mais de 20 milhões de jovens, sendo que muitos não arranjarão par. Os opositores do governo acusam-no de ter sido responsável por milhões de abortos forçados e de infanticídios, como forma de controlarem essa mesma política de filho único, avança a TVI 24. O caso mais chocante foi em 2012, em que uma mulher de 23 anos foi obrigada a abortar no sétimo mês de gravidez pelas autoridades de planeamento familiar.

© China Flag Facts

A decisão de acabar com a política de filho único foi tomada na reunião do comité central do Partido Comunista da China, notícia avançada pelos orgãos oficiais chineses. Sandra Vasconceloss *Textos escritos com o Antigo Acordo Ortográfico


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E a Ucrânia, pá?

© Ilustração Isabela Pimentel

Há uma guerra na Europa e ninguém fala disso. No dia 30 de Novembro de 2014, um grupo de estudantes, que protestava contra as políticas prórussas na praça Mikhailosvskaya, em Kiev, foi brutalmente agredido pela polícia. Os meios de comunicação ucranianos ignoraram o sucedido, mas as imagens da violência a que os protestantes foram sujeitos invadiram as redes sociais. Depressa veio gente de todo o país para defender os estudantes e para manifestar a sua indignação em relação às autoridades policiais e ao governo de Viktor Ianukovitch. As manifestações prolongaram-se por quatro meses, o que levou à queda do governo e a um conflito que já vitimou milhares de pessoas.

“(...) as imagens da violência a que os protestantes foram sujeitos invadiram as redes sociais.”

O conflito começou por ser um protesto contra um governo corrupto, ineficaz e por muitos considerado como demasiado submisso em relação ao Kremlin, mas acabou por fazer emergir uma série de problemas de um país, que à semelhança dos seus vizinhos, tem uma história conturbada e resultou de uma fusão entre diferentes etnias, culturas, línguas e religiões. Durante os primeiros meses, enquanto a violência era visível e as imagens poderosas o suficiente para “agarrar” o público, os meios de comunicação seguiram com atenção os acontecimentos, que tiveram o apogeu mediático no abatimento de um avião comercial da Air Malaysia sobre território ucraniano. Entretanto, a Rússia indexou a Crimeia e o silêncio à volta deste assunto tornou-se paralisante. O silêncio das instituições que, a bem das boas relações diplomáticas com a Rússia, encolhem levemente os ombros às acções tiranas de Putin, já era de esperar. O que fere, mesmo, é o silêncio dos meios de comunicação social, que viraram os olhos para a “next big thing”.


ATUALIDADE

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E a Ucrânia, pá? Numa região que já integrou o Estado polacolituano, a Rússia Czarista, o Império Austro-Húngaro e o Império Otomano, as divergências entre a população são evidentes. Na Ucrânia Ocidental, a herança Austríaca ainda se faz sentir e há também uma forte ligação económica e cultural com a Polónia. Já a Ucrânia Oriental sente uma maior ligação com a Rússia. Na Crimeia, região que pertenceu à Rússia até 1954, altura em que foi cedida à Ucrânia por Nikita Khrushchov, a grande maioria da população identifica-se como sendo russa. Nada disto implica, no entanto, que não haja um grande sentido de identidade nacional. A população converge na noção de pátria, mas diverge no rumo da mesma. Alguns defendem que a Ucrânia devia aliar-se com as forças ocidentais e aderir à União Europeia. Outros acreditam que os laços com a Rússia são demasiado fortes para serem quebrados e que o país não se deve alienar do seu aliado histórico (e geográfico). É claro que as afinidades históricas criadas entre países vizinhos não devem ser mitigadas, mas há que tentar perceber quando essas ligações trazem escondidos ímpetos imperialistas.

Pode, de facto, ser argumentado que, dada a hipótese, a população da Crimeia escolheria ser russa e não ucraniana (como, aliás, fez num referendo considerado ilegal pelo governo ucraniano). Mas é preciso não esquecer que a maneira como a indexação deste território foi feita, tem muito pouco que ver com a integração de um povo, mas sim com o rebaixamento de um povo que se quer fraco e submisso aos poderes de Moscovo. A Crimeia dá à Rússia acesso ao Mar Negro e, consequentemente, ao Mediterrâneo, e a Ucrânia é fundamental para a afirmação da Rússia como império euro-asiático. Putin indexou a Crimeia. O mundo seguiu com atenção os acontecimentos. Agora, o mundo olha para o lado. A Rússia bombardeia a Síria numa luta contra os extremistas do Estado Islâmico e em defesa de Bashar al-Assad, um dos poucos aliados que lhe restam. Todos os olhos estão postos na Síria, mas até quando?

© Gleb Garanich

Inês Linhares Dias *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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Armas e Massacres, Uma Relação Proporcional

No dia 1 de Outubro, quinta-feira, o mundo recebeu a notícia de um novo tiroteio nos EUA. Mais de uma dezena de pessoas morreram e outras tantas ficaram feridas num ataque numa universidade do Estado de Oregon. Em que é que este caso nos é familiar? Na paridade com os outros tiroteios de que já ouvimos falar. Uma pessoa armada, vários mortos e feridos, numa instituição de ensino ou outro local público, nos Estados Unidos da América. É difícil precisar o número de vezes que já ouvimos este tipo de notícia, que parece de frequência diária. Na realidade, o número de ocorrências é substancialmente mais elevado do que o que é noticiado. “Nenhuma outra nação desenvolvida sofre este tipo de violência”, são palavras de Barack Obama num repetido comunicado após o tiroteio, na defesa da alteração da legislação de porte de armas fundada na constituição. Uma das questões mais delicadas para o Presidente dos EUA, que desde o início do seu mandato tem-se movido numa luta ingrata onde o culto pela arma está enraizado com os Democratas a defenderem um maior controlo, e os Republicanos a contraporem uma política mais liberal. Às propostas apresentadas no Senado para alargar a verificação dos antecedentes crimi-

“(...) o culto pela arma está enraizado (...)” Ter acesso a uma arma nos EUA é fácil e rápido. É uma compra personalizada, aconselhada, como se de um relógio se tratasse. A verificação dos antecedentes criminais é feita em loja, mas no caso de compra online não. Segundo dados estatísticos, os EUA têm a maior taxa de posse de armas mundial. Nove em dez americanos têm em sua posse uma arma de fogo, sendo que a tendência é para que comprem mais. Desde 1986 foram registados mais de 70 massacres que envolvem armas de fogo. O número de pessoas que morreram por violência em tiroteios é assustador e alarmante. São contados mais de 11 mil mortos por ano em casos relacionados com armas de fogo. A fórmula é simples: mais armas, mais ataques massivos. Barack Obama iniciou funções em 2009 e não abdicará dos poucos meses de mandato que lhe restam na luta pela restrição de posse de armas de fogo. Como o próprio o disse, “As nossas lágrimas não são suficientes”.

© The News Online

Inês Amado *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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Sintra Press Photo – “Conflito” O que (não) vêem os nossos olhos

© Ana Silvestre

Com financiamento e a convite da União de Freguesias de Sintra, a Reflexo organiza a primeira exposição anual de fotojornalismo no concelho, que irá ser exibida no MU.SA (Museu das Artes de Sintra), no dia 10 de Outubro, com o apoio da Câmara Municipal de Sintra. Falamos de Sintra Press Photo. O melhor do fotojornalismo mundial chega todos os anos a Portugal entre Abril e Maio, com o World Press Photo – mas Sintra não teve tempo a perder. Marcada pelo tema “Conflito”, o Sintra Press Photo pretende ocupar um espaço que se encontra vazio em território nacional, homenageando e exibindo os trabalhos de fotojornalistas premiados de renome, bem como os seus difíceis e encorajadores percursos. O evento, para além de promover as fotografias apresentadas, pretende também promover o fotojornalista enquanto artista, uma vez que, e apesar de muitas vezes condicionados pelo ambiente caótico que os rodeia, mantêm a impressionante habilidade de usar a sua sensibilidade para criar arte a partir das mais trágicas situações.

O evento (...) pretende também promover o fotojornalista enquanto artista (...)

Para tal, o Festival convidou o irlandês Ross McDonnell, o espanhol vencedor de um Pulitzer Manu Brabo e Paulo Nunes dos Santos, português radicado na Irlanda desde 2012 e que já mostrou o seu trabalho em jornais como o New York Times, Le Monde ou Al Jazeera. Enquanto Manu Brabo escolheu mostrar no Museu das Artes de Sintra a série “Mara’s Warfare”, sobre os grupos violentos de El Salvador, Paulo Nunes dos Santos e Ross McDonnell selecionaram imagens do conflito recente na Ucrânia, que resultou numa guerra civil. O primeiro fotografou os tumultos, o segundo focou-se na transformação de civis em soldados e na forma como a sociedade se adaptou à nova realidade de guerra. Numa tarde chuvosa e, por isso mesmo, característica de Sintra, o MU.SA acolheu os artistas e também os visitantes, que não tardaram em chegar. Numa conversa informal e animada, o público ouviu atentamente os fotógrafos convidados, que partilharam as suas experiências enquanto repórteres de guerra da atualidade. Rui Cardoso, jornalista há já largos anos no Expresso, deu início à conversa, fazendo uma breve introdução sobre a guerra e uma homenagem a todos os fotojornalistas, afirmando que “por trás de um trabalho de fotojornalismo, está um trabalho de heróis”. A verdade é que, quando falamos de fotojornalismo, entramos na esfera de uma das mais sublimes e pertinentes formas de arte - a fotografia enquanto objecto artístico e fonte de informação factual.


ATUALIDADE

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Sintra Press Photo – “Conflito” Contudo, a velha e tão debatida questão mantém-se e é discutida entre os artistas: “Será a imagem suficientemente explicativa, conseguindo contextualizar no tempo e no espaço o acontecimento a que se refere?”. Apesar de apresentarem visões distintas, concordam que a palavra sem a imagem não teria a mesma força nem a mesma capacidade de permanecer na memória, ao passo que a fotografia sem a palavra, não conseguiria deixar transparecer todo o seu potencial informativo. Não se diferenciam, mas ao invés, complementam-se. A prova disso é que, hoje em dia, raras são as publicações que não apresentam uma fotografia para captar a atenção do leitor. Ao leitor, já não lhe bastam os seus conhecimentos ou imaginação; este é, mais do que nunca, um observador que quer ver através dos olhos de alguém que testemunha o conteúdo das palavras. “Nós estamos naquele contexto de guerra e o nosso objectivo é transmitir o que é estar naquele espaço, naquele momento”, diz Manu Brabo, afirmando também que, por vezes, estes artistas vêem “certas coisas, muitas delas dificeis de lidar, de viver com elas no pensamento”. Tudo para capturar o frame perfeito, a fotografia ideal, através de um olhar emocional e artístico, que perdura na eternidade.

A imagem é importante e hoje em dia fundamental, para sentirmos o mais perto possível o que, na verdade, esperamos não ver em primeira mão. Temos medo. Estes artistas registam não só a guerra ou o campo de batalha, mas também os dramas familiares e a dor vivida e refletida nos olhos das crianças que choram por paz. Choram porque querem viver; choram para não ouvir os choros dos outros, que choram ainda mais alto. Choram pela vida e pelo fim da guerra, e só imaginar é já tão difícil. A Sintra Press Photo, para além de exibir os trabalhos fotográficos destes três artistas de renome, dá também oportunidade a fotógrafos profissionais ou amadores de mostrar os seus melhores “clicks”, através da implementação de uma mostra fotográfica subordinada ao tema “Sintra Urbana/Sintra Rural”. As fotografias selecionadas serão avaliadas pelos três fotográfos convidados, cabendo aos mesmos a eleição de um dos trabalhos que irá ser alvo de destaque durante a exposição. Uma ideia brilhante e uma exposição sublime, bem concretizada e apelativa. Não só por dar a conhecer as fotografias, mas por enfatizar também o trabalho duro e por vezes injusto de um fotojornalista. Visite e veja com os seus olhos, o que outros olhos viram em primeira mão.

© Ana Silvestre

Ana Silvestre *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


ATUALIDADe

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Dimitri Vegas & Like Mike são os DJs #1 do mundo

© Mariana Pereira Martins

Foi a 2485 quilómetros de Lisboa que se realizou o countdown para anunciar o #1 do mundo, durante o Amsterdam Music Festival, na Amsterdam Arena. Os irmãos belgas vencem o ranking anual da revista inglesa DJ MAG pela primeira vez. Na lista, seguem-se os holandeses Hardwell e Martin Garrix, que ocupam o segundo e terceiro lugar, respectivamente.

No Top 100 DJs também se encontram os portugueses Diego Miranda, que conquistou o 58º lugar, e Kura, que desceu para a 61ª posição.

Tudo se resume a dois dias passados num oceano de luzes, num espectáculo de som e dança, numa atmosfera tecnológica de talento, energia e produção artística. Foi uma grande produção de arte electrónica O melhor festival de Electronic Dance que durou até ao nascer do sol. Music do mundo invadiu a casa do clube de futebol holandês, AFC Ajax, durante Para o ano há mais! dois dias, recebendo cerca de 40 000 pessoas de mais de 100 nacionalidades dife- “Thank you #AMF2015! It was insane!!!” rentes. Foram mais de 16 horas de vibração Afrojack tocadas pelos melhores DJs do mundo: Dimitri Vegas & Like Mike, Hardwell, Martin “Thank you Amsterdam!” - Tiësto Garrix, Armin Van Buuren, Tiësto, David Guetta, Afrojack, Oliver Heldens, Alesso, entre outros.

© Mariana Pereira Martins

Mariana Pereira Martins *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


OPINIÃO

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Um Pouco (In)Conveniente Vamos diretos ao assunto, as mulheres sangram! Dei-me ao trabalho de ver sinónimos do nome Mulher e encontrei uma panóplia deles: senhora, madame, adulta, mulher-feita, esposa, cônjuge, companheira, fêmea etc. Podia ficar aqui o dia todo a escrever todas as expressões com um sentido semelhante ao nome Mulher… Contudo, neste conjunto de expressões, há uma que me salta à vista… fêmea, e porquê? Bem, eu não tirei o curso de Biologia, mas acho que não é preciso tirar um curso para se saber que TODA a FÊMEA (mamífera) sofre, sangra e tem mudança de humor todos os meses. Qual é o nome disso? PERÍODO, as mulheres têm o período! Neste momento, após dizer tamanho “palavrão”, aposto que quem leu pensou: “A sério que ela acabou de escrever isto? Que falta de noção...” e garanto-vos que não foram só homens a pensar assim... Pois bem, já chega de fazer um bicho-de-sete-cabeças em volta de algo como o PERÍODO (não me canso de dizer esta palavra!)! A sociedade tem uma tendência de nos fazer sentir culpadas por falarmos na menstruação e, o pior, é que nos leva a acreditar que sangrar todos os meses é um ato de sujidade do corpo e humilhante para a condição da mulher. Esconder o período é um símbolo de desigualdade de género e está na altura de desmistificar isso. Esta desigualdade é de tal forma grande que apenas 12% das meninas e mulheres em todo o mundo têm acesso a produtos de higiene íntima. E, para além disso, uma em cada 10 crianças falta à escola em África quando tem o período. Além do mais, o período menstrual é visto como um período temporal em que a mulher se encontra “impura” e por isso, leva a que, em diversos casos, esta seja banida de locais de culto, em celebrações religiosas ou então, também chegam a ser obrigadas a isolarem-se em “tocas” porque, segundo algumas tradições religiosas, estão proibidas de participar em comunidade porque são, uma vez mais, consideradas “imundas”. Para piorar o panorama deste tabu, todos os produtos de proteção menstrual como os pensos higiénicos e tampões, que deveriam ser gratuitos, são, na verdade, considerados bens de luxo. - Sim, porque sem dúvida que passar por este processo todos meses, que envolve mudanças de humor, dores exaustivas e desconforto é um “luxo”... Esta situação, a da “taxa do tampão”, está revoltar pessoas em todo o mundo, principalmente nos Estados Unidos, Reino Unido, Malásia ou Austrália, onde é exigida uma taxa de 4%, 5%. 6% ou 10% a estes “produtos de luxo”.

As mulheres sofrem com esta ostracização criada em volta do período, que é algo natural e que faz parte da condição da mulher, e sofrem bastante levando mesmo a que, as próprias, não se sintam bem com elas mesmas e que tenham vergonha de referir que “estão naquela altura do mês”. Querem um exemplo? Então, basta pensarem nas vezes todas em que, por acaso, um tampão decidiu encontrar uma forma de sair da vossa mala, o que é que fazem? Fora o facto de “congelarem” de tanta vergonha, vocês viram autênticos ninjas para voltarem a meter o “cusco” do tampão dentro do sitio a que pertence. Para além disso, cada vez que vão à casa de banho quando estão com o período, todas as mulheres fazem todo um processo de tirar uma bolsa suspeita dentro da mala, colocarem-na discretamente debaixo do braço e depois andam em passo acelerado até à casa de banho, rezando para que ninguém, especialmente se for do sexo masculino, vos interpele durante todo este procedimento oculto. Este secretismo todo é um autêntico indício da disparidade que existe entre a condição da mulher e a condição do homem. Pode parecer que isto é mais um caso típico do “grito do Ipiranga” acerca dos direitos da mulher e da luta dos nossos direitos como tal, etc. Não. Isto é muito mais do que isso. Isto é um problema que nunca deveria ter sido tratado como isso mesmo: “problema”. As mulheres não deviam ser isoladas e minimizadas por “sofrerem” desta causa fisiológica. Faz parte de nós, é nosso e isso não deveria de ser um motivo de vergonha, mas sim de orgulho. Isso deveria ser visto como algo normal, e não como sinónimo de nojo.

Susana Santos


OPINIÃO

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Ao Rosto Vulgar dos Dias Política Habemus Governo! No dia 4 de Outubro, Portugal foi a votos e, após umas conturbadas semanas em que se ouviu falar de tudo (incluindo coligações à esquerda, vejamme só!), o Presidente da República fez o que tinha que ser feito e indigitou Passos Coelho como primeiro-ministro. Cavaco Silva, que tanto apelou a que a maioria votasse de forma a garantir uma maioria governativa (mas não uma maioria governativa qualquer), viu as suas voltas trocadas quando o país falhou em eleger maioritariamente a coligação. Ora, a acrescer a este problema, veio o rebelde do António Costa dizer que não compactuava com o programa de austeridade da PàF e, portanto, iria procurar acordo noutro lado. O que é que sobra? A terrível esquerda, que só de ser mencionada, faz logo descer uns quantos níveis no ‘rating’ financeiro de qualquer país, por mais estável que este seja.

“Ora, a acrescer a este problema, veio o rebelde do António Costa dizer que não compactuava com o programa de austeridade da PàF (...)” O que é que resta fazer quando aquilo de que o país precisa mesmo é de estabilidade? Dar posse a um governo minoritário, pois claro. A esquerda é que não! Pois bem, Cavaco Silva, que tanto apregoou a necessidade de estabilidade política num país ainda convalescente dos efeitos nefastos de um duro programa de austeridade, acabou de atirar para mais uns meses de instabilidade governativa. Mas fê-lo, como não poderia deixar de ser, em nome dos mercados. Um país no recobro não pode deitar a perder a sua recuperação por uma coisa tão banal quanto a democracia. Isto dos mercados pode deitar tudo a perder. E toda a gente sabe que qualquer mercado que se preze prefere uns bons meses de instabilidade política a um governo de esquerda. Mesmo se esses meses vierem a desembocar num governo de esquerda. Ao menos enganámo-los por um bocado...

© TVI24

Inês Linhares Dias *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


OPINIÃO

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Se Houver Tempo... Lifestyle O Porto está na moda “O Porto está definitivamente na moda”, dizem por aí. Eu concordo, por isso decidi falar da Invicta, que hoje em dia está de peito cheio e com razão. O Porto tem vindo a tornar-se numa cidade cada vez mais cosmopolita, por entre lojas de artigos vintage, mercearias gourmet, hotéis de charme e bares de cortar a respiração, esta cidade tem tudo a seu favor como destino para uma escapadela no fim-de-semana. Claro que os lisboetas, por exemplo, vão dizer que não faz sentido fugir da azáfama da capital para se dirigirem a outra cidade igualmente movimentada. De certa forma, compreendo este tipo de statement, no entanto o Porto tem agradáveis surpresas que fogem ao óbvio e já conhecido de Lisboa. Exemplo disso é O Base, uma esplanada que podia ser como qualquer outra que se vê em Lisboa. A novidade é o facto d’O Base dar a conhecer um espaço que nasce no meio de um jardim, com a Torre dos Clérigos como plano de fundo em HD, uma vez que fica mesmo ali ao lado. Esta pérola no seio da cidade traz consigo um lifestyle vision ao ser apologista de actividades saudáveis, oferecer escolhas naturais no dia-a-dia e utilizar a arte, música, imagens e arquitectura para a comunicação e divulgação do próprio espaço. Se eu não soubesse que o Base era um bar, eu diria que estávamos a falar de um indivíduo verdadeiramente erudito, que se encaixa perfeitamente com o ambiente que se vive e respira na cidade.

O Base oferece aos amantes das tapas, por exemplo eu, inúmeras opções para aconchegar a barriga. Quanto às opções mais decadentes, posso referir o cheesecake e para desenjoar do gin com isto, gin com aquilo, aventurem-se num Base Cool, um cocktail de alecrim, abacaxi e vodka. Afinal não só de vinho vive o Porto. Existem “n” espaços “in” que podem visitar, mas para aproveitar o Sol de Outono deixo-vos com esta sugestão. Por isso, se houver tempo... passem por lá.

© Joana Ferragolo

Joana ferragolo *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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Banco de Suplentes Desporto Um jovem prodígio em câmara lenta Portugal não tem muita história no motociclismo mundial. Miguel Oliveira prometeu, desde cedo, acabar com o oásis português no mundo do Moto GP. Com um percurso invejável nas principais categorias europeias de motociclismo jovem, o motociclista de Almada prometia ser uma das novas coqueluches da velocidade a duas rodas. O mundial de Moto GP dividese em 3 categorias: Moto 3 (categoria de iniciação), Moto 2 (preparação para a categoria principal) e Moto GP (a categoria rainha). Miguel entrou no Moto 3 em simultâneo com o seu maior rival dos campeonatos jovens, Maverick Viñales. Após quatro temporadas, Maverick já está a construir um percurso firme na categoria principal, enquanto Miguel tarda em confirmar o potencial que lhe é reconhecido. Apenas na próxima época chegará ao Moto 2, provavelmente sem conseguir o título de Moto 3 na presente temporada. Miguel está a 24 pontos de Danny Kent, o líder da classificação, quando falta apenas disputar uma prova. Após um desempenho irregular, Miguel tem estado muito bem na recta final da campeonato. Já somou 3 vitórias, destronou Ennea Bastiannini do segundo lugar da classificação e aproximou-se de Kent na luta pelo título. Tivesse “acordado” mais cedo e, possivelmente, sagrar-se-ia campeão de Moto 3. O que se tem passado com o percurso do jovem piloto? 1 – Falta de sorte em momentos importantes Miguel não teve a “estrelinha de campeão”. Em muitos momentos não foi bafejado pela sorte e isso tem prejudicado a sua evolução. Esta falta de sorte materializou-se no envolvimento em acidentes provocados por outros pilotos, em erros dos mecânicos em idas às boxes e até neutralizações de corrida em provas que lhe estavam a correr de feição. 2 – Lesões Em cinco épocas, já foi afastado de um número considerável de corridas devido a problemas físicos. As lesões têm impedido o português não só de fazer tantas corridas como os seus rivais, como também de fazer períodos longos de competição nos quais possa evoluir de forma regular. 3 – Vacilou em momentos de tensão Se os dois primeiros aspectos não são críticas directas ao seu comportamento em corrida, este terceiro aspecto toca em maus momentos de Miguel enquanto piloto. Quedas evitáveis, sobretudo em corridas com chuva, e algumas opções tácticas discutíveis têm prejudicado os seus resultados.

4 – Más opções de carreira Oliveira mudou-se para a equipa Mahindra, em 2013. Após duas épocas, é fácil apontar o dedo a esta escolha. No entanto, sempre pareceu que não era a melhor opção, essencialmente por nessa equipa ter uma moto pouco capaz. A própria equipa não era um exemplo de organização. A opção de ficar no Moto 3 em 2013 e 2014 (recusando convites para subir ao Moto 2) foi boa, na teoria. Na prática, acabou por ser um fracasso. Compreende-se a opção de continuar no Moto 3 e construir um percurso mais sólido mas fazê-lo na Mahindra não foi a melhor escolha. 5 – Desânimo com o insucesso Oliveira já mostrou ter garra e vontade de ser campeão no Moto 3 antes de subir para o Moto 2. No entanto, correndo o risco de estar a ser injusto, diria que algumas fases de resultados fracos foram causadas pela falta de motivação e alguma resignação perante a falta de qualidade da sua máquina. A grande qualidade em pista: Miguel tem-se mostrado um dos pilotos mais hábeis do campeonato. É fortíssimo em traçados sinuosos e com travagens fortes. Sabe calcular e atrasar muito bem o tempo de travagem e é um dos pilotos mais fortes na “guerra” directa. As ultrapassagens até à última curva estão no ADN de Miguel Oliveira, mais do que investidas fortes que permitam ganhar vantagens confortáveis em pista. As grandes qualidades humanas: Inteligência e humildade. Miguel quer construir o seu caminho com base em sucessos nas 3 categorias do Mundial. Não querer saltar etapas da sua evolução demonstra inteligência e, sobretudo, muita humildade perante convites tentadores em fases prematuras da sua carreira. Com uma moto mais capaz, Miguel mostrou que tem condições para ser protagonista (mais uma vez, alguns azares impediram o piloto de lutar pelo título de 2015 em melhores condições). Se conseguir melhorar alguns dos aspectos negativos apontados e se conseguir manter as qualidades como piloto e como homem, Miguel Oliveira sagrar-se-á campeão do Mundo de motociclismo. diogo oliveira

*Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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Cuida-te! Instituto de Ciências da Saúde

O regresso da época de frequências é sinónimo de stress para ti? Com o regresso da época de frequências/ exames volta também, para a maioria de nós, a ansiedade e o cansaço. Todos nós sabemos o que é stress e sentimo-lo em vários momentos da nossa vida. Segundo a OMS, stress é um conjunto de reações fisiológicas que preparam o organismo para a ação. A resposta de stress é automática e prepara o organismo para fazer face às possíveis exigências geradas pela nova situação. O objetivo é ajudar a enfrentar a nova situação, colocando à disposição do organismo recursos excecionais, que consistem basicamente num grande aumento do nível de ativação fisiológica e cognitiva. O corpo humano não possui a capacidade de distinção entre o stress diário, como estar atrasado para um encontro, e o stress mais grave, como ser ameaçado por um ladrão, reagindo assim da mesma maneira e desencadeando consequentemente a libertação de uma série de hormonas, entre as quais adrenalina, noradrenalina e hidrocortisona.

A resposta de stress é automática e prepara o organismo para fazer face às possíveis exigências geradas pela nova situação. Para um estudante, o stress pode ser positivo, pois faz com que o organismo fique em estado de alerta e, por conseguinte, permite que fiques focado nos teus objetivos, tenhas mais concentração e te sintas otimista face ao desafio que vais enfrentar. Este tipo de stress denomina-se de “ Eustresse”.

Por outro lado, existe o “Distresse”, ou seja, o efeito negativo do stress que, por exceder o limite da tolerância influencia negativamente o teu desempenho, faz com que os teus pensamentos fiquem confusos, tenhas sentimentos de medo e de pessimismo em relação ao futuro. A personalidade, a auto-estima, a saúde e o coping (lidar) são fatores que influenciam a predisposição das pessoas para o stress. Altos níveis de stress são prejudiciais ao nosso organismo e existem alguns sintomas que deves ter em atenção, tais como:

- Dores de cabeça; - Má digestão; - Dor de estômago; - Alteração da capacidade de memória; - Insónia; - Taquicardia (batimentos cardíacos elevados); - Irritabilidade - Perda de apetite; - Queda de cabelo; - Esgotamento físico.


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Cuida-te! Instituto de Ciências da Saúde

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É, por isso, importante encontrares estratégias para lidar com os problemas, por exemplo, redirecionar a atenção para outro acontecimento ou situação, ou seja, evitar pensar no problema que te está a causar ansiedade. Existem muitas formas de distração que podes utilizar no teu dia-a-dia, tais como:

Eis algumas estratégias que podem evitar o aumento do stress:

- Elaborar um horário de estudo; - Estabelecer prioridades; - Estabelecer objetivos; - Eliminar fontes de distração durante

- Prática de atividade física – Contribui para a tua saúde e para o teu corpo. - Distração social – Um simples lanche com os teus amigos ou familiares é uma forma de afastar da tua mente a frequência que se aproxima. Mas é imperativo que não seja “a frequência” o tema abordado durante o vosso encontro.

o estudo (TV, telemóvel, internet); - Evitar acumular trabalho.

Existem muitas mais estratégias que podes utilizar para reduzir o stress que é natural sentires na época de frequências. É importante que faças um reflexão para que percebas quais são as estratégias que mais se adequam a ti. Quando o stress é de tal forma elevado que prejudica seriamente o teu dia-a-dia, pode ser necessário aconselhamento médico. Por isso, não te esqueças: cuida-te! Sónia Araújo Revisão científica: Sr. Professor Doutor Paulo Seabra


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O Cabide Moda “Isto é uma Palhaçada!” Uma das questões que mais me colocam (e que mais me irrita) é porque é que os estilistas fazem roupa que não pode ser usada, ou seja, grandes peças de roupa que não são propícias ao uso no dia-a-dia. É verdade que o objectivo primário de um designer de moda é criar roupa para as pessoas usufruirem de um modo cómodo e sentirem-se bem. Mas acredito que a maioria (ou talvez não) das mentalidades já tenha evoluído e percebido que as roupas deixaram a sua praticalidade para passarem a ser produtos da mente criativa de um artista. Podem pensar que estou a ser ridícula por conceber sequer a ideia de que uma peça de roupa é equiparável a uma peça de arte do sentido estricto do termo. Mas eu é que tenho razão! E isto pode ser comprovado pelas colecções conceptuais, em que o criador pode dar azo à sua imaginação e criar coisas “inusáveis”. Este tipo de colecção baseia-se na materialização de um conceito ou de uma ideia através da roupa. A peça de roupa passa de um simples bocado de tecido para uma obra de arte. E o seu objectivo não é ser usado no dia-a-dia pelo comum mortal: as revistas utilizam-nas para fotografar editoriais, são expostas em exposições de moda e arte ou são vendidas a coleccionadores.

Foi um espectáculo brilhante! As modelos desfilaram com expressões fortes, a roçar o rude, as peças de roupa com a assinatura típica Rick Owens intercalavam os tons escuros e os tons claros, a justaposição entre os casacos de cabedal pesados com os vestidos de materiais leves mas estruturados, a música ao vivo, o espaço cru – tudo contribuiu para um desfile memorável com características subjectivamente assustadoras, mórbidas e distorcidas. Em entrevista à Vogue, o designer afirmou que o seu desfile pretendia celebrar a força das mulheres (não as mulheres fortes, note-se) através da união literal entre as mulheres. Rick Owens tinha como objectivo controlar a forma física do corpo, distorcendo-o de forma não-natural. As roupas deixaram de ser apenas roupas mas obras de arte intrinsecamente ligadas à sociedade e à cultura. Esta é a magia dos desfiles conceptuais: cada um pode interpretar da forma que entender.

A partir do momento em que a roupa se tornou uma criação artística, os desfiles deixaram de ser apenas para mostrar as peças e passaram a ser um espectáculo. Todos os elementos, desde a música, ao espaço, aos adereços são componentes que num todo tornam o desfile numa experiência sensorial. O grande exemplo desta temporada foi o desfile Spring 2016 Ready to Wear de Rick Owens, em que as modelos desfilaram atadas a outras modelos. O espectáculo provocou muitas reacções: as mais comuns basearam-se em qualquer coisa como “mas que disparate é este?” ou “isto é uma palhaçada!”.

© Vogue

Catarina Veloso o-cabide-moda.blogspot.pt *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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Fita Queimada Cinema Há Vida Em Marte Se há algo que me tem deixado frustrado com a maioria dos filmes de ficção-científica nos últimos anos – e com Ridley Scott em particular – é a falta de humanidade. Graças a Deus, “Perdido em Marte” resolve isso. Olhando para filmes como “Prometeus” ou “Interestelar”, parece-me evidente que existe uma preocupação maior em fazer do mundo onde as personagens habitam um mundo mais bonito/ convincente do que escrever as personagens.

As várias personagens não são brancas ou pretas, mas sim tonalidades de cinzento. As relações estabelecem-se entre as personagens pela forma como se dão, não porque nos dizem “X gosta de Y”, ou “W é uma fã de música K”, mas sim porque nos é mostrado, porque tiramos essas conclusões.

Estas existem apenas para ser veículos do enredo: duas ou três semblances de uma personalidade que por vezes sai do esboço apresentado em filme; uma cena ou outra com uma dose extra de emoção. Fora isto, habitualmente servem apenas para expôr ou ser expostos a informação, nada é mostrado, tudo nos é contado.

Não precisamos de ver Matt Damon dizer que está em sofrimento e com medo de morrer, basta olhar para a forma como se tenta focar em contar batatas, sabendo que o que o separa do vácuo é uma lona e fita adesiva. Não precisamos que alguém nos diga que ele é optimista e engenhoso, o filme mostra em cada ação, em cada abordagem que a personagem faz.

Como sentir, como reagir, como perceber. Matthew McConaughey é o melhor piloto da NASA dizem-nos em “Interestelar” portanto quando a situação é mais complicada, consegue sempre navegar para fora de perigo. Em “Prometeus”, Noomi Rapace é uma cientista talentosa que quer ter filhos, porque várias pessoas o repetem.

E não é a única personagem que o faz. Ao longo do filme a personalidade das personagens é-nos transmitida pelas suas reações, pelas suas ações, não porque uma “personagem”- ou uma inserção do escritor/realizador – nos dizem como a personagem é.

É dito, não é mostrado e aí está o problema. Estas são personagens orgânicas, são personagens escritas, portanto não me interessam tanto quanto o filme, como o enredo, ou até mesmo como a cinematografia. Graças a Deus, agora há vida em Marte.

Neste espaço não tenho tempo de mencionar todas as áreas em como este é um filme cheio de humanidade e não um ambiente estéril, como muita ficção e em especial ficção-científica, actualmente – irónico, pois considero a ficção científica o mais humano dos géneros – portanto deixo só a recomendação.

Não é um filme perfeito, longe disso, “Interestelar” e “Prometeus” são mais bonitos “Alien” e “Blade Runner” tem mundos mais bem construídos, mas fora “Alien” e talvez “Star Wars”, há poucos filmes em que vejo as personagens como pessoas reais, plausíveis – pessoas por quem quero torcer e que se tornam minha companhia e amigos durante o filme. “Perdido em Marte”, o novo filme de Ridley Scott é um triunfo neste aspecto.

“Perdido em Marte” é uma ode à adaptabilidade e ao engenho humano. Há várias coisas de erradas no filme, desde a falta de tensão em vários momentos, como uma certa falta de risco. Mas o que o filme faz bem – a caracterização de personagens - poucos filmes, este ano, fizeram melhor. Pedro Pereira *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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Inteligência Artificial Gaming/Internet Artes Transformativas Grande parte da arte, se não a arte como um todo, é na sua essência, transformativa, transitiva e única. A qualidade da qual quero falar neste caso em particular é a sua capacidade transformativa. A arte é transformativa, pelo menos, em duas frentes, como criação e como produto, isto é, ela apresenta-se como sendo maleável ao ser recriada por outro artista ou ao ser interpretada pelo apreciador. Ainda que prefira falar dos videojogos e o espaço que estes ocupam no mundo artístico com um tom afável, às vezes é necessário abordar tópicos particularmente desagradáveis. Este é o caso de hoje com a recente apresentação do TPP (Trans Pacific Partnership Agreement), um acordo de comércio apresentado entre 12 países que aborda uma variedade de políticas económicas principalmente relacionadas com a criação e manutenção dos direitos de diversas propriedades intelectuais. Este tratado no seu cerne visa a expansão e protecção das propriedades, excluindo os direitos básicos do consumidor. Obviamente que não é a primeira vez que este tipo de práticas ocorre, muitos que tenham qualquer tipo de interesse no comércio mundial actual ponderam-se lembrar de SOPA e o possível desastre que poderia ter sido. A fundação principal na qual se baseiam as preocupações dos consumidores é no facto deste acordo ter sido planificado na sua maior parte em segredo, atribuindo o nosso conhecimento actual a uma série de documentos publicados no website WikiLeaks. Um dos pontos centrais do acordo repousa nos conceitos de Copyright e as patentes.

Originalmente estes conceitos foram instituídos de forma a proteger as criações e os seus criadores, hoje em dia relacionam-se mais com a perpetuação de um sistema que protege os gigantes comerciais, denegrindo tanto artistas como consumidores. Um dos exemplos mais básicos incluídos no acordo é a instituição de patentes com uma maior duração, para quem se pergunta a si próprio como isto afecta o nosso dia-a-dia é só pensar no seguinte: a criação de medicamentos genéricos, consequentemente mais acessíveis, depende grandemente da duração das patentes da amostra original. Da mesma forma basta pensarmos na arte como foi mencionada no início, uma recriação, dando às empresas, distribuidoras e donos de patentes a habilidade de manter como reféns as diversas propriedades intelectuais, impossibilitando a criação de produtos artísticos como remixes, let’s plays, críticas e comentários; sem estar a infringir duma forma ou outra alguma lei presente no acordo. É inútil continuar a divagar, mas aconselho aos interessados a pesquisar e ler sobre o acordo para perceber como o futuro do “mercado livre” se encontra nas mãos de velhos vigaristas. O conhecimento é protecção, mantenham a arte livre e não uma escrava de pen-pushers. Juro que para a próxima falo de videojogos, prometo até! Mitchel Martins Molinos *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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Música nos Tempos que Soam Música “Olha lá, o gajo está só a mexer a boca, não está?” Decerto que já fizemos esta e outras perguntas ao ver um programa de televisão ou num concerto. Chama-se discrepância entre o que se ouve e vê. Ou, para o caso, playback. Este fenómeno é relativamente novo e acompanhou o avanço da tecnologia. Ainda assim, já nos anos 80, Carlão Paião dedicava-lhe uma música, que proponho desde já ser o mote desta viagem a um verdadeiro instrumento, que não é a expressão de quem o toca, mas a representação de quem o transporta. “Podes não saber cantar, nem sequer assobiar / Com certeza que não vais desafinar”. Aqui reside a principal função, e vantagem, deste instrumento: o carácter autodidacta. “Só precisas de acertar / Não tem nada que enganar / E, assim mesmo, sem cantar vais encantar”. No entanto, é necessária alguma destreza para não se falhar o alvo. “Em playback tu és alguém”. Proponho parar aqui, uma vez que se encontrou o Santo Graal da invenção. Se, por um lado, permite transmitir boa figura e, em alguns casos, garantir acesso ao topo, por outro lado, e talvez a vantagem que realcei não seja apenas aparente, altera o conceito de ‘música’. A arte passa a negócio, tornando-se um produto de consumo, muitas vezes passageiro. Entrar no mundo do espectáculo musical tornou-se assim muito mais fácil. A tecnologia dá aquela mãozinha preciosa, sob pena de perder lucro por uma má actuação.

“A arte passa a negócio, tornando-se um produto de consumo, muitas vezes passageiro. “

Lembramo-nos dos EUA. Grande exportador de verdadeiros produtos musicais, e pioneiro na área, tornou a música numa competição, onde a imagem transmitida, o tal “alguém” de Paião, para além das vendas de discos e da atribuição de prémios, é a essência de uma forma de expressão que se aproxima, cada vez mais, do desporto e da moda. A música como expressão honesta e verdadeira de quem a faz, servindo-a e não servindo-se dela, é talvez utópica, actualmente. Este torna-se assim um ponto incontornável. Mesmo para o negar. Por exemplo, os Disclosure afirmaram recentemente fazer tudo o que se ouve nos seus concertos face a alegadas acusações de playback. Quando compramos bilhetes para um concerto (incluindo os de DJs – ´press play and raise your hands´ é uma realidade) ou assistimos a uma actuação na televisão, queremos ouvir as músicas que conhecemos. Mas tocadas, ou melhor, (re)interpretadas como se o trabalho fosse (re)criado no momento. A música é performativa e a magia está no seu conteúdo e não (apenas) na forma como é apresentada. O carácter negocial é uma consequência natural do desenvolvimento económico da sociedade. Mas não deve sobrepor-se à arte. Para terminar, destaco as batalhas de lipsync (uma espécie de ´air singing´, semelhante ao ´air guitar´), que são talvez a consequência mais risonha do fenómeno, porque não denigre a música. Valha-nos isso ao menos. Sempre nos rimos um bocado no meio disto tudo, que espero que regresse eventualmente ao que era. Francisco Marcelino *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


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Literalmente Metafórica Literatura Não quero saber do “E viveram felizes para sempre” Ratos de biblioteca dizem que já não há nada novo na literatura: está tudo mais do que escrito. As histórias estão todas contadas, já ninguém consegue inventar nada: mudamos o nome das personagens, os locais onde decorre a acção, matamos um aqui e outro ali, casamos os outros e acabou-se! Existem, portanto, escreventes em vez de escritores. Podemos dizer o mesmo sobre o que está escrito há anos? Será que andamos a ler sempre as mesmas histórias e nem damos conta? Será que já não nos surpreendemos com nada? Nada disso: eu acho que é possível ler e admirar-me por, a determinada altura, não perceber aquilo que o destino – ou a mão do hábil escritor – reservou para uma personagem. Este mês, o meu objetivo é apenas um: insurgirme contra as histórias lineares, aquelas que nos deixam adivinhar os típicos “e viveram felizes para sempre” (agora podia dizer que não acredito nisso, mas não quero começar, neste segundo mês, a ferir susceptibilidades! Nós só queremos coisinhas bonitas e felizes, não é, estimado leitor?). Sei que, quanto ao que já está escrito não se pode fazer nada, mas será pedir muito que inovem um bocadinho, no futuro? Deixem o leitor ficar na expectativa, encolerizem-no a meio da leitura! Eu não quero sempre as mesmas lengalengas. Não preciso de Josés Rodrigues dos Santos a fazerem cópias ridículas do já suficientemente banal Dan Brown. Não quero Pedros Chagas Freitas sentimentalóides ou toda essa espécie de escritores de trazer por casa, que publicam livros todos os Natais! Se continuarem assim, limito-me a fazer boas viagens pelo passado: esses sim, sabiam o que estavam a fazer; inovaram e conquistaram o mundo com palavras. E fizeram-no usando as palavras certas!

“Deixem o leitor ficar na expectativa, encolerizem-no a meio da leitura!”

Posto isto, confesso que gosto de ler um bom romance. Mas romances sem a típica e escusada lamechice ao longo de todas as páginas. Eu não preciso de histórias que me conduzam direitinha à ideia final, logo após meia dúzia de capítulos – mas, se o fizerem, façam-no bem! Quero tramas que me troquem as voltas, que me façam suster a respiração por não saber o que vou encontrar a seguir. Que me zangue e tenha vontade de mudar o rumo da história com poderes que não tenho; mas, por favor, não me facilitem a vida! Deixem-me viver o que não é meu, deixem-me querer lá estar, deixem-me gritar um “Não!” quando a minha personagem favorita estiver prestes a fazer o maior disparate de sempre! Quero ler empregando o mesmo entusiasmo e surpresa com que descobri que a Bela Infanta do Garrett tinha no homem que tão triste história contava a melhor nova que podia esperar. Quero ter dúvidas sobre quem conquista definitivamente o coração de Fermina Daza: se o homem que García Márquez decidiu que havia de ser o seu marido ou aquele que iria ser, sempre, o grande amor da sua vida. Quero não conseguir adivinhar o destino que Camilo Castelo Branco pensou para Simão e Mariana. Quero chegar ao fim e sentir que, de facto, vivi por uns momentos uma outra realidade, cheia de contratempos e reviravoltas. A vida não é mais do que esta confusão constante, pois não? E um bom livro faz-nos viver. Sinceramente, pouco me importa um final concreto; não preciso de um puzzle perfeito. Não quero saber se fica tudo bem, não preciso de ter sempre respostas claras para o que acontece. Quero, no entanto, ficar com a ideia de que, de alguma forma, tudo fez sentido. Ao fim de umas quantas páginas, sejam elas sobre aquilo que forem, o que importa é que fiquemos com a sensação que o livro nos afectou “como um desastre”. Já Franz Kafka o dizia, e com toda a razão. Alexandra antunes *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


Texto Criativo

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Olhar de Prata Produção Escrita Sete Pecados Mortais O mote deste poema inicia-se na Bíblia Sagrada, em Romanos 3:23: “Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus;”

É a inveja de querer Pensar sem saber no que se quer Algo que no fundo não se queria. É a silenciosa dúvida Que se torna na certeza Do egoísmo permitido Gulosa é a vida Que suga o interior Do nosso íntimo Simbiose dos Fungos Alada ao orgulho ferido Que semeia a terra Entre joio e trigo É a avareza Desconexa das linhas Que unem as almas À vala comum É a preguiça de querer viver Tudo que sentiste, sentias e já não sentes. É somente querer, porque queremos que nos venha buscar O outro lado da vida.

Omar prata *Texto escrito com o Antigo Acordo Ortográfico


Agenda CULTURAl

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Exposição: Luís Filipe – A Farsa da Vida – Exposição que acompanha o percurso artístico do pintor modernista, incluindo caricaturas suas, por Almada Negreiros. Até 30 de Dezembro, na Galeria do Museu Bordalo Pinheiro (Campo Grande, Lisboa).

«While we pay for mistakes with no meaning All your gifts and all your peace is deceiving»

Teatro: E morreram felizes para sempre – Cruzamento entre a história de Pedro e Inês e a invenção da leucotomia. Até 14 de Novembro, de 4ª a 6ª, 21h30 / Sábado, 22h. Pavilhão 30 (H. Júlio de Matos) (Maiores 18 anos).

CAMINHOS (VISITA GUIADA): Fonte Luminosa – Sábados, 15h-17h, Al. D. Afonso Henriques (junto ao IST). Entrada livre.

Cripple Crow, Devendra Banhart

CONCERTOS: Unknown Mortal Orchestra – 13 Novembro, 21h, Armazém F (LX Factory) Bruno Nogueira e Manuela Azevedo – Deixem o Pimba em Paz – 5 e 19 de Novembro, 21h30, Teatro Tivoli BBVA.

As Escolhas do Pontivírgula Álbuns:

VÍDEOJOGOS:

“Daydream Nation”, Sonic Youth

“Disgaea 5”, PS4 “Dragon Quest Heroes”, PS4 e PS3 “Project Zero: Maiden of Black Water”, Wii U “Darkest Dungeon”, PC “Assassin’s Creed Syndicate”, PS4, XBox one, PC

“Sometimes I Sit and Think, and Sometimes I Just Sit”, Courtney Barnett “Wisdom of Crowns”, Wisdom of Crowns “Cripple Crow”, Devendra Banhart “Bass Communion II”, Bass Communion LIVROS: “Amor de Perdição”, Camilo Castelo Branco “A Relíquia”, Eça de Queiroz “Helena”, Machado de Assis “O Perfume: História de um assassino”, Patrick Süskind “O Velho e o Mar”, Ernest Hemingway FILMES: “[REC]” “O orfanato” “As Above, As Deep Below” “Jacob’s Ladder” “Alien”

© devendra banhart - cripple crow, Amazon


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