Caderno de desenhos, Márcio de Lima Dantas

Page 1

caderno de desenhos mรกrcio de lima dantas

1

7faces

caderno-revista de poesia


2


3


Selo Letras in.verso e re.verso 7faces caderno-revista de poesia ISSN 2177 0794

Editor-chefe Pedro Fernandes de Oliveira Neto Catálogo Caderno de desenhos Márcio de Lima Dantas set7aces.blogspot.com Editoração e diagramação Pedro Fernandes de Oliveira Neto

Capa e contracapa © Márcio de Lima Dantas. Série Marcas de ferro. 2012 Caderno de desenhos © Márcio de Lima Dantas 2012.

4


caderno de desenhos

mรกrcio de lima dantas

5


6


Sumário série marcas de ferro

série Brasília

7

33

15


8


O poeta é também um desenhista Por Pedro Fernandes de O. Neto

Não faz muito tempo que saiu por aí desenhos de Elizabeth Bishop, Sylvia Plath e Carlos Drummond de Andrade. Todos os que escrevem tem um rápido interesse por todas as artes, porque cada qual, com suas possibilidades expressivas, oferece uma gama de possibilidades de reinventar a ordem das coisas. Todos os que escrevem tiveram ou têm, não raras vezes, oportunidades para um passatempo e ficam, era esse o caso de Drummond, a compor garatujas que podem, se for o caso, serem aperfeiçoadas e ganhar a delicadeza e o traço profissional, como é patente nos desenhos dos dois primeiros nomes citados. Não foi o caso, por exemplo, de Drummond. Mas, antes de ser passatempo convém pensar que o desenho deve ser a forma de expressão poética mais antiga do homem. Ainda quando sequer sabia fazer uso da linguagem como vimos aperfeiçoando nesse itinerário em que a espécie se constituiu sapiens e, logo, ainda quando nem imaginávamos o trabalho com a palavra escrita, mas já o espírito da poesia 9


habitava essas paragens, fazíamos caricaturas nas pedras, no corpo, como signos de registro ou de celebração. Isso serve para dizer duas coisas: primeiro, o desenho é também forma de arte e tem uma proximidade histórica muito própria e saudável com a poesia. A voz poética prima pela concisão e pela precisão, o desenho também. A concisão e a precisão primam pelo detalhe e tanto a poesia quanto o desenho também podem ser alinhados por ele. E fiquemos por aqui nessas semelhanças. Segundo é que Márcio de Lima Dantas, um dos nomes mais promissores da cena contemporânea da poesia potiguar, o autor de livros como Metáfrase, O sétimo livro de elegias, xerófilo e Para sair do dia, este aqui duas vezes premiado, o autor de trabalhos de fôlego em torno de João Cabral de Melo Neto e de Orides Fontela, ele mesmo, o poeta, decidiu apresentar seus desenhos em público. Publicado numa tiragem eletrônica, Caderno de desenhos, encartado no número 5 do caderno-revista 7faces, é mostra significativa dessa constatação, que não me foi espanto, descobri muito recentemente. São dois itinerários ensaiados por Márcio: um, “marcas de ferro” e outro, “Brasília”. Em ambos, ele reinventa ou inventa novas possibilidades. No primeiro, recupera o antigo sentido que tinha, para os sertanejos, e Ariano Suassuna terá composto à mão uma “cartilha” sobre isso, as marcas desenhadas em ferros e que eram utilizadas para tatuar os animais, denotando signo de posse sobre os bichos. O hábito foi 10


prática de mais de 4 mil anos e não será exagero afirmar se constituiu num potencial espaço para a tipografia moderna. Usados para marcar escravos e para imprimir textos em couro, num tempo em que papel era coisa do tipo. No sertão, por exemplo, cada família tinha seus próprios “ferros” e escolhiam lugares estratégicos nas cabras e bodes, ovelhas e carneiros, vacas e bois, para registrá-los como seus. Eram as orelhas, o dorso, a dianteira dos bichos marcadas num dia específico que juntava nas fazendas gente de todos os lugares próximos. Se aquilo não era nada agradável para os animais, era, para as pessoas, festa, divertimento. Alcancei ainda as ferragens e os ferros de marcar já atualizados com as inicias dos nomes dos proprietários em letras de forma, muito bem desenhadas. Influência certamente das novas formas de escrita, mas, sobretudo, porque muitos dos proprietários de animais ainda que não soubessem ler, conheciam as iniciais dos seus nomes. Agora, o princípio de tudo, num tempo em que, a grande maioria sequer reconhecia o desenho da letra, eram desenhos próprios imaginados que identificavam os donos dos bichos. Como esses desenhos eram sofisticados, já que o propósito era de que eles não fossem repetidos, provavelmente a redução das marcas se atribua ainda ao valor comercial que o couro sempre teve no comércio. É até esse tempo que Márcio volta, num gesto que é misto de memória, mas além de tudo, de reinvenção e vem 11


propor novas possibilidades representativas no rol de símbolos desenhados e muitos já esquecidos e perdidos no tempo. A simplicidade e, simultaneamente, a sofisticação dos traços recupera a dimensão infinita da própria linguagem pela sua capacidade de sempre se reinventar e, a partir de seus próprios corpos, propor novas maneiras de representação da realidade. As “marcas de ferro” têm uma textualidade poética não apenas pelo traçado rudimentar da forma desenhada, mas pela carga de sentidos aí implícita, capaz de, como na poesia, estabelecer um número quase que sem fim de leituras. O segundo itinerário nomeado pelo artista por “Brasília” refunda no papel o espaço concreto da cidade brasileira. Como já está desenhado no imaginário nacional o traço arredondado das formas geométricas pensadas por Oscar Niemeyer, Márcio aí insere para seu trabalho de espreita. Se as curvilíneas projetadas pelo arquiteto põe em suspense a ideia do pesado pela de uma construção que evoca a leveza, Márcio parece está tomado dessa expressão do monumento para propor um redesenho: a sublimação do leve. Prioriza as formas geométricas já arquitetadas e dispõe no papel uma cidade imaginada nos mais diferentes planos de visualização. Como o arquiteto, vê na forma semiarredondada um ideal até mesmo superior de leveza compondo aqui um perfil do viajante imaginário, tal como Kublai Khan no relato à Marco Polo nAs cidades invisíveis, de Ítalo Calvino. 12


Vê-se logo que os dois itinerários têm suas próprias formas, aproximando-se quando somos confrontados pela memória, pelo imaginário e pela síntese das representações, mas, logo, distanciando-se, seja na técnica seja no próprio traçado dos desenhos. Para a série “marcas de ferro” é o desenho livre, para a série “Brasília”, o artista prefere o traço preciso de um transferidor, todos, feito à mão com lápis. Como se fossem garatujas infantis, Márcio traduz o primitivismo como transvaloração radical da forma para o estabelecimento de uma possibilidade nova de representação; quer com isso repetir o gesto de poeta que ele é: propor um rompimento necessário na expressão a fim de refundar espaços; pela revisão, ansiar o novo, porque a mesmice e o marasmo são duas coisas caras à breve existência do homem.

Natal, julho de 2012.

13


14


© márcio de lima dantas. série marcas de ferro. 2012

15


16


17


18


19


20


21


22


23


24


25


26


27


28


29


30


31


32


© márcio de lima dantas. série brasília. 2012

33


34


35


36


37


38


39


40


41


42


43


44


45


46


47


48


49


Márcio de Lima Dantas é professor de literatura portuguesa do Departamento de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), ensaísta e tradutor. Traduziu para o francês, com o prof. Emmanuel Jaffelin, quatro livros da poeta Orides Fontela, organizados em dois tomos: Rosace. Paris: L’Harmattan, 1999 (Transposição e Helianto) e Trèfle: L’Harmattan, 1998 (Alba e Rosácea). Ganhou o prêmio Othoniel Menezes (2006), com o livro Para sair do dia, outorgado pela Capitania das Artes; foi contemplado com o I Prêmio Literário Canon de Poesia 2008. Reside em Natal. 50


51


7faces

Caderno-revista de poesia

Catálogo Caderno de desenhos Márcio de Lima Dantas Redação da 7faces revistasetefaces@ymail.com pedro.letras@yahoo.com.br

52


53


54


55


56 Selo Letras in.verso e re.verso


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.