A segunda vida de Francisco de Assis (1987) Jaime Bertoluci*
Giovanni di Pietro di Bernardone, mais conhecido como São Francisco de Assis, um frade católico italiano do século XIII, passou à história como fundador da ordem religiosa que leva seu nome e como possuidor de muitas virtudes, sobretudo humildade, associada a uma opção intransigente pela pobreza (sua própria e alheia), e amor por todas as coisas do mundo natural, especialmente pelos animais. Essa imagem foi admirada e reafirmada ao longo dos séculos, recebendo elogios de pensadores e escritores de grande renome, como Hermann Hesse, Nobel de Literatura e romântico incorrigível, que está na base dos movimentos de contracultura dos anos 1960. Contudo, A segunda vida de Francisco de Assis, peça de teatro de José Saramago, mostra uma figura vaidosa — por vezes delirante — e autoritária, frequentemente agressiva e mal-intencionada, visão esta antecedida em algumas décadas pela análise penetrante de Aldous Huxley. Em seu relato imaginário e anacrônico da transmutação do santo em homem, Saramago não aborda a pretensa afinidade de Francisco com os animais, mas uma crítica, ainda que indireta, à verdade dessa afinidade já havia sido feita por seu conterrâneo igualmente brilhante e irônico, Eça de Queirós, em um conto (Frei Genebro) baseado na história da vida do “Poverello” — I Fioretti —, escrita por seus discípulos pouco após sua morte, ocorrida em 3 de outubro de 1226. Como se trata de um relato “histórico”, é razoável considerarmos igualmente verdadeiros tanto os fatos ali descritos que favorecem essa fama como os que a detratam. Palavras-chave: José Saramago. Teatro. A segunda vida Francisco de Assis.
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