Revista Mais Contexto (N.2, 2015.1)

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Número 2, 2015.1

CRÔNICA “VENCI O CÂNCER!”, por Saulo D’Annunciação ESPECIAL “QUANDO OUTROS VIVEM EM MIM”

MEIO AMBIENTE CRISE HIDRÍCA E NOVAS FONTES DE ENERGIA SUSTENTÁVEL

Máximo de 33 ca- Chamada 2 racteres


25-30

15-24

EXPANSÃO DO BAIRRO 13 DE JULHO

RÁDIO UFS E PROJETO ECONOAR

MENOS VIOLÊNCIA, MAIS EDUCAÇÃO

A FORÇA POLÍTICA NAS RÁDIOS DE SE

COMO FUNCIONA A ENERGIA EÓLICA?

PRÊMIO JORNALÍSTICO PARA ESTUDANTES

15-24

ENERGIAS LIMPAS VIRAM SOLUÇÃO

ENEM E ENADE SÃO DEMOCRÁTICOS?

4-7

BALANÇO DA GESTÃO MUNICIPAL DE ARACAJU

ENTREVISTA: SERGIPANOS NO RJ

CRESCE PRODUÇÃO ORGÂNICA EM SERGIPE

CAMPUS DE LAGARTO: SONHO INCOMPLETO

EDUCAÇÃO NO SISTEMA CARCERÁRIO DE SE

EMPREENDEDORISMO: NEGROS SÃO DESTAQUE

PERFIS

SUMÁRIO

31-36


MAINSTREAM: DISPUTA GLOBAL ENLATADA

ARACAJU E SUAS MEMÓRIAS

47-54

ENSAIO FOTOGRÁFICO

MANDIOCA: DA SUBSISTÊNCIA ÀS COZINHAS

ABUSO SEXUAL: IMPORTÂNCIA DO DEBATE

UM ABISMO PSICOLÓGICO E EMOCIONAL

BLOG OU YOUTUBE: QUAL VOCÊ PREFERE?

ESPECIAL: TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS EM SE

37-40

55-62

63-70


OPINIÃO VENCI O CÂNCER!

T

oquei o mamilo. Doeu. Pesquisei. Tolerei. Incomodou a virilha. Doeu. Persistiu. Pesquisei. Relacionei: mamilo testículo. Apareceu. Assustei. Auto examinei. Constatei. Entrei em pânico. Li. Reli. Li mais. Aguentei. Passou. Foi o único momento que tive medo. Comuniquei. Desacreditaram. Tentaram. Não me convenceram. Marquei o urologista. Sentei. Relatei. Escutei. Abaixei a bermuda. Ele apalpou o direito. Sentiu. Desconfiou de epididimite. Não garantiu. Receitou. Solicitou exames. Perguntei. Esclareceu. Aliviei. Tomei os remédios. Não passou. Fiz o exame. Esperei. Em casa, sozinho, à noite, meu e-mail sinalizou uma nova mensagem. Eram os resultados. Acusavam uns números na casa dos milhares quando deveriam ser menores que um. Não era epididimite. Era o CID 62, ou neoplasia maligna testicular, também conhecido como câncer de testículo. Contei. Não quiseram crer. Sozinho, no silêncio, chorei. Não por tristeza. Tampouco por alegria. Chorei o choro por sua própria essência. Voltei com os resultados ao urologista. Ele confirmou. Ultrassom, cirurgia, tomografia. Passaram gel. Gelou. No monitor, vi o câncer pela primeira vez. Uma mancha preta, maligna, agressiva, poluída e minha. Não tive medo dela. Vim pra Bahia – sempre a Bahia, como gosto daqui. Em Feira de Santana, minha cidade natal, estava eu nascendo pela segunda vez em minha vida. Outra consulta. Outra constatação. Marquei tomografia. Marquei cirurgia. Avaliei a prótese. Um jejum de 12 horas, sem comida nem água, um atendimento muito ruim, um termo de responsabilidade por possível e fatal reação adversa ao contraste, meu medo de agulha, uma veia calibrosa, uma injeção na bunda, uma sala fria, um contraste que entra queimando, rasgando, doendo, levando pra boca um gosto de cachaça e fel e a pior experiência de todo esse período. Fiquei o restante do dia sonolento. Cedo estava para fazer a cirurgia. Tenso, curioso. Queria saber como seria quando acordasse depois da anestesia. Se acordasse. Me chamaram. Entrei numa salinha. Tirei peça por peça. Vesti a roupinha leve e nua nas costas. Entreguei minha trouxa de roupas e meu tênis pra minha mãe. Queria acordar, mas não estava dormindo. Queria adiar, mas tinha que ser. Olhei Grace, olhei Vanessa e entrei. Arranjei um pretexto qualquer e voltei para vê-las de novo. Na sala de operação, me chamaram de volta. Entrei e assumi nervosismo. Conversei pra relaxar e todos da sala conseguiram me deixar assim. Veio a anestesia e nem senti a furada. Depois, nem as pernas. Só me lembro bem de quando, já finalizada a cirurgia, mandei pelo ar um beijo para minhas queridas, que me esperavam no corredor. Nesse beijo quis dizer: estou bem, deu tudo certo, amo vocês. Acordei já na enfermaria. Meu pai me mostrou o ovo direito. Ali vi o câncer pela segunda vez. Ele parecia uma linguiça toscana dentro de um vaso com água. Branco, venoso, encarcerado, meu, mas não mais. Contei a todos amigos que até então não sabiam. Recebi alta no dia seguinte e voltei pra casa. Recebi visitas nos dias seguintes e me senti querido. Busquei o resultado da tomografia e ele indicou uma linfonodomegalia

Saulo d’Annunciação Aluno de Jornalismo da UFS para-aórtica à direita. Na prática, isso queria dizer que uns linfonodos na altura do quadril ainda continham células defeituosas, provenientes do testículo afetado. Optamos então por fazer quimioterapia. A quimioterapia destrói as células de rápida multiplicação do corpo. Por isso a queda de cabelo, a baixa de imunidade, as anemias e outros danos colaterais, como a infertilidade por 2 ou 3 anos, um quadro que pode ser reversível ou não. Coleta de sêmen para congelamento é uma operação engraçada. Uma sala, uma poltrona, uma tevê, um pornô, um coletor e umas instruções. Ri daquilo, abaixei minhas calças e trabalhei dificultado pelo constrangimento e o de ejacular dentro do potinho. Não é essencial saber que foi a pior gozada de todas, mas fica aí o registro. Minha prole está guardada, caso eu permaneça estéril. Vanessa, como não?, é a exclusiva privilegiada para fazer uso desse líquido precioso. Comecei a químio numa segunda à tarde e terminei numa sexta de manhã. Foram quatro ciclos. Cada um deles durando 21 dias. Desses 21, os 5 primeiros eram de medicação intravenosa durante 4 horas. Os dias restantes eram um descanso pro corpo e pra mente, teoricamente. Apenas na teoria porque cansava demais. Fadiga, enjoos, falta de apetite, checagem de hemograma, queda de cabelo, injeção para estimular o aumento da imunidade, viagem pra Feira, volta pra Serrinha, alimentação especial e o calor do verão mais quente que me lembro começando a mostrar seu poder. Não obstante, pra compensar, fui muito bem tratado na Unacon - Unidade De Alta Complexidade Em Oncologia do primeiro ao último dia. Uns amores. Conheci muita gente boa, que, igual a mim, sabiam que estavam ali só de passagem. Compartilhei tudo o que pesquisei. Aprendi todos as músicas gospel dos repertórios recentes. Quando terminou, fui ao banheiro, me olhei no espelho, dentro de meus próprios olhos e cantarolei: “Warrior fighting for your soul...”, deMatisyahu. Engasguei do choro, mas na verdade sorri. Quando fiz os exames de sangue novamente, os marcadores estavam todos no seu devido lugar. A quimioterapia tinha cumprido a fama de ser eficiente nos casos de câncer de testículo. Fiquei muito contente por mim. Mas muito mais contente porque deixei um mundo inteiro de gente boa e torcedora feliz também. Em especial, minha mãe, cujo nome já conta tudo com tão-só 5 letras: (the) Grace (e não precisa dizer mais nada); aquela que vai ser mãe de meus filhos (e preste bem atenção no valor disso!), Vanessa; e o sujeito em quem me inspiro da careca à malícia, de como me vestir a como ser generoso:Rujani, meu pai. Uma lista enorme de pessoas que estiveram sempre de meu lado, contribuindo em cada detalhe. Ainda bem, meu Deus, que tratei de agradecer a cada uma transparecendo a maior sinceridade possível. Recebi alta nessa sexta-feira, 04 de dezembro. Estou curado e vou monitorar o bom prognóstico até 2020. Tenho fé que o mesmo Deus que me manteve até aqui, me manterá de pé por muito tempo porque quem é do bem não cai. Obrigado à vida pela oportunidade de crescimento. Venci! Hoje só tenho um testículo, mas nunca, prometo, nunca!, vai me faltar culhão.

O Fortalecimento do Jornalismo só depende de nós

Paulo Souza

O

Sindicato dos Jornalistas do Estado de Sergipe (SINDIJOR-SE), com nova direção atuante desde o setembro de 2013, introduziu suas atividades tendo seu objetivo de campanha sempre como alvo: otimizar as ações do Sindicato garantindo aos jornalistas diplomados um alicerce no desempenho de suas atividades em todo o tempo possível. Em um intervalo curto, praticamente no primeiro mês de atuação, o SINDIJOR conseguiu a realização de um sonho antigo da categoria: aquisição de sua sede própria.

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Presidente do Sindjor/SE

Desde então, o Sindicato vem crescendo com suas ações inovadoras, sempre em prol da melhoria da qualidade de trabalho dos jornalistas, articulando com ética e respeito junto à classe patronal, a fim de que as negociações, quer de reajuste salarial, quer de ganho em qualquer outro ponto nas atividades do profissional, sejam resolvidas da melhor forma possível. O SINDIJOR obteve êxito também no alcance dos planos médico e odontológico para os seus filiados, reajustes salariais acima da inflação, Número 2, 2015.1


OPINIÃO aprovação de artigo convencional que obriga as empresas de comunicação a veicularem e publicarem propaganda institucional do SINDIJOR em homenagem ao Dia do Jornalista, comemorado em 07 de abril.

Como ganhos em termos profissionalizante e acadêmico, o SINDIJOR realizou o Curso de Capacitação e Profissionalização para Repórteres Fotográficos e Cinematográficos e também o Curso Preparatório para Mestrado em Comunicação e Jornalismo, além de restabelecer o Prêmio Setransp de Jornalismo e criar o Prêmio Sincor de Jornalismo. Em 2016 mais um prêmio deverá ser lançado: o Prêmio OAB Direitos Humanos de Jornalismo, que já teve Resolução aprovada pelo Conselho Regional da OAB Sergipe. Além disso, a nova Diretoria vem trabalhando para valorizar o papel do estudante de Jornalismo. Como forma de reconhecer o trabalho dos acadêmicos e inseri-los nas discussões e debates de temas relacionados à nossa profissão, criamos o Departamento Estudantil e Acadêmico a fim de aproximar o SINDIJOR dos estudantes e vice-versa, permitindo, ainda, a sua pré-sindicalização. Também incluímos os estudantes nos Prêmios de Jornalismo. Por solicitação do Sindicato, os Prêmios Setransp e Sincor de Jornalismo agora contemplam a categoria Estudante. O SINDIJOR também vem dando sua contribuição para a aprovação da Proposta de Emenda a Constituição 206, a chamada PEC dos Jornalistas, já aprovada por maioria absoluta no Senado, restando apenas votação no plenário da Câmara Federal. Por iniciativa da entidade de classe dos jornalistas, senadores e deputados assinaram documento do SINDIJOR em que se comprometem a votar a favor da nossa PEC. No Senado, os senadores Antônio Carlos Valadares, autor da proposta, Eduardo Amorim e Maria do Carmo confirmaram o voto em prol dos jornalistas. A pressão agora é para que os nossos federais façam o mesmo que fizeram os nossos senadores.

Enquanto a votação da PEC não é concluída, continuamos combatendo o exercício ilegal da profissão, fiscalizando e autuando as empresas que desrespeitarem a Regulamentação e a Convenção Coletiva dos Jornalistas. Aliás, foi pensando nisso que no ano passado conseguimos aprovar em nossa Convenção um parágrafo que obriga as empresas a priorizarem a contratação apenas de jornalistas com nível superior na área, a fim de preservar o nosso espaço profissional. Outro avanço significativo foi o reconhecimento da nossa carga horária de 25 horas semanais na UFS e no IFS e a ampliação de vagas em seus recentes concursos para jornalista, sendo que na Ebserh/HU foi preciso acionar a Justiça para que a nossa carga horária fosse respeitada. Mais uma importante conquista foi a decisão unânime do Tribunal de Justiça que negou o pedido de uma “jornalista” precária para que o SINDIJOR reconhecesse tal registro e a indenizasse por esta ter sido demitida por não ser detentora de diploma de jornalista.

Além de ampliar a fiscalização, também temos solicitado do Governo do Estado concurso público para a Fundação Aperipê - composta pelas rádios AM e FM e TV Aperipê. Em recente reunião com o diretor-presidente Messias Carvalho, ficou acertada a criação de um grupo de trabalho para discutir entre outros pontos, a criação do tão sonhado concurso público. A expectativa é que até o final do próximo ano tenhamos a divulgação do edital, que deverá contemplar pelo menos 40 vagas para jornalistas em suas diversas funções. E para que possamos avançar ainda mais, é necessária a participação de todos, jornalistas e estudantes comprometidos com o fortalecimento de nossa profissão. O SINDIJOR, como entidade que representa os jornalistas e o Jornalismo, sozinho não fará muita coisa, mas com a participação da classe avançará e muito. Portanto, filie-se a sua entidade de classe e nos ajude a construir um sindicato mais forte e uma categoria cada vez mais respeitada.

Deputados cassados representam uma gota no oceano de acrobacias usuais para se manter no palco Joedson Telles

S

em querer extrair o mérito do Ministério Público e da Polícia Civil pelo serviço prestado à sociedade, nesta história de verba de subvenção x mandatos de deputados, e, óbvio, sem jogar confetes, já que apenas cumpriram a missão pela qual são bem remunerados pelo contribuinte, penso ser uma gota no oceano de acrobacias usuais para se manter no palco. Importante acossar meia dúzia de deputado que peca com verba de subvenção, ainda que a prova dos 9 esteja agora com o TSE. Todavia ingenuidade além da conta acender fogos, achando que a pátria está salva. N-a-o-~. Olhe o dedinho… Com muito otimismo, aplicou-se a primeira dose do antibiótico, que, quando faz efeito, em certos casos, só costuma vencer o microrganismo na dose cabo. Aos 44 do segundo tempo. Quando não nos descontos.

Supondo-se que todos os deputados cassados não consigam provar inocência em Brasília. Que o julgamento do TRE/SE seja mantido, e fique do episódio o rastro da desfaçatez. Ok? Alguém parou para pensar que – repito: em ninguém conseguindo provar inocência – o uso indevido da verba de subvenção jamais seria um caso isolado? Que usar dinheiro para se eleger, apesar de os deputados jurarem na cruz que isso é inverdade, só vale se for com verba de subvenção? Ninguém compra votos – direta ou indiretamente – com grana de outra origem? Que, agora, com o trabalho do MP e da PC não haverá mais compra de votos? Que quem for político, mas não estiver no foco da metralhadora do MP e PC é santo? Que a roda foi descoberta com estes deputados cassados? Santa ingenuidade. Mais uma vez o lugar comum: todo mundo é inocente até que se prove o contrário. Mas vale lembrar também: nem todos os políticos foram investigados. Ok? Outro lugar comum? Com a palavra Albano Franco: “aqui é pequeno. Todos se conhecem. Tudo se sabe”… Como dito, nada de tirar o mérito de ninguém, mas que o buraco é bem

Editor do site Universo Político

mais em baixo isso é. Conseguir um mandato, hoje, note-se, com raríssimas exceções, se tornou uma engenharia financeira dos diabos. Nem pense em colocar Deus nisso. Nunca como hoje a população entrou tanto no jogo do “toma lá dá cá”. Além do crescimento desta cultura asquerosa do “me ajude” a sufocar políticos – com ou sem mandatos –, outra cultura nociva à moralidade é observada facilmente: a troca do voto pela “ajudinha” saiu do varejo para o atacado. De uns anos para cá, é comum, e os políticos sabem disso, só “não têm jeito para dar”, o eleitor safado, corrupto, imoral e sem compromisso com o coletivo, coleciona a “ajudinha” do maior número possível de candidatos que topem entrar na desfaçatez, para manter ou conquistar um mandato. Evidente, o verme só tem um voto. Mas como voto não fala, ele fala pelo voto e promete votar em todos.

Ser político, hoje, é ser um homem ou uma mulher que vive sob pressão o tempo todo. Acorda ouvindo pedido e, quando consegue dormir, sonha precisando ajudar alguém para se manter vivo. E como tudo – ou quase tudo – significa dinheiro, haja caixa para atender a grande demanda. Agora pense nas borras: o político é pressionado para resolver com dinheiro problemas de várias pessoas, e se não o fizer – inclusive para não cometer crime eleitoral – o eleitor baterá outras portas até conseguir seu objetivo. Dá para você, leitor? Este é o cenário político de hoje. Mesmo com todo o esforço inegável das autoridades responsáveis para impedir a prática. Assim vivem os políticos: numa selva do salve-se quem puder com o ritmo ditado pelo eleitor corrupto. Quando o político é igualzinho, adeus moralidade. Ética. Projeto coletivo. Eis o mostro a ser batido somente quando agentes passivos e ativos passarem um longo tempo naquele lugar onde o sol jamais nasceu redondo.

P.S. O MP e a PC nem sonhavam com subvenção, o Universo já dava carona a um banner aconselhando o eleitor a não vender o voto. Trabalho de formiguinha, mas que legitima o juízo.

Texto publicado no site Universo Político e com reprodução autorizada pelo editor. Número 2, 2015.1

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OPINIÃO

+ Conteúdo, + Contexto, + Humanização Em sua segunda edição, após uma reformulação editorial e gráfica, a revista Mais Contexto traz um rico conteúdo pluritemático, dividida em diversas editorias, com abordagens aprofundadas dos assuntos para deixar você, leitor, ainda mais informado e com o olhar crítico apurado, pois Mais Contexto pretende revelar novas perspectivas do ponto de vista da informação. Às vésperas de um ano eleitoral, trazemos um balanço das ações realizadas, bem como dos problemas não solucionados, na saúde, educação, cultura, mobilidade urbana, segurança, infraestrutura e economia, pela atual administração da capital sergipana. Como manda o bom jornalismo, foi feita uma apuração minuciosa, que buscou ouvir todos os lados, embora nem sempre tenha sido atendida. Diante dos problemas ambientais enfrentados pelo país, um ganhou “voz” na mídia durante o ano 2015: a crise hídrica. Um regionalismo interessante, chamar de “crise” um fenômeno novo na região Sudeste do país, mas que há anos ocorre no Nordeste, cujo nome é “seca”. Além dos problemas de abastecimento, abriu-se a discussão sobre a necessidade de novas fontes energéticas, uma vez que a maior parte da energia produzida no país é proveniente das hidrelétricas, que precisam da água para movimentar suas turbinas.

Nossas reportagens também abrem espaço para temas delicados, tratando muito a vida do outro e os seus sofrimentos. Depressão. Assédio. Superação. E também uma reportagem especial sobre as expectativas, vivências e dificuldades para quem necessita de um transplante de órgãos em Sergipe. Como a revista dá a possibilidade de criação textual e visual, trazemos um ensaio fotográfico produzido pelo aluno de Fotojornalismo Yago Andrade, sobre a “Marcha do Empoderamento Crespo em Aracaju”. Um movimento estético e político de valorização do cabelo natural, contra o racismo e qualquer tipo de discriminação, especialmente no que diz respeito aos cabelos crespos. Para finalizar este editorial, deixamos aqui uma homenagem ao nosso colega de curso Saullo d´Anunciação, um colaborador importante para o projeto gráfico do jornal Contexto e da própria revista Mais Contexto ao longo de vários semestres. Saullo enfrentou um câncer e relata em um emocionante texto, publicado em seu perfil no Facebook e reproduzido nesta edição, toda a sua luta para vencer a doença. Um texto com caráter literário, humano e surpreendente. Boa leitura!

Cleydson Santos e Fernanda Sales

*A revista Mais Contexto surgiu com a proposta de complementar as ferramentas informativas desenvolvidas no Departamento de Comunicação Social (DCOS) da Universidade Federal de Sergipe. A publicação laboratorial foi criada para possibilitar aos alunos do curso de Jornalismo o exercício dos conhecimentos teóricos e técnicos no jornalismo de revista, integrando as disciplinas Laboratório em Jornalismo Impresso, Planejamento Visual e Fotojornalismo.

Expediente Universidade Federal de Sergipe Campus Prof. José Aloísio de Campos

Av. Marechal Rondon, s/n, São Cristóvão ­SE Reitor ­Prof. Dr. Angelo Roberto Antoniolli

Vice­Reitor ­Prof. Dr. André Maurício C. Souza

Pró­Reitor de Graduação ­Prof. Dr. Jonatas Silva Meneses Diretora do CECH ­Dra. Iara Maria Campelo Lima Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo Chefe do Departamento de Comunicação Social (DCOS): Prof. Dra. Raquel Marques Carriço Ferreira Núcleo de Jornalismo: Prof. Dra. Greice Schneider

Fone: 2105­6919/ 2105­6921 Email: dcos.ufs@gmail.com

Coordenação Editorial: Prof. Ma. Michele da Silva Tavares (DRT ­ 1195/SE) Coordenação Projeto Gráfico: Prof. Dr. Vitor Braga

Coordenação Fotojornalismo: Prof. Dra. Greice Schneider

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Reportagem: Cleydson Santos, Fernanda Sales, Rodrigo Alves, Jéssica França, Helena Sader, Camila Araújo, Daniela Barbosa, Daniel Damásio, Isadora Santos, Silvia Rodrigues, Eduardo Santos, Júnior Dias, Rafael Santos, Leilane Coelho, Miguel Carlos, Sara Madureira, Tatiana dos Santos, Josiane Mendonça, Elson Mota, Bruno Cavalcante, Kamille Perez, Carolina Leite, Demétrius Oliveira, Deyse Tuanne, Edson Romeiro, Wilmarques Santos, Elienai Conceição, Baruc Martins, Iargo Correia, Ana Lúcia, Maria Belfort, Cinthya Santos, Cristiane Santos, José Augusto, Maíra Silveira, Rayan Alves, Ediê Reis, Marielle Rocha, Jussara Gonçalves, Aliny Ayalla. Orientação Pedagógica: Suyene Correia (DRT - 923/SE; Mestranda PPGCOM/UFS) e Bárbara Nascimento (DRT - 1916/SE; Mestranda PPGCOM/ UFS). Gestão/editoria geral: Helena Sader e Íris Brito.

Projeto gráfico: Demétrius Oliveira e Luís Matheus.

Capa e artes: Hugo dos Santos, Ana Lúcia, Jennifer Cristina, Demétrius Oliveira e Luís Matheus.

Diagramação e preparação dos arquivos: Cleanderson dos Santos, Elienai Conceição, Ellen Cristina, Ícaro Novaes, Ítala Marquise, Leandro de Carvalho, Leilane Coelho, Lucivânia dos Santos, Maria Alves, Mirian Santos, Nathalia Gomes, Júnior Dias e Willmarques Santos. Edição de imagens: Yasmin de Freitas e Tais Cristina.

Revisão geral: Cleydson Santos, Fernanda Sales, Carolina Leite e Jéssica França. Ensaio Fotográfico: Yago Andrade

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No Rio de Janeiro, despontam estrelas de Sergipe OS ATORES LUANA ANDRADE E GABRIEL NASCIMENTO BUSCAM LUGAR AO SOL NA CAPITAL DA EFERVESCÊNCIA ARTÍSTICA E NA MAIOR PRODUTORA DE TELENOVELAS DO MUNDO Rodrigo Alves

jornalistaalvesrodrigo@gmail.com

Alex Yupuri

Uma amizade, um sonho em comum e muitos desafios a enfrentar, características que ditam a regra do jogo para os atores de Aracaju, Luana Andrade, 24 anos, e Gabriel Nascimento, 19 anos, no Rio de Janeiro. Luana já emplacou em seu currículo, participações em produções como a novela I Love Paraisópolis, programas como Fantástico, Caldeirão do Huck e The Voice Brasil e o que considera o maior feito em terras cariocas, o Especial de 50 anos da TV Globo, onde interpretou um dos personagens mais icônicos da teledramaturgia brasileira, a Perpétua da novela Tieta, originalmente interpretada pela atriz Joana Fomm, em 1989.

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Acervo pessoal

Já Gabriel, também em elenco de apoio, não para de trabalhar e já marcou presença na novela de João Emanuel Carneiro, A Regra do Jogo (atu-

almente em exibição), no humorístico Zorra Total, e também tem sido visto na nova novela das 7, Totalmente Demais. Mais próximos do

sonho de emplacar algum papel de destaque, os dois perseguem cami-

nhos de atores que, um dia fazendo figuração, conseguiram seu lugar ao sol como Juliana Paes, atual protagonista da novela em que Gabriel atua.

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Ricardo Stuckert\Domínio Público

ENTREVISTA


ENTREVISTA

+ CONTEXTO: Com quantos anos fez sua primeira apresentação teatral? Houve influência da escola?

L.A.:Olha! Por incrível que pareça, comecei tarde, na escola eu participava sempre das atividades artísticas, claro, mas dei início ao meu primeiro curso de teatro mesmo aos 17 anos, aos 19 anos entrei para o primeiro grupo de teatro e daí me envolvi cada vez mais. + CONTEXTO: Você escolheu ser atriz, e ainda há um certo preconceito com quem vive de arte. Houve rejeição por parte de sua família?

L.A.: Quando eu cheguei a comentar com meus pais que era isso que eu queria pra mim, eles vinham com aquela velha conversa de que isso não é nada sério, isso não dá dinheiro, isso não é uma profissão séria. Enfim, tenho certeza que não sou a primeira, muito menos serei a última a sofrer por isso, muitos colegas de profissão compartilham de histórias semelhantes a minha. Cheguei a cursar até o quarto período de nutrição, que é uma área que até me interessa, mas ficava com o coração dividido por estar me afastando de tudo que sonhei pra mim apenas para agradar a família, então, quando chegou o momento que tive que tomar uma decisão e devido a algumas oportu-

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Sem esquecer sua terra natal, Luana diz estar bem acolhida no Rio e tem planos de se especializar para no futuro atuar no cinema

nidades que surgiram pra mim, tive que trancar a faculdade, já que precisei mudar de cidade. Agora que já estou me estabilizando em meu novo endereço, penso até em transferir o

curso para cá e concluir aqui mesmo, não descarto essa possibilidade, conhecimento nunca é demais, embora me falte tempo para conciliar as duas áreas, mas o futuro a Deus pertence.

L.A.: Sinceramente, não enfrentei dificuldades, entrei no primeiro grupo de teatro, obtive uma incrível experiência com eles, era teatro de rua mesmo, na raça, no improviso, era cantar, dançar, tocar, de verdade! Não tem glamour não, é arte! Na rua não tinha essa coisa de efeitos não, os efeitos éramos nós, os atores; tínhamos um

diretor super exigente, não era pra pegar o papelzinho, decorar e cuspir não, tínhamos dever de casa, era pra saber mesmo do assunto, cada novo projeto, um novo aprendizado, absorvi o que pude. Hoje sei que isso não passa da obrigação de um ator. Depois passei para meu segundo grupo, viajei muito, aprendi bastante também, nos palcos e ruas afora.

+ CONTEXTO: Sua carreira começou em Sergipe, como foi este processo e a sensação de subir pela primeira vez no palco?

L.A.: Desde pequena tinha vontade de aprender, aos 17 anos comecei a pesquisar cursos na minha região e as opções não eram tantas, porém não eram zero como eu pensava. Comecei a fazer oficinas particulares e quanto mais me relacionava com pessoas do meio, mais ficava por dentro do que acontecia de bom. Desde então, aproveitava tudo que aparecia, muita coisa que o governo oferecia, nem precisa ter grana para aprender. Tem que se informar! Tem que pesquisar! Profissionalmente atuei em onze peças. Quando subi no palco pela primeira vez me senti em casa. + CONTEXTO: Houve dificuldades enfrentadas no teatro sergipano?

Dirigida por Boninho, Luana deu grande salto na sua carreira ao interpretar Perpétua, protagonista da novela Tieta, exibida no especial 50 anos da TV Globo

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Acervo pessoal

LUANA ANDRADE: Realmente é uma paixão desde a infância, lembro que brincava que estava fazendo uma cena de novela, filme, ou mesmo que estava no Faustão... Quem nunca? (risos). Embora tenha começado como brincadeira de criança, por um tempo até tentei seguir outros rumos, mas chegou um ponto da minha vida que vi que longe da minha arte era uma pessoa infeliz, eu tentei, mas é mais forte que eu. Hoje levo isso muito a sério, é minha profissão. Não é glamour, não é Faustão não gente, pra quem só quer ser famoso, chamem atenção de outra forma. Arte não é isso, e o reconhecimento vem devido a um trabalho bem feito, às vezes nem vem. Então trabalhem primeiro, é uma profissão, como outras, e na vida cada um escolhe a sua, ou é escolhido.

Acervo pessoal

+ CONTEXTO: De onde surge a paixão pelas artes cênicas?


ENTREVISTA

da

Além se

de tudo, respira arte

ainaqui.

+ CONTEXTO: No Especial de 50 Anos da TV Globo você interpretou a Perpétua, grande personagem da novela Tieta, produção icônica da teledramaturgia brasileira, e considera essa, a maior experiência de sua carreira até agora. Como aconteceu essa oportunidade? L.A.: Fiquei sabendo que estava rolando a pesquisa pra escalar os atores que representariam alguns personagens que marcaram a Rede Globo, então me joguei mesmo, fui atrás dos produtores, mas a pesquisa estava quase fechada. Como a Perpétua é bem mais velha que eu, foi difícil convencer os produtores de que eu daria conta, afinal, ninguém me conhecia, não conheciam meu trabalho, creio que consegui pela persistência. Foi grandioso representar um personagem que marcou tanto! Ser dirigida pelo Boninho foi uma experiência incrível. Me senti orgulhosa de mim mesma, afinal foi mérito meu, eu fui atrás, eu pedi, eu não deixava os produtores em paz, pedi mesmo pra fazer, e dizia “Me dá essa chance, se precisar faço teste. Eu dou conta, vou estudar, vou chegar pronta, podem confiar”. Disse que dava conta e dei mesmo! Foram dias e dias de ensaio, ganhei parceiros lá, recebi convites para outros trabalhos dos próprios colegas que fiz lá. O maior palco que já subi na vida foi o do Maracananzinho, lotado de artistas, funcionários e convidados da Rede Globo, era essa a plateia que estava lá pra assistir ao espetáculo do qual eu fazia parte. Foi muita emoção. A TV não mostrou quase nada do que foi o espetáculo, mas pra quem esNúmero 2, 2015.1

+ CONTEXTO: Você voltou a Sergipe recentemente e fez sua primeira protagonista no musical “A Bela Adormecida” no seu estado de origem. Após suas experiências no Rio, algo mudou com relação a sua maturidade na atuação?

L.A.: Com certeza, vim ao Rio pra estudar também, absorvo o que posso, creio que o ator não pode parar nunca, quero estudar pra sempre! Isso traz a maturidade na atuação. + CONTEXTO: E daqui pra frente, quais os próximos projetos?

L.A.: Estou me preparando para passar uma temporada nos EUA me especializando em interpretação pra cinema. Meu sonho é continuar sendo atriz, seja na TV, cinema, teatro. Quero aprender cada vez mais e me superar sempre.

duas. Com a música consigo interpretar e até ser um modelo melhor, pois no palco, um cantor tem que interpretar e fazer poses boas para passar o seu lado musical, além de tudo, vejo a música com muito mais durabilidade profissional para uma pessoa como eu que quero viver de arte pelo resto da vida. + CONTEXTO: No teatro você começou em Sergipe e participou dos Grupos Imbuaça, Raízes e fez 10 peças. Qual o momento mais marcante da carreira em seu estado?

Apaixonado por artes, Gabriel diz se inspirar em músicas no dia-a-dia

Para Gabriel Nascimento de Santana a arte começou aos 05 anos de idade quando brincava como cantor em cima do sofá de casa. + CONTEXTO: Você não é só ator, mas também modelo e cantor. O gosto pela arte nasceu na igreja, o que você fazia?

GABRIEL NASCIMENTO: Minha convivência na Igreja do meu bairro, Parque dos Faróis, influenciou muito, já que com apenas 08 anos de idade passei a fazer leituras nas

Acervo pessoal

L.A.:Amo minha terra natal, mas quero aprender cada vez mais, temos um mundo de possibilidades! Resolvi sair da zona de conforto, quero mais sempre! A princípio vim fazer um curso de curta duração no Rio, a cidade me recebeu tão bem, foram surgindo trabalhos, cursos, enfim... Acabei ficando e me apaixonei pelo Rio, que lugar lindo!

tava lá, quem sentiu como eu senti... Foi um trabalho incrível, todos os artistas participantes contribuíram para fazer dar tudo certo. Recebi elogios de colegas e equipe, isso não tem preço!

Acervo pessoal

+ CONTEXTO: O que te fez ir buscar outros horizontes na carreira de atriz no Rio de Janeiro em fevereiro deste ano? Como a cidade te recebeu?

missas, onde era exigido pelo meu pai que eu soubesse sempre o que estava lendo. Depois de varias leituras passei a me interessar por salmo nas missas, onde no começo não fui muito incentivado, porém, depois de alguns domingos a assembleia e o Padre da época já se entusiasmava comigo cantando . Fora da igreja eu gostava de cantar e imitar os cantores, Ana Colina, Ney Matogrosso, Madonna, Tim Maia, o sergipano Chico Queiroga e outros, sempre incentivado pelo meu pai que me fazia entender desde novo as letras das musicas. Destaco também que meu pai me levava aos Canarinhos de Aracaju, onde desenvolvi ainda mais o dom de interpretação e o gosto por instrumentos. Hoje toco flauta, lira, violino e teclado. + CONTEXTO: Qual caminho artístico mais te motiva?

G.N.: Das três modalidades, música, moda e artes cênicas, acho que a mais fascinante é a música, porque acho que com ela, consigo desprender das outras

G.N.: A cada apresentação há uma sensação diferente. Mas o que mais marcou foi o Musical As Mulheres de Holanda do Grupo Raízes, por ser uma peça em que interpretei um dos papeis principais, e também pelo número recorde de pessoas que assistiram lotando por 03 vezes o Teatro Tobias Barreto. Só acho que a cena deve melhorar, pois o teatro sergipano passa por dificuldades, falta um maior incentivo ao teatro em geral e seus artistas. + CONTEXTO: O que te fez ir buscar outros horizontes na carreira artística no Rio de Janeiro e em São Paulo? Quais dificuldades tem enfrentado?

G.N.: O reconhecimento e também a satisfação financeira, quero poder viver de arte, o que infelizmente em nosso estado é um pouco mais difícil. Santo de casa não faz milagre. Tive que me mudar principalmente pela falta de incentivo em Sergipe e por causa da falta de locais de trabalho em nosso estado, que, às vezes, abre as portas para os de fora e esquece os de casa. A recepção no sudeste é boa, porém, se torna um caldeirão, onde existem muitos na mesma procura que eu, a batalha é grande. Acho que Sergipe deveria honrar seus bons artistas e divulgá-­los ao mundo, assim como a Bahia faz. + CONTEXTO: Daqui pra frente quais seus objetivos?

G.N.: Meu objetivo, como já disse, é ser reconhecido não por simples vaidade, mas por saber que posso através deste reconhecimento dar alegria a um publico e também viver deste ofício que amo. Quero também representar meu estado nas mídias do sul e sudeste. Meu maior sonho, sem dúvidas, está na área musical.

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PERFIL

Não podemos deixar o samba morrer Helena Sader

Há quase vinte anos, dona Nadir encontrou inspiração – que, sinceramente, não deve ter sido muito difícil – para dar origem ao “Reisado da Nadir”. Um grupo que reúne garotas de todas as idades e um menininho, a fim de perpassar ao longo de gerações a cultura do samba de pareia, um dos tipos do samba de coco, que é de fundamental importância e relevância na história da cultura de Sergipe.

Praticante do samba de pareia desde os dez anos, dona Na-

Por onde passa, dona Nadir faz barulho e deixa seu rastro de cultura. Em Sergipe, não satisfeita em realizar seus trabalhos apenas na região da Mussuca, a senhorinha boa de samba também faz questão de e sua sabedoria além das terras de Laranjeiras. Atualmente, existem oficinas de samba de pareia que, em Aracaju, acontecem no Museu da Gente Sergipana. O nome do local já diz muito sobre as performances de dona Nadir. E, pra ela, realmente não há tempo ruim para a sergipanidade. “Eu ensino

Helena Sader

dir herdou de seu pai, seu José Paulino dos Santos – que também exercia prática da cultura – a paixão pelo folclore. “Mesmo com tanto tempo de meu pai morto, eu não paro de brincar e passar cultura pra filhos, netos e quem queira aprender”, diz. Crescendo em um ambiente que respira cultura, dona Nadir se viu com uma missão muito clara: transmitir para gerações futuras o samba de pareia. Ou melhor: “não deixar o samba morrer”. Frase que não é de sua autoria, mas que é bastante replicada por dona Nadir, já que é o verdadeiro sentimento que se tem.

Sambistas do grupo de Dona Nadir

pra criança, adulto, todo mundo. Basta querer aprender”, fala.

Em entrevista, Marcelo Rangel, diretor de programas e projetos do Instituto Banese - que promove as oficinas - falou sobre a importância do samba de pareia divulgado por dona Nadir. “A gente não pode valorizar aquilo que a gente não conhece. Então, isso foi uma forma que a gente encontrou de aproximar essa cultura, para que as pessoas conheçam um pouco mais as tradições de Sergipe. Dentro

da cultura, o que eles fazem é um trabalho importante e que merece destaque e valorização”, falou.

A tradição do samba de pareia marca, não só a cultura do sergipano, mas relembra todo o processo histórico de formação da manifestação, que tem sua origem africana. Dona Nadir não esconde o orgulho dos ascendentes negros e de ser um dos símbolos da permanência do movimento no estado. E, com população predominantemente negra, a terra do samba de pareia, a Mussuca, não para nunca. Não enquanto depender de dona Nadir.

Helena Sader

R

oupas coloridas, tamanquinhos de madeira, garganta afiada, sorriso sempre no rosto e muita disposição. Quase setenta anos, mãe de dez filhos e avó de quase trinta. São duas sentenças que resumem de forma ainda muito superficial uma figura única: dona Nadir. Moradora do povoado da Mussuca, nos interiores do município de Laranjeiras, no estado de Sergipe. Dona Nadir, como é carinhosamente chamada pelos que a rodeiam, tem cumprido com maestria uma função importante no estado: a de manter viva a cultura do povo sergipano.

helena.sader@hotmail.com

No mundo em que vivemos hoje é muito fácil esquecer quaisquer coisas. Os avanços da tecnologia têm tornado os acontecimentos cada vez mais efêmeros. Diversas manifestações culturais têm se perdido pelo dinheiro, pela ganância, talvez até pela pressa. Mas enquanto houver senhorinhas como a dona Nadir, podemos acreditar que nossas raízes estarão muito bem preservadas.

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“A tradição não pode ter fim. Não podemos deixar o samba morrer”. Não sou eu quem está dizendo. É uma pessoa que já dedica anos de sua vida à paixão, à cultura e ao respeito ao passado. Então, um grande salve à dona Nadir! E, não, não deixaremos o samba morrer. Número 2, 2015.1


PERFIL

Ruth Carmo e as histórias que ninguém lê Jéssica França

jessicaf.1@hotmail.com

“S

Sua casa desconfigura a paisagem da Passarela do Caranguejo, tão movimentada e recheada de estabelecimentos comerciais. É uma das poucas moradias que estão presentes naquele lugar tão disputado por empresários que visam explorar o turismo de um dos locais mais frequentados da cidade. Dona Ruth é resistência à beira mar.

Um de seus vizinhos é dono de uma pequena mercearia na rua perpendicular à direita. Ele interrompe seu trabalho para me explicar onde fica a casa de Ruth. “É ali mesmo onde você passou”, indica com a cabeça e o braço. Olha para a esposa, sentada numa cadeira de ferro em frente e solta: “Ela está procurando aquela velha doida”, adjetiviza. Uma das primeiras coisas que Ruth diz quando abre o portão de sua casa e me oferece uma poltrona na sala, é que só se dá bem com gente muito inteligente ou muito pouco instruída. “Gente mediana não me entende e acha que sou louca”, explica com um riso no canto dos lábios, sem imaginar o que ouvi de seu vizinho. Eu, ali, fico me perguntando em qual das três categorias estou inclusa.

O riso ­meio preso, meio solto ­é expressado algumas vezes durante aquele dia quente de primavera. Com muita história para contar e poucos ouvidos para ouvir, Ruth aproveita a breve estadia de alguém que a escute. Ouço histórias tristes, amenas e chocantes. Ouço sobre o desenvolvimento de uma doença psicológica e exposta na pele como algo bom ­ algo que ajudou a prevenir um abuso. Ouço sobre como uma menina de sete Número 2, 2015.1

Jéssica França

into falta da cultura dele”, diz, relembrando o ex-­marido falecido há sete anos. Não estavam juntos em sua morte: a ausência se fez presente por consequência de uma separação nada amigável. Viúva e morando sozinha na beira da praia da Atalaia Velha, Ruth Carmo passa a maior parte de seu tempo mergulhada, não na água, mas no mar de conhecimento que os livros têm a lhe oferecer.

“Gente mediana não me entende e acha que sou louca”

anos já se interessava por assunto de “gente grande” e aprendia a se livrar de pessoas mal intencionadas. Ouço sobre uma infância com uma mãe criada em lar rico que aprendeu a ser amada, mas muito pouco a amar. Ouço sobre um amor pela leitura que ao longo de cerca de 60 anos só cresceu e se multiplicou em formato de uma estante repleta de bibliografias e uma mente repleta de ideias. Ruth Carmo estuda cerca de oito horas por dia. Autodidata, aprende grego e hebraico apenas com os ensinamentos dos livros que compra pelas livrarias em que passa. Judia de nascimento, navega pela história de seu povo e conhece a fundo os detalhes. “Sou judia e cristã”, ressalta. A mãe foi deserdada pelo pai. Judeu, não aceitou a conversão da filha ao cristianismo. Hoje, a neta Ruth é leitora assídua da Torá – os cinco livros que formam o texto central do judaísmo – e da Bíblia Sagrada. Esta última, inclusive, está reescrevendo pela terceira vez à mão. “É por causa da LER”, explica. A sigla é alusiva à conhecida “Lesão por Esforço Repetitivo”, uma inflamação causada por movimentos locais reiterados ou posturas forçadas. Mas a doença é apenas uma desculpa para descobrir as minúncias que se escondem nas entrelinhas do sagrado livro cristão. Ruth vive mesmo para aprender. Técnica em nutrição, seu conhecimento vai muito além. Ela gosta de estudar temas como ge-

nética e religião. Além disso, aprecia escrever o que aprende. Prova disso, são os 23 livros que tem guardado em seu computador. ­Não publiquei nenhum – diz.

Por que? – questiono. ­ Não preciso ter meu nome publicado por aí, além disso, eu sempre aprendo um pouco mais e sempre volto e modifico aquele livro que eu achava que já tinha terminado. Estão todos inacabados. – justifica. Apesar de ter tanta história para contar, a jovem senhora não gosta de ser reconhecida. Quase todo ano, em parceria com centros ou igrejas, realiza jantares de natais para pessoas carentes. “Não tenho uma foto sequer. As outras pessoas é que tiram, mas eu não tenho nenhuma.”, diz pensativa.

Depois de algumas horas de conversa peço água. Ruth volta com um copo e um livro. Este havia sido escrito para um amigo. Impresso e encadernado de maneira simples, o material estava repleto de amor fraternal. Na introdução, Ruth falava a seu amigo o quanto era grata por poder passar horas a fio conversando com ele.

Um outro livro está sendo escrito por Ruth: ele fala sobre mulheres que fizeram a diferença em tempos em que apenas homens podiam se destacar. Os primeiros relatos são dados históricos sobre Hipátia de Alexandria, a

primeira mulher documentada como matemática. Era professora de filosofia e astronomia, além de chefe da escola platônica. Os escritos seguem falando sobre importantes mulheres ­ talvez pouco conhecidas pelo grande público, e chegam em Débora, que profetisa e quarta juíza de Israel ­- a única citada na Bíblia com tal cargo. Hipatia foi morta por cristãos, depois de ser acusada de intensificar um conflito entre um governador e um bispo em Alexandria. Já Débora, ajudou a liderar os israelitas contra o domínio de Canaã. Ruth é mãe de duas mulheres, de 32 e 29 anos. Ambas alçaram voo, mas ela pouco expressa as escaladas das filhas. Na estante de livros, é possível ver fotografias antigas de uma mulher e suas duas crias na infância e na juventude. Nenhuma recente.

Arrodeada pelo comércio e quase sem vizinhos, Ruth nem pensa em sair dali. Propostas não faltam. Segundo ela, os donos do hotel ao lado já lhe ofereceram imóveis em outros locais para que o estabelecimento fosse ampliado.

Mas, de frente para o mar, gosta de ver as estrelas à noite e observar as mudanças de fases da lua. “Ontem mesmo ela estava linda, enorme”, disse com os olhos fitos na janela. Para viajar, Ruth não precisa sair de casa, basta ir até a estante de madeira na sala e procurar um de seus livros ou ligar o computador para pesquisar. Mas agora, pensionista e sem preocupações com a criação das filhas, pretende conhecer Israel pessoalmente. Do Brasil, seus olhos já conhecem uma pequena porção: nasceu em Salinas, uma cidadezinha de Minas Gerais, mudou­-se para Brasília, onde conheceu o ex­-marido, e então para Sergipe, sua terra firme desde 1994. Em alto mar, Ruth vive desde que aprendeu a embarcar nos livros e se deixar capitanear pelas palavras. Esse navio do conhecimento, às vezes a leva às fronteiras dos julgamentos alheios. Mas, no fim, quem delimita o que é realidade e o que é ficção?

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POLÍTICA

Às vésperas do ano eleitoral, balanço da gestão municip

EQUIPE DA MAIS CONTEXTO FAZ BALANÇO DOS 75% DA ADMINISTRAÇÃO DO PREFEITO JOÃ NOS SETORES DA EDUCAÇÃO, ECONOMIA, MOBILIDADE URBANA, SEGURANÇA E PONTOS MU

À

s vésperas do último ano de mandato da atual gestão municipal, a população já pode fazer um balanço mais consistente das promessas da última campanha que foram efetivadas pela administração de Aracaju. Os eleitores que decidirão o pleito municipal no próximo ano, devem observar o que foi realizado, as ações

Mobilidade Urbana

que estão em andamento e os projetos que (ainda) não foram possíveis de realizar. A equipe de reportagem da Revista Mais Contexto apurou uma série de informações que possibilitaram apresentar um panorama da atual gestão nos diversos segmentos: ­ saúde, educação, cultura, transporte e trânsito, segurança, infraestrutura e economia. Resgatamos,

Mobilidade urbana nada mais é que o efeito de uma junção de políticas de transporte e circulação que proporciona o acesso amplo e igualitário ao espaço urbano, através da escolha prioritária do uso de transporte coletivo e de veículos socialmente inclusivos e ecologicamente sustentáveis, como a bicicleta. A capital sergipana apresenta inúmeras dificuldades quando falamos nesse assunto: algumas promessas se encontram em andamento, outras já foram executadas e muitas outras precisam sair do papel para que seja possível trazer uma maior comodidade para a população aracajuana.

Políticas de transporte Uma das maiores apostas da campanha do prefeito João Alves foi solucionar esses problemas com a proposta de implantação do Bus Rapid Transit (BRT), que tem a intenção de minimizar os transtornos do transporte público na capital, a exemplo da superlotação dos ônibus e terminais, os constantes atrasos, a insegurança e o congestionamento. De acordo com o Programa BRT Brasil, que acompanha e monitora os BRTs em fase de implantação ou funcionamento do país, atualmente há 14 cidades envolvidas com essa proposta de transporte. No entanto, apenas São Paulo, Rio de Janeiro e Uberlândia implantaram total ou parcialmente esse projeto. As demais encontram­-se em fase de implantação ou de elaboração. Após três anos de mandato, o projeto ficou pronto e, de acordo com a Superintendência Municipal de Transporte e Trânsito (SMTT), as obras para a implantação do BRT terão início em 2016. No entanto, surgem muitos questionamentos a respeito desse sistema, já que outros problemas ficam estagnados dependendo de uma efetivação do projeto. Um exemplo disso é outra proposta feita durante a campanha: a reforma de todos os terminais da capital. De acordo com o superintendente em exercício da SMTT, Francisco Manoeu Navarro, o não cumprimento desta promessa deve­-se ao

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então, algumas promessas de campanha das eleições municipais realizadas em 2012, pelo então candidato João Alves Filho (DEM), ao cargo de Prefeito de Aracaju. Antes da disputa eleitoral, todo candidato precisa apresentar um Plano de Governo ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE) e registrá-­l o em cartório. Logo no inicio da redação

do Plano do então candidato João Alves, identifica­- se uma preocupação com a elaboração de um “urgente Plano Estratégico de Desenvolvimento Urbano”. Sugere­- se, então, a necessidade de replanejar a estrutura urbanística de Aracaju, considerando seu crescimento populacional. Segundo o documento, o último Plano foi realizado há 40 anos (por coin-

fato de que, para a implantação do BRT, serão substituídos os atuais terminais por novos locais de integração, que farão a ligação do novo sistema com o atual. Havia também a promessa de construir abrigos de ônibus, sendo que até o momento foram instalados/substituídos 240. De acordo com a SMTT, a capital atualmente possui 1.030 pontos, dos quais 750 podem receber a estrutura. Para atender aos 500 abrigos restantes existe uma licitação em andamento, ainda sem um prazo de conclusão definido. As regiões que mais sofrem com os problemas de mobilidade são as periféricas. Além de aguardar o transporte exposto ao sol ou à chuva, a população tem que esperar a condução que chega atrasada, lotada e oferece péssima condição estrutural. Outro ponto muito importante é a licitação do transporte público intermunicipal, que engloba quatro cidades do entorno de Aracaju. Ela visa a melhoria da qualidade do transporte e uma redução nos lucros das empresas. Segundo o superintendente da SMTT, esta etapa foi concluída e agora aguarda a liberação do Governo do Estado, pois trata­-se de uma junção de municípios. Quando questionado sobre a demora de execução da promessa, o superintendente informou que “o projeto existente só abrangia a capital e era preciso ser refeito e englobar São Cristóvão, Nossa Senhora do Socorro e Barra dos Coqueiros, que fazem parte do acordo, para evitar o aumento da tarifa para essas localidades”. Veículos inclusivos e sustentáveis Há menos de dois anos foi criada uma parceria entre a Prefeitura Municipal e uma empresa privada que resultou no lançamento do Caju Bike, projeto que incentiva o uso de bicicletas e visa amenizar os impactos ambientais de forma sustentável. Em 2014, Aracaju foi eleita a segunda cidade com maior faixa de ciclovia no Brasil. A fim de nos certificar do merecimento desse título, a nossa equipe saiu às ruas e entrevistou algumas pessoas que dependem da bicicleta para se locomover na cidade e as respostas não foram as melhores. “Trabalho e vou à faculdade todos os dias de ‘bike’ e me deparo com as péssimas condições estruturais delas. Falta de manutenção é um ponto forte, mas nosso maior problema é a falta de continuidade da faixas. Sem falar que elas só existem em algumas das principais avenidas da zona sul da cidade”, desabafa Márcia Rita. Em relação ao tema das ciclovias, a SMTT diz que existe constante manutenção e os problemas são pontuais e que existem projetos que visam aumentar essas vias para o incentivo ao uso dos transportes alternativos. Número 2, 2015.1


POLÍTICA

pal de Aracaju é essencial para avaliação dos eleitores

ÃO ALVES FILHO. CONHEÇA OS PONTOS QUE EVOLUÍRAM OU SEGUEM COM PROBLEMAS UITO FRISADOS PELO ENTÃO CANDIDATO. Camilla Araújo

milla_umacancao@hotmail.com cidência, foi executado durante a gestão do próprio João Alves Filho, enquanto prefeito biônico ­ indicado pela Ditadura Militar). No entanto, ao observar as propostas do então candidato, percebe­s e que nem todas as pastas da administração foram contempladas no Programa de Governo, pelo menos

Segurança Pública

de forma clara e objetiva. Uma alternativa para nossa empreitada foi procurar nos veículos de comunicação todas as entrevistas dadas pelo candidato para conseguir fazer um levantamento do que ele havia se comprometido a realizar em seu governo. Selecionamos para nossa lista as secretarias que registraram mais

De acordo com a Constituição Brasileira, garantir a segurança do cidadão é responsabilidade do Estado. Ainda assim, cada município deve colaborar através do planejamento urbano e de ações estruturais e sociais para evitar a violência. Em Aracaju, a Guarda Municipal é o órgão responsável por proteger os bens, serviços e instalações do município. Durante a campanha eleitoral, João Alves propôs melhorar as condições de trabalho e de capacitação da Guarda Municipal. Para a secretária de Defesa Social, Georlize Teles, apesar de ainda não ter atingido um padrão ideal, a segurança na cidade aumentou muito. Para a secretária, o principal investimento ocorreu na formação dos profissionais. “Hoje nós temos um dos melhores centros de treinamento do Nordeste, criamos o ticket alimentação e realizamos todas as promoções pendentes com o pagamento dos retroativos”, comemora. Além disso, ela afirma que foram compradas bicicletas, carros, 100 armas de choque não letais e 500 coletes balísticos, sendo todos sob medida. O presidente do Sindicato dos Guardas Municipais de Aracaju (SigNúmero 2, 2015.1

Daniela Barbosa

danielabarbosareis@hotmail.com

propostas: Saúde, Educação, Economia, Segurança Pública e Mobilidade Urbana, pontos muito citados por João Alves Filho em debates e entrevistas. Com o intuito de traçar um diagnóstico das ações realizadas e dos projetos em andamento, conversamos com secretários e alguns representantes de sindicatos. Apresen-

tamos indicadores que avaliam em qual situação se encontram as propostas: as pastas grifadas em verde indicam que as ações estão praticamente todas realizadas; em amarelo, aquelas que ainda não conseguiram avançar com êxito; e, vermelha, as pastas que não conseguiram realizar o mínimo das promessas feitas.

ma), José Ricardo Silva, confirmou os avanços na valorização das atividades da categoria. “As potencialidades da guarda estão sendo mais exploradas e estamos mais presentes nas ruas que há um tempo atrás. No entanto, a questão estrutural ainda deixa a desejar, já que muitos de nossos postos de serviços são insalubres”, explica. De acordo com dados da Coordenadoria de Estatística e Análise Criminal (Ceacrim) da Secretaria de Segurança Pública de Sergipe, SSP/SE, há um crescimento dos índices gerais de violência na capital sergipana, com registros feitos de janeiro de 2011 a setembro de 2015 dos seguintes crimes: ameaça, furto, lesão corporal culposa na direção de veículo, lesão corporal, roubo e homicídio doloso. Ainda assim, Georlize informou que houve uma queda dos assaltos em terminais e no mercado central, pontos que sempre foram alvo de reclamações constantes e que são patrimônio da Prefeitura. “A prevenção é o nosso forte. As praças estão mais tranquilas e os guardas têm atuado em casos de flagrante”. A secretária também citou o programa Anjo Azul como forma de aumentar a segurança, já que o mesmo trabalha diretamente com as crianças dentro das escolas, e o reforço na fiscalização eletrônica, com a implantação recente de mais de cem câmeras.

Calcanhar de Aquiles Durante a campanha eleitoral, o então candidato João Alves afirmou que, ainda em seu primeiro ano de governo, realizaria concurso público para a guarda municipal de Aracaju visando o aumento do efetivo e, consequentemente, da segurança na capital. No entanto, no final do penúltimo ano do mandato não há sequer uma previsão para o lançamento do edital. De acordo com o sindicato houve um bom acréscimo no efetivo, mas ainda está longe do necessário. Pela Lei que rege a profissão, considerando­s e a população aracajuana, a cidade deveria ter entre 1200 e 1300 guardas. Hoje a categoria conta com (cerca de 515 ­ pouco mais de 500) profissionais. Segundo Georlize, 164 novos colaboradores foram convocados, o que zerou a lista de excedentes do concurso anterior. “Ainda não realizamos outro concurso porque o município atingiu o limite de funcionários indicados na Lei de Responsabilidade Fiscal. Quando esse problema for resolvido nossa primeira ação será realizar o certame”.

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POLÍTICA Educação

A educação é a principal forma de garantir um futuro de qualidade. Investir nela significa uma melhoria no Índice de Desenvolvimento Humano, a diminuição da desigualdade social e de gênero e uma variedade maior de possibilidades profissionais e pessoais. Costuma ser também um dos itens mais observados pela população, motivo pelo qual está quase sempre presente nas campanhas eleitorais. Por se tratar de algo muito amplo, a responsabilidade pelo sistema educacional brasileiro é dividida entre os governos Federal, Estadual e Municipal, sendo que um pode - e deve - ajudar o outro. Segundo a Constituição Brasileira, o Governo Federal é responsável pela educação superior e o Estadual pelo ensino fundamental II (do 6º ao 9º ano) e pelo ensino médio. Enquanto isso, cabe aos municípios garantir a educação básica para crianças de 0 a 5 anos, por meio de creches, e o ensino fundamental I (do 1º ao 5º ano). Durante o pleito, João Alves destacou a importância da educação para a formação da sociedade e alegou que melhoraria a qualidade de ensino para garantir uma formação sólida ainda na primeira série do ensino fundamental, além de ter como objetivo alcançar o maior Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, (IDEB), do Nordeste. Também foram feitas promessas na área da segurança escolar, como a criação de um batalhão escolar e de um cartão de acesso às unidades de ensino. Nossa equipe conversou com a Secretaria Municipal de Educação (Semed) e com o Sindicato dos Profissionais de Educação do Município de Aracaju, Sindipema, e constatou uma visão completamente diferente entre os órgãos sobre a atual situação da educação aracajuana. Semed Segundo a Semed, desde 2013 três leis foram alteradas na área de educação. A primeira lei atualizou a estrutura orgânica interna do órgão, enxugou cargos e criou um Departamento de Tecnologia da Informação. Além disso, legalizou-se o direito de receber verbas do município para realizar pequenos reparos. Esse dinheiro é gerenciado pelo Conselho Escolar e pela direção da unidade.

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A segunda lei criou o cargo de professor substituto. Segundo a secretária municipal de educação Marcia Valeria Lira Santana, quando um professor se afastava de forma temporária a vaga era preenchida por um estagiário, que exercia as funções de forma irregular, já que assumia a sala de aula sem supervisão. “Atendendo a uma decisão judicial, desde julho de 2015 não há mais nenhum estagiário em sala de aula, por enquanto nem acompanhando os profissionais. Mas realizamos concurso para substituto e desde setembro de 2014 contamos com esses professores em sala de aula. Esse concurso vale por dois anos e quando o que está em vigência for acabar acontecerá outro”, explica. Outra mudança foi a mudança na Lei 121/13 que regulamenta a gestão das escolas. Considerada uma revolução pela Semed, de acordo com Valeria a comunidade elege um Conselho Escolar e os membros desse Conselho escolhem o diretor, que deve ter passado por um curso de qualificação e, gestão escolar. O curso é aberto aos professores através de edital e conta com 196 horas de aulas presenciais e à distância, além de um exame de certificação. “Em dezembro de 2013 realizamos a primeira eleição dessa forma para que os diretores assumissem em janeiro de 2014. Como o mandato dura dois anos, no final deste ano haverá uma nova eleição”, afirma. De acordo com Valeria, no início de 2013 foi realizado um teste diagnóstico com os alunos da rede municipal para verificar o nível de alfabetização das crianças. “O resultado foi muito ruim, então fizemos uma parceria com o Instituto Alfa e Beto, que é referência nessa área. Também resgatamos o Currículo Referencial Mínimo para padronizar o que obrigatoriamente será passado para os alunos em sala de aula. Esse currículo foi feito há alguns anos por professores e universidades e foi implantado em 2015 nas escolas da rede”, comemora. A secretária considera, ainda, que a palavra que define essa gestão na área de educação é valorização. O piso está sendo pago a todos os professores de carreira desde 2013 e eles agora têm acesso ao Centro de Formação onde podem ser reunir para trocar experiências e se capacitar. Além disso, os professores receberam um tablet 3G, com Wi-Fi, que dá acesso ao Diário de Classe Eletrônico e a uma biblioteca virtual com mais de 11 mil títulos. “Agora é possível estudar de casa e acessar vários livros pelo tablet. O acesso mais fácil a material de estudo era uma reivindicação antiga dos professores. Agora, a Semed vai dar definitivamente os tablets a quem os utilizou direito e redistribuir equipamentos novos para todos os professores” A preocupação com a segurança das escolas foi outro tema abordado com a Semed. Segundo Valeria, como o público atendido nas escolas da rede municipal é mais tranquilo já que, em sua maioria, são crianças e pré-adolescentes, os roubos, furtos e outros delitos acontecem muito mais na parte externa das unidades. “Para fazer a segurança externa dividimos as escolas de Aracaju em cinco regiões. Cada região conta com uma viatura monitorando. Internamente, trabalhamos em parceria com a Guarda Municipal com o projeto Anjos Azuis, apresentando peças de teatro. Investimos em um trabalho educativo e cultural com essas crianças. Em alguns lugares, quando é necessário, realizamos uma ação mais ostensiva”, explica. A reforma e construção de novas escolas é o ponto que menos evoluiu na gestão. O então prefeito Edvaldo Nogueira entregou o cargo com três escolas em fase de conclusão das obras, com previsão de reformar, a partir de 2013, outros seis prédios. “As reformas são nosso tendão de aquiles. Conseguimos concluir as três unidades que estavam em reforma quando assumimos, mas não foi possível reformar mais nenhuma unidade. Nossa previsão é entregar uma escola nova no bairro 17 de março em 2016”, Número 2, 2015.1


POLÍTICA

aponta Valeria. A rede municipal de ensino possui 75 escolas. Também não foi construída nem reformada nenhuma creche.

Stephanie Wauters

Sindicato Para o Sindicato dos Profissionais de Educação de Aracaju (Sindipema) a situação da educação no município não é boa. Em entrevista concedida por e-mail, o presidente Adelmo Meneses Santos classificou a situação da educação na rede pública municipal de ensino como um “retrocesso em todos os sentidos. Há desordem administrativa, perseguição de professores que se opõem a usar os pacotes educacionais comprados pela Semed, pacotes estes que foram adquiridos sem a prévia consulta aos professores, além de falta de planejamento das ações realizadas pela gestão municipal no que diz respeito à educação”. Segundo o sindicato, a implantação do currículo referencial mínimo nas escolas não pode ser considerado um ponto de evolução, já que o mesmo não teria sido discutido com a categoria. Da mesma forma, a implantação do Diário de Classe Eletrônico é considerada “apenas uma forma de controle”. Para Adelmo, “todo recurso e ferramenta tecnológica que tenha como objetivo facilitar o trabalho do professor e o aprendizado do aluno será bem-vinda, desde que funcione”, explicou referindo-se aos tablets recebidos da Semed. A lei 121/2013 determinou que, ao atingir 70% da meta, seja pago um 14º salário. No entanto, o sindicato é contra o Pacto de Gestão, pois defende que todos os envolvidos no processo recebam uma bonificação: a unidade de ensino, os professores e a equipe diretiva. “Não é o que ocorre. A única bonificada é a equipe diretiva. O sindicato fez parte da comissão de avaliação do pacto, mas não assinou o resultado final por não concordar com os métodos utilizados para avaliar as unidades de ensino, pois houve escolas que não foram bonificadas”, reclama. Além disso, apesar de confirmar o recebimento do piso salarial corretamente, o sindicato discorda sobre o conceito de valorização da Semed. “Meritocracia não significa valorização e sim uma forma de dividir, de punir a escola e os professores que não se enquadrarem na atual política adotada pela Semed. Valorização, por exemplo, é quando o professor participa os encaminhamentos da comunidade escolar através do Plano Político Pedagógico, o que não vem acontecendo”. O outro ponto questionado pelo sindicato é a mudança na forma de escolha dos diretores das escolas. Durante muitos anos, o Sindipema lutou para que a comunidade e os professores tivessem uma participação direta na escola do diretor da unidade. O direito havia sido conquistado através da aprovação da Lei de Gestão Democrática, em 2002. “A nova Lei retirou das escolas a autonomia pedagógica e restringiu o processo de eleição para coordenadores escolares, voltando a existir a figura do diretor e a indicação dos coordenadores pedagógicos pela Secretaria de Educação, o que já não existia mais na rede municipal. A finalidade dessa mudança é diminuir a autonomia da escola, a deixando atrelada às decisões da secretaria”, reclama.

“Há desordem administrativa, perseguição de professores que se opõem a usar os pacotes educacionais comprados pela Semed, pacotes estes que foram adquiridos sem a prévia consulta aos professores, além de falta de planejamento das ações realizadas pela gestão municipal no que diz respeito à educação”. (Adelmo Meneses Santos)

Número 2, 2015.1

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POLÍTICA

Saúde A atual gestão cumpriu a promessa de fechar o lixão do bairro Santa Maria em abril de 2013. A utilização de aterros sanitários possui influência direta na saúde da população, já que evita diversas doenças. Apesar de ter sido um ponto positivo, é importante ressaltar que o fechamento de lixões é uma determinação federal e, no caso de Aracaju, deveria ter ocorrido muito antes. Na época do fechamento do lixão, a multa contra a prefeitura já ultrapassava R$ 35 milhões de reais. Com o fechamento efetivo, o valor da multa foi negociado e ficou em R$ 10 milhões, que estão sendo revertidos para o Fundo Municipal do Meio Ambiente em Aracaju em parcelas anuais no valor de R$ 2 milhões.

Conversamos com o vice-presidente do Sindicato dos Médicos (Sindimed), José Menezes, sobre a atual situação da saúde na capital sergipana. Para ele, não houveram avanços durante a atual gestão. “Em um almoço no sindicato João Alves prometeu melhorar as condições de trabalho da categoria, mas isso não ocorreu. Existe uma mudança constante no cargo de Secretário da Saúde, o que impossibilita o diálogo e o andamento das ações e nos obriga a paralisar as atividades e, infelizmente, prejudicar a população”, lamenta.

A saúde pode ser considerada uma das pastas mais complicadas de Aracaju. Tida como uma das mais importantes, durante a campanha eleitoral, foi uma das mais citadas por todos os candidatos, inclusive o atual prefeito João Alves Filho, que prometeu resolver os problemas existentes e transformar a saúde da capital sergipana em uma referência para o Nordeste. No entanto, durante os três anos de mandato, a população já se deparou com várias greves e paralisações no setor.

A equipe do Mais Contexto precisou analisar cada uma das propostas de campanha em loco para fazer um balanço do que já foi cumprido ou não. Para isso, visitamos postos de saúde e a Unidade de Pronto Atendimento Nestor Piva, conversamos com a população que utiliza esses serviços, com os profissionais que vivenciam a realidade diária da pasta, além de nos apoiarmos também no material já divulgado pela imprensa. Promessas como a criação de um centro de apoio para dependentes químicos e a construção de uma maternidade municipal com cem leitos no bairro Santa Maria não foram concretizadas nos últimos anos e, após a eleição, não foram sequer anunciadas como uma possibilidade real. Entretanto, ainda em 2013 a prefeitura encaminhou para a Câmara Municipal de Aracaju (CMA) um Projeto de Lei (PL) que não havia sido proposto durante a campanha nem discutido com os profissionais e a população antes [ou depois] de sua apresentação.

O PL no 118/2013 foi aprovado pela bancada governista em maio de 2013, com apenas cinco meses de mandato, e previa a qualificar entidades como Organização Social de Saúde (OS) e vincular essas OS’s ao município através de contratos. Considerada uma forma de privatizar os serviços, os profissionais de saúde se posicionaram contra o PL e abriram uma ação para impedir a efetivação do mesmo. Da mesma forma, o Ministério Público Estadual se colocou contrário ao Projeto de Lei e instaurou inquérito para investigá­-lo. Até o momento. o PL não foi efetivado.

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Segundo Menezes, os médicos da capital também encontram­ se insatisfeitos porque a prefeitura está desrespeitando os direitos conquistados anteriormente. Ele afirma que os acordos de encerramento de greve não estão sendo cumpridos, cortou­se a gratificação, o desempenho e as incorporações dos médicos, e há atrasos nos pagamentos. “Além disso, não houve concurso para repor os médicos que saíram, então faltam médicos nos postos de saúde e a situação das UPAs é ainda pior, porque existe uma escala medica fictícia”, denuncia.

Em visita às unidades de saúde, nossa equipe constatou que alguns postos tiveram seu horário de atendimento modificado e ficam abertos também no período da noite. Entretanto, tanto nas UPAs quanto nos postos, percebemos a superlotação e a ausência de médicos que estariam de plantão. Para a dona de casa Maria Augusta, que frequenta o posto de saúde do seu bairro, existe um descaso com a população que precisa esperar durante meses pelo atendimento e no dia da consulta ela não acontece por falta de médicos. Um funcionário do posto, que não quis se identificar, confirmou que os atrasos são frequentes e, às vezes, é necessário remarcar as consultas. Menezes afirmou ainda que a promessa de informatizar o atendimento nos postos de saúde não foi cumprida, apesar de ser uma reivindicação antiga da classe médica. “Outro problema é a reativação das ações do Pró­Mulher, Pró­Família. Esse é um programa com uma proposta boa, mas o que vejo hoje é uma farsa para as eleições. Ele é realizado com um direcionamento totalmente eleitoral”, afirma. Secretaria Municipal de Saúde

Nossa equipe foi até a Secretaria Municipal de Saúde duas vezes para tentar falar com o secretário Luciano Paz. Em uma das vezes, com hora marcada, ele transferiu a entrevista para o adjunto Adalberto Canuto, que não quis falar com nossa equipe. Fomos orientadas pela Assessoria de Comunicação para enviar as perguntas por e­mail, mas , depois de alguns dias, fomos comunicadas que o e­mail não seria respondido. Número 2, 2015.1


POLÍTICA

Economia

Comércio O Comércio da capital está passando por uma estruturação, com uma forma de organização mais pulverizada. Antes a concentração de lojas ocorria no centro da cidade, nos shoppings e em poucos bairros como o Siqueira Campos. Hoje, os demais bairros estão absorvendo essa expansão. Para Fábio, essa situação deriva da crise pela qual o país passa, já que a população se adéqua às novas perspectivas. Com o objetivo de aquecer o movimento no centro da cidade, a Semict afirma que está investindo em melhorias na estrutura local e, neste final do ano, na decoração natalina e na Casa do Papai Noel. “Também estamos realizando mais eventos, que refletem no comércio direto e indireto da capital e ajudam na circulação de dinheiro”, explica Fábio. Turismo

Em meio às promessas feitas pelo então candidato João Alves Filho estava a criação da Secretaria de Indústria, Comércio e Turismo (Semict) afim de atrair investimentos, reaquecer o comércio e gerar empregos para a juventude. Logo no início de sua gestão essa proposta foi colocada em prática e hoje a pasta é uma das mais importantes da prefeitura. Conversamos como o consultor da Semict, Fábio Araújo de Andrade, que nos deu um panorama da atual situação econômica das três vertentes que a secretaria cuida. Indústria

De acordo com Fábio, Aracaju tem um problema logístico em relação à implantação de indústrias. A maior dificuldade seria a localização da capital, já que os empresários acabam optando por cidades do interior que apresentam uma maior facilidade de escoamento de produção. Com isso, a cidade acaba recebendo prioritariamente fábricas de pequeno porte. Segundo o consultor, a crise também teria afetado a negociação com novas fábricas, que desistiram de abrir novas filiais na cidade. “A região que tem recebido mais investimentos é o bairro Santa Maria, que hoje conta com um incentivo do governo. Mas, mesmo com o cenário econômico brasileiro ruim, conseguimos inaugurar neste mandato a Alma Viva e a Ferreira Costa, duas grandes empresas, além de atrairmos com sucesso a indústria hoteleira”, comemora.

O investimento em treinamento profissional foi outra promessa de campanha, na qual a proposta é capacitar os moradores da cidade para que empresas não tivessem necessidade de trazer funcionários especializados de outros locais. Essa parceria foi fechada com a Fundação Municipal do Trabalho (Fundat), que oferece os cursos e encaminha os candiados para as respectivas empresas, aumentando a confiabilidade dos empresários e gerando renda para o cidadãos aracajuanos.

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O setor que recebe mais investimentos da secretaria é o turismo, segundo maior gerador de empregos de Sergipe. De acordo com Fábio, a capital sergipana é a cidade do estado mais procurada pelos turistas, o que justifica a atenção recebida da prefeitura. Aracaju tem sediado importantes eventos esportivos que ajudam a projetar a cidade para todo o Brasil. Esses eventos são uma das táticas utilizadas pela pasta para movimentar, inclusive, o comércio local através do aumento de turistas na cidade. A secretaria também afirma que tem investido nas divulgações em outros estados brasileiros, além de fechar parcerias com empresas de aviação e de viagens. “A alta do dólar também tem contribuído a nosso favor, já que muitos turistas têm substituído viagens ao exterior pelas realizadas dentro do país, principalmente no Nordeste”, explica Fábio. A equipe da Mais Contexto verificou que alguns projetos que visam melhorar o setor turístico de Aracaju se encontram em fase de desenvolvimento ou já em execução. A Orla Pôr do Sol, que fica localizada na zona de expansão da cidade, tem se consagrado como um belíssimo cartão postal, que desenvolve há mais de um ano uma feira todos os sábados. Nela, a comunidade comercializa artesanatos e comidas típicas, enquanto o turista acompanha as apresentações de grupos folclóricos e artísticos.

Fábio Araújo destacou ainda uma das promessas feitas pelo prefeito João Alves durante a campanha: a capacitação profissional. “Para a criação do projeto da Pôr do Sol, por exemplo, capacitamos todos que iriam trabalhar. Todas essas pessoas são da própria região, não trouxemos ninguém de fora, já que a nossa intenção é trazer uma fonte de renda para os moradores da comunidade”, explicou o consultor da Semict. O cadastro no Ministério do Turismo, para a criação da nova orla na região do Farol da Coroa do Meio já foi iniciada e liberada a primeira etapa, que é a construção da arena e a secretaria espera a liberação da segunda etapa.

Outro evento realizado este ano foi o Primeiro Festival do Caranguejo, que aqueceu a economia local e impulsionou setores como bares, restaurantes e hotelaria, que registraram 100% de ocupação em suas instalações. O festival teve repercussão nacional e trouxe visibilidade para a cidade.

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POLÍTICA

Entre o dial e a urna, as vozes da voz do povo FÓRMULA QUE VIROU TRADIÇÃO NO RÁDIO SERGIPANO, O RADIOJORNALISMO DE ÂNCORA É ESMIUÇADO EM TRÊS PERSONAGENS, QUE DISCUTEM A RELAÇÃO DE UM PODEROSO CASAL: RÁDIO E POLÍTICA. Daniel Damasio borrachodesofa@gmail.com

‐B

OM DIA!!!

GIRE O DIAL DE UM LADO A OUTRO AO NASCER DA MANHÃ E PREPARE-SE PARA UM TSUNAMI DE INFORMAÇÕES E OPINIÕES PARA TE CONVENCEREM EM QUE PAÍS VOCÊ VIVE. NEM MESMO O VELHO TRABUQUEIRO VICENTE LEPORACE (19121978), O PRIMEIRO ÂNCORA DO RADIOJORNALISMO BRASILEIRO COM O HISTÓRICO O TRABUCO, DA RÁDIO BANDEIRANTES DE SÃO PAULO, IMAGINARIA QUE BOA PARTE DAS QUASE DEZ MIL EMISSORAS DE RÁDIO BRASILEIRAS CONTAM NA SUA GRADE DE PROGRAMAÇÃO COM UM NOTICIÁRIO DE ÂNCORA. EM ARACAJU, SÃO 11 DAS 16 RÁDIOS QUE CONTAM COM UM PROGRAMA DO GÊNERO, A MAIORIA NO HORÁRIO NOBRE DO RÁDIO – DAS 6H ÀS 9H DA MANHÃ, DE SEGUNDA À SEXTA – TIRANDO AS EMISSORAS DA FAIXA COMUNITÁRIA E DO INTERIOR SERGIPANO, ONDE A POLÍTICA É AINDA MAIS FERVENTE NAS ONDAS HERTZIANAS.

“O rádio é o menor caminho entre o povo e o poder”. Essa, pelo menos, é a filosofia de trabalho de Carlos Ferreira. A origem humilde vivida em Penedo (AL), onde iniciou carreira em 1978, na extinta Rádio São Francisco, lhe dá a base suficiente para priorizar a interatividade, que sempre moldou seus programas desde as passagens pelas rádios Liberdade (onde comandou por oito anos O Pulo do Gato – programa homônimo ao da Bandeirantes) e Cultura de Aracaju, Lagamar de Boquim (hoje Transamérica), Progresso de Lagarto, Abaís de Estância e Capital do Agreste de Itabaiana, entre outros veículos. Atualmente, é a voz da segunda edição do Jornal da Ilha, de segunda a sexta às 17h00 na Ilha FM (102,3 MHz), no mesmo horário onde comandou na emissora o Espaço Livre por seis anos e 25 em outros prefixos. Entrevistado em pleno estú-

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dio na hora do programa, ele expõe, entre um intervalo e outro, o seu estilo baseado na participação direta do ouvinte. “O rádio, quando ele é feito com decência, ele não contribui com a política, e sim com a sociedade. Eu acredito muito no jornalismo solidário, e ser solidário jornalisticamente não é só fazer campanha, mas dar à população o direito de se expressar – e nós vivemos num país onde, infelizmente, a população trabalhadora só é respeitada na época de campanha”, afirmou com sua peculiar franqueza. A interatividade com seus ouvintes chega ao ponto da nossa reportagem acompanhar, ao vivo, a noticia de uma tentativa de assalto que resultou na morte de um policial, apurada, informada e confirmada a partir da participação direta do ouvinte.

Sabedor dos macetes do poder e criterioso com seu estilo de jornalismo, Carlos Ferreira enfatiza os limites entre política e prestação de serviço: “Ninguém vive sem a política, não adianta. São os políticos que elaboram as leis que nos regem, regem o país. No meu programa tem o espaço para a política, a gente precisa noticiar os fatos. Agora, o que eu não dou ouvidos é a política pequena. Tenho duas horas diárias de programa e não vou ficar uma hora e meia discutindo pra qual partido um político vai, vai pra onde é melhor pra ele. A gente noticia os fatos, mas com objetividade, dá eco as ações políticas, aos partidos, aos candidatos, mas a prioridade é o ouvinte”. AM x FM

Com mais de 50 anos de carreira, que inclui uma passagem pela Agência Radiobrás, um dos pioneiros do gênero na ativa é o veterano Jairo Alves de Almeida, âncora do Linha Direta, há 25 anos (segunda a sexta 6h30), da Rádio Cultura AM (670 KHz), começando como repórter e de-

pois assumindo a apresentação. Jairo fala da liberdade de expressar opiniões e se orgulha do seu programa (e também o Giro da Notícia, no horário da tarde) ser feito por funcionários da emissora, fundada em 1959 pela Arquidiocese de Aracaju e desde os anos 1990 administrada pela Comunidade Católica Shalom, do Ceará, e logo, ter uma linha editorial definida. “Estamos nesse programa há mais de 20 anos levando um jornalismo como ele deve ser, dando a oportunidade para todos sem aquele partidarismo que a gente observa muito nesse tipo de programa. A gente que faz política sem ser partidária, e um programa desse tipo, tem que ter um cuidado muito grande para não ser tendencioso”, sentencia Jairo, que fez as ponderações com o estilo dos âncoras e o teor opinativo das pautas em um espaço político, inclusive citando Rosseau (“o homem é um ser social e político”).

ria que detalha os custos que as emissoras AM devem arcar com a migração para FM. Dependendo da potência da emissora, do número de habitantes e da renda per capita da cidade de outorga, os preços variam, de R$ 8,6 mil até R$ 4,4 mi ‐ preços tão salgados quanto a irritação do velho Jairo.

Em tempo: no último dia 24 de novembro, antes do fechamento da matéria, a presidente Dilma Rousseff sancionou porta-

Versátil, André é atuante em todos os segmentos de comunicação, começando pela manhã na rádio, passando pelas TV’s Ata-

Ao falar da concorrência de seu programa com o poderio da Frequência Modulada (FM’s), o jornalista abre parênteses para criticar a migração das Ondas Médias (AM’s), estabelecida pelo Ministério das Comunicações. “O Governo começou lá atrás a acabar com o rádio, quando acabou com os prefixos antigos (PRE‐8, PRG‐3, PRH‐9, PRJ‐6 – da Rádio Difusora de Aracaju, hoje Aperipê) e colocou tudo no mesmo patamar (“hoje é ZY não‐sei‐o‐que‐lá “(sic)). E agora acabou de colocar no caixão transferindo para a faixa da televisão. A Rádio Cultura, hoje ela penetra em mais de 400 municípios, e com o advento da FM, talvez ela penetre nos 75 municípios de Sergipe e um ou outro município da Bahia e de Alagoas, e isso é um aborto, porque a FM é feita para a localidade”, fuzilou.

De volta à pergunta, ele foi direto: “A gente se preocupa, mas fica muito tranquilo, porque a gente tem um viés, uma filosofia, e o povo é sábio. O povo sabe quem é quem, quem está fazendo esse tipo de programa, e qual o objetivo desse programa”.

Já pelo lado dos “canhões” da FM, fala o aracajuano André Barros. De caminho inverso ao tradicional, começou na TV Atalaia em 1981 e só entrou no rádio em Brasília, quando repórter da Rádio e TV Manchete. Após passagens pela TV Globo e por várias capitais brasileiras, voltou a Sergipe para períodos na extinta CBN Aracaju e na própria Pan. Com vivência de quem morou no centro do poder, inclusive cobrindo grandes greves, como a dos bancários em 1987, comenta sobre o local e no nacional no jornalismo político: “A política funciona da mesma forma em todos os lugares. Em Brasília se discute Brasil e, em Sergipe, discute‐se Sergipe, as discussões são pertinentes para o espaço. Não que se discuta, mas na verdade, o processo de discussão política que a imprensa acompanha, em qualquer lugar ela segue o mesmo princípio”. O que não impede que a agenda nacional influa localmente, a exemplo citado pelo jornalista do deputado André Moura (PSC‐SE), aliado de primeira hora do presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB‐RJ) ‐ que enfrenta violenta oposição por sua gestão controversa.

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POLÍTICA

Detalhe: a entrevista feita no último dia 04/11 foi um dos últimos movimentos de André Barros como titular da edição local do Jornal da Manhã, na Jovem Pan FM (88,7 MHz). No dia 30/11, começando a semana em que fechamos a edição, ele fechou sua transferência para a Liberdade FM (99,7 MHz), onde assume o Liberdade Sem Censura (agora André Barros Sem Censura). Com o seu projeto de comuni-

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cação integrada ao projeto de convergência em seus espaços na Liberdade, Transamérica Boquim, TV Cidade e mais um site na internet, André deve encorpar sua chancela comercial, que no Jornal da Manhã era composta por 31 anunciantes. Corvos e Trabucos nos Ís

No que tange à influência política na imprensa, temas espinhosos são tratados com certa serenidade pelos entrevistados. Em 2014, nas últimas eleições presidenciais, 141 emissoras de rádio, 32 de TV e 16 jornais impressos, pertenciam à candidatos em disputa. Em Sergipe, não se foge à regra, a exemplo da Ilha FM, de propriedade dos Irmãos Amorim, cabeças de um grupo político de Itabaiana. Carlos Ferreira, crítico do governo Dilma, garante sua postura independente: “Eu não sei jogar pra galera: eu acho que o poder público tem que investir na mídia, agora, permitindo que aquele órgão de comunicação siga com sua linha editorial de independência. Lamentavelmente, no Brasil não acontece isso, os governos investem para acabar com a mídia”. E critica o envolvimento das emissoras com grupos, principalmente, na acirrada política interiora-

na. “Geralmente os grupos são formados por fanáticos políticos, e eles não admitem a aproximação de um grupo com o outro, e isso acaba respingando no rádio”, lamentou entre os inúmeros exemplos citados em suas andanças no interior: rixas entre políticos, casamentos impedidos, comunicadores agredidos e até assassinatos.

Para bem ou para mal, o acirramento político desde as Jornadas de Junho de 2013 provocou uma maior politização dos brasileiros. Jairo Alves de Almeida enxerga semelhanças entre hoje e a sua época, quando a crise política de 1954 acabou no suicídio de Getúlio Vargas. Nesse ponto, é traçado um longo embasamento no duelo contra Carlos Lacerda (1914‐1977), jornalista e líder oposicionista, crítico feroz ao governo pelo seu programa na Rádio Globo do Rio e do jornal Tribuna da Imprensa: “A coisa funcionou a tal ponto que o povo anoiteceu contra Getúlio, e quando tomou conhecimento do suicídio, amanheceu a favor de Getúlio. E ai de você se fosse contra, você morria em praça pública. Então veja como o povo é, é a mesma coisa acontecendo com Dilma, tá todo mundo querendo que Dilma saia, e se acontecesse alguma coisa, você ia ver a coi-

sa virar, porque o povo é uma massa de manobra, lamentavelmente. E muitos comunicadores se aproveitam para ‘plantar notícia’”, criticou Jairo, que comparou os estilos de Lacerda e de seu ídolo, o já citado Vicente Leporace e seu Trabuco: “O Leporace era mais decente, conversava mais. O Lacerda esculhambava”.

Ontem Lacerda, hoje Reinaldo Azevedo, líder de audiência no horário em São Paulo com o programa Os Pingos nos Ís, na Jovem Pan paulista. Caracterizado por suas críticas ferinas contra Dilma Rousseff na rádio e no seu blog, hospedado no portal Veja, e em dois livros publicados, o estilo “Tio Rei” é visto com reservas pelos colegas graças ao seu exagero. André Barros é sincero ao falar do seu ex‐colega de matriz: “Eu hoje ouço pouco Reinaldo Azevedo. Porque eu sei que ele não vai mais me convencer em nada, e não é que eu sou governista – pelo contrário, fiz até críticas duras aos governos (local e nacional) – não me cabe falar de Dilma, posso até falar an passant, mas vejo a dose da crítica de Reinaldo e eu digo ‘pô, aí não dá!’. Eu quero sim assistir um telejornal, ouvir uma notícia no rádio e sentir que a notícia está sendo transmitida com cuidado, com esmero ”, disparou.

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Luís Matheus

laia e Cidade e dedicando ao longo do dia tempo para seus espaços no Portal A8 e na sua coluna no Correio de Sergipe. Valendo‐se do velho clichê de que “tempo é dinheiro”, ele comenta sobre a disposição financeira para tocar os projetos e como a pressão do anunciante é semelhante ao do político no que tange à linha editorial. “A influência externa na notícia vai existir independente de ter dinheiro ou não. No exemplo do Jornal da Manhã, óbvio que você vai ter 500 mil pessoas com interesses diversos, mandando mensagens pressionando, aí você diz ‘um empresário que patrocina o programa, se acontecer alguma coisa com a empresa dele, você vai noticiar?’ Claro! Agora o que eu sou contra é o exagero, a imprensa precisa entender que o sensacionalismo barato não pode existir”, afirmou.


POLÍTICA

De propriedade

NEGROS COMANDAM 71,9% DAS MICROS E PEQUENAS EMPRESAS DE SERGIPE. DENTRE AS ATIVI

D

e mãe loira mineira e pai negro quilombola sergipano, nasceu no estado de São Paulo e veio para Sergipe ainda criança. Negra e de cabelo afro, foi nessa fase que “sentiu na pele” o impacto da mídia e das indústrias de cosméticos que impunham como padrão ideal de beleza, cabelos alisados. Sua mãe, influenciada por esse padrão de beleza, não permitia que ela assumisse seus cabelos, fazendo­-a crescer frustrada e acreditando que não era bonita. Com o tempo, seu cabelo começou a quebrar devido a grande quantidade de química que usava. Decidiu então, assumi-­l os.

“Comecei a fazer tranças no meu próprio cabelo, mas tive

muito medo de sofrer preconceito, porque no ano de 1998 não era tão comum. E sofri. Mas aí algumas pessoas me paravam na rua e perguntavam ‘quem faz?’, eu respondia, ‘eu mesmo’. Foi a partir daí que comecei a fazer na casa das pessoas”. Ainda jovem, acabou engravidando e precisou de emprego fixo. Trabalhou em vários lugares, mas sempre conciliava com suas clientes. Após sofrer preconceitos nos lugares onde trabalhou, devido ao modo que se vestia e arrumava os cabelos, decidiu abrir seu próprio negócio. Regiane Ribeiro dos Santos, 32 anos, faz parte dos 71,9% dos negros que comandam a maior parte das micro e pequenas empresas sergipanas, segundo levantamento realizado

Entrevistados Destacam

pelo Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Sergipe (Sebrae) com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) de 2013, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), publicada em maio de 2015. “Abri um salão afro há cinco anos, porque acredito que a beleza negra tem que ser valorizada. O que eu quero é que as pessoas abram os olhos para a aceitação de seu cabelo original”, relatou a cabeleireira, emocionada ao lembrar­- se das pessoas que falavam mal do seu cabelo e hoje a aplaudem por ter seu próprio negócio. Essa possibilidade de abrir um salão de beleza afro, nesses últimos anos, deu­- se por meio da grande demanda de procura para esse tipo de cabelo, que

vem ganhando destaque na última década. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec), o Brasil tem o terceiro maior mercado de produtos de beleza, ficando atrás apenas dos Estados Unidos e do Japão. Entretanto, apesar da predominância de negros (e pardos) no país, o mercado de cosméticos ainda não oferece uma variedade de produtos, apenas em algumas cidades, a exemplo do Rio de Janeiro, Salvador e Vitória (sudeste do Espírito Santo), onde os produtos mais vendidos são direcionados para as muitas tonalidades que vão do marrom ao preto. Embora esse mercado de cosméticos ainda não seja satisfatório, a mídia vem gerando

Antônio Henrique; Diretor de Soluções

Regina Ribeiro; cabelerira.

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Sílvia Rodrigues

“Comecei a fazer tranças no meu próprio cabelo, mas tive muito medo de sofrer preconceito, porque no ano de 1998 não era tão comum. E sofri”.

Sílvia Rodrigues

“Quando cursei Administração, fiz um trabalho onde montei uma empresa, que acabou se tornando real quando percebi o potencial do mercado”.

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POLÍTICA

e a proprietário

IDADES ESTÃO: O SETOR DE SERVIÇO, COMÉRCIO, AGRÍCOLA, CONSTRUÇÃO E INDÚSTRIA. Sílvia Rodrigues

silviajornalista.s@gmail.com

“Em Sergipe os dados apontam para o crescimento de 15,3% do número de pequenos negócios, de janeiro a setembro do ano corrente. Ao todo, foram criados 4.690 novos pequenos negócios” (Thiago Oliveira) visibilidade aos negros, modificando os esteriótipos considerados tradicionais (domésticas, porteiros, moradores de favelas, entre outros) para a construção de novos modelos de referência. Atualmente, os espaços midiáticos vêm inserindo personalidades negras que influenciam a aceitação da identidade racial e suas características (rou-

pa, cabelo, acessórios). Como a youtuber Rayza Nicácio, a jornalista Maria Júlia Coutinho, o casal Barack Obama e Michelle Obama, a blogueira e jornalista Márcia Pacheco, a modelo Gracie Carvalho e os atores Lárazo Ramos e Sherom Menezzes, que são exemplos de personalidades considerados espelhos para os espectadores negros.

“Quando a Sheron Menezzes e Taís Araújo começaram a usar aqueles brincos grandes, chamativos e formatos assimétricos, meu negócio deu um up”, relata Gabriela Santana Teles Santos, 27, dona da marca Câmbio Negro acessórios. Com referências africanas em suas cores, estampas e formatos, Gabriela abriu seu negócio com o intuito da autoafirmação da mulher. “Eu percebi que havia uma carência nos acessórios vendidos em Aracaju, principalmente para nós, mulheres negras. Só encontrá vamos brincos e braceletes dourados ou prateados, então percebi uma ótima oportunidade de mercado”, expressou Gabriela, orgulhosa por estar próximo de completar um ano de negócio bem­ sucedido.

Isadora Santos

isadorasantos18@gmail.com

Quebrando Correntes Assim como Regiane e Gabriela, 26% dos negros donos de pequenos negócios trabalham no setor de serviços. Entre outros setores de atividade, 24% estão no comércio, 20% no setor agrícola, 20% na construção e 10% na indústria. Segundo o analista técnico do Sebrae, Wellington Amarante, dentro desses setores pode-­s e encontrar graus diferentes de escolaridade. O estudo mostra que 54% dos empresários negros têm no máximo o ensino fundamental incompleto, 12% ensino fundamental completo, 28% ensino médio (completo ou incompleto), 2% têm ensino superior incompleto e apenas 5% concluiu o ensino superior.

Gabriela Santana; empresária.

Breno Valentim; Gerente de Negócios no BNB.

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Arquivo Pessoal

“Nós não emprestamos por emprestar. Nosso crédito é produtivo e orientado, ou seja, ajudamos o cliente a aprender a administrar seu próprio negócio”.

Sílvia Rodrigues

“Quando a Sheron Menezzes e Taís Araújo começaram a usar aqueles brincos grandes, chamativos e formatos assimétricos, meu negócio deu um up”.

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POLÍTICA

“Apesar desses 54% terem no máximo o ensino fundamental incompleto, a qualidade no serviço é positiva, porque a área em que eles atuam não tem a obrigatoriedade de um ensino completo. Nessa categoria há uma associação aos tipos de atividades realizadas pelos seus integrantes, como agropecuária, construção, comércio de sucatas, e outros”, explicou o analista. Dentro do nível de escolaridade que concluiu o ensino superior, 5%, está Antônio Henrique dos Santos, 48 anos, diretor de soluções de um escritório do ramo de tecnologia de gestão empresarial. “Trabalhei por muito tempo como analista de sistemas de grandes empresas e isso foi me dando um conhecimento de como uma empresa funcionava. Quando cursei

Administração, fiz um trabalho onde montei uma empresa, que acabou se tornando real quando percebi o potencial do mercado”, afirmou Henrique que está desde 2004 à frente da empresa.

Devido ao segmento de seu trabalho, Henrique precisa manter contatos com clientes fora do Estado, tendo que lidar com vários tipos de pessoas e situações. “Em uma viagem que fui para o interior da Bahia, tratar de negócios, um cliente me perguntou que tipo de comida eu mais gostava. Disse a ele que chinesa ou italiana. Então ele me levou a um restaurante italiano. Chegando lá, o sommelier nos entregou a carta de vinho e ele foi logo pegando da minha mão para escolher por mim, achando que eu não saberia. Pedi outra

Arquivo Pessoal

“Diante do aumento do desemprego o empreendedorismo torna­-se uma alternativa viável e relativamente rápida”.

carta ao sommelier e escolhi o vinho. Meu cliente ficou desconcertado”, descreveu o empresário afirmando que, independente da cor, ele mostra aos seus clientes conhecimento, para que assim possa derrubar qualquer tipo de preconceito.

Thiago Oliveira; Economista do Sebrae .

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Fortalecendo Laços

Uma das possibilidades para

abrir um negócio, ou expandi­-lo, é através de um investidor. Nesses últimos dois anos, onde houve um desemprego desenfreado, devido à crise, a área informal cresceu. Diversas pessoas abriram seu próprio negócio e consequentemente a área de microfinanças seguiu o mesmo ritmo. “A área de microcrédito tem crescido bem acima da média de qualquer outra área, de 30% Número 2, 2015.1


POLÍTICA

Wansley Santana

mês, ou seja 120 mil por ano; que o empreendedor não tenha um endividamento superior a 40 mil reais; e que venha realizando a atividade, em pelo menos, um período de 6 meses.

“Respondendo a esses requisitos, atendemos tanto empreendedores formais, com CNPJ constituído, como empreendedores informais, que são aqueles menores e que não formalizam a empresa. Fazemos empréstimos para os clientes comprarem produtos, maquinários, para reformarem suas lojinhas, entre outras coisas. Um diferencial é que nós não emprestamos por emprestar. Nosso crédito é produtivo e orientado, ou seja, ajudamos o cliente a aprender a administrar seu próprio negócio. Nosso cliente tem um acompanhamento prévio e pós-empréstimo”, completa Breno.

a 50% no ano, que é um dado utópico. Este ano agora deu uma queda no ritmo de crescimento, mas ainda é bem maior do que as outras áreas. A tendência é que, principalmente no próximo ano, dê uma aumentada, em especial novos clientes”, destaca Breno Valentim, gerente de Negócios em Microfinanças do Banco do Nordeste (BNB). Instituído pela lei 11.110, de

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25 de abril de 2005, o Programa Nacional de Microcrédito Produtivo e Orientado (PNMPO), composto por representantes dos Ministérios do Trabalho e Emprego, da Fazenda e do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, estabelece alguns pré -­requisitos para que o investidor possa fazer um empréstimo. Dentre os quais: ter um faturamento de até 10 mil reais por

Além de fazer um acompamento profissional, outra forma de qualificar o trabalho dos clientes é a partir de cursos e palestras. “Temos uma parceria muito boa com o Sebrae. Existe um programa chamado ‘Aprender a empreender’ que é um curso de uma semana, onde todo material e toda metodologia é do Sebrae. Uma pessoa do Instituto Nordeste Cidadania (INEC) que é vinculado a gerência do BNB ministra esse curso. Todo evento que o Sebrae realiza, o Banco do Nordeste é convidado”, concluiu o gerente. Construindo caminhos

Em Sergipe os dados apontam para o crescimento de 15,3% do número de pequenos negócios, de janeiro a setembro do ano corrente. Ao todo, foram criados 4.690 novos pequenos ne-

gócios, aproximadamente 521 por mês. Segundo o economista do Sebrae, Thiago Oliveira, esse fato decorre da atual situação do país, com a desaceleração da economia e o consequente aumento do desemprego, que favorece a criação de novos empreendimentos. “Diante do aumento do desemprego o empreendedorismo torna­- se uma alternativa viável e relativamente rápida”, destacou.

Trabalhar por conta própria, com a criação de pequenos negócios, exige, em geral, pouco capital inicial e os resultados são imediatos. Os dados levantados pelo Sebrae apontam que os pequenos negócios representam 99% das empresas do país, gerando 52% dos empregos formais, 25% do PIB e 40% da massa salarial. Entretanto, é necessário um processo de qualificação do empreendedor para que ele consiga dominar os assuntos inerentes ao empreendedorismo, como gestão financeira, formação de preço, entre outros.

“Diante deste cenário, é importante que as instituições de fomento continuem apoiando tanto os pequenos negócios quanto os potenciais empresários, visto que o empreendedorismo no país tem se mostrado uma ferramenta importante no combate ao desemprego”, salientou o economista. Os dados da economia para o próximo ano não são animadores. O Boletim Focus, publicado pelo Banco Central (publicado no último dia 27/11/2015), aponta para uma redução de 2,04% do PIB. Esse fato possivelmente causará impactos no mercado de trabalho e certamente novos pequenos negócios poderão surgir.

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POLÍTICA

Relações trabalhistas e previdenciárias mudam e geram polêmica em 2015 TRABALHO DOMÉSTICO, REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO MEDIANTE REDUÇÃO SALARIAL, ACESSO AO SEGURO-DESEMPREGO E APOSENTADORIA TÊM NOVAS REGRAS EM 2016 Eduardo Santos

edu.jorst@bol.com.br

O

Outro dado negativo, este recém divulgado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, destaca que o Brasil registrou em outubro, pelo sétimo mês consecutivo, o fechamento de vagas formais. No mês, as demissões superaram as contratações em 169 mil vagas, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Tal resultado foi o pior para o período nos últimos 23 anos. Até então, a marca mais negativa havia sido registrada em 1992, com 67.242 vagas fechadas. Como forma de atenuar os impactos da problemática da economia e manter o emprego, o Executivo e o Legislativo vêm editando medidas provisórias e leis, dentre as quais estão o Programa de Proteção ao Emprego (PPE), a lei que al-

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Eduardo Santos

ano de 2015 proporcionou algumas mudanças importantes no tocante às relações entre empregador e empregado e ambos em relação à Previdência Social. Tais alterações são frutos de negociações históricas entre os segmentos (patronais, trabalhistas e Estado) e também das medidas de ajuste apresentadas pelos Poderes Executivo e Legislativo, visto a instabilidade econômica que o país está vivenciando. Para se ter uma ideia de como o momento é difícil, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), a previsão é que a economia brasileira finalize o ano com uma retração em 3%. Em 2016, há uma expectativa de declínio em 1%, e que só volte a crescer em 2017.

tera as normas de acesso ao seguro­ desemprego e a nova fórmula para o cálculo das aposentadorias. Já um outro ponto importante que mexe com as relações entre empregador e empregado, mas que não foi motivado pela situação da economia, e sim por negociações tripartites (empregados, empregadores e Estado) de anos, é a Lei das Domésticas, sancionada em junho deste ano, pela presidente Dilma Rousseff. Ela regula a situação do trabalhador contratado para exercer atividades no ambiente residencial e familiar, dentre os quais fazem parte, por exemplo, os responsáveis pela

limpeza da residência, lavadeiras, passadeiras, babás, cozinheiras, jardineiros, caseiros da zona urbana e rural, motoristas e pilotos de aeronaves particulares. Lei das Domésticas A Lei das Domésticas regulamenta sete direitos, além dos que já haviam entrado em vigor em 2013, com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) das Domésticas (jornada de trabalho definida, hora extras, salário mínino e férias de 30 dias), que são: adicional noturno, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), salário ­ família, seguro acidente de trabalho, indenização por de-

missão sem justa causa e auxílio creche e pré­-escola, este último ainda precisa de regulamentação As novidades trazidas pela emenda constitucional e regulamentadas pela lei, de início, causaram um susto nos empregadores e muitos começaram a rescindir o contrato com seus trabalhadores, preocupados, dentre outros aspectos, com a questão tributária do serviço. Porém, o advogado trabalhista Edson Andrade de Araújo esclarece que neste quesito o custo para manter um trabalhador doméstico aumentou em apenas 8%, “Antes, o empregador recolhia 20% para a Previdência

Número 2, 2015.1


POLÍTICA E a diarista, ela é empregada doméstica?

Não, ela não é empregada doméstica, pois exerce seu trabalho em uma mesma residência, em caráter intermitente, eventual e esporádico. (Fonte: JusBrasil) Social, porém só pagava 12%, os 8% quem pagava era o trabalhador, ou seja, era descontado do seu salário este valor. Hoje, ele paga 20%, 12% de três obrigações fracionadas e mais 8% do FGTS, e o empregado continua pagando os mesmos 8% de antes”. O advogado destaca também, que o “eSocial”, ferramenta online que possibilita ao empregador o recolhimento unificado dos tributos e do FGTS de seu trabalhador, hoje não é mais um problema.“Ele veio para facilitar, tornando o serviço mais simples. E, apesar do transtorno em seus primeiros dias de uso, marcado por travamentos e erros, hoje está estável e é de fácil utilização”, defende. Programa de Proteção ao Emprego A presidente do Sindicato das Trabalhadoras e Trabalhadores Domésticos de Sergipe (Sindoméstico/SE), Sueli Maria de Fátima, comenta que os novos direitos de fato geraram várias demissões, porém, o mercado já começou a se estabilizar. Sueli acredita que o empregador que tem seu bom profissional, dificilmente, abrirá mão dele. Ela enxerga ainda uma mudança de paradigma em relação à atividade: “O trabalho doméstico tornou­-se extremamente necessário, por causa da emancipação social da mulher. Antigamente, ele era coadjuvante, pois havia a presença da mulher como a “rainha do lar”, que tomava as diretrizes da casa e pronto. Hoje, não é mais assim, pois ela busca, cada vez mais, seus espaços, além do seu lar. E o trabalhador doméstico faz o mesmo movimento, tanto para buscar também o seu espaço, quanto para ajudar a patroa”. Sancionado Número 2, 2015.1

em

bro, pela presidente Dilma Rousseff, o Programa de Proteção ao Emprego (PPE) prevê a redução temporária da jornada de trabalho, com diminuição de até 30% do salário do trabalhador. O Governo Federal arca com 15% da redução salarial, através de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e o empregador com a outra parte. Às empresas que desejarem participar do PPE tem até dezembro de 2016 para a adesão e devem atender os seguintes requisitos: comprovar que passam por dificuldades de ordem econômico­ financeira, demonstrar regularidade fiscal e previdenciária e estar em conformidade com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). A lei que institui o programa prevê também que haja um acordo coletivo específico acertado entre a empresa e a entidade de classe. Na solenidade, no Palácio do Planalto, em Brasília, que marcou a sansão do programa, a presidente Dilma destacou que o PPE é positivo para todos os participantes: “Para as empresas, porque, além do processo de adesão ser rápido, elas podem ajustar sua produção sem abrir mão dos seus trabalhadores; para os trabalhadores porque preserva o emprego e a maior parte de rendimentos; para o Governo Federal, porque, diante da crise essa é uma medida de proteção ao emprego. E, além disso, é possível que o gasto do PPE seja menor do que com o seguro desemprego e ainda preserve a arrecadação das contribuições sociais” O deputado Federal por Ser-

gipe e empresário, Laércio Oliveira, também é favorável ao programa. Para ele, qualquer ação que evite o desemprego neste cenário de crise é bem vinda. Mas, o parlamentar faz ressalvas acerca da constante participação do Estado nas relações trabalhistas: “O Brasil insiste em participar de todas as tratativas referente as relações de trabalho, inclusive com excesso de burocratização e isso prejudica muito a geração de emprego. Entendo e trabalho para modernizar as relações de trabalho no país, com evidente foco na negociação direta entre empregado e empregador”. O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), em Sergipe, Rubens Marques de Sousa, acredita que, das saídas para garantir oe mprego, o PPE éa menos pior eq ue só deve ser utilizada em tempos de crise. “O programa prevê que os trabalhadores tenham sua jornada de trabalho diminuída entre 20 e 50%, mas que não sejam demitidos, algo que é um avanço. Na Alemanha, já é utilizado este tipo de ação, tanto é que lá, apesar das crises, os índices de desemprego são muito baixos”, explica. Seguro­ Desemprego Entraram em vigor em ju-

nho, após sanção do Executivo, as novas regras de acesso ao seguro­ desemprego, benefício ao desempregado que objetiva garantir­-lhe assistência por tempo determinado em virtude de demissão, sem justa causa ou de paralisação nas atividades do empregador. O seguro também é pago ao trabalhador que foi resgatado em situação análoga à escravidão e ao pescador profissional no período em que a atividade é proibida. Agora, para requerer o benefício pela primeira vez, o interessado deve ter trabalhado nos últimos 12 meses, sem interrupções. Já na segunda, é necessário ter trabalhado nove meses, e, na terceira, o período deve ser de 6 meses. Pela lei anterior, o lapso de 6 meses já dava direito ao benefício em qualquer um dos pedidos. O presidente da CUT­-SE acredita que as novas regras de acesso ao benefício, além de prejudicarem o trabalhador, não contribuem para a melhoria da situação econômica do país. “A mudança penaliza a camada mais vulnerável da classe trabalhadora, que é composta, majoritariamente, por aqueles que ocupam postos de trabalho com grande índice de rotatividade. O que o Governo deveria fa-

“A mudança penaliza a camada mais vunerável da classe trabalhadora” (Rubens Marques de Souza)

novem-

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POLÍTICA

Hugo Fernando

zer era uma ampla reforma tributária, que taxasse de fato os mais ricos, estes que não pagam quase nada de tributos em relação às pessoas pobres”, defende. O vendedor Gabriel D’àvilla, que trabalha há mais de dois anos na mesma empresa e se for demitido já terá direito ao benefício, acredita que a nova lei é injusta com o trabalhador, ainda mais em tempos de crise econômica e o com aumento no número de desempregados. “A ideia do Governo em economizar pode acabar dando errado, pois muitas pessoas que deixam de ser atendidas pelo seguro­ desemprego podem acabar precisando mais ainda da ajuda do Estado para se manterem, e assim entrarem em situação de miséria, agravando mais ainda o problema”, critica. Cálculo das Aposentadorias Sancionada em novembro pelo Executivo, a nova regra de cálculo para a aposentadoria integral entrou em vigor no mesmo mês. De acor-

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do com o texto, que não prevê extinção das fórmulas anteriores (por idade, homem 65 anos e mulher 60; e por contribuição, 35 anos homem e 30 mulher), a soma entre tempo de contribuição e a Idade da pessoa que deseja se aposentar tem que dar 95 pontos, caso seja homem, e 85, mulher, acrescendo 1 ponto ao número, ac ada dois anos, ap artir do dia 31 de dezembro de 2018. Esta última especificação leva em conta a progressão da expectativa de vida da população brasileira.

O presidente da CUT-­SE apesar de concordar com o novo cálculo, acredita que ele poderia ser mais benéfico ao trabalhador se o Governo Federal adotasse uma postura mais firme diante do empresariado e de demais instituições. “Caso o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) resolvesse parar as desonerações e começasse a cobrar as dívidas de empresários e governos com a previdência, as coisas seriam mais justas. No entanto, acerca da regra atual, é compre-

ensível aa dequação em relação àe xpectativa de vida do brasileiro”, pondera. Lei das Terceirizações (2016)

Aprovado em abril deste ano, pela Câmara dos Deputados, e encaminhado para votação no Senado, que deve discuti-lo em 2016, o projeto de lei 4330/2004, em síntese, objetiva regulamentar a contratação de serviços terceirizados para quaisquer atividades, sejam elas meio (acessória) ou fim (principal ou análoga) à atividade econômica da empresa contratante. Hoje, segundo o entendimento sumulado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), a terceirização no país só é permitida para a atividade-­meio. O PL que, caso entre em vigor, atingirá empresas públicas e privadas, sociedades de economia mista, profissionais liberais e produtores rurais, exceto da administração pública direta, autarquias e fundações, tem sido alvo de uma série de polêmicas envolvendo entidades patronais e de trabalhadores, além políticos e

órgãos do Judiciário.

O deputado Federal Laércio Oliveira (SD), que é dono de uma das maiores empresas de terceirizações do estado, é um dos defensores do projeto no Congresso Nacional, inclusive foi um dos responsáveis pelo seu desarquivamento. Entre suas propostas, desde o primeiro ano de seu mandato, em 2011, ele luta para que Brasil tenha uma lei de terceirizações. “Ela é extremamente necessária, pois vai trazer segurança jurídica às partes envolvidas, principalmente para os 13 milhões de trabalhadores terceirizados do país. Um outro ponto positivo é que, tal lei é a melhor ferramenta de gestão, principalmente para o cliente público”, defende.

Quem não concorda em nada com a visão do parlamentar é o presidente da CUT­-SE, Rubens Marques. Segundo ele, a lei, se aprovada, acabará com conquistas histórias do trabalhador, além de atentar contra sua saúde ocupacional. “Um levantamento feito por nossa entidade, com a assessoria do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), revelou que os acidentes de trabalho com os terceirizados é muito maior que com os regulares, isto porque há uma precarização na segurança naquele tipo de trabalho”, destaca.

O presidente levanta ainda outras possíveis desvantagens em relação a lei, como a dificuldade para a organização sindical, os baixos salários, além do gradual fim dos concursos públicos. “Se ela for aprovada, escolas, universidades, hospitais, dentre outros, poderão terceirizar professores, médicos, enfermeiros... Será o fim dos concursos públicos”, conclui. Número 2, 2015.1


POLÍTICA

Sergipe aposta de forma tímida no turismo de negócios ATUALMENTE O ESTADO TEM APENAS 5% DE PARTICIPAÇÃO NO SEGMENTO, MAS JÁ DEMONSTRA AÇÕES PARA SEU DESENVOLVIMENTO Júnior Dias

juniordiasjornalista@gmail.com

Rafael Lima

rafaellssantos@hotmail.com Jennifer dos Santos

O

Turismo de Negócios e Eventos compreende o conjunto de atividades turísticas decorrentes dos encontros de interesse profissional, associativo, institucional, de caráter comercial, promocional, técnico, científico e social. Essa definição do Ministério do Turismo demonstra o quanto essa modalidade pode ser atrativa para as cidades.

Sergipe ainda não está no grupo dos estados do Nordeste mais procurados por organizadores de grandes eventos de negócios, por não apresentar estrutura necessária para competir com outros destinos. Entre os anfitriões estão Fortaleza, Salvador, Natal e Recife. O segmento tem despontado no nordeste pela possibilidade da região oferecer, além de es-

Número 2, 2015.1

trutura para os eventos, mais opções de lazer, que fazem com que o turista gaste quase cinco vezes mais. A Pesquisa Anual de Conjuntura Econômica do Turismo (Pacet) do Ministério do Turismo aponta que a região brasileira apresentou, em 2012, a maior expansão em atividades relacionadas ao turismo. Ainda segundo a Pesquisa, entre as operadoras de turismo, 51% detectou aumento de demanda para alguma região ou destino nacional, 81% citou cidades nordestinas. Dos nove setores ouvidos na pesquisa, três registraram crescimento dos negócios no Nordeste. De acordo com o Secretário de Estado do Turismo e Lazer, Adilson Júnior, Sergipe busca o ingresso no ramo. “Atualmente, possuímos 5% de representatividade no setor de turismo de

negócios. É preciso continuar investindo em formas de ampliar o alcance, para que isso acarrete em crescimento econômico, já que o turista que vem para eventos e negócios, gasta 125% a mais do que um turista de lazer”, disse.

Receber convenções, feiras e grandes congressos, pode ser uma via extremamente lucrativa, mas requer algumas premissas básicas para que o evento possa ser viabilizado como se deve. Os investimentos devem ir além de um espaço para a realização dos encontros. Ampliar as linhas de percepção para entender todos os setores que estão envolvidos em ações turísticas, deve fazer parte de qualquer planejamento. A capital sergipana é a menor da Federação e, por ser uma cidade litorânea, recebe muitos visitantes. Em momentos de grande movimento por

aqui, como feriados prolongados e datas comemorativas, a rede hoteleira registra grande ocupação, além de bares e restaurantes que ficam nas proximidades de onde os turistas estão instalados.

Será que a cidade está preparada para receber eventos de grande porte? E vários eventos ao mesmo tempo? Essas são indagações básicas que o estado que pleiteia entrar de maneira mais aprofundada no turismo de eventos deve fazer. Unindo os turistas de eventos aos de lazer, pode haver um inchaço e os serviços essenciais podem não ser ofertados com presteza. A presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis de Sergipe (ABIH/SE), Daniela Mesquita, reconhece que há registros de 100% de lotação dos hotéis em datas específicas e que a rede ainda não está preparada

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POLÍTICA Marcelle Cristine

para receber visitantes de eventos de negócios. “Sergipe já e um destino atrativo para o turismo de lazer e em datas importantes para o segmento, a cidade fica lotada. Ainda não estamos na rota do turismo de negócios, mas se isso for uma possibilidade, será preciso ampliar a oferta de hotéis, já que o reflexo vai ser direto restaurantes”, conta. Novo Centro de Convenções

Um dos principais investimentos que está sendo feito nessa área é a reforma do Centro de Convenções de Aracaju (CIC). O novo centro vai apresentar algumas mudanças na área que atualmente é 8 mil m2. O novo pavilhão está sendo construído no terreno ao lado, onde funcionava o antigo Centro de Treinamento da Superintendência Municipal de Transporte e Trânsito (SMTT), e será anexado ao espaço atual, totalizando 14.000 mil m2 e aumentando a capacidade total do CIC para 5.000 mil pessoas. Segundo o gerente da obra, Paulo Portugal, o pavilhão contará com oito auditórios removíveis com capacidade para 1.400 pessoas. “Será uma inovação porque poderemos aproveitar melhor os espaços e, junto com a área já existente, receber eventos de grande porte”, explica. De acordo com o secretário, Adilson Júnior, Sergipe vai se tornar mais competitivo na captação de grandes eventos. Será um desenvolvimento significativo para a economia local, visto que o turista que visita o estado para participar desses eventos gasta cerca de 125% a mais do que um turista de lazer”, disse.

A obra está gerando grande expectativa por parte dos empresários da área. A presidente do sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos de Sergipe (Sincodiv-SE), Cynthia Faria Souto, espera que a reforma traga conforto ao público que frequenta o centro de convenções. “Essa iniciativa de melhorar a estrutura física do CIC é muito importante por que teremos eventos maiores. O setor de concessionárias de veículos espera ansiosamente pela reabertura do espaço”, conta. Já a presidente da ABIH/SE, informou que a rede hoteleira também será beneficiada. “O novo CIC vai fazer com que Ser-

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gipe se torne um destino atrativo para o turismo de negócios e o reflexo vai ser direto na ocupação máxima dos hotéis, além da movimentação de bares e restaurantes localizados nas proximidades dos locais de hospedagem de quem vem ao estado participar dos eventos”, relata.

A obra, que está sendo realizada através de recursos do Ministério do Turismo e está sendo executada pela Companhia Estadual de Habitação e Obras Públicas tem data prevista para ser entregue em fevereiro de 2017 e a expectativa é que Sergipe passe a ter 25% de representatividade no turismo de negócios e eventos. Outras Áreas

O secretário Adilson Junior também informou que estão sendo feitos investimentos no interior do Estado, objetivando atrair mais turistas e possibilidades de eventos. “Obras de infra­estrutura turística estão sendo realizadas em Canindé, segundo destino mais procurado por quem visita Sergipe, Lagarto, Laranjeiras, Estância e Itaporanga”, informa. Mas é bom lembrar que investimentos em grandes estruturas, apenas, não são suficientes. É preciso existir um bom sistema de transporte público para oferecer ao turista a possibilidade de diferentes alternativas de mobilidade, passagens aéreas acessíveis, além de um serviço de hospedagem e alimen-

“O novo CIC vai fazer com que Sergipe se torne um destino atrativo para o turismo de negócios e o reflexo vai ser direto na ocupação máxima dos hotéis”. (Paulo Portugual) tação de qualidade dentro e fora da capital sergipana.

Recentemente, a agência de notícias do Governo do Estado veiculou informações sobre um acordo entre o poder estadual com uma empresa de aviação para ofertar mais voos diretos para Aracaju. Esse acordo garante a redução de 17% para 14,5% ou 12% a alíquota de ICMS sobre combustível de aviação, desde que haja o aumento efetivo nas frequências de pousos e decolagens no Aeroporto Santa Maria e ainda aumento de consumo do chamado querosene de aviação pela empresa no Estado, com o abastecimento de mais aeronaves (ou seja, as aeronaves que pousarem aqui receberão desconto na alíquota).

A princípio, essa ação fomentaria o turismo ampliando o fluxo de visitantes oriundos da região Sudeste. Porém isso não reflete no preço das passagens, que a depender da temporada, apre-

sentam valores altos para quem opte visitar Sergipe.

O turismólogo Eduardo Barreto, que trabalha com turismo emissivo (aquele que leva pessoas para fora do estado) avalia que, pela experiência no ramo, Sergipe precisa se estruturar em todos os âmbitos para que possa ingressar no turismo de eventos. “Alguns eventos estão sendo direcionados para o hotéis, pois possuem um estrutura melhor, mais ainda assim não comporta um grande evento. A exemplo também do nosso maior teatro, o Tobias Barreto, que tem capacidade para apenas 1330 pessoas. Dessa maneira, o Estado ainda pode continuar captando só eventos de pequeno porte, mesmo com o auxilio do Centro de Convenções. Se todas essas esferas forem pensadas, aí sim poderemos estar competindo de igual pra igual com outras cidades do nordeste e do Brasil”, conclui. Número 2, 2015.1


EDUCAÇÃO

Formas de avaliação para entrada e saída no Ensino Superior O ENEM E ENADE SÃO REALMENTE DEMOCRÁTICOS?

Leilane Coelho

LEILANE COELHO

leilane.ocoelho27@gmail.com

O

Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), surgiu em 1998 com o intuito de avaliar os alunos que concluíram o ensino médio. O exame tem um modo diferente de avaliação porque ele não foca somente na escravização da memória, ele busca utilizar questões de conteúdos interdisciplinares e contextualizadas, colocando o aluno diante de problemas cotidianos.

Dados mostram que em sua 1º edição, o Enem contou com um número modesto de 157,2 mil inscritos e de 115,6 mil participantes. Já em sua 4ª edição, em 2001, alcançava a marca expressiva de 1,6 milhão de inscritos e de 1,2 milhão de participantes. No entanto, a popularização definitiva do Enem veio em 2004, quando o Ministério da Educação instituiu o Programa Universidade para Todos (ProUni) e vinculou a concessão de bolsas em instituições de Ensino Superior (IES) privadas à nota obtida no Exame. No ano seguinte, o Enem alcançava a marca histórica de 3 milhões de inscritos e 2,2 milhões de participantes. Em 2006, estabeleceu novo recorde, com 3,7 milhões de inscritos e 2,8 milhões de participantes. Mesmo tendo alcançado uma popularização entre os estudantes,

Número 2, 2015.1

Alunos do segundo ano do colégio estadual Tobias Barreto, durante a preparação para os examens de fim de ano.

o Enem não era tratado como porta de entrada nas universidades, e sim o vestibular tradicional. Muitos chegavam a fazer o exame pelas oportunidades que ele oferecia, mas, ainda sim, o foco eram os vestibulares tradicionais. Em 2012, foi instituído que o Enem seria a única porta de entrada para as universidades públicas. A notícia causou um grande alvoroço em alunos, escolas e até mesmo nas universidades. De repente, uma forma tradicional de vestibular era quebrada para seguir a chamada democratização do ensino brasileiro. Em Sergipe, a notícia de que o Enem seria o requisito para ingresso na Universidade Federal de Sergipe causou um grande incômodo no estado. Em 2011, alguns alunos até protestaram contra a nova forma de avaliação, o que não adiantou muito. Dali, estudantes que tinham em 2011 sua única chance de enfrentar o concorrente de forma igual apostaram tudo. Alguns obtiveram êxito, outros nem tanto. Nessa estrada de renovação do ensino e das universidades, o Enem é o grande protagonista. Neste ano, os alunos tiveram como foco principal o Enem, após quase três anos de adaptação. As escolas lutam para aparecer no

ranking entre as melhores do Brasil, enquanto os alunos estudam com a sensação de que concorrem com o Brasil inteiro. Um ensino cada vez mais caro, um aluno cada vez mais estressado e com uma sobrecarga de assunto. Existe mesmo democratização do ensino? Quanto custa um sonho?

Olhos atentos, outros dispersos, mas todos almejam um novo ciclo da vida. A sensação de entrar nas escolas de Aracaju é a de estar respirando sonhos alheios. São burburinhos nos corredores que começam e terminam a todo instante: “Quando eu entrar na faculdade...”. “O professor de matemática veio hoje...?”. O estresse também está por toda parte, é uma tensão vivenciada seja antes da avaliação (por não saber o que estar por vir), como também após o Enem (por achar que uma dedicação mais intensa teria melhorado o desempenho). São professores que se doam, que tratam a escola como casa, os alunos como filhos, que vivem as alegrias e as tristezas de um mundo de ensino médio. São eles também os responsáveis por fazer os alunos se sentirem confiantes durante a transição vestibular tradicional ->

Enem.

Para o professor de história, Valtemberg Torres, o processo de adaptação exigiu sim um tempo, mas na visão dele e dos colegas de profissão o Enem veio para agregar uma nova forma de avaliação. “O Enem trouxe algumas vantagens e os alunos não demoraram a perceber, pois a parte conteudista dos assuntos foi relegada a segundo plano, ganhado valor o conhecimento geral e uso prático do que é assimilado em sala de aula”, explica. Felipe Manoel, estudante de escola particular, geralmente acorda às 5h30 da manhã e só volta a dormir perto da meia noite. Faz assistente em um colégio particular e ainda tem como aliado os cursinhos particulares. Por ansiedade, optou por acompanhamento com a psicóloga, academia e até mesmo a massagem. Durante cinco anos essa tem sido a rotina dele. O sonho? Medicina. Ele é apenas um dos milhares de estudantes que lutam pelo sonho há um bom tempo e, dentre as maiores dificuldades, está a transição de um vestibular tradicional, que usava a extrema fixação de conteúdos, para uma prova que exige do aluno a interpretação e interdisciplinaridade. “Esse processo de adaptação

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EDUCAÇÃO foi ruim tanto para as escolas como para os alunos. Era possível sentir isso no começo. Hoje já está tudo encaminhado, mas no começo foi bem difícil. Apesar da minha dificuldade em me acostumar com outra forma avaliativa, eu prefiro o Enem por que o aluno é convidado a entender o assunto e fazer associações a outras matérias e isso faz com que o aluno pense diferente do tradicional que é mais ‘decoreba’”, afirma. A rotina de Felipe não é muito comum. Ele tem a disposição recursos que permitem que ele invista mais no próprio sonho. Já o aluno de escola pública, apesar de competir por igual com um aluno da rede particular, enfrenta uma grande problemática que volta a ser discutida todos os anos: a greve.

Este ano, a paralisação durou quase cinco meses e chegou a ser decretada ilegal, teve corte dos pontos dos professores e mesmo assim a greve perdurou por um bom tempo. Por um lado, a desvalorização do professor e a precarização do ensino público; por outro, o aluno que vira refém de uma greve e se atrasa por um embate (que já virou anual) que prejudica o calendário escolar. Para se ter noção, apesar de já terem feito o Enem, o ano letivo da rede pública estadual só deve ser concluído em março de 2016 e iniciado em maio, o que deixa apenas quatro ou cinco meses para preparação dos alunos para o exame 2016. Uma situação que tem sido enfrentada por alunos e professores da rede pública há anos. Regina Pinto ensina na rede pública e no ensino médio desde 1994. Para ela, a greve, atualmente, não é a melhor saída. “O que minha categoria resolver, eu acato. Mas, no contexto atual, a greve não deve ser a única maneira de resolver um conflito, porque ela não só prejudica o aluno, como prejudica o professor. Por outro lado, temos um governo autoritário, e eu realmente não sei qual seria a melhor forma de resolver esse impasse”, diz. Ana Maria, 17 anos, estudante da rede pública, enfrenta o problema da greve há muitos anos, concilia estudos e trabalho, e aproveita qualquer tempo para poder se dedicar ao Enem. “Eu acho que a greve não atrapalha tanto porque se o aluno quiser ele pode estudar em casa. Mas a gente se sente com medo em relação ao aluno de escola particular, porque eles não paralisam as atividades. Esse ano a greve

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foi bastante longa e a reposição das aulas ainda está acontecendo. Então eu acho que sim, isso nos atrapalha, porque conteúdos que caíram no Enem as vezes ainda não foram vistos em sala de aula”, pontua.

As dificuldades são enormes, seja o tempo de estudo, o estresse, a pressão familiar, conciliar trabalho e estudo, greves. A sobrecarga em cima de um estudante e do professor é enorme, o que faz pensar se o Brasil tem preparado e avaliado realmente os estudantes para o ingresso nas universidades. Se compararmos o sistema de seleção do Brasil com o dos Estados Unidos, teremos uma grande discrepância no que tange a forma de avaliar o aluno. Além de fazer uma prova que é parecida com o Enem, os candidatos participam de entrevista, são avaliados pelos três anos de colégio, por atividades extracurriculares e até mesmo pela vida pessoal, ou seja, o que aquelas pessoas, como cidadã, fez de bom para construir uma sociedade melhor. Para quem vê de fora, acha que a avaliação é bem mais pesada. No entanto, lá fora existe a preocupação de fazer o estudante se humanizar para poder entrar em uma universidade. Dinâmica das Provas

O Enem ocorre em dois dias, geralmente, sábado e domingo. Durante o primeiro dia, o aluno faz a prova de “Ciências Humanas e suas Tecnologias” e “Ciências da Natureza e suas Tecnologias” e tem disponível 4h30. Já no segundo dia de avaliação, são aplicadas as provas de Redação, “Linguagens, Códigos e suas Tecnologias” e “Matemática e suas Tecnologias”, com tempo disponível de 5h. Ao todo o aluno enfrenta 180 questões durante os dois dias de prova, tendo uma média de três minutos para resolver uma questão. Esse ano a prova foi realizada no dia 23 e 24 de outubro e o que se constatou é que a grande maioria dos alunos consideram que o tempo para resolver as provas é insuficiente e que é um exame extremamente cansativo. Para Pedro Santos Júnior, 17, que está cursando o 2º ano do ensino médio em um colégio da rede pública, mas já fez a prova para testar os conhecimentos. “Para mim a prova foi bem mais cansativa do que difícil, apesar de não conseguir responder todas as questões. O tempo também é uma coisa que me atrapalhou muito. Quando fui fazer a redação isso me atrapalhou muito.

NÚMERO DE PARTICIPANTES E INSCRITOS EM QUATRO EDIÇÕES DO ENEM

Para mim, não me dediquei tempo suficiente à redação”, pontua.

Além do tempo, os alunos também reclamam de como a prova é extensa. “Esse ano ela apresentou questões mais longas, mas ano passado fiz uma prova terrível mesmo as questões sendo menores. Hoje me sinto mais preparado para o próximo Enem. Continuo sem conseguir responder todas as questões, mas acho que esse ano evolui”, afirma Elberte Rabelo, aluno do 2º ano. Enade - a porta de saída?

O Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (ENADE) começou a ser aplicado em 2004, substituindo o antigo Provão. Participam do ENADE estudantes iniciantes, ou seja, que começaram o curso no ano da prova, e concluintes, ou seja, os que estão no último ano de seus cursos.

A prova faz parte do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), que mede tanto o conhecimento do aluno, como proporciona a instituição uma auto avaliação, seja no quesito infraestrutura quanto do corpo docente.

Mesmo sendo alvo de boicote, por parte dos estudantes, alguns alunos concordam com a aplicação do ENADE. Paulo Amaral, 22, estudante de direito, acha que a prova é importante porque ela não existe apenas para medir a qualidade da instituição de ensino, mas também para avaliar a qualidade dos estudantes universitários.

“A prova me instigou bastante a refletir sobre temas contemporâneos. Foi sim uma prova bastante extensa, mas conseguiu abordar diversos temas interessantes. Por isso, eu acho que o ENADE avalia sim o aluno. Através das questões é pos-

sível saber se o estudante está por dentro dos acontecimentos atuais, bem como o assunto visto durante o curso”, afirma.

Existe democratização do ensino? O que vemos no ensino brasileiro, seja ele da rede pública ou particular, é uma cobrança excessiva e massiva dos assuntos abordados em sala de aula de aula. O ENEM chegou para tirar o aluno do “decoreba”, desenvolvendo assim, uma forma de estudo onde as disciplinas são vistas de forma conjunta. No entanto, vemos cada vez mais um aluno individualista que acredita que partilhar conhecimento seja abrir mão da própria vaga em uma universidade.

Quando conseguem finalmente realizar o sonho (cursar o ensino superior), vivenciam um mundo completamente diferente. Na universidade, os alunos são incentivados a trabalhar em grupo, a fazer prova em dupla, a partilhar o que sabem com toda rede acadêmica. Talvez seja na universidade que a maioria dos alunos vivencie a chamada humanização do ensino. Por isso, a porta de saída, o ENADE, não é visto com maus olhos pelos alunos. Eles entendem e compreendem a importância do exame. Mesmo não sendo uma prova de puro conhecimento acadêmico, os futuros profissionais entendem mais as questões de temas atuais que são abordadas em prova. Se existe a democratização do ensino? É difícil dizer. O estudante enfrenta provas diferentes e ambientes diferentes, cabe a ele tirar o melhor que essas avaliações e o conhecimento possam trazer para ele e para a construção de um país melhor. Número 2, 2015.1


EDUCAÇÃO

Violência

Educação

Sergipe mostra o quanto ainda não conseguiu resolver essa equação que mistura ações de violência e aprendizagem no mesmo espaço. Miguel Carlos

HUGO FERNANDES

miguelcomunicaufs@gmail.com

O

cenário da educação nas escolas públicas de Sergipe nas últimas décadas tem criado discussões acerca dos altos índices de violência, ocorridos com frequência num local onde o que deve reinar é o conhecimento. O caso de maior repercussão é o do professor Carlos Cristhian Almeida Gomes, do Colégio Estadual Olga Barreto, em São Cristóvão, que em agosto de 2014 foi alvejado com cinco tiros - sendo três nas costas, um na boca e um no braço - e que (ainda) corre sério risco de ficar paraplégico.

Segundo a vice-presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Educação Básica da Rede Oficial do Estado de Sergipe (Sintese), Ivonete Cruz, o assunto violência nas escolas parte de um pressuposto de Número 2, 2015.1

que a escola é composta por pessoas com determinadas situações diferentes, sendo elas: trabalhadores, estudantes, professores, gestores, auxiliares administrativos, os próprios estudantes e vigilantes. “Tem um grupo de pessoas dentro da escola que provém das mais variadas situações de vida, convívio familiar e são naturais os conflitos”, enfatiza. A violência é um fenômeno que tem raízes e se estabelecem nas desigualdades sociais. “Os meninos que frequentam as escolas públicas, na sua grande maioria, vão para a escola sem ter a alimentação básica, porque vêm de famílias com muitos irmãos, com a condição social muito baixa”, explica Ivonete. Sem falar da questão da fome, da violência no próprio lar e do convívio desarmonioso entre os pais

que a maioria desses adolescentes tende a conviver. A violência em três dimesões

A Escola Estadual 15 de Outubro, localizada no bairro Getúlio Vargas, teve um de seus turnos interrompido pelo constante tráfico de drogas entre os alunos, além de furtos e roubos na região em torno da escola, sem falar do medo por parte dos professores e do alto número de alunos irregulares nas determinadas séries. Para a diretora, Marcia Maria Coelho Correia, a escola era rejeitada pela sociedade e precisava de uma reorganização. “A realidade é bem diferente do que o sindicato vive”, relata Marcia.

Ainda segundo a diretora, a escola não era vista com bons olhos. “Não quer estudar, vá para o 15!”.

Com a reorganização feita pela gestora, houve uma melhora no quadro de violência dentro da escola, que agora funciona somente no turno da manhã e possui uma média de 160 alunos. Para o estudante do 15 de Outubro, George dos Santos, a escola é espaço de aprendizagem e não de vandalismo. “Quero formar um grupo de estudantes e professores, para que possamos discutir sobre a violência e agressão física dentro da escola”, relata o jovem, que sonha em se tornar bombeiro ou policial civil. Um dos projetos sugeridos pela gestora é o ensino integral da escola, onde o aluno entra pela manhã, almoça e é liberado às 16 horas. O projeto foi encaminhado e será avaliado pela Secretaria de Educação.

Conforme previsto na Constituição Brasileira, o Estado tem o dever

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EDUCAÇÃO de garantir a segurança do indivíduo e do patrimônio público. Para a diretora do Serviço de Educação em Direitos Humanos da Secretaria de Estado da Educação (SEED), Josevanda Mendonça Franco, a violência interna na escola atinge três instâncias: contra o patrimônio, contra a propriedade e contra as pessoas. “A gente não pode, de maneira nenhuma, imaginar que vá conseguir sanar questões ligadas à violência com medidas que tenham um caráter linear”, ressalta. Nesse caso, a diretora da SEED refere-se aos diversos fatores que podem culminar em ações de violência. Do ponto de vista da violência contra o patrimônio, a SEED fez a opção por inserir em algumas escolas profissionais do segmento de segurança terceirizados, com uma especialização específica. Até 2018, todas as 354 escolas espalhadas por todo o estado serão beneficiadas. Já em relação à violência contra a propriedade, a diretora destaca que é necessária a construção de uma cultura de não violência dentro da escola. “Precisa-se construir uma cultura de respeito ao que é do outro, de responsabilidade pelo que é do outro, de responsabilidade pelo que é da escola”, enfatiza

Josevanda.

No tocante à violência contra pessoas, as estratégias atingem fundamentalmente o fortalecimento da estrutura dos valores, dos conceitos ligados às questões da moralidade vigente e a construção de uma sociedade que se reconheça cidadã.

A violência em suas raízes deve avançar na discussão pensando no tripé: escola, aluno e família. Para a vice-presidente do Sintese, Ivonete Cruz, a escola deve ser pensada como espaço do saber, da arte, do conhecimento, do lazer e da cultura. Nesse sentido, muitos profissionais de educação defendem que o ideal seria se os alunos estudassem próximo de suas casas, dando margem para um melhor acompanhamento por parte dos diretores das escolas. Segurança nas escolas

A respeito do monitoramento permanente da Polícia Militar dentro das escolas, a diretora da SEED, Josevanda Mendonça Franco, acredita que não cabe à polícia esse papel. “Ela tem uma atribuição na área de prevenção e na execução das ações de segurança, além de trabalhar no setor investigativo”, explica.

A Secretaria de Educação possui um setor responsável pela contratação de vigilantes, além de planejar projetos que tendem a minimizar a violência dentro da escola, entre os alunos e a comunidade atendida pela unidade. Já o papel da Secretaria de Segurança Pública de Sergipe (SSP) não está ligado diretamente à segurança das escolas públicas. “A SSP não é responsável pela segurança nas unidades escolares”, afirma Renato Nogueira, assessor de imprensa da SSP.

O Centro de Aracaju é bastante movimentado. Além do comércio predominante, destaca-se a presença de escolas da rede estadual, localizadas na região. Uma delas é a Escola Estadual Tobias Barreto, que possui um conselho escolar atuante, com no mínimo duas reuniões por ano, sem falar da participação dos alunos no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid), da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Porém, a onda de assaltos existentes na localidade próximo à escola assusta e deixa um clima de medo por parte dos alunos e professores da instituição. É o que relata a diretora do Tobias Barreto, Yolanda Maria Bezerra: “Sempre chega aluno que foi assaltado ou

roubado nas imediações da escola, por conta das praças e do comércio. Dando vez aos assaltantes e trombadinhas na área do Centro”. Quando questionada à respeito da violência dentro da escola, Yolanda responde que essa questão não é um problema recorrente na escola. “Às vezes é um aluno que briga com outro, é uma coisa muito pontual, mas demora acontecer”, diz.

Discutir a violência vai para além de avaliar o cenário, a conjuntura social. Faz-se necessário construir gestões democráticas, onde todos os atores se tornam importantes na construção de uma escola pública que contemple toda a sociedade. É preciso repensar as relações estabelecidas no interior das instituições de ensino, pois as decisões tomadas precisam ser discutidas coletivamente por todos os sujeitos em plenárias ou outros espaços de discussão.

Para Josevanda Franco, a segurança é um segmento que tem uma necessidade imensa de articulação, sendo cuidados inerentes ao próprio respeito à cidadania. “A sociedade precisa compreender que segurança é responsabilidade de todos nós. Precisamos construir isso dentro da escola também”, conclui.

Os tipos de violência são diversos

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EDUCAÇÃO

Educação por trás das grades: ressocialização presa à obstáculos ALÉM DAS QUESTÕES INTERNAS DOS PRESÍDIOS, COMO INFRAESTRUTURA E DISPOSIÇÃO DE AGENTES, SÃO VÁRIOS OS DESAFIOS EDUCACIONAIS DO SISTEMA CARCERÁRIO SERGIPANO. Sara Madureira saramadureira@outlook.com

O

s oito presídios sergipanos abrigam uma população carcerária de quase 5000 apenados. Além da precariedade e da escassez das instalações, são inúmeros os desafios educacionais para aqueles que apostam neste caminho para a ressocialização. Os detentos, em quase todas as carceragens sergipanas, vivem em condições subumanas de superlotação. O exemplo mais desumano é o Complexo Penitenciário Manoel Carvalho Neto (Copemcan), em São Cristóvão. Em um gesto extremo, docentes do Copemcan improvisam salas de aula no refeitório da unidade.

Em um cenário tão estarrecedor, o Presídio Feminino (Prefem), localizado em Nossa Senhora do Socorro, destaca-se por sua estrutura pois é um dos poucos que possuem salas específicas para educação. Prometido a ser um dos mais modernos e eficientes de todo o país, conta com salas de aula, quadra esportiva, capela para realização de cultos religiosos, enfermaria, salas para atendimento social e visita íntima, além de berçário e creche para acompanhamento de bebês pelas mães até os seis meses de vida. À época em que o presídio foi reformado, em 2010, os investimentos nas obras do Prefem superaram R$ 2 milhões. As celas, com banheiro e três beliches, raramente estão superlotadas e, além dos consultórios médicos e odontológicos, a unidade tem salas destinadas às oficinas de corte e costura, onde são confeccionados os uniformes da população carcerária sergipana. Buscando mudar o panorama, o Projeto “Florescer”, uma iniciativa do Ministério Público de

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Sergipe e da Secretaria de Justiça do Estado, surgiu em 2011 com o propósito de fortalecer a cidadania aos apenados através do estímulo à informação, por meio da doação de livros, do aperfeiçoamento da biblioteca itinerante e da promoção de oficinas de leitura e literatura. Embora tenham resultados significativos, as ações do projeto não são realizadas em todos os presídios sergipanos. A biblioteca itinerante, por exemplo, foi implementada somente no Prefem, em Nossa Senhora do Socorro, e no Presídio Regional Juiz Manoel Barboza de Souza (Premabas), em Tobias Barreto. Por outro lado, a Educação de Jovens e Adultos (EJA), que busca desenvolver, através de aulas e exames, os ensinos fundamental e médio, é realizada em sete dos oitos presídios do Estado. Mas nada a ser comemorado: todo detento tem direito à educação. A Constituição Federal e a Lei de Execução Penal, entre outros dispositivos, garantem o acesso dos presos aos estudos.

Além das questões internas dos presídios, como infraestrutura, dias de visitas, disposição de agentes penitenciários para o trabalho e clima de tensão ocasionado por eventuais tentativas de fuga, os desafios educacionais do sistema penitenciário são enormes. Segundo o coordenador pedagógico da Secretaria de Estado de Justiça, Genaldo Freitas Lima, os detentos analfabetos ou que não concluíram o ensino fundamental são maioria no sistema carcerário. Ações mínimas

Em 2011, surgiu um grande incentivo em todo o país para que os presos retomassem a educação. A Lei 12.433 previu a re-

‘‘A Lei 12.433 previu a redução de pena para aqueles que estudam. A cada 12 horas de frequência escolar, o sentenciado tem um dia a menos de pena para cumprir’’ dução de pena para aqueles que estudam. A cada 12 horas de frequência escolar, incluindo ensino fundamental, médio, superior, profissionalizante ou de requalificação profissional, o sentenciado tem um dia a menos de pena para cumprir. Em contrapartida, a presidente da república, Dilma Rousseff, sancionou em setembro deste ano uma mudança na Lei de Execução Penal que institui os estudos do ensino médio nos presídios brasileiros. Agora, a oferta dos estudos de ensinos médio e profissional não será mais obrigatória, como acontece com as aulas do ensino fundamental.

O Coordenador das Atividades Policiais e Políticas Penitenciárias da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, em Sergipe, Erick Furtado, entende que os ensinos fundamental e médio, por si só, não são suficientes para a ressocialização dos presos. “O mercado de trabalho exige qualificações que vão muito além de ler e escrever”, diz. Ele considera fundamental a oferta e a efetiva-

ção de cursos profissionalizantes nos presídios brasileiros. “É essencial seguir o princípio de que, quando o indivíduo que cometeu um delito é retirado da sociedade e colocado sob a tutela do Estado, muito além da necessidade de puni-lo, há a obrigação de prepará-lo para sua reinserção social”, defende.

Em 2012, partindo desse princípio, o Ministério da Justiça garantiu repassar R$ 6 milhões a 20 estados do Brasil para financiar e dar apoio técnico a projetos do Programa de Capacitação Profissional e Implementação de Oficinas Permanentes (PROCAP). Dos 26 estados brasileiros, 20 foram habilitados a participar da elaboração dos pré-projetos, iniciada em maio de 2012. Em Sergipe, somente em 2014, o Governo Federal e a Secretaria de Estado da Justiça e de Defesa ao Consumidor celebraram um convênio, no valor global de R$ 180.807,41, para a implementação do PROCAP no Estado. Em 2016, dos oito presídios sergipanos, serão realizados os cursos de Silk Screen, no Prefem, e de panificação,

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Sara Madureira

EDUCAÇÃO

Sala de aula de um presídio, em Sergipe: dilema da educação formal para os detentos de Sergipe passa a ser discutido no processo de ressocialização.

no Copemcan.

De acordo com a Secretaria de Justiça, a demora para a efetivação do PROCAP-2014 deve-se ao cronograma de adequação do programa, que é de dois anos. Por ora, para que fosse realizado, foram homologadas apenas 100 vagas. Eis o problema: em relação ao número de vagas que são oferecidas, o mesmo acontece com o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). No entanto, apesar da intercepção da Secretaria para manter o número de vagas abonadas pelo Governo Federal, que seriam suspensas em 2015, o quantitativo de ofertas para o Pronatec, em Sergipe, ainda é muito pequeno em relação à população carcerária sergipana. Poucos são os detentos do Estado que podem participar dos cursos oferecidos pelo programa nacional. Os desafios educacionais são ainda maiores do que se imagina: embora escassas, as vagas para os cursos profissionalizan-

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tes nem sempre são preenchidas. Ainda que o Governo ofereça mais vagas, grande parte da população carcerária não estará apta para preenchê-las porque a maioria dos cursos profissionalizantes exige, no mínimo, o ensino fundamental incompleto. Para a diretora do Presídio Feminino, Valéria Victor, ‘‘as ações para erradicar o analfabetismo devem ir além das prisões. “Esse não é um problema que nasce dentro dos presídios. Os indivíduos que entram no sistema carcerário analfabetos ou com baixo índice de escolaridade, não se preocuparam em se educar ou não tiveram oportunidade de estudar lá fora”, relata. Para A. P. S. A, interna do Prefem há um ano e 10 meses, o acesso à educação é o primeiro passo para recomeçar uma nova vida. Aos 56 anos, ela já aprendeu a ler e a escrever o próprio nome. “Eu nunca imaginei que um dia eu saberia ler e escrever. Aqui, estudando, estou aprendendo a ser gente e só agora

estou certa de que a educação é sobrevivência”, conta.

A escritora e estudante de Direito, Iza Jaqueline Barros, afirma que a educação é o instrumento mais efetivo para a reinserção social dos detentos. Ex-interna do Prefem, ela permaneceu em reclusão por três anos, mas isso não a impediu de ler e estudar. Ainda que em um quadro tão complexo e adverso, Iza lecionava aulas de alfabetização a outras internas. Para ela, ainda há inúmeros obstáculos para a efetivação da educação dentro dos presídios, como a ausência de bons recursos materiais e a resistência dos funcionários a ações de cunho educativo, que vêem nelas um risco à própria segurança. Durante os anos em que esteve presa, a biblioteca era extremamente desatualizada e havia apenas um docente além dela. Segundo a Secretaria de Justiça, o empenho do órgão tem sido grande, buscando implementar várias ações educacionais, como

a aplicação das provas do supletivo, realizada três vezes ao ano e o Projeto “Reforçar para aprovar”, que promove revisões para o Enem. Embora vital e realizado semanalmente pela organização Aghata, o projeto foi implantado apenas no Prefem. A Secretaria garante que as condições educacionais melhoraram com a atual gestão. A realidade, no entanto, mostra que os desafios da educação são imensos e não dependem apenas do órgão competente pelo sistema penitenciário.

Uma coisa é certa, ao dar condições básicas, os detentos têm pelo menos uma chance de escolher como retornar à sociedade. E embora seja um mecanismo essencial para a ressocialização dos detentos ao mercado de trabalho e à sociedade, a educação para os presos trata-se, antes de tudo, da garantia de um direito humano inalienável, que todo indivíduo deve ter, recluso ou em liberdade. A humanização do tratamento dado aos sentenciados não é e nunca será um luxo. Número 2, 2015.1


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Prêmios universitários estimulam produção jornalística entre estudantes PREMIAÇÃO OFERECIDA PELO BANCO DO NORDESTE SELECIONA A MELHOR REPORTAGEM SOBRE ECONOMIA DESENVOLVIDA POR UNIVERSITÁRIOS Tatiana Santos tatianasantosaracaju@hotmail.com

Com as premiações jornalísticas a categoria universitária vem sendo divulgadas nos cursos de Comunicação. De acordo com o professor Josenildo, produzir reportagens sobre a economia de Sergipe foi o foco do conjunto de trabalhos feitos pela turma no ano passado na disciplina jornalismo online II. Eles fizeram um panorama da economia do estado subsidiando o debate eleitoral. Os prêmios são uma consequência do trabalho produzido. “Na Universidade, nosso objetivo é exigir ao máximo dos alunos em termos de reportagem, produção e edição de texto. Trabalhamos em um grau máximo de exigência os padrões jornalísticos. A estratégia no processo de formação é desenvolver produtos laboratoriais que frisem as informações levantadas pelos estudantes”, explica. A partir dos prêmios jornalísticos, estudantes universitários são reconhecidos em igualdade pela sociedade. Com os temas desenvolvidos, os alunos trazem um conteúdo abrangente para seu público alvo. Cada ano essas premiação vem sendo importante no Brasil porque é uma forma de crescimento para o mercado. “As quatros matérias premiadas no prêmio Banco do Nordeste (BNB), Número 2, 2015.1

mostravam a inconsistência nas informações, era um trabalho de idas e vindas. Em alguns casos, era estressante porque o aluno é cobrado e tem que trazer resultados. Mas é parte natural do processo, se não a matéria não avança. Ao longo do trabalho, sentamos várias vezes com o aluno e a forma de apuração era criteriosa, exaustiva e cuidadosa, no trabalhar dos textos”, fala Josenildo.

Daniel Brandi

P

ara os estudantes universitários as premiações jornalísticas são importantes. É uma forma de estimular trabalhos acadêmicos qualificados. Pensando nisso, os prêmios voltados para o Jornalismo prezam pela categoria universitária. “Cada prêmio tem um foco específico e isso leva o aluno a pensar certa variedade de questões sobre as quais pode produzir reportagens jornalísticas”, afirma o professor do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Josenildo Guerra.

Valorização e reconhecimento é o prêmio nacional Banco do Nordeste

Reconhecer e premiar trabalhos de profissionais e estudantes de jornalismo. Atualmente, esse é o papel do Banco do Nordeste em Sergipe. Alguns estados do Nordeste e também da Região Sudeste, como Minas Gerais e Espírito Santo, estiveram na disputa por premiações este ano. “Concorreram nessa categoria jornalistas profissionais que já são formados, estudantes e todas as categorias de mídia e veículos de comunicação. Os prêmios foram nacionais, regionais e locais, ou seja, cada categoria estava dividida pelo tipo de veiculo. Além disso, tivemos a categoria extra regional para municípios com menos de 100 mil habitantes e as categorias universitárias, que e justamente para estudantes de comunicação”, diz o assessor de comunicação, do Banco do Nordeste, Daniel Brandi. Para o assessor, valorizar o que produz nas universidades é essencial porque os materiais bons são os que evidenciam o desenvolvimento regional e mundial nas regiões nordestinas, que precisam desse tipo de conhecimento. “O grande prêmio nacional este ano tem duas novidades: a melhor reportagem avaliada pela comissão julgadora, vai receber um prêmio no valor de 35 mil

reais e a outra é que a categoria foto passou a ser contemplada, como foto cadastrada em mídia eletrônica online. Anteriormente só concorriam fotos, veiculadas em veículos de comunicação impresso, jornais e revistas. Mas, a partir desse ano, a categoria foto pode ser de qualquer tipo de mídia”, comenta Brandi. Hoje, o universitário que vai receber prêmio, futuramente concorrerá na categoria profissional, então isso vira um ciclo porque retroalimenta. Para o assessor do BNB, é importante conhecer publicações que sejam feitas em qualquer esfera, tipo de mídia

e veiculo. “O objetivo do BNB ao oferecer as premiações jornalísticas para categoria universitária é conhecer aquele profissional que está em formação e aprendendo. O aprendizado do conteúdo apresentado nos veículos de comunicação tem toda uma orientação, dos profissionais capacitadas para isso, eles chegam junto ao aluno, fazendo um acabamento na matéria para que possamos concorrer com outros estados regionais”, revela. O tema para prêmios jornalísticos, necessariamente não tem que estar voltado ao âmbito da economia, mas deve amarrar os

Palestra com Daniel Brandi

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EDUCAÇÃO

bamos não acreditando em nós mesmos. E eu sou uma das que não me dou muito valor no sentido que eu acho que o texto não está bom”, acredita a estudante.

Material de divulgação do BNB para o prêmio de 2016,

ingredientes típicos do desenvolvimento regional e de inclusão social ou uma crescente economia que contenha esse tema. O olhar crítico daquela região ou município está compreendido na área de atuação do banco. “A valorização do reconhecimento dado ao jornalista profissional, é no valor de 5 mil reais, isto, serve de incentivo para todo mundo dessas categorias. No entanto, pode se inscrever a categoria universitária com reportagens publicadas em qualquer plataforma online, impresso, rádio, ou seja, todas as plataformas possíveis”, destaca . Universitários premiados com melhores reportagens jornalísticas

Atualmente assessor de comunicação do Escritório Frank Teixeira Arquitetura e Urbanismo, Rodrigo Alves é apresentador do Programa Via de Cultura vinculado ao Portal Via de notícias e no Youtube. A prova de que é possível ir além, os estudantes adquirem com a experiência e ganham crescimento intelectual. Assim, ser reconhecido na área é o sonho de muitos profissionais e estudantes de jornalismo. “Nunca achei que mesmo antes de me formar esse reconhecimento viria. A participação veio como grande surpresa. Eu e meus colegas, não esperávamos trabalhar com jornalismo econômico, foi quando resolvemos sair da zona de conforto e ir em busca deste conhecimento”, revela Rodrigo. De forma geral, levar infor-

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mações sobre Sergipe ao Brasil era o foco de produção da série de reportagem desenvolvida pelos estudantes de jornalismo da UFS, Marielle Rocha, Elson Mota, Rodrigo Alves e Josiane Mendonça, intitulada “IDHM avança em Sergipe, mas não alcança média nacional”, sob a orientação dos professores Josenildo Guerra e Greice Schneider. “A capacidade em levar um trabalho jornalístico além de fronteiras, com qualidade, foi uma orientação cedida pelo professor Josenildo para que participem do prêmio. Então foi ótimo o incentivo já que é um dos maiores prêmios no Brasil na nossa área. Cada um desempenhou uma respectiva temática dentro do desenvolvimento do IDHM em Sergipe. A minha pauta falava de mineração e seus dados. Então, cada um fez o que estava a seu alcance para um bom resultado final. Por isso, o trabalho deu certo”, conta rodrigo. A estudante de jornalismo do 7º período, Marielle Rocha, despertou interesse em participar da conmpetição, a partir de outros prêmios que havia participado e não tinha conseguido. “Quando apareceu essa oportunidade do BNB de jornalismo para categoria Universitária com o tema economia, por incrível que pareça, no ano anterior, tínhamos feito uma série de reportagens sobre a economia e, foi isso, a gente se inscreveu. Para nós que estamos em reta final de curso a experiência com o premio BNB de jornalismo é boa porque muitos de nós aca-

Para Marielle, depois de chegar a um título percebeu que realmente escrevia alguma coisa e isso foi bom porque motivou a continuar participando de outros prêmios. “O tema proposto foi desenvolvimento regional que inclui economia. Quando o escolhemos, havia alguns temas aparentemente comuns, que poderiam fazer parte das reportagens. Os incomum que sobrariam eram de economia. Apesar de pouca intimidade com a área, lá no mercado a gente não vai poder escolher pauta ou área, então decidimos fazer sobre economia”, relata Marielle .

No inicio tiveram muitas dificuldades, principalmente em relação às fontes, muitos não respondiam o email, passaram meses pesquisando sobre o tema e o que cada reportagem abordaria. “O material principal sobre IDHM em Sergipe tratava de renda, educação e longevidade em que pesquisa a situação do município no interior de Sergipe, uns com taxa mais elevadas e médias mais baixas. Quando pesquisamos algumas fontes elas nos ajudaram respondendo todas as nossas perguntas e duvidas, enriquecendo nossas reportagens”, diz a estudante.

As matérias sobre indústria, mineração, exportação e importação também tiveram certa dificuldade em relação aos termos, porque o assunto que era discutido na reportagem para eles até então era desconhecido, desde o primeiro contato com as fontes até o desenvolvimento do produto. “Durante essa parceria, nossa equipe se interessava em fazer as coisas, em fazer valer um resultado final. Então a gente procurou ser bom através daquilo que foi feito. Portanto, para realizar um excelente trabalho vemos que não depende só de instituição em si, depende também dos alunos em quererem se esforçar e correr atrás”, acrescenta a graduanda. A graduanda do 7º período do

curso de jornalismo, Josiane Santos Mendonça, ao saber das premiações jornalísticas do Banco do Nordeste em desenvolvimento regional, desde o inicio estava confiante no prêmio. “Uma premiação é o reconhecimento do seu trabalho, então isso nos enriquece e motiva a produzir notícias cada vez melhores. Ao acompanhar o regulamento no site, fomos informados por email sobre os resultados de quem foi classificado, primeiramente quem ficou sabendo do prêmio foi a Marielle. Mas, depois, através de cartazes, fiquei sabendo pelo DCOS. Quando vimos que a nossa se encaixaria e que poderíamos participar fizemos a inscrição e deu certo”, conta a graduanda . No nordeste, o prêmio BNB de jornalismo, busca trabalhos qualificados de alunos, empenhados em suas reportagens. Depois de participar da edição do prêmio em 2014, a graduanda Josiane avalia que o jornalismo econômico está em quase tudo. Assim como o jornalismo politico, é preciso saber contextualizá-lo no nosso dia-a-dia. Ao fazer as matérias, nosso conhecimento contribui para que cheguem aos prêmios. “O aluno que não acredita que seu trabalho esteja em nível de concorrer, deve tentar e se não ganhar é porque não participou. O primeiro passo é tentar porque se não tenta, ninguém vai saber e será mais difícil conseguir”, destaca Josiane.

Também, estudante de jornalismo do 7º período, Elson Mota ficou feliz ao receber o prêmio. Honrados em poder estar representando a universidade, eles tiveram incentivo para poder alcançar os objetivos, com esforço e dedicação. A partir dessa premiação eles viram que são capazes de conquistar prêmios, de concorrem com alunos de outros estados, e isto serve como um incentivo em continuar cada vez empenhados e dedicando-se, mais e mais nas reportagens. Melhorando não só a vida acadêmica, mas a vida profissional também. “No começo a gente não esperava que iríamos ganhar, então ficamos muito feliz”, acrescenta o estudante. Número 2, 2015.1


EDUCAÇÃO

O

EGRESSO SILAS BRITO SILVA, BACHAREL EM COMUNICAÇÃO SOCIAL COM HABILITAÇÃO EM JORNALISMO PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE FOI PREMIADO RECENTEMENTE NO EXPOCOM, DURANTE O INTERCOM 2015, NA CATEGORIA “REPORTAGEM EM TELEJORNALISMO”, COM O TEMA “A FEIRA NAS RAÍZES DE ITABAIANA: COMO SEUS ASPECTOS CULTURAIS FORJAM A IDENTIDADE LOCAL”. O EVENTO DE PREMIAÇÃO ACONTECEU NO MÊS DE SETEMBRO, NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO.

Em entrevista à Revista + Contexto, ele falou da importância da premiação e contou que possui interesse prioritário de pesquisa nos temas relacionados aos critérios de noticiabilidade da produção jornalística, além do interesse complementar no estudo da gestão dos processos jornalísticos. Silas tem experiência na área de técnicas de redação jornalística, produção de pautas, notícias e reportagens e aptidão em temas relacionados à comunicação regional. +CONTEXTO: Porque essa premiação foi importante para você em reta final do curso?

SILAS BRITO: O prêmio foi um indicador de que meu trabalho não foi em vão. De certa forma é uma porta que se abre para o universo acadêmico e para o mercado de trabalho. O prêmio é também um estímulo para seguir em frente na carreira acadêmica e acreditar que não importa quem você é, muito menos de onde você veio, basta correr atrás e

se esforçar, aproveitando todas as oportunidades que aparecem. +CONTEXTO: Quais foram suas expectativas quando soube que estava concorrendo a premiações jornalísticas junto a outras categoria Universitária ?

S.B.: Na verdade, fiz a minha inscrição com a intenção de conhecer o Congresso Brasileiro de Ciência da Comunicação e poder apresentar meu trabalho para tantos outros estudantes e pesquisadores. Mas, depois de ter feito a inscrição, comecei a levar o projeto a sério e me empenhei o máximo possível para conseguir os recursos da viagem, pois não é barato e não tive nenhuma ajuda de custo da universidade. Depois disso, o empenho de realizar uma boa apresentação para os jurados e meus concorrentes. Como o prêmio foi na categoria de projetos experimentais, acredito que o grande diferencial do meu trabalho foi o embasamento teórico mais profundo que acabou sendo um diferencial dentre todos os candidatos. +CONTEXTO: Como é ganhar uma premiação jornalística que reconhece seu trabalho de apuração?

S.B.:Tenho dito a meus amigos que a ficha ainda não caiu. No momento da entrega das premiações, comecei a ficar um pouco nervoso, pois a Universidade Federal de Sergipe (UFS), não tinha sido premiada nas habilitações de audiovisual e publicidade naquela noite, então o peso maior ficou sob minhas costas. Chegando ao final da premiação, veio o resul-

tado da categoria reportagem em telejornalismo e com uma pausa de suspense, a coordenadora da premiação leu o nome do meu trabalho, autor e universidade. Foi indescritível, mas sem perceber, subi ao palco em lágrimas e recebi um abraço caloroso de amigos, professores e até dos meus concorrentes, pois durante o intercom tivemos uma relação muito boa com todos eles. +CONTEXTO: Como a Universidade contribui no seu desempenho para que participasse dessa premiação?

S.B.:No que se refere a minha formação acadêmica, com certeza, posso afirmar que os professores do Departamento de Comunicação Social da (UFS) tiveram um peso significativo, principalmente nas disciplinas mais teóricas e no acompanhamento fora de sala de aula, me fazendo entender melhor os desafios e responsabilidade do mundo acadêmico. No entanto, a universidade simplesmente fechou os olhos não só para mim, mas para todos que participaram do Intercom. Não houve nenhuma ajuda de custo e muito menos um simples cumprimento ou agradecimento por parte da reitoria aos alunos que representaram tão bem a instituição. Uma grande vergonha para a Universidade Federal de Sergipe, pois outras universidades do país cobriram parcialmente os custos dos estudantes no Intercom Regional e no Nacional, algumas universidades cobriram todas as despesas. +CONTEXTO: Quem esteve lado

a lado com você na disputa por esse prêmio ? S.B.: Não posso deixar de frisar novamente que Deus esteve comigo em todo tempo, desde a inscrição até agora. Com ele, tudo fica mais leve! Uma pessoa especial que sempre esteve comigo desde a minha primeira reportagem em vídeo, foi o Wendell Rezende. Meu amigo, editor de vídeos, cinegrafistas, produtor, sem ele eu não teria conseguido fazer um trabalho tão bem feito e concorrer a nenhuma premiação. Não posso deixar de ressaltar a importância da minha amiga e professora Michele Tavares, uma profissional sem igual, que sempre me deu força para concorrer e vencer todos os obstáculos que apareciam no caminho. Na verdade, confesso que ela é um referencial de profissional pra mim. Por fim e não menos importante, agradeço a minha família que sempre se alegrou com minhas vitórias e sempre fizeram de tudo para contribuir com minha formação e nunca deixaram de acreditar em mim. Até hoje ouço minha mãe “Silas, daqui a pouco você vai está no Jornal Nacional”, mãe é mãe! (risos). +CONTEXTO: Já esperava por essa premiação durante a rotina produtiva do seu trabalho?

S.B.: Não, na verdade eu nem esperava que meu trabalho fosse obter nota 10 no Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), pois as circunstâncias não eram favoráveis. Como todos sabem, não temos muito recursos, temos pouquíssimo tempo para desenvolver o trabalho. En-

Confira abaixo outras premiações jornalísticas que oferecem categorias universitárias e profissionais para 2016: https://www.embrapa.br/premio­de­reportagem As inscrições para o Prêmio Embrapa de Reportagem 2016 estão abertas desde o dia 5 de outubro. É a 14a edição do concurso, que irá premiar as melhores reportagens em quatro categorias – Impresso, Vídeo, Rádio e Internet ­ com o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) para o primeiro colocado de cada uma delas. O tema desta edição é defesa da agropecuária. O conteúdo das reportagens deve versar sobre pesquisa e inovação em sua relação com a proteção à agropecuária brasileira, buscando sanidade, qualidade e inocuidade de produtos e processos agroalimentares e agroindustriais. http://www.bnb.gov.br/premio­bnb­de­jornalismo­2016 A edição 2016 do Prêmio Banco do Nordeste de Jornalismo em Desenvolvimento Regional está com inscrições abertas até 18 de janeiro de 2016, com chamada a trabalhos jornalísticos profissionais ou universitários, produzidos em todo território nacional, para veículos impressos, TV, rádio ou internet.

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Esta edição traz mudanças que tornam a premiação mais competitiva e atraente. A criação do Grande Prêmio de Jornalismo promoverá a eleição do melhor conteúdo inscrito, independentemente da mídia para qual foi produzido. Os trabalhos serão avaliados por aspectos técnicos e também pelo retrato apresentado de iniciativas ou atividades produtivas economicamente viáveis, socialmente justas, ambientalmente corretas e que respeitem o principio da diversidade cultural. http://www.sincor­se.com.br/premiodejornalismo2015/ O PRÊMIO SINCOR­SE DE JORNALISMO é um concurso jornalístico instituído através de uma parceria entre o Sindicato dos Corretores de Seguros do Estado de Sergipe (SINCOR/SE), a Federação Nacional dos Corretores de Seguros (FENACOR) e a Escola Nacional de Seguros (FUNENSEG), com apoio institucional do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de Sergipe (SINDIJOR­ SE), para premiar matérias veiculadas na imprensa local sobre a área de seguros.

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EDUCAÇÃO

Vamos falar de economia?

O ECONOAR, PROJETO DE EXTENSÃO DA UFS, ENSINA DE FORMA SIMPLES ASSUNTOS ECONÔMICOS QUE ESTÃO NO DIA A DIA DA POPULAÇÃO. Bruno Cavalcante

bcavalcante2107@gmail.com de termos econômicos. A partir daí, olhamos o edital e vimos que ele contemplava a rádio e resolvemos fazer um programa que tinha como tema central a economia acessível a todos”, disse a professora. Diversos temas comuns na vida do ouvinte são debatidos no programa: dívidas de cartão de crédito, aposentadorias, inflação, imposto de renda e o sonho da compra da casa própria são tratados e explicados pela equipe que faz o Econoar. Esses assuntos são escolhidos através de pesquisas realizadas pelos professores e pelos estudantes de economia que são bolsistas no projeto. “As pau-

T

kamille.kp@gmail.com

tas surgem através das dúvidas que as pessoas têm. A cada um ou dois meses nós nos reunimos e definimos os temas que serão abordados nos próximos quadros. Sempre pedimos para os bolsistas observarem as pessoas no dia a dia. A partir de conversas de supermercados, encontros em terminais de ônibus e bate­papos entre os alunos surgem os novos programas do Econoar”, afirmou Fernanda.

Depois de observar o comportamento das pessoas em relação à economia, o estudante do curso homônimo, José Severino, resolveu se esforçar para participar do Projeto e contribuir com o seu

Equipe de professores e estudantes envolvida no projeto ECONOAR.

odas as terças­feiras, pela manhã, antes mesmo do sol nascer, a pequena menina de cabelos escuros e pele branca se arruma e segue em direção ao ponto de ônibus mais próximo. Chegando lá encontra sua amiga e os papos fluem naturalmente:

“Menina, o final do ano já está chegando. O décimo terceiro já vai sair, hein?” diz a amiga. “Pois é, pretendo fazer várias coisas com esse dinheiro extra, ele salvará minhas dívidas. Graças a João Goulart que instituiu essa renda milagrosa”, afirmou a menina dos cabelos negros. “João Goulart?”, espantou­se a companheira.

“Sim, ele que instituiu essa gratificação há 50 anos, vi a explicação do surgimento do décimo, ontem, em um programa da Rádio UFS”.

O programa falado pela mulher miúda é o Econoar, projeto de extensão desenvolvido pelo Departamento de Economia da Universidade Federal de Sergipe, que vai ao ar de domingo a domingo, na

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Kamille Perez

Rádio UFS (92,1 Mhz). O quadro surgiu em 2012 e é coordenado pelos professores Fernanda Esperidião, Patrícia Pugliese, Marco Antônio Jorge e Helmer Matos, todos do mesmo departamento. A função do Econoar é explicar de maneira clara e objetiva os temas econômicos que despertem o interesse e a curiosidade do público ouvinte. O décimo terceiro, assunto discutido pelas personagens, é um exemplo do que é abordado. Segundo a professora do departamento de economia e uma das fundadoras do Projeto, Fernanda Esperidião, o Econoar nasceu a partir de uma conversa entre ela e a Professora Patrícia Pugliese. Elas tomaram conhecimento de um edital de extensão e resolveram desenvolver um trabalho com o intuito de apresentar o departamento de Economia da Universidade Federal de Sergipe para toda a população. “Uma das propostas para divulgar o curso era fazer com que as pessoas entendessem um pouco do que é a economia sem ter a chateação

Estudantes da Universidade gravam programa da rádio, como parte de um projeto de extensão

conhecimento. José passou no edital para ser monitor voluntário do programa e começará a desenvolver as atividades no início de 2016. Para ele, as expectativas com os novos projetos que serão realizados no ano vindouro são altas, já que, desde o início do curso, ele quer seguir a área de educação financeira. “A minha perspectiva é que as pessoas aprendam economia e não fiquem com dúvidas sobre os assuntos que tratamos no cotidiano. Eu espero que com nossa pesquisa e com nosso empenho a gente acrescente informações necessárias para a comunidade acadêmica e fora dela”, ressaltou

o estudante.

Já para o acadêmico Aldo Lima, que está no projeto desde que surgiu, o Econoar abriu portas e se tornou essencial para a trajetória acadêmica dele, que se encerra no próximo semestre. Ele afirma que os projetos de extensão que são ofertados pela universidade possibilitam que os alunos conheçam áreas interessantes e desenvolvam na prática o que aprendem na teoria. “Nós entramos na graduação perdidos, sem rumo e sem saber que caminho seguir. Se o aluno não se inserir nos projetos de extensão ele continua desorientado durante toda caminhada acadêmica. No meu Número 2, 2015.1


EDUCAÇÃO tra no ar de domingo a domingo durante a programação da rádio UFS. “O quadro até hoje tem uma circulação muito boa dentro da emissora, isso se deve aos temas que interessantes que eles abordam”, destacou Helder.

Crachá de um dos participantes do projeto que apresenta o programa na rádio

caso, o Econoar foi o projeto que abriu a minha mente e permitiu que eu aprendesse coisas que eu não aprenderia apenas na sala de aula.”

Ainda de acordo com Lima o que ele vai levar dos anos que dedicou ao Econoar para a formação dele é a definição do caminho que pretende traçar. Ele pretende continuar com a carreira acadêmica, dedicando­se à área de educação financeira e ingressar no curso de jornalismo. “Eu adoro o Econoar, foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida acadêmica”, concluiu o estudante. Choque de Linguagem

Uma das maiores dificuldades apresentadas pelos integrantes do Departamento de Economia na hora de escrever um texto próprio para rádio foi a discrepância entre a linguagem utilizada pelo veículo de comunicação e a habitual deles. O texto mais claro e objetivo que a linguagem jornalística aborda é totalmente diferente dos textos rebuscados e com termos econômicos com o qual eles estavam acostumados. Patrícia afirma que logo que a ideia de criar o programa se tornou concreta, a equipe de economistas procurou uma professora do curso de Jornalismo da UFS para poder orientá­-los sobre como era feita a escrita para o rádio, foi então que tomaram conhecimento sobre um manual do jornalismo que explicava como se construía textos jornalísticos. Os economistas leram e estudaram o livro por conta própria, só assim aprenderam a fazer textos econômicos com a linguagem apropriada para a comunicação. “Ao longo desses anos nós tivemos muita dificul-

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dade em aprender o jornalismo, encontramos todos os obstáculos possíveis com essa área que não estávamos acostumados. O objetivo maior do projeto é colocar de uma forma clara os assuntos da economia. Isso para a gente era difícil, pois sempre trabalhamos com termos econômicos que passaram a fazer parte do nosso cotidiano.” Depois de muito esforço para conseguir se adaptar à linguagem jornalística, o Econoar finalmente produziu o primeiro quadro que seria gravado. Para Patrícia, a Rádio UFS foi essencial na adaptação dos economistas com o meio. “Nós tivemos um suporte da rádio, eles eram e são até hoje cuidadosos com a gente”, ressaltou a professora.

Helder Santos, radialista na Rádio UFS, enfatizou a perseverança dos participantes do Projeto em aprender como se pronunciar no veículo de comunicação e como é o processo de produção dos quadros. “No processo de produção do Econoar, as professoras faziam o roteiro de como seria o quadro e a coordenação de produção ficava responsável pela revisão do texto. Quando fazíamos a revisão sempre percebíamos que existiam alguns termos da área econômica que as pessoas não entenderiam, então tínhamos o cuidado de orientá­ los para produzir uma linguagem mais fácil.”

Outra grande dificuldade apresentada era relacionada ao tempo do programa, pois os quadros não poderiam passar de cinco minutos para não ficar cansativo para os ouvintes e a locução das professoras tinha que ser dinâmica. Com o fim de todo esse processo, o quadro en-

Mesmo com todo o esforço, a equipe do Econoar sentiu falta da integração de estudantes das áreas de jornalismo e letras, já que eles possuem mais facilidade com a escrita do que os alunos de economia. Foi então, que a equipe resolveu abrir um edital com duas bolsas, uma para cada área. “Entramos em contato com o coordenador do departamento de comunicação da época, para divulgar a oferta da bolsa entre os alunos. Não sei como funcionou o sistema de divulgação da vaga no departamento de comunicação, mas só tivemos uma pessoa interessada e a experiência com essa aluna não foi muito boa. Faltava comprometimento e dedicação. Depois dessa experiência, nós resolvemos ficar só com o pessoal da Economia e não abrimos mais edital para as outras áreas”, afirmou a professora Patrícia. A chefe do Departamento de Comunicação Social, Greice Schneider, fala que é importante que haja a interação entre os departamentos da Universidade e destaca três fatores que dificultam essa troca de conhecimento entre os cursos. “O primeiro fator é a falta de diálogo entre as áreas, o curso de Educação Física, por exemplo, tem uma disciplina chamada ‘Mídia e Esporte’ que poderia servir para um projeto de jornalismo Esportivo. Outra dificuldade que encontramos aqui no Departamento é a quantidade de professores que o Jornalismo possui, temos apenas 08 efetivos para um curso que precisaria no mínimo de 11 profissionais. Se tivéssemos um grupo de docentes suficiente realizaríamos muitos projetos de extensão, mas infelizmente é complicado dar conta de tudo”, lamenta a professora. Ainda de acordo com Greice, o terceiro fator e o que mais a preocupa é a falta de interesse dos alunos do curso. “A gente não vê a iniciativa da maioria dos estudantes de jornalismo que reclamam dos métodos utilizados, mas não aproveitam os equipamentos que

o curso oferece”.

NOVIDADES PARA 2016 Mesmo com todas as dificuldades, o Departamento de Comunicação e o Departamento de Economia seguem com projetos para melhoria das atividades de extensão, e quem sabe, encontrar uma forma de interação entre os cursos. O Econoar, que foi premiado em terceiro lugar durante o Encontro de Iniciação Científica (EIC), que ocorreu em meados de novembro, continuará no ar e investirá ainda mais na informação econômica para os seus ouvintes. “Em 2016 teremos dois projetos novos: o primeiro será a oferta de um workshop do Econoar. Nesse evento vamos trabalhar os conceitos do manual jornalístico para rádio e dar uma introdução breve do que é o jornalismo econômico para os nossos alunos. Quem escrever melhor terá o seu texto gravado para o Econoar; o segundo projeto é a confecção de um acervo, ou quem sabe um livro, com todos os programas escritos do projeto separados por temas, para que as pessoas, futuramente, tenham acesso ao material”, relata Fernanda Esperidião.

No Departamento de Comunicação, as expectativas com os planos futuros também são animadoras. “Estamos montando uma nova grade curricular para dar conta de todas as necessidades do curso, queremos trazer mais para perto a Rádio UFS, a TV Universitária que chegará, a Assessoria de Comunicação da Universidade e os projetos adicionais com os outros departamentos, como o de economia”, comenta Schneider. A professora Patrícia também não descarta a possibilidade de abrir novas vagas para os alunos de jornalismo. “Nada é empecilho para mim, tenho muito interesse de que outras pessoas participem do Econoar porque é um projeto que está caminhando. Estamos vendo a possibilidade também de abrir vagas para os estudantes de jornalismo participarem do workshop que vamos produzir. O que interessa mesmo para nós é que os participantes, independente da área, estejam sempre interessados em aprender e praticar coisas novas”.

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EDUCAÇÃO

Campus de Lagarto: o sonho ainda incompleto SÃO 1574 ALUNOS QUE LUTAM CONTRA OS PROBLEMAS ESTRUTURAIS DE UM ENSINO AINDA EM PROCESSO Elson Mota Josiane Mendonça

S

er aprovado em uma universidade pública é o sonho de muitos estudantes brasileiros. Para alcançar tal objetivo, dedicam horas de estudo diário conciliando colégio, cursinho e até atividades em casa. Após a aprovação vem a alegria, a comemoração e, finalmente, o início do período letivo. Ao chegar na universidade, o que se espera é uma boa estrutura, que possa oferecer as oportunidades necessárias para o aprendizado.

Mas em alguns casos, isso nem sempre acontece. Alunos da Universidade Federal de Sergipe (UFS)­ Campus Lagarto, passam por essa realidade e sofrem com a falta de equipamentos fundamentais para aulas práticas, assim como laboratórios específicos nos oito cursos oferecidos, Fonoaudiologia, Medicina, Terapia Ocupacional, Nutrição, Farmácia, Odontologia, Enfermagem e Fisioterapia. Devido aos problemas enfrentados, os alunos já entraram em greve diversas vezes, em forma de protesto e em prol de melhorias

elsonmota@hotmail.com.br

na estrutura dos cursos. Para mobilizar a classe estudantil, assim como divulgar os avanços do movimento, os universitários criaram uma fanpage no Facebook intitulada “Movimento pró­clínica ODONTO/ UFS­Lagarto”. A ferramenta é usada como um meio de denúncia, através da qual são postadas fotos que denunciam estruturas incompletas e/ ou de equipamentos encaixotados. Aprendizagem Baseada em Problemas

Inaugurado em 2011, na cidade de Lagarto, o Campus Universitário Prof. Antônio Garcia Filho, foi o segundo a ser descentralizado da capital (o primeiro foi o de Itabaiana), com a proposta de interiorizar a prática médica através desses novos cursos e proporcionar, sobretudo, uma interação ativa entre aquilo que estava sendo oferecido pela universidade e o Sistema Único de Saúde (SUS). O que, necessariamente, resultou na escolha das chamadas metodologias ativas ­ Problem Based

Learning (PBL) ­ em português, Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP). Essa proposta pedagógica é diferente do modelo oferecido no curso tradicional, do Campus de São Cristóvão. Nela, o aluno interage com a comunidade através do Sistema Único de Saúde (SUS). Eles não têm semestre, são cursados ciclos anuais (seguem um ano letivo). “A ideia era que houvesse essa interação e o aluno fosse preparado desde o início para a atenção básica de saúde, proporcionada pelo SUS. Não só a população de Lagarto, mas também de cidades próximas estão sendo beneficiadas”, comenta o Pró­ Reitor de Graduação, Jonata Silva Menezes. Segundo o Pró­Reitor, os alunos matriculados nos cursos menos procurados do Campus Lagarto (Fonoaudiologia, Terapia Ocupacional, Nutrição, Farmácia, Enfermagem e Fisioterapia) são oriundos de diversas cidades sergipanas. Já os mais procurados, Medicina e Odontologia, ainda agrega, na sua maioria, alunos de outros estados. O professor do curso de Me-

Campus Lagarto, recém inaugurado e oferecendo cursos nas três grandes áreas do saber

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josiesaints@gmail

dicina, Mauro Oliveira Santos, Nefrologista e Especialista em Clínica Médica, avalia a estrutura do campus como algo que vem se desenvolvendo. Segundo ele, a capacidade técnica dos cursos vem aumentando em termos de salas e laboratórios. “As atividades didáticas realizadas pelos alunos em sala de aula estão sendo satisfatórias para os objetivos que estamos propondo. Há, também, a questão da ampliação dos campos de trabalho, de estágio, em termos de saúde coletiva e saúde hospitalar. Os alunos cursam uma disciplina chamada ‘Habilidades e Atitudes em Medicina’ onde uma parte dessas atividades é realizada dentro do Hospital Regional de Lagarto e, fora isso, eles têm uma outra atividade ‘Prática do Ensino na Comunidade ­(PEC)’ que é uma inserção em comunidade, realizada nos municípios próximos da região”, explica.

As estudantes de Enfermagem Malena Carvalho e Nívea Lisbela Fontes são alunas da primeira turma (2011). Malena é de Lagarto e diz ter escolhido estudar no Campus do município pela proximidade. A aluna do último ciclo diz ainda que, no momento, a estrutura é conveniente, mas não tanto, porque o processo de mudança ainda deixou algumas falhas. “Estão tentando amenizar, implantaram ar-condicionados, bebedouros, mais salas. A dificuldade maior mesmo foi no início, pois estudávamos num polo onde antes funcionava uma escola estadual”, comenta Malena. Nívea, que mora em Itabaiana, fala que optou por estudar no Campus de Lagarto devido à proximidade do município onde reside e por ele ser voltado para a saúde, já que era a área que queria seguir. “Não foi tudo que imaginei. Como somos alunas da primeira turma, passamos por grandes dificuldades não só de estrutura, mas também de questão organizacional do curso. Um problema que observamos é a questão do deslocamento, pois o campus fica numa área onde não há acessibilidades de transportes, o que dificulta bastante, além Número 2, 2015.1


EDUCAÇÃO Elson Mota

da insegurança. Aqui não há lanchonete, para almoçar temos que nos locomover e ficamos assustadas em sair daqui do espaço, ter que pegar o transporte. Espero que com o passar dos anos, tudo se organize, porque o planejamento do campus é ótimo”, diz a estudante. Ambas as estudantes dizem já ter participado de manifestações.

Já a estudante do segundo ciclo de Terapia Ocupacional, Carol Souza, também do município de Lagarto, diz não ter sentido dificuldades durante a fase inicial do curso. “Quanto entrei, em 2014, ainda era o campus provisório no Colégio Estadual Professor Abelardo Romero Dantas e, agora que viemos para o campus definitivo, a diferença é notável, para melhor”, acrescenta Carol.

Até o momento, muitas já foram as conquistas, mas muitas coisas ainda precisam ser conquistadas. Não podemos esquecer que o polo é recente, nem tampouco, também, que as primeiras turmas estão se formando. Quais as perspectivas desses estudantes?! Talvez seja um pouco difícil responder. O que se sabe mesmo é que o ensino­aprendizagem proposto, ainda passa por processo de mudanças estruturais.

Carol Souza aproveita o tempo livre para estudar na biblioteca do campus

Os alunos do campus possuem um grande acervo à disposição. (Foto Elson Mota)

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MEIO AMBIENTE

Crise hídrica estimula busca por novas fontes de energia Com o declínio do nível das represas, os cientistas buscam novas maneiras de conseguir energia elétrica. Carolina Leite

Demétrius Oliveira

demetriusdoliveira@gmail.com

BRUNO ARANGUIZ

carolinaafontesleite@gmail.com

T

endo em vista o agravamento da crise hídrica no Brasil, faz-se necessário repensar o uso consciente da água, assim como o uso da energia elétrica. Grande parte da energia elétrica do nosso país, cerca de 95%, é gerada por usinas hidrelétricas. Tudo isso porque o país é rico em rios com grandes extensões, caudalosos, e correndo sobre planaltos e de depressões. Devido a esses fatores, o país possui o terceiro maior potencial hidráulico do planeta, ficando atrás somente de países como China e Rússia. A quantidade de eletricidade que uma usina hidrelétrica pode produzir depende da quantidade de água que passa pela turbina (o volume do fluxo de água) e da altura da qual a água cai (queda bruta). Quanto maior o fluxo e a queda, mais eletricidade é produ-

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Usina Binacional de Itaipu (parceria com o Paraguai) – localizada no rio Paraná tem capacidade 7.000 MW (parte brasileira)

zida. As secas afetam diretamente esse fluxo e a quantidade de energia produzida. Por isso, algumas usinas hidrelétricas possuem barragens para aumentar a queda de uma cachoeira ou para controlar o fluxo da água. Os reservatórios também são utilizados pelas usinas para armazenamento de água e uso posterior como fonte de energia (barragem de armazenamento), enquanto outras produzem eletricidade pelo uso imediato do fluxo de água de um rio (run-of-river). Normalmente as usinas hidrelétricas são construídas em locais distantes dos centros consumidores, esse fato eleva os valores do transporte de energia, que é transmitida por fios até as cidades. O investimento inicial e os custos de manutenção das usinas são elevados, porém, o custo do combustível (água) é nulo.

Em termos de tamanho e de capacidade instalada, as usinas hidrelétricas são as maiores estruturas para a geração de energia elétrica do planeta. As nações que possuem grande potencial para trabalhar com essa forma de energia são os Estados Unidos, Canadá, Brasil, Rússia e China. A maior de todas, a usina de Três Gargantas, na China, supera em quatro vezes a maior termoelétrica que já havia sido construída. O Brasil adota um sistema de geração e transmissão de energia interligado. A energia gerada em Sergipe está interligada a todos os sistemas das Centrais Elétricas Brasileiras (Eletrobrás), como a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf ), a Furnas Centrais Elétricas, e os demais sistemas geradores de energia. Exceto alguns pequenos sistemas isolados do norte do país, todos os estados são beneficiados ou pre-

judicados com o regime hídrico no sistema interligado. As usinas térmicas a gás ou óleo combustível geram energia cerca de seis vezes mais caras que o sistema hidroelétrico e são utilizadas pelo Governo Federal, através do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) quando falta água para gerar energia no país. Esses custos são assumidos pelas geradoras, transferidos para as empresas concessionárias e repassados para os consumidores, via tarifa. Portanto, a crise hídrica acarreta consequências no abastecimento e custo da energia elétrica. “Com a diminuição da vazão dos reservatórios, a produção diminuiu e o custo elevou-se”, explica o professor Cristyano Ayres, doutorando em Meio Ambiente e membro do Grupo Acqua em Sergipe. O aumento do nível de chuvas Número 2, 2015.1


MEIO AMBIENTE nenhuma forma de geração de energia que não cause nenhum impacto na natureza. No caso da energia limpa, esse impacto se restringe à região da construção da usina. Desde 2011, a Agência Nacional de Águas (ANA) antecipou que deveriam haver investimentos no gerenciamento da água para a crise não afetar a população em 2015. Para Ayres, a estiagem e as mudanças climáticas que o Brasil sofreu nos últimos tempos não é a principal causa da atual crise hídrica no país. “A crise é um problema de gestão e planejamento, a estiagem colabora, mas não é um fator determinante”, explicou o doutorando. Quando indagado sobre possíveis soluções para a crise, Ayres não vê soluções rápidas. “A curto prazo, não vejo solução. Seria necessário investir em fontes alternativas de energia, revitalização de rios, e etc, mas o custo é elevado”, afirmou. Outros tipos de obtenção de energia aparecem como alternativas, caso a crise se agrave. São elas: energia eólica, energia solar, energia maremotriz, energia geotérmica e energia nuclear. Elas são as chamadas “energias limpas” e são fontes renováveis

que não lançam poluentes na atmosfera, interferindo no ciclo do carbono, ao contrário dos combustíveis fósseis. Mesmo sendo chamadas de “limpas”, o sonho de não causar nenhum impacto ambiental ainda não se tornou realidade. Apesar disso, os problemas gerados por elas não interferem em nível global. Os cientistas ainda não tem como afirmar se é possível sobreviver somente com energia limpa. A energia das usinas eólicas é tão descontínuo quanto o vento, e por isso serve para garantir fornecimento de eletricidade firme, contínuo e regular. A energia nuclear ainda apresenta grandes riscos de acidentes. A energia solar ainda apresenta um custo elevado. O modo como produzimos essa energia, porém, está se tornando cada vez mais crucial. SERGIPE A busca por outras fontes de energia em Sergipe é importante para contribuir com a segurança energética do país e do estado, fomentar pesquisas e desenvolvimento tecnológico, diversificar a matriz energética do estado e combater o aquecimento global. Pensando nisso, foi inaugurado em 2013, o Parque Eólico de Sergipe, no município de Barra dos

Coqueiros. Com um investimento de R$ 125 milhões, o Parque possui 23 torres de 100 metros e sua capacidade de produção chega a 35 MW (megawatts de energia), suficiente para abastecer uma cidade com 120 mil habitantes. A instalação da Central Geradora (CGE) da Barra dos Coqueiros visa suprir a necessidade de produção de energia elétrica em virtude das alterações climáticas e também a preocupação da população em produzir energia limpa, segura e ecologicamente correta. O projeto obteve financiamento de US$ 56 milhões do China Development Bank (CDB). A CGE serve principalmente para criar uma reserva de energia para os períodos de estiagem, onde não haverá riscos de desabastecimento elétrico, ocasionado pela baixa dos rios que sustentam as usinas hidrelétricas, que são a base do abastecimento do país. O Sergipe Parque Tecnológico (SergipeTec) mantém uma linha de pesquisa para potenciais sítios eólicos que possam atrair investidores para novos parques eólicos no estado. Para os próximos dois anos de estudos e viabilização do projeto, estão sendo adquiridos equipamentos que serão instala

ANTÔNIO FLORÊNCIO

é a esperança para que haja um controle tanto do preço como produção. “Este ano os reservatórios estão com os níveis mais baixos do que estavam no ano passado. A esperança é que chova muito em Minas Gerais para encher as represas de Três Marias e de Sobradinho e aliviar a geração de energia no Nordeste. Caso contrário, podemos ter energia mais cara e racionamento ainda esse ano ou no início do próximo ano”, alerta o gestor de pesquisa e desenvolvimento do Sergipe Parque Tecnológico (SergipeTec), Francisco Pedro de Jesus Filho. Em um mundo cada vez mais dependente de eletricidade, nossa maior fonte de energia passa por uma crise, e com isso aparece a necessidade de obtê-la de outra forma. Entretanto, não se pode pensar só na produção energética sem pensar no meio ambiente. Os cientistas estão cada vez mais pesquisando novos modelos energéticos, pois os combustíveis fósseis não são renováveis e, portanto, um dia irão se esgotar. Pensar cada vez mais em um mundo sustentável e menos poluente colabora com a busca por fontes mecânicas ou elétricas que sejam limpas. É bem verdade que, até o momento, não se descobriu

Usina de Xingó - localizada no rio São Francisco tem capacidade de 3.160 MW menor hidelétrica em potência

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BRUNO HUBERMAN

MEIO AMBIENTE

dos ainda este ano. Apesar de mais de R$ 600 mil de investimento da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) do Governo Federal, ainda serão necessários investimentos de R$ 450 mil nos próximos anos para monitoramento e elaboração do Atlas Eólico de Sergipe. Havendo continuidade das ações, em até três anos, novos parques eólicos poderão ser viabilizados em Sergipe. Para Francisco Pedro de Jesus Filho, gestor de pesquisa e desenvolvimento do SergipeTec, existe outra razão para o interesse no desenvolvimento de energia eólica em Sergipe. “Os estados que sediaram parques eólicos atraíram investimentos para instalação de indústrias que produzem componentes e aerogeradores utilizados nos parques eólicos, gerando emprego e renda no local”, explica. De acordo com o gestor, além da energia eólica, o estado produz energia da biomassa da cana-de-açúcar e tem potencial para produção de energia solar em grandes volumes com concentradores solares e sistemas fotovoltaicos.

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Usina de Tucuruí – localizada no rio Tocantins tem capacidade de 8.360 MW e é a maior produtora de energia do país

Como também pode produzir a energia híbrida, que consiste na união de duas ou mais energias renováveis para maior eficiência e equilíbrio no fornecimento energético. No caso de Sergipe, seria a possibilidade da combinação de energia solar com o gás natural, apesar da limitação da rede de gasodutos e de suprimento de água para geração de vapor. Segundo Francisco Pedro a produção das energias limpas tem atraído grandes investimentos. “No momento existe um grupo de investidores com projeto de geração de energia térmica a gás natural de grande porte, com interesse em investir em Sergipe. Em média, é necessário de dois a três anos para viabilizar um projeto desses” conta Francisco. “Quebrando alguns paradigmas, Sergipe também poderia gerar energia com a ‘reciclagem energética do lixo’, tanto lixo urbano, de varrição das ruas e poda de árvores, quanto lixo hospitalar. Afinal, existe mais 600 usinas dessas em operação no mundo, mais de 70 somente na Alemanha”, completa o gestor do SergipeTec.

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MEIO AMBIENTE ENTENDA MELHOR AS MANEIRAS DE SE PRODUZIR ENERGIA ELÉTRICA Energia eólica: São instaladas hélices presas (eólias) em um pilar que captam a energia mecânica produzida pelos ventos e a transformam em energia elétrica. Seu rendimento depende da rapidez e constância dos ventos na região. As vantagens: Impacto ambiental é praticamente nenhum, e o custo de geração de eletricidade é baixo. Fonte inesgotável de energia; abastece locais aonde a rede elétrica comum não chega.

Desvantagens: A instalação desse tipo de usina pode causar alteração na paisagem, poluição sonora, interferência em transmissões de rádio e televisão, além da ameaça aos pássaros. Maiores produtores: Alemanha, Espanha e EUA.

Energia solar: É obtida através de painéis solares que captam a energia do sol. Essa energia térmica captada pode ser usada de modo direto em residências, como para aquecer a água do chuveiro ou aquecer ambientes, e pode também ser usada indiretamente para a geração de energia elétrica. Vantagens: Depois de prontas para uso, não geram poluição alguma, seu impacto ambiental é insignificante. Fonte inesgotável de energia; equipamentos de baixa manutenção; abastece locais onde a rede elétrica comum não chega; Recebemos do Sol uma quantidade 10 mil vezes maior de energia do que a necessária para a população mundial em um ano; Gasto inicial pode ser compensado pela economia na conta de energia elétrica convencional.

Desvantagens: Como é necessário extrair e processar silício para produzir os painéis solares, o que gera poluição (mas que pode ser controlada); além disso, o custo ainda continua elevado para a maioria da população, seu rendimento é baixo, sendo de apenas 25%, principalmente porque seu sistema de armazenamento de energia é pouco eficiente, sua produção oscila conforme o clima e à noite não existe produção. Produção interrompida à noite e diminuída em dias de chuva, neve ou em locais com poucas horas de sol. Os maiores produtores: Japão e EUA.

Energia maremotriz: Num processo similar ao da energia eólica, a energia cinética proveniente das ondas dos mares é aproveitada para gerar energia elétrica ao passar pelas turbinas. Esse tipo de energia é produzido por meio da instalação de turbinas perto dos mares, em que se produzirá energia elétrica por meio da energia potencial das ondas do mar. Franca, Inglaterra e Japão são os pioneiros na produção.

Vantagens: É uma fonte de energia abundante capaz de abastecer milhares de cidades costeiras.

Desvantagens: a diferença de nível das mares ao longo do dia deve ser de ao menos 5 metros; produção irregular devido ao ciclo da maré, que dura 12h30. Rendimento é baixo e o fornecimento de energia não é contínuo. Ainda não existe tecnologia para exploração comercial. Rendimento é baixo e o fornecimento de energia não é contínuo. Ainda não existe tecnologia para exploração comercial. Energia geotérmica: É a energia calorífica da terra. Ela é oriunda do magma que fica a menos de 64 km da superfície terrestre. Esse calor faz a água de camadas subterrâneas evaporar e esse vapor é conduzido por meio de tubos até lâminas de uma turbina que são giradas por ele. Um gerador transforma essa energia mecânica em elétrica.

Vantagens: As centrais geotérmicas, como vento e centrais solares, não têm de queimar combustíveis para manufaturar o vapor para mover as turbinas. A geração de eletricidade com a energia geotérmica ajuda a conservar combustíveis fósseis não renováveis, e reduzindo o uso desses combustíveis, reduzimos emissões que prejudicam a nossa atmosfera. Não prejudica a terra. É resistente a interrupções de geração de energia devido a condições atmosféricas, catástrofes naturais ou cisões políticas que podem interromper o transporte de combustíveis. Desvantagens: Se não for usado em pequenas zonas onde o calor do interior da Terra vem à superfície através de gêiseres e vulcões, então a

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perfuração dos solos para a introdução de canos é dispendiosa. Os anti-gelificantes usados nas zonas mais frias são poluentes: apesar de terem uma baixa toxicidade, alguns produzem CFCs e HCFCs. Elevado custo de manutenção. Energia hidráulica: É obtida através da construção de usinas hidrelétricas que aproveitam o movimento das águas de rios que possuem desníveis naturais ou artificiais. Vantagens: O seu rendimento é muito superior aos outros.

Apesar do alto custo para a instalação de uma usina hidrelétrica, o preço do seu combustível (a água) é zero. É uma fonte de energia renovável e não emite poluentes, contribuindo assim na luta contra o aquecimento global. E para um país como o Brasil, cortado por imensos rios, torna-se uma fonte de energia vantajosa e altamente sustentável.

A energia hidrelétrica uma fonte constante, confiável e renovável de energia limpa, e assim a mais importante.

Quase 20% da eletricidade mundial é produzida por energia hidrelétrica.

A energia hidrelétrica é um das fontes de eletricidade que menos geram gases de efeito estufa, sendo 60 vezes menos que usinas movidas a carvão e 18 vezes menos que usinas movidas a gás natural. - A água represada pode, dependendo do projeto, ser usada para irrigação de plantações nas proximidades da usina. - Através da represa é possível regular a vasão do rio.

- Custo operacional baixo, pois as usinas atuais são automatizadas.

- Como não há uso de combustíveis fósseis (gasolina, diesel) ou gás, os preços da energia elétrica gerada para o consumidor final não sofrem grandes alterações, pois não há influência de aumentos de preços destes combustíveis fósseis. Desvantagens: Os seus impactos ambientais são imensos, incluindo destruição de ecossistemas, alteração de paisagens, alagamentos, bloqueio nos rios e deslocamento da população que morava no local onde a usina foi construída.

Quando o nível pluviométrico torna-se menor que o esperado, as hidrelétricas ficam com níveis de água abaixo do requisitado para a produção de energia normal e a geração de energia é transferida para outros tipos de usinas como as termelétricas e nucleares, encarecendo a conta do consumidor.

Maioria dos países não possuem as condições naturais necessárias para a construção dessas usinas. O aumento ou diminuição do fluxo de água que sai das barragens pode afetar a vida nos ecossistemas dos rios.

Energia nuclear: As reações de fissão nuclear resultam na emissão de uma quantidade colossal de energia, que é usada nessas usinas para aquecer a água. O vapor gerado faz as turbinas girarem, produzindo energia elétrica. Desvantagens: A construção e manutenção de uma usina nuclear possui custo muito elevado, riscos de acidentes, problemas com o lixo nuclear gerado e ainda tem o problema da água aquecida que retorna aos lagos, rios e mares, podendo causar a morte de peixes e outros seres vivos.

Vantagens: Apesar desse tipo de energia envolver altos riscos de contaminação, isso só acontece se houver acidentes ou se o lixo atômico não tiver um tratamento e destino corretos. Mas se tudo transcorrer bem, a energia nuclear é considerada limpa, pois não causa poluição pela emissão de substâncias. A maior vantagem desse tipo de energia é a grande quantidade de energia elétrica que é gerada.

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MEIO AMBIENTE

Você sabe como funciona a energia Eólica? LEIA O TEXTO E DESCUBRA A RESPOSTA

ANDRÉ MOREIRA

Deyse Tuanne annie_ufs@hotmail.com

V

ocê já se perguntou de onde vêm e como é gerada a energia eólica? A energia eólica é um tipo de energia que vem dos ventos, convertendo essa energia em energia elétrica. Acredita‐se que foram os egípcios os primeiros a fazer uso prático do vento. Em torno do ano 2800 A.C., eles começaram a usar velas para ajudar a força dos remos dos escravos. Eventualmente, as velas ajudavam o trabalho da força animal em tarefas como moagem de grãos e bombeamento de água. Mas, o processo de gerar eletricidade através do vento, começou somente por volta do início do século XX, com alguns dos primeiros desenvolvimentos creditados aos dinamarqueses.

Para a professora da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Elizabeth Cartaxo, Doutora em Planejamento de Sistemas Energéticos, o uso do vento como fonte de energia na antiguidade, tinha como foco o

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movimento dos barcos a vela, a trituração de grãos, o bombeamento de água, entre outras formas de uso. “A partir do desenvolvimento tecnológico de turbinas mais eficientes com 2 ou 3 pás foi possível fazer uso desse recurso para a produção de energia elétrica”, explica.

Em Sergipe, esse tipo de energia é produzido no Parque Eólico da Barra dos Coqueiros. Inaugurado em janeiro de 2013, pelo então governador de Sergipe, Marcelo Déda, o parque tem a capacidade de gerar 34,5 megawatts de energia. Segundo a ABEE, os estados do Ceará, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Bahia e Santa Catarina são os que figuram a maior capacidade instalada de energia eólica em operação comercial. O estado do Ceará lidera a região do nordeste em potencial instalado, quando se fala em energia

eólica. Com relação ao histórico de geração, nos últimos 13 meses, dentre os cinco estados com os maiores montantes gerados de

energia eólica, estão os estados do Ceará, Rio Grande do Norte e Rio WGrande do Sul, que apresentaram as médias de 288 MW, 166 MW e 110 MW, respectivamente. Um fato curioso é que o potencial da energia eólica no Brasil é mais intenso na época de junho a dezembro, meses de menor intensidade de chuvas. O que coloca o vento como uma fonte de grande potencial suplementar de energia.

O processo de geração da energia eólica se dá por meio de aero geradores. Um aero gerador é um gerador elétrico integrado ao eixo de um cata‐vento e que converte energia eólica em energia elétrica. Pode ser implantado em terra ou mar (offshores), onde a presença do vento é mais regular.

Esse equipamento ficou conhecido por ser uma fonte de energia renovável, além de não poluente. Elizabeth Cartaxo, explica de forma mais fácil como ocorre esse processo de conversão desse vento que chega nos parques eólicos em ener-

PARQUE EÓLICO DA BARRA DOS COQUEIROS

gia limpa: “O princípio é o mesmo de um moinho de vento, ou seja, é uma turbina de vento de 2 ou 3 pás. O vento faz girar um rotor composto pelas pás.

O rotor está conectado a uma haste engrenada num gerador elétrico que converte em eletricidade. Como o ar apresenta baixa relação entre massa e volume (densidade), as lâminas (pás) da turbina têm que varrer uma área grande para produzir uma quantidade significativa de energia. Razão porque são necessárias estruturas altas e extensas pás para cobrir essa varredura objetivando obter maior produção de energia. Essa energia pode ser armazenada numa bateria ou entregue à rede”.

Os parques eólicos são formados por esses conjuntos de aero geradores, que são instalados em áreas de ventos fortes e constantes. Mas, para que haja a instalação de um parque desse tipo, é preciso um planejamento ambiental. Segundo Emanuela Carla Santos, Analista Número 2, 2015.1


MEIO AMBIENTE Ambiental da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (SEMA), para qualquer empreendimento é necessário requisitar um Estudo de Impacto Ambiental e um Relatório de Impacto ao Meio Ambiente – EIA /RIMA, que descrevem todos os impactos possíveis e as medidas de mitigação. O empreendimento somente é aprovado após a análise destes documentos. Esse é um tipo de fonte de energia limpa e renovável e que merece um investimento ainda maior do que o que já é feito. Um tipo de energia como esse tem um grande potencial para crescer, levando em consideração o fato de que vivemos em um mundo cada vez mais preocupado com os recursos naturais e como protegê‐los. Com tantas vantagens ao lado desse tipo de produção de energia, não é à toa que em recente entrevista coletiva realizada em um evento da Organização das Nações Unidas (ONU), que aconteceu

na cidade de Nova York (EUA), a Presidente da República, Dilma Rousseff, afirmou em seu pronunciamento, que seria muito bom se inventassem uma tecnologia capaz de estocar o vento, da mesma forma que se estoca água. Esse comentário foi motivo de chacota para algumas pessoas, mas levou outras a se perguntarem: Seria possível armazenar o vento? Por enquanto, ainda não. Mas ninguém sabe o que o futuro pode reservar, não é?

Recentemente a BBC de Londres divulgou um vídeo sobre o plano da União Europeia para armazenar vento em cavernas. De acordo com esse vídeo, a energia natural é fácil de se obter quando há uma frequência de vento, porém para os lugares onde não há vento, a saída é a estocagem.

Segundo o vídeo, é um processo que exige máquinas para enviar um

volume maior de vento para dentro da caverna. Desse modo, terão ar comprimido para venda se for necessário. De acordo com os técnicos do vídeo, haverá a necessidade de uma tubulação para que sempre tenha vento entrando na caverna e suprindo o estoque. A energia gasta será reciclável para outros fins, e a construção totalmente inserida na natureza, sem danos. A energia pode ser catalisadora, ou pode ser até perigosa. Mas o vento é sempre necessário, pois ele e o ar suprem necessidades e criam a energia necessária para tudo que se movimenta. Em relação aos custos, vantagens e desvantagens, como a maioria das formas de geração de eletricidade requerem altíssimos investimentos de capital e baixos custos de manutenção, a energia eólica, não foge dessa regra. Os custos com a construção de cada aerogerador de alta po-

tência podem alcançar milhões de reais, porém os custos com manutenção são baixos, e o custo com o combustível é zero. Nesse caso, há vantagens e desvantagens, e no cálculo de investimento e custo nesta forma de energia deve‐se levar em conta diversos fatores como: a produção anual estimada, as taxas de juros, os custos de construção, de manutenção, de localização e os riscos de queda dos geradores. Levando em conta todos esses fatores, os cálculos sobre o real custo de produção da energia eólica divergem muito, de acordo com a localização de cada usina. Bom, agora que você já sabe como funciona a energia eólica em diversos aspectos, que tal fazer uma visita ao Parque Eólico mais próximo para ver esse grande processo ao vivo?

ELIZABETH CARTAXO

COMPONENTES BÁSICOS DE UM SISTEMA DE ENERGIA EÓLICA

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MEIO AMBIENTE

A degradação ambiental determina a u

ENTRE MANGUEZAIS, ESGOTOS, O RIO E O MAR, O BAIRRO EXPANDIU DE FORMA DESORDENADA DORES RODEADA DE CASAS DE VERANEIOS, HOJE TORNOU-SE ÁREA NOBRE.

A

o longo dos 160 anos de fundação da cidade de Aracaju, o território que hoje compreende o bairro 13 de julho, situado próximo ao encontro dos rios Poxim e Sergipe, passou por profundas transformações urbanísticas. O local, por sua localização estratégica em relação às outras áreas da cidade e por possuir uma das mais belas vistas da região, é um dos mais valorizadas da capital sergipana. Inicialmente, a região era denominada de Ilha dos Bois e, no ano de 1872, foi vendida ao Governo Imperial, por José Honório dos Santos. Este é o registro mais antigo que se tem do local. No final do século XIX, por ser uma área ribeirinha, começou a ser povoada por marujos e pescadores, que tiravam o sustento da família explorando a perigosa Barra do Cotinguiba (antigo nome do Rio Sergipe).

No início do século XX, os banhos de praia em águas salgadas começaram a se popularizar como forma de lazer. Assim, o lugar passa a se chamar Praia Formosa. A beleza do encontro da barra do Rio Sergipe com a foz do Riacho Tramandaí, conhecida como Quatro Bocas, atraiu as pessoas. As areias brancas e águas limpas à época também serviram de atrativos. O escritor e memorialista Murillo Melins ainda tem uma memória viva do lugar e do tempo em que passou ali. “Minha família tinha casa lá. Depois que passava as festas de final de ano, nós íamos veranear lá e passávamos três meses. A Praia Formosa era a praia principal de Aracaju. A Atalaia era distante e de difícil acesso na época e o trecho do rio no bairro Industrial já era poluído por causa das fábricas de tecidos que jogavam os dejetos ali”, contou. Ele ainda acrescenta que as pessoas que residiam ali eram em sua maioria pescadores e marujos, mas que muitas pessoas tinham casas de praia por lá. A praia já não está mais formosa, porém ainda conserva um dos cenários mais bonitos da cidade. Quem passa de carro pela avenida Beira-Mar com certeza se deslumbrará

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com a beleza do rio Sergipe, apesar do mal cheiro que hoje impregna toda aquela área, em decorrência dos esgotos que deságuam para lá. O tempo do banho na perigosa “Quatro Bocas” também é coisa do passado. Onde existiam as choupanas de pescadores e dos poucos aventureiros que se deslocavam para a região da praia, hoje estão erguidas mansões e casas elegantes em estilo moderno, daqueles que decidiram investir alto para morar em zona nobre. Por isso mesmo, quando se é avistada uma das poucas casas que remontam à velha época, o panorama se adapta ao bucólico, em virtude das lembranças que vêm à tona na cabeça dos moradores, que chegaram na Praia Treze de Julho, quando existiam apenas os areais, mangues e muitos carangueijos. A marinete que dava acesso ao local tinha como final de linha o ponto onde agora está instalado o Posto Aracaju, já na entrada da avenida Anísio Azevedo. Mesmo assim ela fazia apenas uma volta pelas avenidas ao entrar nas ruas do bairro, todas de piçarras e com muitas lagoas, afinal tudo era mangue que aos poucos foi sendo ocupado. ”Muitos pobres que moravam na área em casas de palha, viviam da pescaria de peixes e do maçunim que serviam até mesmo para alimentar as famílias sem esquecer dos banhos que

hoje não existem mais por causa do esgoto, que é a maior reclamação dos antigos moradores, que hoje são obrigados a conviver com o mal cheiro. Nosso ponto de namoro na juventude era onde hoje estão situados o Constâncio Vieira e a Biblioteca Pública. Tempos bons que não voltam mais, assim como os arraiás e blocos de micaretas que fazíamos pelas ruas durante as festas juninas”, afirma Murillo.

Somente em 1950, no governo de Leandro Maciel, é que o bairro começa a ser urbanizado. Foram criados loteamentos destinados às classes mais ricas que ergueram casarões e ruas calçadas com paralelepípedos. A avenida que ali existia foi denominada posteriormente de Beira Mar, ligando o Centro de Aracaju à praia de Atalaia. Em 1953, o Iate Clube foi construído no lugar onde ficava o Inflamável, um antigo depósito onde se estocava e vendia querosene para as embarcações que atracavam no extinto porto de Aracaju. O Estádio Lourival Baptista foi construído em 1969 e um ano mais tarde, a nova sede da Biblioteca Epifânio Dória. Lançados a partir da década de 80, os luxuosos edifícios residenciais substituíram quase a totalidade dos antigos casarões existentes ali. O Calçadão da Treze de Julho foi construído na década de 90 e se tornou o grande ponto turístico da região.

Hoje, o bairro exibe ares modernos, característicos de uma severa adaptação ao progresso e nesse processo sofreu com os impactos ambientais. A poluição, o mau-cheiro e os problemas com o escoamento de água, principalmente em períodos chuvosos, são hoje os maiores problemas do bairro, que apesar de todos essas questões possui o metro quadrado mais caro da cidade. Processo de aterramento do manguezal

Sergipe é banhado por oito bacias hidrográficas e dessas, duas banham Aracaju, que são as do Rio Sergipe e a Rio Vaza Barris. O Rio Sergipe, principal curso da bacia, ao se adentrar a capital, passa pelos bairros Porto Dantas, Industrial, Centro, São José, Treze de Julho e Coroa do Meio. Com 210 km de extensão, nasce na Serra da Boa Vista, na fronteira da Bahia e deságua no oceano, na divisa entre Aracaju e a Barra dos Coqueiros. Com a mudança da capital em 1855, o período de implantação de Aracaju, caracteriza-se pelas medidas de fixação do aparato administrativo, pela construção do porto e por um pequeno crescimento espacial. Outro fato a se destacar nesse momento inicial, é a necessidade de aterros e a luta contra os mosquitos transmissores de doenças. Na carta Número 2, 2015.1


MEIO AMBIENTE

urbanização do bairro Treze de julho?

A ALTERANDO A MEMÓRIA COLETIVA DA REGIÃO. O QUE ANTES ERA UMA COLÔNIA DE PESCAEdson Romeiro

mega_rtv@yahoo.com.br hidrográfica do sítio original, além do Rio Sergipe, existiam ainda os riachos Aracaju, Caborge, Tramandaí e Olaria, hoje canalizados ou aterrados e distantes da memória coletiva da cidade. O manguezal e as lagoas faziam do ambiente natural um verdadeiro domínio aquático, cuja ocupação exigia uma espécie de reconstrução. Muitas das primeiras construções necessitaram de aterros e drenagem para se converterem em lugares habitáveis. A ameaça à saúde pública e a necessidade de obras de engenharia tornaram inviáveis, durante muitos anos, a possibilidade de Aracaju como capital de Sergipe.

No estuário do Rio Sergipe, embora os manguezais estejam adaptados para se desenvolverem sob condições de elevadas temperaturas, substratos anaeróbios e flutuações na salinidade, há certas situações, tanto naturais, quanto induzidas pelo homem, que lhe são extremamente vulneráveis. Os mangues ribeirinhos, notadamente os da margem direita do Rio Sergipe, onde se localiza Aracaju, apresentam-se degradados em face das atividades humanas exercidas ao longo do tempo. Parcela considerável dos terrenos que compõem a parte plana da cidade de Aracaju era originalmente coberta por mangue. O crescimento da sua área física foi realizado através de cortese aterros dos mangues, o que vem ocorrendo até os dias atuais pelo fato de ser uma área de intensa especulação imobiliária. O processo de aterramento dos lagos e mangues e a canalização do riacho Tramandaí e o despejo de esgotos in natura concentrado de matéria orgânica, fez surgir o manguezal que margea o calçadão.

pedras, do outro lado do rio, na Barra dos Coqueiros, para conter a alteração da correnteza. Desde então, houve uma mudança ambiental que agora afeta o bairro 13 de Julho.

Para o coordenador do Laboratório Geo, Rio e Mar, da Universidade Federal de Sergipe (UFS), professor Luiz Carlos Fontes o mangue está sendo sufocado por areia trazida por ondas, ou seja, a mesma matéria orgânica que criou o mangue não esta mais exercendo a função de nutrí-lo. “Tudo faz parte de um mesmo processo”, explica.

Em relação às obras de contenção e aterramento do rio Sergipe, que iniciaram em 2013 e passou por diversos entraves judiciais, o professor possui um posicionamento crítico em relação à forma como ela é conduzida. “Essa obra antes gera um impacto local e pode modificar também essa dinâmica mais ampla que envolve a foz do Rio Sergipe. O estuário do rio é um encontro dele com o Rio Poxim. Essa área é caracterizada por ser de deposição de sedimentos. Essa conformação deveria ser estudada. A prova disso são as formações de croas dentro do rio. Com o passar do tempo, a área do rio que passa próximo a ponte da Coroa do Meio forme croas de areia e una as duas margens do rio. Essa é uma dinâmica que já existe nesse local, mas que foi influenciada de forma negativa pelas

intervenções humanas”, afirma.

Fontes ainda faz um alerta importante sobre o assoreamento do rio: “A obra emergencial deveria ter sido feita para evitar possíveis riscos a curto prazo e com estudos de uma equipe multidisciplinar, se chegar a uma intervenção definitiva. Mas sempre com base em análises ambientais procurando alternativas que não agridam a paisagem natural do lugar”. A origem do nome 13 de Julho

Em 13 de julho de 1924, na Praia Formosa, tropas rebeladas do Exército Brasileiro entrincheiraram-se na barra do Rio Sergipe à espera de possíveis forças federais que ameaçariam os tenentes rebeldes. O episódio está ligado ao Movimento Tenentista, que aconteceu durante a República Velha (1889-1930).

As tropas foram deslocadas também para as fronteiras de Sergipe. Neópolis, uma das cidades fronteiriças do estado, ofereceu grande resistência, durante vários dias, aos combatentes do Norte, que estavam aquartelados na cidade alagoana de Penedo e armados em barricadas. Na parte sul, o deslocamento de soldados foi um tanto deficiente, devido à esperança que Sergipe depositava nos militares do estado da Bahia. Mas, por incrível que pareça, eles

possibilitaram a entrada vitoriosa do movimento contrário, justamente pela fronteira sul, que mal armada não pôde conter os adversários.

Do lado esquerdo da Praia Formosa, exatamente onde hoje é o Iate Clube de Aracaju, as tropas fizeram o seu quartel general. Os soldados armados com canhões, metralhadoras, fuzis e revólveres, concentraram-se na curva que o Rio Sergipe faz para o lado direito, em direção ao mar. Durante 21 dias, as tropas aquarteladas na Praia esperaram o temido visitante, que poderia ter vindo em navios ou mesmo submarinos, porém nada foi registrado. Enquanto a pressão maior dos soldados se concentrava na Praia Formosa, a fronteira norte conseguia resistir. Já a sul permitiu a entrada do inimigo em Aracaju, e este, de imediato, tomou o Palácio do Governo. Em outubro de 1930, em uma reviravolta política, os antigos tenentes ascenderam ao poder em nível nacional, após a denominada revolução, sob liderança de Getúlio Vargas (1883-1954). Então, em 27 de novembro daquele ano, instituiu-se, através do Ato Municipal nº 11, a mudança de nome Praia Formosa para bairro 13 de Julho. Uma homenagem dos representantes do governo revolucionário ao levante dos tenentes naquele local, dia e mês de 1924.

As obras de contenção

O estuário do Rio Sergipe vem sofrendo com as constantes intervenções do homem em sua dinâmica, desde a construção do bairro Coroa do Meio, região que precisou ser aterrada e onde foi feita uma contenção de pedras para impedir o avanço das águas do rio. Por ser uma área de foz, a força dessas águas é grande. A obra completa também envolveu a construção de outra contenção de Número 2, 2015.1

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MEIO AMBIENTE

Cresce a produção orgânica em Sergipe AGRICULTURA SEM USO DE AGROTÓXICOS TEM GERADO RENDA E DESENVOLVIMENTO NO AGRESTE SERGIPANO Elienai de Jesus Wilmarques Santos

wilmarques.santos@hotmail.com WILMARQUES SANTOS

elienaidejesus@gmail.com

A

agricultura orgânica tem ocupado cada vez mais espaço no cenário agrícola do país. Segundo dados do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), em 2014, a atividade movimentou cerca de R$ 2 bilhões e a expectativa é que em 2016 este número alcance R$ 2,5 bilhões. A projeção é que o mercado nacional de orgânicos cresça entre 20% e 30% no ano que vem.

Em Sergipe, o cenário não é diferente. De acordo com dados da Empresa de Desenvolvimento Agropecuário de Sergipe (Emdagro), somente no município de Itabaiana se produz por ano aproximadamente 520 mil quilos de produtos orgânicos. Entre os principais, estão as hortaliças, frutas, folhas e

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raízes. Os municípios de Areia Branca, Malhador e Campo do Brito também têm se destacado nesse tipo de produção.

Sergipe possui atualmente mais de 50 agricultores orgânicos certificados ou com declaração de controle social em atividade orgânica. A certificação é concedida pelo Instituto Biodinâmico, que acompanha o processo de transição da produção convencional para a orgânica e posteriormente outorga o produto com o selo de garantia da procedência.

As hortaliças representam hoje o carro chefe dessa produção, a exemplo do coentro, um dos mais vendidos. A busca dos consumidores por produtos orgânicos impulsionou um crescimento de 2,5% na produção obtida no período de 2012 a 2014,

Plantação de coentro: uma das hortaliças mais vendidas em Sergipe

conforme dados da Emdagro.

Diversas iniciativas são realizadas no Estado para estimular a produção de orgânicos. Segundo a Engenheira Agrônoma e Especialista em Agroecologia Jailza Siqueira, a busca no mercado por produtos orgânicos tem aumentado, o que estimula os agricultores a aderirem a esse tipo de produção.

Jailza Siqueira coordena o Programa Estadual de Agroecologia, desenvolvido pela Emdagro em Sergipe. “Nós trabalhamos dando assistência técnica aos agricultores do Estado, instruindo-os sobre as técnicas de produção saudáveis e de baixo custo, para que eles passem a trabalhar com o método orgânico, sem uso de agrotóxicos”, explica. Siqueira ainda ressalta a im-

portância de um trabalho de intervenção realizado em parceria com o Ministério Público do Trabalho. Segundo ela, foram feitas fiscalizações rigorosas com relação à utilização de agrotóxicos e orientação técnica aos agricultores para minimizar os efeitos prejudiciais gerados pelos produtos químicos nas lavouras. Como resultados de todas as ações de estímulo a produção orgânica ela destaca o seu crescimento no mercado. “Os produtos orgânicos ganharam cada vez mais espaço nas prateleiras e hoje podem ser encontrados em diversos lugares como feiras livres, lojas e supermercados”, conclui. A Aspoagre

A região de Itabaiana, que é situada no Agreste Central Sergipano, possui dois perímetros Número 2, 2015.1


MEIO AMBIENTE WILMARQUES SANTOS

gânicos. Entre elas, está que o alimento orgânico é mais nutritivo e saboroso, pois sem agrotóxicos, o produto se desenvolve naturalmente e os alimentos têm maior durabilidade e aroma intenso. Já com relação aos produtos cultivados com o uso de agrotóxicos, está provado que a ingestão de substâncias químicas prejudica o organismo e os resíduos que ficam nos alimentos podem provocar doenças, como reações alérgicas, respiratórias, distúrbios hormonais, problemas neurológios e até mesmo câncer.

Manuel Messias: primeiro produtor orgânico do Estado. Ao fundo, prateleira de produtos orgânicos da loja da Aspoagre em Itabaiana

irrigados e tem se destacado no cultivo saudável e consciente. Lá, há vários produtores que já utilizam o modelo orgânico e outros que estão em processo de mudança. Esses produtores desafiam uma realidade assombrosa: o agronegócio brasileiro é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. O senhor Manuel Messias Costa, 67, foi o primeiro produtor sergipano a trabalhar com o método orgânico e receber o Selo de Qualidade do Instituto Biodinâmico (IBD) em 2001. “Seu Lelé”, como é popularmente conhecido, possui uma propriedade rural no Povoado Junco, do município de Areia Branca, distante 36 km da capital Aracaju, onde vive da agricultura orgânica há 30 anos. Ele conta que antes de ser agricultor, testemunhou muitos produtores terem sérios problemas de saúde devido o alto uso de agrotóxicos, e até mesmo chegando a óbito.

De acordo com o produtor, em 1985 a Emdagro viajou com quatro agricultores do Estado para conhecer uma experiência de sucesso com produtos orgâ-

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nicos em municípios do interior de São Paulo. Manuel ficou satisfeito com o que viu e assim que retornou ao seu município iniciou o cultivo de orgânicos. “Enfrentei muita resistência, foi muito difícil no começo, sozinho, isolado. Não tive apoio de ninguém, a não ser dos técnicos da Emdagro”, relata. Ele conta também que os demais agricultores que foram a São Paulo com ele não aderiram ao método orgânico. Os anos mostraram que ele tomou uma atitude corajosa para a época, em que nem se falava em produtos orgânicos, mas que hoje ele tem orgulho em saber que foi o pioneiro em Sergipe. “Ver o mercado de produtos orgânicos crescer hoje é motivo de alegria e orgulho pra mim. Me sinto vitorioso”, diz risonho.

Bruno Farias, 44, também é proprietário rural do Povoado Junco. Estimulado por amigos que eram técnicos da Emdagro e pensando na alimentação saudável ele abandonou o uso de agrotóxicos há 15 anos e também recebeu o Selo do IBD. Inicialmente ele cultivava para consumo próprio, depois come-

çou a participar das reuniões promovidas pela Emdagro com um grupo de produtores como ele, com o objetivo de formar uma associação. Em 2001, surgia a Associação de Produtores Orgânicos do Agreste Sergipano (Aspoagre), composta por 22 agricultores dos municípios de Areia Branca, Itabaiana e Malhador. Além disso, os produtos passaram a ser comercializados em uma feira montada na frente da Associação dos Engenheiros Agrônomos de Sergipe (AEASE). A procura por alimentos orgânicos cresceu e, em 2002, foi aberta a primeira loja de orgânicos da Aspoagre no centro de Itabaiana. Em 2006, surgiu a primeira loja de Aracaju, no Bairro Salgado Filho. Em agosto deste ano, outro ponto comercial foi inaugurado, desta vez, no Bairro 13 de Julho, área nobre da capital. Hoje a Aspoagre possui 14 associados, conta com uma loja no centro de Itabaiana, duas na capital Aracaju e uma feira na AEASE. Orgânicos x Convencionais

De acordo com especialistas, há inúmeras vantagens em se alimentar com produtos or-

Agda Brito, 38, é vendedora da loja da Aspoagre em Itabaiana há nove anos e filha de um produtor orgânico, já falecido. Ela diz que tem percebido uma grande procura por alimentos orgânicos nos últimos anos. “A venda desses produtos cresceu muito. Eu mesma se tiver um alimento orgânico e convencional, prefiro comprar o orgânico, por ser mais saudável, para evitar doenças, além de ser mais saboroso”, fala. José Firmino de Oliveira, 66, trabalha com orgânicos há 14 anos, em seu sítio, no Povoado Poço Terreiro, município de Malhador, localizado a 49 km da capital. Ele relata o que o levou a trocar o método convencional agrícola pelo orgânico. “Um de meus filhos, que na época tinha 27 anos, trabalhava comigo no sítio. Certa vez ele se sentiu mal e foi ao médico. Lá ele recebeu o diagnóstico de que era alérgico a agrotóxicos. A partir daí, abandonei o uso de agrotóxicos e comecei a trabalhar com orgânicos seguindo a orientação de técnicos da Emdagro”, relembra.

Firmino é presidente da Aspoagre há quatro anos, e assim como os demais associados está satisfeito com os frutos do seu trabalho. “Eu tive uma chance muito boa que foi abandonar o uso de agrotóxicos. Se não fosse a Aspoagre eu não estaria sendo agricultor”, finaliza. A preocupação com a saúde, gerada pelo surgimento de casos de intoxicação por uso de agrotóxicos tem conscientizado as pessoas a optarem pelos produtos orgânicos, que além de saborosos e nutritivos, não são prejudiciais à saúde.

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ESPECIAL

Quando outros

EXPECTATIVAS, VIVÊNCIAS E DIFICULDADES PA

Rosa descobriu que estava com insuficiência renal crônica quando engravidou do segundo filho, Rodrigo, hoje com 17 anos. Mas poderia ter descoberto bem antes, quando estava grávida de Neto (19). Na época, a sua médica pediu alguns exames para entender o motivo do aumento da pressão arterial e do princípio de eclampsia. Rosa chegou a fazer os testes, mas desistiu de entregá-los assim que percebeu uma melhora significativa de seu quadro. Este erro, segundo ela, foi decisivo. Neto havia nascido com oito meses de gestação, mas Rodrigo, devido às fortes dores, veio antes, com seis meses. A partir do nascimento de Rodrigo, e com o diagnóstico da doença em mãos, Rosa começou a sua saga, peregrinando pelas clínicas de Recife, para fazer o tratamento de hemodiálise. Quatro horas por dia, três vezes por semana, durante seis anos e nove meses. Some-se a isso: frequentes alterações de humor, os ossos ficando cada vez mais fracos. Na primeira vez que foi fazer hemodiálise ainda teve um susto: o coração parou. Mas voltou a bater pouco tempo depois. Logo, o medo de não enfrentar os aparelhos foi vencido. A nova vida de Rosa, espremida em uma rotina rígida, gerou uma reordenação da família para atender às suas necessidades básicas e, consequentemente, garantir o ritmo certo para continuar vivendo. Era fato: a hemodiálise havia aliviado algumas dores e garantido, minimamente,

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cientes em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) com morte encefálica, geralmente vítimas de traumatismo craniano ou AVC, conhecido como derrame cerebral.

ANA LÚCIA

N

o dia 22 de outubro de 2005, Rosa Maria Gonçalves dos Anjos não esperava mais nada. Aos 35 anos de idade, enfrentava o doloroso processo para um transplante de rins com a sensação de que qualquer coisa que viesse da mesa de cirurgia seria lucro. A esperança já tinha dado lugar à iminência de morte. “Eu já tinha pedido a Deus pra me levar”, reforça. Porém, quando olha para trás, surpreende-se. Não acreditava que a sua vida pudesse mudar tanto depois de um transplante.

Pesquisadora sobre doação de órgãos em Sergipe

que pudesse continuar de pé, à espera de um doador compatível.

A primeira opção, como geralmente acontece, veio da família. O seu irmão, José Gonçalves, chegou a propor: “Eu vou parar de fumar pra te doar o rim”. Quando os resultados dos exames dele chegaram, Rosa percebeu algo estranho. Decidiu levá-los à sua médica que constatou o princípio da tragédia: ele também tinha insuficiência renal crônica. “Ele ia me salvar e eu terminei salvando ele”, brinca Rosa. A saída para José Gonçalves foi a sua esposa, que doou um dos rins para ele. Rosa conta que durante o período de acompanhamento para doação, sua cunhada foi muito questionada: “Você tem certeza que vai doar? E se amanhã você se separar dele?” Ao passo que respondeu: “Pelo menos não vou ver ele sofrendo”. Com a impossibilidade de um doador na família, Rosa continuou a espera. Seu tratamento aconteceu em Recife, pois, na época, Sergipe não fazia transplantes desse tipo. Para cada sessão, um ônibus da Prefeitura levava e trazia todos os pacientes em casa. O que gerava um vínculo, solidificando amizades. Parte das esperanças e angústias eram, assim, compartilhadas. E os medos também. “Eu vivi, eu vi muitos morrerem, esperando uma

nova chance”, recorda. A participação do marido foi fundamental para suportar todo o processo de tratamento. “Ele em todo momento esteve comigo”, reforça. Mudou-se com ela para Recife, largou o trabalho, cuidou dos filhos. Enquanto Rosa realizava, com cada vez mais dificuldade, a hemodiálise, ele estava lá, suportando os impactos de uma vida vivida no limite. Talvez, até por isso, pelas vezes de cuidado e atenção, ela se refira a ele ora como um filho ora como marido e ora como amigo.

“Eu vivi, eu vi muitos morrerem, esperando uma nova chance” Interstícios para a vida: entre o doar e o receber Há dois tipos de doadores: os vivos e os não vivos. Os vivos podem ser qualquer pessoa saudável que concorde com a doação. Nesse caso, poderá ser doado um dos rins, parte do fígado, da medula óssea e do pulmão. Já os não vivos, doadores falecidos, são pa

Viviane Fernandes, doutoranda em Saúde e Meio Ambiente pela Universidade Tiradentes (Unit), lembra bem quando o tema da doação e do transplante de órgãos lhe chamou a atenção. Um amigo seu, Alisson, havia sido atropelado em frente ao Shopping Jardins, em Aracaju. Logo em seguida à confirmação de sua morte, a família foi consultada e, em meio a dúvidas, decidiu não doar. Ela, então, decidiu tomar esse caso como exemplo para, primeiro, investigar o porquê da não doação de órgãos por famílias e, depois, já no mestrado, o que envolvia o outro lado: dos transplantados.

Há ainda muita desconfiança no processo de transplante de órgãos. Sobretudo na fase anterior da doação. O receio aumenta ainda mais quando a doação envolve quem já morreu. No Brasil, em 2014, segundo a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), a negativa de famílias para a doação ficou em 46%. Em Sergipe, esse número foi ainda maior: 78%. Para Viviane, isso também tem a ver com a prevalência, ainda hoje, de uma simbologia do coração. “As pessoas ainda colocam o coração como o centro da vida. “O coração tá batendo? Então tá vivo”, explica.

A família, a partir do momento em que é comunicada da morte, tem apenas seis horas para definir o destino do corpo do seu ente. São apenas algumas horas que torcem a angústia e a expectativa de quem está lá do outro lado, na fila de espera, aguardando uma chance para continuar vivendo. Cada segundo perdido nessa espera por uma solução, de um suposto retorno à vida daqueles que já se foram, torna mais distante as possibilidades de aproveitamento dos órgãos. “Nessas horas, a família geralmente obedece o desejo do familiar”, diz Viviane. Número 2, 2015.1


ESPECIAL

vivem em mim

RA O TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS EM SERGIPE Ana Lúcia Carmo

Baruc Martins

Iargo Souza

tinha recebido o rim, o pâncreas e parte do fígado do mesmo doador.

a simples constatação, que escorregava por suas palavras firmes, fez confirmar a tese: “Eu renasci”.

ber água há restrição. Com isso, uma estratégia muito utilizada, no caso da água, é chupar gelo. No caso dos outros alimentos, segundo os médicos, somente evitando mesmo. Mas algumas pessoas em tratamento ainda conseguem desenvolver outras estratégias, como comer um pouquinho de cada coisa. Como explica Viviane, mesmo eles sabendo da proibição, quando chegam, eles sentam e comem. “Levam coxinha, saltam [a comida] de ketchup. Levam pra hemodiálise porque sabem que a máquina vai limpar tudo.” Rosa confirma: “Mas tem horas que você começa a beber o que não deve, comer o que não deve. Se revolta!”.

anajornalismo22@gmail.com

Essa impessoalidade do processo, de maneira pragmática, ajuda a dar isonomia a toda operação. Mas também possibilita uma relação de intimidade diferente entre doador e o transplantado. Parte de um que vive agora em outro. Uma relação de complementaridade que só se torna possível nesse breve instante em que o órgão chega ao novo corpo. Para Rosa, o resultado disso foi um casamento perfeito: “Eu acredito que ele foi feito pra mim, é meu”. E não tinha como não ser. Mais de 80% de compatibilidade, apenas três dias internada na UTI e nenhum revés do rim transplantado. Uma mudança tão drástica que

IARGO SOUZA

Ainda assim, quando o órgão é doado, outras dúvidas aparecem. “Ao mesmo tempo em que aquela pessoa diz que não vai desistir; outros dizem que eu tenho que me acomodar com a minha cruz e vou ficar onde estou”, acrescenta. Tudo isso por causa do medo de voltar para a máquina. Medo que, de algum modo, Rosa também viveu. Ela chegou a ser chamada três vezes para o transplante e somente na última fez a operação, devido, sobretudo, à compatibilidade. O seu doador foi um jovem de 21 anos, que faleceu após um acidente de moto, com traumatismo craniano. Ela jamais o teria conhecido, não fosse o noticiário, que trazia uma outra mulher que

aglomeradao@gmail.com

As dificuldades do transplante de Rosa foram vencidas aos poucos. Mesmo ela, com todo o receio, não enfrentou grandes dificuldades. A escolha pelo tratamento na Santa Casa de Misericórdia, em Recife, ao invés de São Paulo, tinha motivo. Parte de sua família é de Pernam-

“Eles têm dificuldade de se imaginar em sair do estado. Sabem que não podem perder a diálise porque é ela que [os] mantém vivos”

buco e o deslocamento, no fim das contas, foi a mudança de uma casa para outra. Outros, porém, não têm a mesma sorte. Demanda dinheiro, perda de proteção e crescimento do risco. É difícil dizer “sim” para um processo que vai reordenar completamente a sua família e colocar abaixo paradigmas e estigmas que cultivou durante a vida. “Eles têm dificuldade de se imaginar em sair do estado. Sabem que não podem perder a diálise porque é ela que [os] mantém vivos”, pontua Viviane. E, em seguida, completa: “Tem ainda o seu José, por exemplo, que não se vê andando de avião…”. Dificuldades que afastam a possibilidade de transplante em detrimento de uma tentativa sempre hercúlea de sobrevivência nas clínicas. O horizonte tamento

O sorriso de alguém que aprendeu de fato a viver

Número 2, 2015.1

incerto do tra-

Durante o período de tratamento com hemodiálise é proibido comer quase tudo. Até para be-

iargocorreia@gmail.com

Desses desprazeres, porém, a comida é o de menos. O que incomoda mesmo é o futuro, ou a insuportável expectativa do presente e desse tempo que se espera - de terminar o tratamento, voltar pra casa, reorganizar a vida. Nisso, o receio da morte é sempre constante. “No início, há muita esperança, acreditam que aquilo é possível. Quando vai pro terceiro/quarto [ano] de hemodiálise, você vê tristeza”, diz Viviane. Difícil mesmo é manter essas angústias guardadas, como monstros domesticáveis, reduzidas entre o desejo de realizar e a possibilidade concreta de fazer algo. Palavras que se transformam em mais que simples sons jogados ao vento. Simbolizam uma esperança real: de cuidar de um filho, ir até o mercado, trabalhar. Admitindo, a cada dia, a possibilidade de que uma autonomia, agora negada, seja possível.

E essas angústias se intensificam conforme a fila cresce e o sonho por uma nova vida vai ficando mais distante. Atualmente, segundo dados da Central de Transplantes de Sergipe, o estado possui 147 pessoas esperando por um órgão para transplante de córneas, que é o único tipo de transplante realizado aqui. No cenário nacional, esses números também são significativos, e com resultados positivos na diminuição do número de pesso

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ESPECIAL ANA LÚCIA

sempre atenta quando um novo provável doador - nesse caso, o/a falecido/a - entra no hospital. O trabalho dele e de sua equipe, geralmente, é de convencimento, de explicar passo-a-passo o que significa morte encefálica e certificar que não há mais possibilidade de vida para os familiares. “Hoje, o Conselho Federal de Medicina estabelece que para esse diagnóstico de morte encefálica são preciso três avaliações - duas clínicas e um exame complementar para mostrar que o encéfalo não tem atividade elétrica, ou não tem sangue circulando, ou não tem metabolismo. Só depois das três avaliações é que a pessoa é considerada ‘legalmente’ morta. A partir daí é que a gente pode entrevistar a família. Nesse momento, a gente percebe um grande receio da família que confunde morte encefálica com coma, que são duas coisas totalmente diferentes”, explica

A história do transplante de órgãos em Sergipe é datada da década de 1980, tendo início em um hospital privado de Aracaju, de cunho filantrópico - cujo nome não será revelado, em respeito ao sigilo da fonte. Mas hoje, segundo Benito, esse hospital sequer tem o alvará da vigilância sanitária, que é pré-requisito para nomear um hospital como transplantador. “Como o hospital perdeu esse alvará, nós não temos condições para realizar transplante lá. E assim o número de sergipanos transplantados caiu muito. Para se ter uma ideia, o último transplante cardíaco realizado no estado foi em 2006. Ou seja, já temos um bom tempo. Em 2012, o ministério não mais renovou a habilitação para transplante cardíaco, por falta de produção. Apesar de estarmos enviando coração para outros estados, o que denota que nós temos uma equipe habilitada”, completa Benito. as na fila, como mostra o gráfico.

Com isso, o lugar da clínica não se torna apenas o espaço físico em si, mas o ponto de diálogo e atravessamento de experiências. Um refúgio necessário para o incontrolável mundo “de fora”, com seus sujeitos obedecendo a padrões sociais que não permitem - ou não correspondem - aos anseios e expectativas desses novos sujeitos, que habitam as clínicas. O que faz até mesmo a possibilidade de um tratamento em casa ser descar-

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tada. Seja pelo receio de estar em um ambiente que não dispõe dos cuidados médicos durante todo o tempo da diálise, seja pelas trocas e vivências compartilhadas. “Você vê o outro, vê a si mesmo, e se sente vivo. Você está entre iguais. Enquanto em casa você é o outro, o diferente”, argumenta Viviane. Os bastidores do transplante

“O paciente está cadastrado, mas ele é o octuagésimo quarto.” Sentado atrás de uma mesinha simples, Benito Fernandez, enquanto con-

versava com nossa equipe, respondia assim a uma das famílias que sempre ligam querendo saber novidades sobre a lista de espera para transplante de órgãos. Durante o nosso breve diálogo, o telefone ainda tocou algumas vezes. Benito é coordenador da Central de Transplantes de Sergipe, vinculada à Secretaria de Estado da Saúde. A sala que trabalha funciona como um anexo do Hospital de Ur

gências de Sergipe (Huse). Benito faz parte de uma equipe que fica

Entre 2010 e 2015, segundo a Central de Transplantes de Sergipe, foram realizados 1.394 transplantes no estado. Em convênios celebrados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). No entanto mesmo com toda participação do SUS para a realização de transplante de órgãos no país, ainda há uma grande dificuldade em atender uma demanda técnica do Ministério da Saúde que poderia ser desenvolvida tanto em hospitais públicos como também particulares. “A maioria dos nossos pacientes está sendo encaminhada para fazer o transplante em São Paulo, com uma ajuda diária de Número 2, 2015.1


ESPECIAL R$24,60 e nós sabemos que isso não sustenta ninguém numa cidade como São Paulo. Mas também são encaminhados para Santa Catarina, Ceará. Sendo que aqui nós teríamos condições de fazer esses transplantes”, defende Benito.

E, logo em seguida, arremata: “O Hospital Universitário até vem tentando se habilitar, mas é um lugar que não tem nem serviço de hemodiálise e este é o requisito principal para realizar transplante. Portanto, não temos como habilitar o [Hospital] Universitário no momento. Mas nós temos dois hospitais privados no estado que podem realizar transplante hepático, renal, cardíaco, de medula óssea. Basta os donos dos hospitais quererem. A gente sabe que o serviço de saúde é um dever do Estado. Daí o Estado faz uma concessão com o serviço privado e é aí que o hospital cumpre a sua missão social”. O depois

Quer agora cuidar só da vida, do muito que dela agora tem. Sem preocupações ou medos tolos da morte. Das velhas agonias e das histórias guardadas, encontra forças para ajudar os outros e diz: “Ajudo no que eu sei, no que aprendi e no que eu vivi. Se precisar, eu corro atrás”. No fim, ainda quer também conquistar seus sonhos. De uma maneira mais palpável e concreta. Rosa quer terminar o curso de Nutrição. Rosa quer simplesmente continuar a viver. Número 2, 2015.1

No Brasil Os primeiros transplantes no Brasil datam da década de 1960. As cirurgias pioneiras foram realizadas nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, onde foram feitos transplantes renais. Já o primeiro transplante de coração aconteceu em 1968, também em São Paulo.

A primeira Lei que dispunha sobre “a retirada e transplante de tecidos, órgãos e partes de cadáver para finalidade terapêutica e científica” é do ano de 1968, mas apresentava uma série de limitações. Essa lei foi revogada por um novo dispositivo em 1992, mas foi somente em 1997, com a Lei 9.434 que houve a regulamentação completa e mais detalhada sobre a atividade, que culminou, no mesmo ano, na criação do Sistema Nacional de Transplante (SNT). A lei prevê por exemplo que o diagnóstico de morte encefálica, obrigatório em caso de doação, deva ser atestada por dois médicos não participantes da equipe transplantadora. Ou ainda que as gestões

locais, regionais e nacional do Sistema Único de Saúde (SUS) devam fazer campanhas de estímulo à doação. Em Sergipe

Sergipe foi o primeiro estado do norte e nordeste a realizar um transplante de coração, ainda na década de 80. Entretanto, desde de 2012 o estado não realiza transplantes com exceção do de córneas, que hoje conta com 143 pessoas na lista de espera. O estado conta com uma equipe para captação de órgãos que são enviados para realização de transplantes em outros estados. Atualmente a maioria dos pacientes na fila aqui são encaminhados para São Paulo, quando surge um órgão compatível. Quem deve fazer transplante?

O Hospital Albert Einstein elenca as principais indicações para transplante. O procedimento é indicado para pacientes portadores de doenças graves, agudas ou crônicas, e que não possuem outra forma de tratamento com comparada eficácia.

O transplante de fígado - é indicado em casos de Cirrose Hepática, Câncer de Fígado, Hepatite Fulminante e outras doenças. Lem-

brando que a pessoa na fila de espera por um transplante de fígado pode receber parte do órgão de um doador vivo. O transplante renal - principalmente, voltado aos pacientes em tratamento de hemodiálise ou em diálise peritoneal. Os pacientes renais podem receber a doação de um doador em vida. O transplante de rim significa para esses pacientes a oportunidade de livrar-se da “máquina”, equipamento que realiza a filtragem do sangue ao qual eles se submetem até quatro horas diárias em diferentes dias da semana. Transplante simultâneo de Pâncreas - Rim - Esse tipo de transplante é indicado para alguns pacientes portadores de diabetes melitus, insulinodependente e com insuficiência renal crônica, que se encontram em diálise ou muito próximo do seu inicio.

O transplante de coração - é indicado a pacientes com doenças do miocárdio em estágio final causadas, na maioria das vezes, por doença de Chagas, infartos ou problemas congênitos. ANA LÚCIA

Rosa não vive mais sem riscos. Hoje, dez anos após o transplante que lhe garantiu, como gosta de chamar, uma “nova vida”, ainda se dá ao luxo de desafiar os seus próprios limites. Como das vezes em que viajou de moto, sozinha, de Aracaju a Recife, perfazendo um trajeto de 501 quilômetros. “Agora vou mudar de rota, vou por Maceió, vou pelas praias”, diz entre sorrisos. Ou de quando largou tudo para ajudar um de seus filhos a estudar em Campina Grande, na Paraíba. Para qualquer dúvida sobre o tratamento, ou sobre o processo de transplante, responde: “Faria tudo de novo se fosse preciso”.

História dos transplantes de órgãos

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COMPORTAMENTO

Blog ou Youtube: qual você prefere? CONHEÇA AS EXPERIÊNCIAS DE DUAS BLOGUEIRAS QUE TAMBÉM PRODUZEM VÍDEOS PARA INTERNET Cinthya Rejane Maria Belfort maribelfort.75@gmail.com

cinthyarejane@gmail.com

O

s blogs surgiram na década de 1990 e até hoje fazem sucesso na internet. Eles são diários online, em que seus donos os utilizam para compartilhar suas viagens, gostos, dicas e abordar diversos temas. Inicialmente, os posts (informações adicionadas periodicamente no blog) eram apenas links, ou seja, pontes para outros sites e as pessoas não podiam fazer comentários. No ano 2000, foram criados os permalinks que apontam para uma postagem específica de um blog. O intuito deles era permitir que se chegasse diretamente ao post desejado quando se fazia referência a alguma postagem ou a um conteúdo específico, e com isso surgiu o sistema de comentários. Com essa nova ferramenta de interação, os blogueiros ou bloggers (aqueles que escrevem em blogs) tornaram-se mais escritores do que simplesmente blogueiros, seus textos começaram a ser comentados e existia uma cobrança maior dos leitores.

Atualmente com o avanço da tecnologia, os blogs cresceram e se tornaram uma comunidade. Visualmente eles são mais atraentes, permitem além de textos, postagens de músicas, áudios, vídeos e possuem interação com outras redes sociais. Existem diversos tipos de blogs: entre eles, os voltados para o universo feminino, que tratam sobre moda, beleza, comportamento, saúde e bem-estar.

Em Aracaju, a blogueira Jéssica Vieira, 31 anos, sergipana, graduada em Jornalismo e mestre em Letras pela UFS é proprietária do blog “Deixe-me contar”, em que ela aborda assuntos como moda, beleza, viagem e entretenimento. Jéssica contou que criou o blog porque desde criança gostava muito de escrever e sempre teve diários. Ela tinha como projeto transformar um diário em um diário virtual. “Mais ou menos em 2007 eu comprei o domínio do ‘Deixe-me contar’, mas eu fazia os textos e não os divulgava. No ano passado, resolvi fazer o blog como algo profissional, tive uns problemas, mas aí ele foi lançado no final de abril deste ano, por uma vontade mesmo de escrever e de gostar de compartilhar as coisas com as pessoas”. Jéssica acredita que ser jornalista ajudou a se tornar blogueira, porque para ela o jornalismo é uma porta de entrada, ele é uma área de comunicação em que as pessoas têm como foco e como trabalho produzir textos. Mas, ela não acha que só pode ser blogueiro quem é da área de comunicação. Segundo a jornalista, tem gente de outras áreas que faz um trabalho muito bem feito, só que a comunicação viabiliza o texto e a pessoa tem como saber a melhor forma de se comunicar com o leitor.

Muitos blogueiros trabalham apenas com seus blogs e ganham dinheiro através de publicidades, ou com vendas de produtos como, por exemplo, cursos online. Jéssica conta que ainda não ganha dinheiro com seu blog e que se tivesse a possibilidade, trabalharia somente com ele. “No começo você tem que investir, eu acho que você não pode criar um blog visando o retorno financeiro. É claro que se você investe no trabalho, se investe dinheiro com layout e programação, comprando coisas e tudo mais, você quer receber algo de volta, só que o principal objetivo é fazer um texto para o seu leitor, compartilhar as informações que você quer, para que as pessoas vejam seu trabalho e criem confiança”, explica. Segundo Jéssica, independente de ganhar dinheiro ou não, o melhor reconhecimento é receber um comentário, uma curtida, um e-mail perguntando “Esse livro realmente é bom? Onde é que eu encontro?”, além dos comentários nos textos de pessoas que você nunca viu. “Isso é muito gratificante”, destaca.

Jéssica acha que a publicidade dentro de um blog tem que ser voltada para o que o blogueiro tenha a oferecer e ele tem que ser muito realista com o leitor. “Digamos que uma loja de papelaria queira anunciar no meu blog e eu gosto do produto, mas eu vejo que o material é bonito, mas não é bom, mesmo que ela me pague um dinheiro considerável não

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Jéssica Vieira, jornalista e mestre em Letras pela UFS

posso falar de um produto que não tenha qualidade para o meu público, só por causa da publicidade que aquela empresa está me oferecendo. O próprio nome do blog é em primeira pessoa, então eu não posso colocar uma coisa que não é a minha opinião naquele espaço. Claro que todo mundo quer publicidade no seu blog, pois quando você começa a receber propostas de parcerias é porque o seu trabalho está sendo reconhecido, mas tem que ser bom para os dois, porque tem em jogo os leitores, a sua credibilidade”, relata.

Todos nós sabemos que as redes sociais são importantes ferramentas que ajudam na divulgação de blogs. Jéssica divulga o “Deixe-me contar”, só que passou a utilizar mais as redes sociais depois, pois começou a ver que as pessoas estavam lendo. Ela acha importante o uso delas, porque é uma forma do blogueiro se aproximar do leitor, divulgar seu trabalho e interagir com o público. “Os blogueiros escrevem para as pessoas e aí elas vão perguntando as coisas, eles não podem só jogar conteúdo, quando recebem um posicionamento em troca eles não podem ficar ausentes, porque a pessoa que está lendo quer um retorno também”. O público dá sugestões, as pessoas acompanham o seu trabalho e é através dessa dinâmica e das visualizações, que Jéssica vai seguindo o blog. No entanto, alguns pedidos não podem ser atendidos porque ela tem que seguir o projeto editorial do seu blog.

São com essas sugestões em comentários e com o número de leitores que Jéssica observa o seu público. Ela acompanha o crescimento do seu blog e tem uma equipe que trabalha ao seu lado. “Quando eu criei o “Deixe-me contar” procurei fazer da forma mais profissional possível, com um layout organizado. Se acessar o blog do celular, tablet, computador ou em qualquer navegador, o layout vai se adequar à tela e ao navegador. Isso é o que nós chamamos de programação responsiva. Preferi assim porque nem todo mundo acessa pelo computador. Hoje em dia, a gente vê muita coisa pelo celular e também é mais fácil de visualizar. Eu tenho acesso no blog de quem está vendo, de que cidade é, quantos acessos têm, porque a gente faz a contabilização pelo analytics. No começo eu fazia todo dia para saber quantas pessoas estavam vendo, hoje não faço porque não dá Número 2, 2015.1


COMPORTAMENTO tempo”. Ela fala que não fica vendo sempre porque isso é muito instável, o blog está no começo ainda, não tem nem seis meses, então não tem como ela dizer quem é o público que acessa em determinado horário. Inovação

Alguns blogueiros também são youtubers (pessoas que possuem canais no Youtube e fazem vídeos). Jéssica criou um canal no Youtube recentemente, mas o “Deixe-me contar” é seu foco principal. O Youtube para ela é um complemento do seu blog e não quer que seja o contrário, porque criou o blog para que ele seja reconhecido como blog, o resto das coisas são complementares, como o Instagram, o Facebook e o Youtube.

Os canais do Youtube estouraram e estão crescendo rapidamente. A maioria das pessoas que possuem um canal têm blog, mas será que os canais substituem-nos? Para Jéssica se você tem um blog de leitura fácil e rápida a pessoa vai continuar lendo porque todo mundo gosta de ler, o vídeo ele facilita porque a pessoa pode estar fazendo um trabalho e ouvindo o vídeo e não necessariamente vendo. É como televisão, às vezes você está ouvindo, mas não está vendo. “O blog exige que você leia, mas eu acho que são duas ferramentas distintas, com públicos distintos também. Eu não acho que o blog vai acabar, que o Youtube vai tomar conta ou vai substituir, acho que cada meio de comunicação tem sua peculiaridade não existe um que vai dominar o outro, mas eu prefiro o texto”, destaca. O Youtube foi lançado em 2005, sendo comprado em 2006 pelo Google. Ele é um sucesso internacional que teve grande impacto na popularização dos vlogs e no surgimento dos canais. Os vlogs são vídeos que tratam de diferentes assuntos, uma espécie de diário virtual de uma pessoa que mostra tudo o que faz. Atualmente, existem vários canais no Youtube que falam de moda, beleza, videogames, viagens, receitas, uma grande variedade de assuntos e que trazem os vlogs dentro deles. Qualquer pessoa, de qualquer profissão, ou até mesmo um adolescente, pode ser dono de um canal. Essa mídia digital, que é o Youtube, deixou de ser apenas um hobby para muitas pessoas e se tornou uma forma de trabalho. Os donos dos canais falam em seus vídeos do que gostam, conquistam um público específico e ganham dinheiro através de publicidades ou através da quantidade de acessos, pois quanto mais acessos o canal tiver, mais famoso ele fica.

Ao buscar por canais legais aqui em Sergipe, encontramos o Antena Antenada, de Karly Marques, 23 anos, fisioterapeuta, estudante de design de moda, blogueira e youtuber. Além de ter um canal, ela possui um blog com o mesmo nome e os dois foram criados em 2012. Karly começou a trabalhar mais com o canal neste ano, e seus vídeos falam sobre moda, beleza, dicas de compras. Ela confessa que passou muito tempo para se render aos vídeos, mas está amando a experiência. Ao ser questionada se suas profissões ajudaram na criação do seu blog e canal, Karly afirma que sim. “O Antena Antenada só nasceu e cresceu por conta da fisioterapia, posteriormente, os cursos que fiz e agora o superior de moda, tudo se liga a ele, pois todo meu aprendizado eu aplico em meu conteúdo”.

• Foi criado em 2005 • Para compartilhar vídeos • É um site em que os youtubers colocam seus vídeos • Utiliza também a publicidade

Número 2, 2015.1

Karly Marques, fisioterapeuta, consultora de imagem e estilo e estudante de design de moda

O canal Antena Antenada possui muitas visualizações e o número de inscritos vêm aumentando. Para ela, as redes sociais são importantes e as utiliza bastante como meios de divulgação. Com relação ao retorno das pessoas que assistem os vídeos do canal, Karly fala que elas interagem de várias formas, seja comentando uma foto, mandando uma carta ou uma mensagem de carinho pelo Facebook, assim como através de empresas que a procuram e querem anunciar em seu espaço. Ela só trabalha com publicidade em seu blog, pois não possui tempo e nem espaço para investir mais no canal agora. Sendo assim, não acha justo cobrar nele.

Ao falarmos do crescimento dos canais no Youtube e do fato que o aumento do número de canais pode estar provocando uma diminuição na leitura dos blogs, Karly contou sua experiência: “Eu atualizo meu canal há menos de um ano e ainda não consigo me dedicar a ele como gostaria, mas senti que a interação do blog diminuiu desde que os canais estouraram. As pessoas preferem interagir no Youtube, seja assistindo ou comentando. Muita gente questiona o porquê de não migrar de vez para o Youtube, mas é que blog, hoje em dia, é mais amor do que qualquer outra coisa, pois não é fácil produzir conteúdo de qualidade”.

• Surgiu na década de 90 • Para postar textos, fotos e divulgar vídeos • Cada blogueiro tem seu blog, ou seja, seu site • Trabalha com publicidade 57


COMPORTAMENTO

Um abismo psicológico e emocional A DEPRESSÃO É UMA DOENÇA QUE ATINGE A TODOS OS TIPOS DE PESSOAS Cristiane Santos

marie.csanthos@gmail.com

José Augusto

gugu_vps@hotmail.com

A

s sobrecargas de trabalhos e uma decepção amorosa, foram as causas que geraram em abril desse ano, uma crise emocional na cabelereira de 31 anos que não deseja ser identificada. Segundo ela, a crise veio acompanhada de aceleração no coração, tremedeira em todo o corpo e mal conseguia andar. Ao procurar ajuda médica descobriu pelos diagnósticos que estava com depressão. “ No período eu trabalhava no salão, no supermercado, em casa e fazia faculdade, mas a crise apareceu depois de um conflito na minha vida sentimental”, afirma a cabeleireira.

A depressão tem sido uma doença silenciosa e que atinge a todos os tipos de pessoas e classes sociais, levando diversas a cometer o suicídio. Vulgarizada pelo simples fato de ser considerada uma tristeza, o conceito da doença é complexo, mas suficiente para diferenciá-la do senso comum. Mas afinal, o que é a depressão?

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a depressão é considerada um transtorno mental com vários tipos de sintomas básicos como tristeza, desânimo, humor deprimido, falta de prazer, insônia, falta de apetite e perda de peso, que se repetem em todos os tipos.

No Encontro Temático “Depressão e Ansiedade” para Servidor Cidadão, realizado na Universidade Federal de Sergipe, pela a psiquiatra e professora de medicina Helena Pinho de Sá, explica que a depressão não é apenas tristeza, mas precisa ter alteração de outros componentes do corpo como: alterações de humor, fisiológicas e psicomotores.

A depressão é popularmente conhecida quando as pessoas detectam quando estão tristes, que não sentem vontade de viver, mas a doença é bem mais do que isso. “Considerada no ramo da psiquiatria como uma patologia, o transtorno depressivo apresenta em seu quadro sintomas bem característicos e bem complexos - podemos dizer variados - tudo não começa apenas de uma tristeza puramente”, esclarece a psicóloga Danielle Alves Menezes.

É necessário diferenciar tristeza de depressão, conforme alerta a psicóloga: “A tristeza é uma reação natural do ser humano, que surge quando o organismo reage a um estado momentâneo de perdas. A depressão está relacionada a um conceito patológico, que numa situação de perdas surge uma reação cronificada, que implica em outras complicações.”

De acordo com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a depressão é a perda da alegria, um esvaziamento da existência, um achatamento dos pensamentos e da energia corporal, um humor depressivo que é algo constante e com o passar do tempo torna-se incapacitante. Devido ao seu difícil diagnóstico, a depressão é sub-diagnosticada e sub-tratada, e cerca de 50% a 60% dos casos da doença não são detectados pelo médi-

co clínico. Muitas vezes, os pacientes deprimidos também não recebem tratamentos suficientemente adequados e específicos. Diagnosticada de modo rápido e eficiente, as mortes causadas pela depressão podem ser prevenidas em torno de 70% com o tratamento. Abrangência da doença

A doença vem atingindo mais de 350 milhões de pessoas no mundo e será a doença mais prevalente em 2030, sendo um dos grandes problemas de saúde pública, segundo a OMS. De acordo com Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), no Brasil, atualmente, há entre 17 a 20 milhões de pessoas apresentando algum tipo de quadro depressivo. A doença é mais frequente em mulheres e acontece devido à ques-

Critério Diagnóstico de Episódio segundo a CID - 10

Sintomas Fundamentais

1 - Humor deprimido 2 – Perda de interesse 3 - Fatigabilidade

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Sintomas Acessórios

1 – Concentração e atenção reduzidas 2 – Auto-estima e Auto-confiança reduzidas 3 – Ideias de culpa e inutilidade 4 – Visões desoladas e pessimistas do futuro 5 – Ideias ou Atos Autolesivos ou suicídio 6 – Sono perturbado 7 – Apetite diminuído Número 2, 2015.1


COMPORTAMENTO

tão hormonal e na faixa etária de 24 anos, conforme afirma a psiquiatria Helena Pinho de Sá. Mas os homens não estão fora desse contexto, Dy Wanderley e Andrade, 27 anos, funcionário público, fez parte desse quadro. Anos atrás ele foi diagnosticado com a doença devido a um estresse. “Manchas no corpo, tristeza, vontade de chorar quando assistia a noticiários na TV, medo de sair sozinho, pegar ônibus, emocional muito fragilizado”, relata Andrade sobre os sintomas depressivos que apresentava.

efetivo e oferecendo menos efeitos colaterais. Essa preparação poderá ainda ajudar outras doenças neurológicas, por enquanto não há previsão de quando esse remédio chegará a população.

“O importante é enfatizar que nem todos os pacientes apresentam todos os sintomas”, explica a psiquiatria Helena Pinho de Sá. Há alguns mais recorrentes como a tristeza em choro, a sensibilidade, a alteração de humor, alterações de cognição (dificuldade de pensar, mente fica devagar), pensamentos negativos, sono alterado, apetite (aumento ou diminuição), desesperança, pensamentos suicidas,

Segundo a psicóloga Danielle Alves Menezes a religião é uma ferramenta importante para o tratamento. “A religião e a palavra da Bíblia traz um conforto, um novo sentido e um movimento para existência da pessoa com a doença. Então a religião e a música trazem várias formas de canalizar essa tristeza”, explica.

Elienai de Conceição, 26 anos e universitária, também sofreu com a depressão depois de uma perda familiar e o término de um relacionamento amoroso. Durante dois anos teve que conviver com o choro, a insônia, a falta de apetite, a vontade de morrer e a perturbação mental.

O Tratamento da Depressão

Os antidepressivos são efetivos e eficazes no tratamento agudo das depressões, mas existem outros tipos de tratamento. Segundo a psiquiatra, os tratamentos podem ser múltiplos: o psicossocial ( é um tratamento com conta com o acompanhamento de uma equipe multidisciplinar de profissionais como: psicólogo, enfermeiro, assistente social e psiquiatra, com intuito de oferecer o bem-estar físico, mental e social do paciente) psicoterapia (tem a presença importante do profissional, o terapeuta, que oferece ao paciente um modelo compreensível da sua depressão e promove esperança, nesse caso, os medicamentos podem ou não ser utilizados e têm menos efeitos colaterais e reduz as recaídas do transtorno depressivo) e o social (psicoeducação com orientação familiar e busca por meios de distrações como dançar, ir a igreja entre outros). Uma nova pesquisa inovadora no tratamento da doença, realizada pela pesquisadora mineira Alline Campos pode em breve trazer um novo medicamento aos depressivos. A sua pesquisa se propõem em encontrar substâncias que melhorem os sintomas da doença, sendo mais Número 2, 2015.1

O tratamento de Elienai Conceição foi à base de calmantes e antidepressivos para que ela dormisse, além disso teve o apoio da família na superação da doença e no momento está curada. Já o tratamento de Andrade contou com muita fé e investimento em alimentação. “Tratamento de Cristo, ajuda espiritual e alimentação natural, muito peixe, abóbora crua que eleva os níveis do hormônio do bem-estar, chá de erva de São João que tranquiliza. Além disso, procurava me distrair, saindo e mantendo a rotina, se parar é pior”, afirma Andrade na sua fase de tratamento e atualmente está curado.

A cabelereira continua fazendo tratamento e toma medicamentos antidepressivos. “Os remédios aumentaram meu peso, mas tem me ajudado muito a enfrentar a doença e tem permitido que eu durma e sinta a tranquilidade que preciso no momento”, revela.

Além de medicamentos, e outros tipos de tratamentos para superar o transtorno depressivo, a família é o suporte importante para passar por esses momentos tão difíceis, precisa apenas que ela apoie e se preocupe em manter a pessoa acolhida, dando carinho e orando. Estas foram as atitudes que a família de Andrade fez para ajudá-lo. “A família tem o papel importante sim, mais não podemos colocá-la como regra. Ela sendo um suporte auxilia muito. Dependendo do estado de abandono do paciente, a família é a melhor observadora que vai chegar ao psicólogo e conversará sobre o comportamento do paciente que está depressivo”, alerta a psicóloga Aline Alves. Em relação à cura é possível quando a pessoa encontra um sentido para a sua existência, agora não é garantia que toda essa terapia vá alcançar isso. “A cura será a percepção que a pessoa vai ter sobre seu estado, se está bem ou não, é tudo muito singular”, finaliza a psicóloga Danielle Alves Menezes.

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COMPORTAMENTO

Abuso sexual na infância: a importância do debate MOVIMENTOS FEMINISTAS GANHAM FORÇA NAS REDES SOCIAIS E PERMITEM QUE MILHARES DE USUÁRIOS RELATEM SEUS CASOS Maíra Silveira

mairasilveira__@hotmail.com

N

a última semana de outubro a internet foi palco de grande discussão sobre assédio e abuso sexual na infância e adolescência. A história começou após a exibição do primeiro episódio do programa MasterChef Junior, da TV Bandeirantes, que tem como participantes crianças com habilidades na cozinha. Na rede social Twitter, uma das participantes, de apenas 12 anos, foi alvo de comentários e mensagens com teor sexual. Na mesma rede, um grupo feminista chamado Think Olga deu início a uma ação de mobilização pública utilizando a hashtag “primeiro assédio” (#primeiroassédio) como ferramenta.

Em quatro dias foram registradas mais de 80 mil mensagens. Milhares de mulheres se abriram para relatar em seus perfis histórias pessoais sobre os assédios e/ou abusos sexuais que sofreram na infância: quando começou, o que aconteceu e como se sentiram. Na maioria desses relatos, as vítimas tinham entre sete e doze anos, e em muitos deles é possível perceber que o abuso aconteceu dentro das suas próprias casas. O agressor, normalmente, é uma pessoa com algum grau de parentesco ou que possui uma relação muito próxima da vítima (pai, padrasto, tio, vizinho). Mudança jurídica

Um exemplo amplamente divulgado na mídia foi o caso da nadadora Joanna Maranhão. A pessoa que treinava e servia de inspiração para a menina ainda no início da sua carreira na natação, quando tinha oito anos, foi também a pessoa que a abusou. Assim como muitas vítimas de abuso, ela não sabia a quem pedir ajuda. Já adulta, a nadadora falou abertamente sobre o que sofreu. À época, Joanna já estava com 21 anos e, como o crime já havia prescrito, nada podia ser feito contra o acusado. Porém, seu caso deu início a um grande debate sobre esse tipo de crime e fez com que, em 2012, a Câmara dos Deputados aprovasse o projeto de Lei 12.650, que alterou o Código Penal Brasileiro no que dizia respeito ao abuso sexual na infância. A criação dessa lei, que recebeu o nome da nadadora, tornou possível denunciar casos de abusos na infância mesmo depois de a vítima já ter se tornado adulta. O prazo para denúncia se tornou maior e a prescrição para esse tipo de crime passa a ser contada a partir do momento em que a vítima completa a maioridade, ou seja, 18 anos. Porém, se a denúncia for feita ainda na época do abuso, o tempo de prescrição do crime passa a contar a partir do fato ocorrido. O prazo de prescrição vai depender do crime cometido e de qual seria a pena aplicada a ele. Além do Código Penal, a proteção contra o abuso sexual na infância é garantida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). De acordo com esse conjunto de normas, será punido em forma de lei qualquer ato de negligência, violência, crueldade e opressão a criança e ao adolescente. “O crime vai ser tipificado nos artigos definidos no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Penal, para que, depois de provado e respeitado o contraditório, o abusador seja julgado. Isso vai depender do relatório do inquérito policial que chega à justiça”, explica Glícia Salmeron, advogada e ex-conselheira do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA). Caracterização

O abuso sexual infantil, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), é todo envolvimento de uma criança em uma atividade sexual

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que não compreende completamente, já que não está preparada em termos de desenvolvimento. O abuso pode ocorrer com ou sem contato físico. O estímulo à nudez, a comentários verbais de ordem sexual ou a exposição dos órgãos genitais da criança são exemplos de abuso sem contato. Beijos e toque nos órgãos genitais são configurados como abuso com contato físico. O ato de observar em situações inapropriadas também pode caracterizar o abuso sexual, a exemplo de quando uma criança está trocando de roupa. A criança vítima de abuso sexual manifesta que algo está errado através do seu comportamento. Segundo a psicóloga Morgana de Oliveira, a criança se torna agressiva, tem dificuldades de se relacionar ou acaba se isolando. “Essas crianças são despertadas para o sexo precocemente e de uma forma traumática, então naturalmente elas terão consequências em várias áreas do seu desenvolvimento, como alimentação, desempenho escolar e no relacionamento com a família ou a comunidade em que vive”, disse. Além disso, a criança pode sofrer ganho ou perda de peso, bem como excesso ou falta de sono. Esse tipo de violência compromete o psicológico da criança de diversas formas e, caso aconteça por muito tempo, pode gerar consequências devastadoras. “Além de ansiedade elevada e sintomas de depressão, há casos em que a criança vítima de abuso sexual tem transtorno de estresse pós-traumático (TEP). Isso ocorre quando a pessoa revive a lembrança diversas vezes”, explica a psicóloga. Morgana ressalta ainda que o silêncio interfere ainda mais no psicológico, aconselhando a não esconder o trauma e procurar ajuda.

Porém, nem sempre o ambiente familiar é aberto ao diálogo entre pais e filhos para que estes se sintam a vontade para revelar o abuso sexual. É preciso que os pais conversem e orientem seus filhos fazendo com que eles tenham consciência de que a relação sexual entre adulto e criança é errada e que ninguém deve tocar o seu corpo sem consentimento. Caso a criança revele o abuso, é importante que se sinta acolhida pela família. Isso ajudará a obter resultados positivos na recuperação de qualquer tipo de trauma que uma vítima desse crime pode ter na vida. #meuamigosecreto

Após o sucesso da #primeiroassédio, outro movimento online que ganhou milhões de adeptos foi o da hashtag “meu amigo secreto” (#meuamigosecreto), que estimula mulheres a relatar comportamentos machistas que enfrentam regularmente, e, principalmente, denunciar declarações contraditórias daqueles que se dizem a favor da igualdade de gênero. A campanha foi iniciada por sete jovens que fazem parte da militância feminina e se conheceram no meio. De acordo com as idealizadoras, a ação começou quando uma das integrantes resolveu relatar um fato vivido no seu perfil pessoal, e acabou tendo um grande número de compartilhamento. A partir disso, elas criaram uma página para dar mais força à campanha. O que difere as duas hashtags é que a primeira denuncia casos que aconteceram no passado, e a segunda são fatos mais recentes. Ambas as ações são iniciativas que contribuem para a quebra da vergonha e do silêncio, principais obstáculos vivenciados pelas vítimas. Uma tentativa de subverter o assédio e o preconceito tão presentes na sociedade. Número 2, 2015.1


COMPORTAMENTO

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CULTURA

“Mainstream: A disputa global enlatada” Ediê Reis

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ocê é o que você consome? Ou você consome o que você é? Podemos responder todas essas perguntas em diferentes óticas como ciência, religião, biologia, matemática... Mas porque não, geopolítica da cultura e das mídias? Por que não, entendermos tudo através do “Mainstream”?

Mainstream nada mais é que um termo em inglês que designa o pensamento ou gosto corrente da maioria da população, ou seja, tudo que agrada a gregos e troianos. Com base no livro “Mainstream”, do Francês, Fréderic Martel, entendemos um pouco melhor sobre como funciona a cultura de mercado e nos portamos diante da indústria cultural. Segundo o autor do livro, foi declarada a guerra mundial de conteúdos.

É travada uma batalha nos meios de comunicação pelo controle da informação por diversos países: as produtoras e emissoras de televisão, pelo domínio dos formatos audiovisuais, séries e talk-shows; os produtos culturais, pela conquista de novos mercados através do cinema, da música e do livro; e, além dsso, é uma batalha internacional de troca de conteúdos pela Internet. Ao falarmos em consumo Mainstream, pensamos em “americanização” da cultura, no entanto, poucas vezes paramos para pensar que em cada país está diretamente ligado por uma mídia direta que influencia a sociedade e seus novos rumos não apenas em direções culturais, mas principalmente políticas, econômicas e sociais.

Dessa forma, é fácil enxergarmos o poder de transformação cultural das grandes agências de filme: Hollywood influencia os Estados Unidos e o resto do mundo, assim com Bollywood fideliza seu poder na Índia e em seus países vizinhos, a Al Jazeera no mundo Árabe, A Telesur e a Rede Globo na América Latina. São diversas, as frentes de domínio da comunicação ao redor do mundo que crescem cada vez mais suas forças localmente e expandem as fronteiras regionais. No entanto, se pararmos para pensar na influência de cada país na

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reisedie@gmail.com indústria mainstream internacional, ainda percebemos um grande domínio Norte Americano e Europeu. Segundo, Frederic Martel, a importância desse posicionamento, não traz apenas grandes benefícios econômicos, mas principalmente de posicionamento da nação como porta-voz de sua cultura e não apenas como consumidora passiva de conteúdo estrangeiro. Em entrevista ao site G1, Martel informa que o Brasil por ser um país emergente, deveria se colocar como objetivo a construção de uma política ativa para estabelecer seu cinema nacional. A solução é simples: basta um sistema de apoio, no modelo francês ou coreano, mas não um sistema que envolva cotas e censura, como nos modelos chinês e egípcio.

“Se for criado, por exemplo, um imposto de 10% sobre cada ingresso nas salas de cinema, e esses recursos forem aplicados na produção de filmes nacionais, em dez anos vocês terão uma indústria poderosa. Talvez ela não alcance o mercado internacional, mas ao menos os brasileiros verão mais filmes brasileiros nas salas de cinema de seu país. É uma questão de vontade política”, conclui.

rayan_alves@hotmail.com

em produção longe do alvo da grande mídia. Era comum encontrar produções independentes nacionais no portfólio de longas. Porém, por questões econômicas, tal sessão fora esquecida pelas redes de cinemas locais. Alguns programas, como o “Curta-SE”, continua na batalha para consolidação do cinema nacional e principalmente local.

Formada em Audiovisual, Raine Souza encara tais movimentos como um retrocesso para o fortalecimento do cinema independente, nacional e local. “Nós, praticamente só consumimos aquilo que é imposto e que é economicamente mais viável. Parar para pensar e refletir está cada vez mais difícil porque tudo que chega até nós não foi produzido no sentido de fazer pensar, mas no sentido de fazer comprar”. Mainstream e o consumo

Quando pensamos na batalha internacional pela dominação da Indústria Cultural não paramos para pensar que esse mesmo fenômeno acontece nacionalmente, um exemplo disso, é o nosso próprio Brasil que é praticamente dominado por duas grandes frentes de comunicação que exercem sua influência por todo o território, influenciado os hábitos, gostos e comportamentos.

Não é novidade que a indústria do entretenimento movimenta a economia na esfera global. O faturamento anual de Hollywood ultrapassa a casa dos bilhões só com a produção dos filmes e não para por aí. A indústria do cinema norte-americano atinge patamares e áreas da economia que nem devem passar pela sua cabeça. Por exemplo, você vai ao cinema e, naturalmente, pensa em acompanhar a diversão do seu filme com uma pipoca, certo? Por causa desse costume “inocente” que está presente na sua mente, e de várias outras pessoas, os Estados Unidos se tornou o maior produtor de milho do mundo. E essa é só uma das áreas dentro da economia que a cultura do mainstream potencializa.

Em Aracaju, por exemplo, há alguns anos costumávamos contar com o “Cinecult” um espaço focado

O estilista Michael Kors abriu

Trazendo como ponto de discursão o exemplo dado acima pelo Frederic Martel, percebemos que, apesar de uma maior veiculação de filmes nacionais em nossos cinemas desde que a lei de incentivo à cultura entrou em vigor, todo espaço cultural concedido é praticamente voltado para filmes de grandes emissoras. Ou seja, ao mesmo tempo que Hollywood domina o espaço internacional, a globo domina o espaço local.

Rayan Alves

Ainda tem dúvidas sobre a sua influência?! Um exemplo mais próximo pode te ajudar: em uma relação entre a moda e o mainstream, tendências de estilo e (consequentemente) consumo são criadas no rastro de um sucesso de uma novela. Tente lembrar quantos “anéis-pulseiras” foram usados entre 2001 e 2002, período da novela de grande audiência da Rede Globo “O Clone”. E, antigamente, no final da década de 1970, comprar seu par de meias de lurex para usar com sandálias de salto alto era o must!

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RODRIGO CARVALHO

CULTURA

sua primeira loja no Brasil em 2013, após perceber um grande crescimento repentino da procura das brasileiras por modelos das bolsas da marca. O que o estilista talvez tenha demorado a perceber de início é que essa procura por bolsas, que levam na estampa o monograma “MK”, veio da personagem Carminha, interpretado pela atriz Adriana Esteves, na Novela Avenida Brasil, que cruzava as ruas do Rio de Janeiro cometendo suas atrocidades, carregando sua bolsa Michael Kors metalizada, que aparecia em várias cenas da novela. E de uma hora pra outra, o estilista que só era (pouco) mencionado aqui pela sua participação no reality show “Project Runway”, virou o queridinho das “dondocas” brasileiras e logo se popularizou em todas as camadas sociais. Comece a resgatar da sua memória quantas vezes você viu o monograma “MK” também em falsificações vendidas nos camelôs.

De 2014 para cá a gastronomia se tornou uma das áreas profissionais mais procuradas do Brasil. Dados apontam que em 2005 existiam apenas 25 escolas de gastronomia no país e cerca de 2.900 alunos cursantes. Esse número cresceu até chegar atualmente ao número de 115 escolas, com quase 10.000 alunos e, dentre os fatores que contribuíram para esse crescimento, está um muito marcante que foi a glamourização da profissão de chef de cozinha, que passou a ter o patamar de celebridade no Brasil, graças a versão brasileira do reality show de gastronomia MasterChef, exibido pela Rede Bandeirantes, programa que alcançou níveis altíssimos de audiência e grande alcance nas redes sociais. Seguindo o sucesso do programa, versões brasileiras dos programas “Hell’s Kitchen” e “Cake Boss” também foram incluídas na programação da televisão brasileira. A procura do brasileiro por hábitos gastronômicos sofisticados também seguiu a onda de crescimento. Um dos papeis da mídia e da indústria criativa é de ser a ponte que liga o produto e a sociedade, com uma forma de comunicação com o público. As dimensões que essa relação toma são infinitas, por atingir diversas áreas. Número 2, 2015.1

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CULTURA

Mandioca, da subsistência às altas cozinhas EM SERGIPE, O MUNICÍPIO DE CAMPO DO BRITO É DESTAQUE NA PRODUÇÃO DE DERIVADOS DA MANDIOCA Marielle Rocha

marirocha_jornalismo@hotmail.com

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uitas pessoas sobrevivem da mandioca em Sergipe, seja o agricultor, o proprietário e os trabalhadores das casas de farinha, o atravessador, o feirante, os consumidores e outras. Dentre os municípios considerados maiores produtores estão: Lagarto, na região centro-sul, Itabaiana, São Domingos e Campo do Brito, na região agreste. Esse último agrega uma expressiva quantidade de casas de farinha, mesmo com uma população rural considerada pequena.

Atualmente a produção sergipana de mandioca não atende às demandas das casas de farinha, devido à uma doença que causa limitação no cultivo de mandioca, gerando podridão nas raízes e perdas em 30% da produção. Assim, em vários municípios produtores de farinha recorre-se à matéria-prima de outros estados para que a ofer-

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A área rural de Campo do Brito recebe para ser processada em farinha de 30 a 35 caminhões contendo de 18 a 25 toneladas de mandioca. Essa movimentação ocorre de três a quatro vezes por semana, dando uma média de 2.500 toneladas e tendo uma carga mensal média de 11.000 toneladas de mandioca processada. O diretor da Cooperativa dos Produtores de Farinha de Mandioca do Município de Campo do Brito (Coofama), Carlos Lapa, vê a situação como um obstáculo. “Hoje a nossa maior dificuldade é a falta de raiz mais próxima porque o nosso estado é pequeno e produz pouca raiz e precisamos trabalhar o ano inteiro para atender a demanda”, considera.

latifúndios (engenhos e fazendas de gado), que atualmente pertencem aos municípios de Santa Luzia, São Cristóvão, Itabaiana, Lagarto, Nossa Senhora do Socorro e Santo Amaro. Os colonos aprenderam a cultivar a mandioca e produzir seus derivados com os índios Tupinambás.

Os produtos da mandioca, principalmente a farinha, eram consumidos nos engenhos e nos primeiros núcleos urbanos da Capitania de Sergipe del Rey e até hoje faz parte da realidade social, econômica e cultural do Brasil, principalmente da região Nordeste. A farinha de mandioca era comida básica dos escravos e da população pobre livre. Se algum problema impedisse sua produção e elevasse seus preços, isso era suficiente para ocasionar sérias crises alimentares, interferindo

de forma profunda nas condições de sobrevivência das pessoas. Para a doutora em História, Edna Maria Matos, podia-se diminuir o consumo de carne e feijão, mas era impensável ficar sem farinha.

Pode-se dizer que a mandioca afirmou-se como instituição cultural da sociedade sergipana, já que ela está presente no trabalho (lavouras, casas de farinha, feiras livres, mercados) com suas técnicas de produção, sejam primitivas ou mecanizadas e como produto indispensável na culinária. Existem mais de cem espécies de mandioca. Em Sergipe, as mais encontradas são: aramaris e kiriris, ambas produzidas pela Empresa Brasileira de Pesquisa em Agropecuária de Sergipe (Embrapa) através de cruzamento genético no sistema de policruzamentos.

MARIELLE ROCHA

O município de Campo do Brito é localizado cerca de 62 km da capital e possui uma população de 17.594 habitantes. Sua maior atividade econômica é a produção de farinha de mandioca, cujas unidades fabris estão localizadas nos povoados Gameleira, Terra Vermelha, Cercado, Tábua, Limoeiro e Caatinga Redonda. O desenvolvimento econômico no interior tem se destacado nessa atividade que gera renda e empregos no local. São cerca de 350 casas de farinha espalhadas por toda a região (número considerável se comparado à população rural da cidade), que envolvem 2.500 pessoas entre proprietários, mulheres responsáveis pela raspagem da raiz e homens responsáveis pela atividade dos fornos.

ta do produto esteja garantida ao longo de todo o ano. “A maioria da matéria-prima chega da Bahia e de Alagoas, porque apesar de produzimos muita farinha, a produção acaba ultrapassando o que se é plantado aqui na região”, explica o produtor Luiz Carlos.

História

Logo após a conquista do território que se constituiu capitania e hoje estado de Sergipe, realizada pelos portugueses em 1590 e liderada por Cristóvão de Barros, diversos colonos fizeram solicitações de sesmarias ao Capitão Mor para cultivar lavouras de subsistência nos vales férteis dos rios Real, Piauí, Vaza Barris, Poxim, Sergipe, Cotinguiba, Siriri e Japaratuba. Um dos produtos mais cultivados foi a mandioca (Manihot esculenta Crantz), nas áreas da extinta Mata Atlântica e do agreste em pequenas propriedades nas margens dos

Antônia Santos, funcionária da cooperativa de produtores de mandioca de Sergipe

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CULTURA MARIELLE ROCHA

MARIELLE ROCHA Lavagem das mandiocas e cortes em pedaços após a descascagem

Além de outras espécies: cravela (caravela), sutinga, roxinha, jacobina, babuzinha, mangue, aipim preto, aipim rosa, escondida, etc. Quase todas essas espécies contém ácido cianídrico, conhecido popularmente como manipueira (líquido de cor amarelada que sai da mandioca depois que ela é prensada, durante o processo de fabricação da farinha). Se a manipueira for despejada na natureza, provoca a poluição do solo e das águas, causando grandes prejuízos ao meio ambiente e ao homem. Dados

A produção de mandioca é uma atividade agrícola de alta relevância no Brasil por sua importância econômica e social, cultivada predominantemente em áreas que combinam baixa incidência de chuvas e solos pobres em nutrientes. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), considera a raiz como um dos principais alimentos energéticos consumidos no Brasil. No estado de Sergipe, em seu conjunto, a área plantada e colhida na base de 2012 foi de 30.730 hectares, produção de 450.486 tonelaNúmero 2, 2015.1

Diretor da Cooperativa, Carlos Lapa

das, produtividade de 14.659 Kg/hectare, a 2ª melhor produtividade do Nordeste. O menor estado do Brasil, possui o mesmo valor da produção agrícola do maior estado do país, o Amazonas (com uma área de 1.570.745.680 Km2).

Dentro da Região Nordeste, o peso da produção agrícola de Sergipe foi quase igual ao peso da produção agrícola do 2º estado mais rico do país, o Rio de Janeiro que na base de 2012 detinha 0,6% do valor da produção agrícola do Brasil. Dos vinte principais produtos agrícolas do país, a mandioca se destaca na sexta posição. De acordo com um levantamento sistemático da produção agrícola produzido pelo IBGE, em setembro de 2013, cerca de 435 mil toneladas mensais são produzidas em Sergipe. Tapioca: “a queridinha do momento”

A tapioca é feita da goma de mandioca (ou aipim ou macaxeira) hidratada. Por ser feita apenas de mandioca, é um alimento natural com baixo teor de sódio, sem gordura, rico em carboidratos, de fácil digestão e

sem glúten. Embora diretamente associada à dieta diária do Norte e Nordeste do Brasil, a farinha de tapioca ultrapassou as fronteiras dessas regiões. As famosas panquecas, com recheios doces ou salgados, chegaram aos menus dos restaurantes do Sul e Sudeste, assim como os bolos, os pudins e os sorvetes.

vagem e higienização e depois vai pra refrigeração. Aqui também criamos algumas receitas, produzimos a goma úmida da tapioca peneirada e embalada à vácuo para comercialização e a própria tapioca, também fazemos bolos de macaxeira para merenda escolar”, comenta a funcionária da cooperativa, Antônia Santos.

Brigadeiro de Macaxeira

Você sabia? Em Sergipe, entre as espécies curiosas mais encontradas estão:

No povoado Gameleira, área rural do município de Campo do Brito, os produtores estão se dedicando também na produção da goma de tapioca. A produção do produto nos últimos dois anos dobrou, cresceu mais de 50% e para dar conta da demanda, a cooperativa teve que contratar mais funcionários. “A matéria-prima é trazida aqui e a gente faz o beneficiamento, descascagem, processo de la-

Ingredientes:

395g de leite condensado

1 colher de sopa de margarina

½ Xícara de chá de leite de coco 3 colheres de sopa de tapioca Coco ralado para decorar Modo de preparo:

Dissolva a mandioca no leite

condensado, depois misture

aos demais ingredientes e leve ao fogo médio entre 10 e 15 minutos.

Sobre as perspectivas para o futuro, Carlos Lapa, o diretor da Coofama, é otimista. “Apesar da crise estamos vendendo normalmente e pretendemos ampliar a variedade de produtos, começamos só com a farinha, hoje temos variedades de produtos e nosso próximo passo é inserir a farofa de mandioca Delícia da Copa no mercado que é a nossa marca”, finaliza.

Cravela

Sutinga

Mangue

Maria Pau

Talaia

Cria Menino

Pilha

Saco nas Costas

Roxinha

Jacobina

Babuzinha

Escondida

Itapicuripe

Aipim Preto

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CULTURA

Cordel e repente podem virar patrimônio imaterial O CORDEL E O REPENTE, QUE CHEGARAM AO BRASIL POR INFLUÊNCIA PORTUGUESA, HOJE, COM ALGUMAS CARACTERÍSTICAS PRÓPRIAS, JÁ FAZ PARTE DA CULTURA BRASILEIRA. Jussara Gonçalves

jussara_jornal@hotmail.com

O

O pedido foi realizado pela Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC), no ano de 2010. Em 18 de novembro do mesmo ano, a Câmara Setorial do Patrimônio Imaterial do IPHAN apreciou o pedido. Agora, o processo passa por um mapeamento do material existente no Nordeste, Sudeste e Distrito Federal, por serem considerados, historicamente, o território construído pelo cordel e o repente. Mas, caso venham se tornar patrimônio imaterial brasileiro, será válido para todo o país. No Brasil, a literatura de cordel e o repente foram trazidos pelos portugueses, no século XVIII, se estabelecendo em Salvador e depois espalhando-se pelas demais regiões do país. O

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Jussara Gonçalves

cordel existe muito antes do período medieval, surgiu da cultura popular, cresceu no anonimato, sem que se saiba verdadeiramente a sua origem ou quem o fez. Muito charmoso e com um jeito curioso de se escrever, conquista aplausos dos seus admiradores e vem sendo passado de geração em geração. O Repente, que também vem sendo passado pelas tradições, são versos improvisados e cantados. Feito na cantoria de viola, é um desafio entre dois cantores, que dizem versos espontâneos para ganhar a competição. Atualmente, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), junto com demais pesquisadores, vem discutindo a possibilidade da Literatura de Cordel e o Repente se tornarem Patrimônio Imaterial Brasileiro.

cordel escrito com rimas e tendo baixo custo, aos poucos foi se tornando cada vez mais popular. Sem eletricidade, na época, era o jornal e a novela do sertanejo. O repente alcançava todo o território brasileiro, pois os poetas populares iam de região em região, conquistando seus admiradores, que gostavam de ver a disputa dos versos cantados. O repente e os folhetos, como alguns chamam o cordel, permanecem na cultura popular

brasileira mesmo com as novas tecnologias e mantém as suas tradições. Assim como em outros países, no Brasil, o cordel e o repente também são passados de geração em geração. Todos que com eles estão envolvidos reconhecem a sua importância como parte integrante de seu patrimônio cultural. Mas o que é um patrimônio imaterial?

Todas as representações, expressões, conhecimentos e téc-

Cordel: coisas do sertão

nicas podem se tornar patrimônio do país, mesmo que sejam compostas por bens de natureza material ou imaterial. Mas esses instrumentos, objetos, fatos e espaços culturais devem estar inseridos dentro de uma sociedade, um grupo e, em alguns casos, os indivíduos que o reconheçam como parte do seu patrimônio cultural. De acordo com Flávia Gervásio, supervisora técnica do IPHAN, os bens culturais e imaNúmero 2, 2015.1


CULTURA

DEMÉTRIUS DE OLIVEIRA

Os bens, ao se tornarem um patrimônio nacional, são preservados pelo IPHAN. Quando se trata de algo material, há o tombamento do objeto, ou seja, os bens móveis e imóveis de interesse cultural serão cuidados e preservados através de gerações. Já os bens imateriais - sejam celebrações, ofícios, expressões, lugares, modos de fazer - são registrados pelo IPHAN no livro de Registro dos Saberes ou Registro das celebrações. “O cordel brasileiro tem seu modo de fazer específico, diferente de outros lugares e, por isso, deve

ser reconhecido como patrimônio imaterial do país”, afirma Damião Ramos, cordelista e repentista sergipano.

JUSSARA GONÇALVES

teriais se caracterizam pelo saber popular, por meio de crenças, ritos, práticas, além de manifestações musicais, plásticas e literárias. “O patrimônio imaterial tenta trabalhar essa diversidade. Ele tem um aspecto material que está presente nas roupas, nos folhetos, em objetos. Mas, há uma carga imaterial que é, justamente, o valor que aquele bem tem para uma sociedade”, afirma.

No entanto, algumas medidas são adotadas para averiguar se as manifestações culturais devem ou não se tornar patrimônio imaterial brasileiro. Para isso, precisam atender a um conjunto de critérios: ser de caráter coletivo; ser transmitido através das gerações; ter um valor referencial para diferentes grupos/ comunidades; além de uma continuidade histórica do bem. Vantagens

Segundo Flávia Gervásio, a cultura que passar a ser um patrimônio nacional, ganha um reconhecimento. “As pessoas veem que aquele bem é valorizado pelo país e é importante para a sua formação, principalmente para um determinado grupo da nação”, diz a supervisora. A manifestação cultural, por meio do processo de Salvaguarda, terá mais divulgação. Serão adotadas medidas para manter esse bem,

estimulando a prática em detentores mais jovens. Desta forma, o zelo pelo patrimônio nacional estará garantindo a manutenção desses bens ao longo das gerações futuras.

A literatura de cordel e do repente está há quase cincos anos sendo avaliada por diversos especialistas da área de patrimônio nacional. O processo está em fase de documentação e mobilização dos detentores. Após essa Instrução Técnica, será realizada uma votação na Coordenação de Registro da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), a qual decidirá se o cordel e o repente devem ser considerados Patrimônio Imaterial do Brasil. “Para nós cordelistas, se aprovado, será uma alegria muito grande”, afirma Damião Ramos. Espaços de cordelistas e repentistas em Sergipe

Dia 19 de novembro foi comemorado o Dia do Cordelista. A data foi criada em homenagem ao pioneiro, Leandro Gomes de Barros, que nasceu neste dia no ano de 1865. Sua vida foi dedicada a escrever versos populares inventados, publicados em cerca de mil folhetos e milhares de edições. Gomes escrevia sobre variáveis temas, entre eles, as aventuras de Antônio Silvino. Na capital sergipana, existem alguns lugares que preservam essa cultura popular como também incentivam novos cordelistas. A Cordelteca, localizada na biblioteca Municipal Clodomir Silva, é um espaço dedicado tanNúmero 2, 2015.1

Cordas, Cordéis ou barbantes?

to para a população conhecer mais sobre o cordel e os cordelistas/repentistas, como para realizar leituras dos folhetos. Neste local, pequenos grupos da sociedade e alunos de qualquer instituição, podem ter “dois dedos de prosa” com um cordelista/repentista sergipano convidado, desde que o representante do grupo ou dos alunos entre em contato com a biblioteca e marque a visita com antecedência. A Casa de Cordel, criada em julho de 2013, também oferece um espaço para que o público conheça mais sobre a literatura de cordel. Administrada pela cordelista Izabel Nascimento, filha do também cordelista Pedro Amaro do Nascimento, a Casa promove atividades públicas para divulgar o cordel e o repente em Sergipe, mantendo acervo, salão de poemas, e realizando saraus (reunião festiva) e encontros entre os cordelistas.

Outros lugares onde esses profissionais do poema podem ser encontrados é no Mercado Municipal e no Museu da Gente Sergipana. No mercado, há muitos repentistas e cordelistas espalhados. Lá eles vendem seus folhetos e cantam versos improvisados para conquistar a atenção do público, receber alguma coisa em troca e, assim, garantir seu sustento. Já no Museu, a pessoa pode se tornar o próprio cordelista ao recitar poemas dos vários autores sergipanos. Seu desempenho é gravado e depois, se a pessoa quiser, pode ser divulgado nas redes sociais.

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CULTURA

O teatro e o drama do apoio em Sergipe ALGUMAS AÇÕES CULTURAIS MOVIMENTAM O CENÁRIO TEATRAL, MAS A FALTA DE APOIO CONTINUA NA PAUTA DAS RECLAMAÇÕES DOS ARTISTAS. Rodrigo Alves

jornalistaalvesrodrigo@gmail.com

O

s registros históricos do teatro em Sergipe acontecem a partir do século XVI e mais especificamente na Aracaju de meados do século XIX, quando a localidade havia sido eleita capital da província. Tudo começa em 1868 com a Companhia Dramática Santo Antônio, contratada pelo empresário João Ferreira Bastos para atuações semanais em Aracaju e no interior. De lá para os tempos atuais, os críticos avaliam que a cena sergipana cresceu muito nos últimos cinco anos devido ao advento do Festival sergipano de Teatro e a Semana da Dança, que agora é chamada de Festival Sergipano de Artes Cênicas.

A retomada das apresentações cênicas no Encontro Cultural de Laranjeiras, a Mostra SESC de Artes Cênicas e o Festival de Artes de Tobias Barreto (TobiArte), na cidade de Tobias Barreto, compõem as ações que tem sustentado a área em grande parte. Outros fatores que alavancam as demandas são os editais locais e nacionais e o Projeto Mariano de Artes Cênicas, mantido pela Secretaria de Estado da Cultura (Secult). Porém há reclamações por parte dos artistas que querem um Plano Estadual de Cultura mais efetivo no estado e apoio empresarial que pouco aparece nas produções.

De acordo com Ivo Adnil, presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversão de Sergipe (Sated/SE), atualmente o estado tem 839 membros, destes 614 são artistas e 225 são técnicos, e apenas uma média de 105 aderem ao movimento sindical, ou seja, a maioria que entra com o processo para retirada do registro profissional. “A procura tem aumentado depois de alguns cursos e oficinas de Dança e Teatro, como o processo de comprovação exige que o candidato tenha participado de no mínimo 03 espetáculos, essa procura oscila entre 01 a 03, a cada dois meses. Temos

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apoiado essas iniciativas para oportunizar para os atuantes a profissão desejada”, explica.

O Sindicato também enfrenta problemas já que, desde 2014, estão sendo emitidas autorizações especiais, pois a instituição está com um processo de requerimento do registro na Secretaria de Relações do Trabalho no Ministério do Trabalho e Emprego e, enquanto o parecer não acontece, não estão sendo realizados os processos para emissão dos registros profissionais. Problema que tinha prazo para acabar em seis meses e já perdura por 18 meses.

Jorge Lins é um dos diretores em Sergipe que mais tem lançado novos artistas no mercado e promove em média duas oficinas por ano, colocando atores amadores nos maiores palcos do estado, a exemplo das apresentações no Teatro Atheneu e Teatro Tobias Barreto. Para ele, a classe de novos atores é animadora. “Muitos atores da nova geração já conquistaram definitivamente seu espaço dentro da cena teatral sergipana e já fazem voos solos, e vejo que muitos dos que fazem as oficinas continuam trabalhando, formam

grupos novos, entram nos grupos existentes e até mesmo aventuram-se fora daqui, porém como toda produção cultural nordestina, o que falta é gestão e uma política definida por parte dos órgãos que trabalham com cultura, em todos os âmbitos”, opina.

O povo funciona como termômetro de sua própria cultura e, em meio às ruas do Centro de Aracaju, das cinco pessoas abordadas, apenas uma havia ido ao teatro alguma vez. Os quatro que nunca foram alegaram a falta de dinheiro e se referiram aos altos custos dos ingressos insinuando certo elitismo, porém quando questionados sobre produções sergipanas que geralmente tem ingressos que variam entre 40 e 20 reais, ambos afirmaram não ter conhecimento, como a vendedora Ana Santos. “Acho que os ingressos de teatro devem ser todos caros”, justifica. O atendente de caixa, João Santana, o único que havia ido ao teatro, também não assistiu a apresentação de uma peça sergipana, mas sim de um artista da Paraíba chamado “Zé Lezin”. Apesar dos problemas de valorização, em contrapartida, a atriz do

Dani Veloso e Manoela Veloso

Grupo Caixa Cênica e diretora teatral, Diane Veloso, afirma que o teatro sergipano vive um momento interessante dentro da sua comunidade, pois seus membros ultimamente têm discutido questões estéticas e temas atuais, o que tem proporcionado um diálogo mais direto. No entanto, ela lamenta a falta de apoio,“as produções necessitam de tempo e pesquisa, mas temos um problema sério por não termos essa disponibilidade por falta de incentivo, não é só o estado e o município que tem que mudar, mas também o empresariado que não reconhece que precisa dar um retorno à sociedade, isso é uma realidade muito pobre, isso precisa ser mudado, não existe política pública efetiva, temos apenas eventos pontuais”, protesta. Diane denuncia ainda que é urgente que o povo sergipano se veja em cena e se reconheça, porém diante dos problemas e até mesmo da constatação nas ruas, a peça dramática da falta de apoio tanto do público, quanto do poder público e, principalmente, do setor privado em Sergipe, tende a não sair de cartaz tão cedo. Número 2, 2015.1


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Invisibilidade da memória COM DESCUIDO DE BENS PATRIMONIAIS, A HISTÓRIA DE ARACAJU CAMINHA PARA O ESQUECIMENTO Ayalla Anjos

ayallaufs@gmail.com

Número 2, 2015.1

Ayalla Anjos

F

im de tarde de domingo em Aracaju. Famílias, casais e jovens passeiam despreocupadamente pela Praça Fausto Cardoso. Seguem olhando as vitrines da Rua João Pessoa ou caminhando até a Praça General Valadão para ver o famoso Hotel Palace. Depois da missa na Catedral, os jovens namorados se aconchegam na sessão das 19h no Cine Palace, enquanto a boêmia já se reúne na Sorveteria Yara. Com os olhos de saudade o fotógrafo, economista e memorialista Expedito de Souza, de 71 anos, relembra uma época perdida no tempo. Nascido em Riachão do Dantas, chegou a Aracaju ainda moleque, para estudar e ajudar na bodega de sua tia Olga, na Rua Siriri com Itaporanga. Costumava sair com um amigo para a caixa d’água, que na década de 1940 abastecia Aracaju e hoje é o Centro de Criatividade, para avistar toda a cidade. Na época de faculdade na década de 1970, o Cacique Chá, que reunia a nata da sociedade aracajuana, era o roteiro dos fins de semana. Foi no ano de 1975, em viagem a São Paulo, que decidiu adquirir uma máquina fotográfica e no retorno começou a fotografar ruas, avenidas e imóveis de Aracaju. Inspirado em Marc Ferrez, fotógrafo que registrou as transformações urbanas no Rio de Janeiro no século XIX, começou a realizar o trabalho que quase quarenta anos depois, resultaria no livro Memórias de Aracaju. A obra retrata as mudanças urbanas e arquitetônicas, devido ao desenvolvimento e o crescimento populacional. Das suas memórias e registros, muitos imóveis que tiveram importância política, cultural e social, não existem mais ou estão abandonados, como o antigo Diário de Aracaju, A Fonseca & Cia, o Hotel Palace e diversas residências na Avenida Rio Branco, no centro histórico. Outros imóveis resistem ao tempo, mas estão descaracterizados, como o Cine Rio Branco e o Colégio Nossa Senhora de Lourdes. “A gente fica cobrando do setor público, que não faz isso, não faz aquilo e realmente

Expedito de Souza

é uma verdade. Temos uma quantidade grande de prédios e edifícios abandonados”, diz. Ele destaca a importância de conscientizar as crianças e adolescentes da importância dos bens culturais e da história. “É necessário um trabalho intensivo junto aos alunos nas escolas, com as novas gerações. A educação é fundamental”, afirma. Além disso, o fotógrafo ressalta que a parceria de instituições públicas com os setores privados pode resultar em bons resultados, como o Cacique Chá, reaberto esse ano através da parceria do Governo do Estado e o Sistema Fecomércio Sesc/Senac. O diretor do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural (DPHAC), da Secretaria do Estado da Cultura, Marcos Paulo Carvalho, fala que a união entre o poder público e a iniciativa privada pode ser um caminho para a recuperação e modernização dos imóveis sem desca-

racterizar suas características arquitetônicas e históricas. Contudo, ainda não há projetos para atrair investidores. “A união desses dois setores só tem a crescer os processos de salvaguarda, visando à elaboração de projetos de restauração e a sua execução. Planos para atrair investidores precisam ser elaborados de forma sistêmica e efetiva. Ainda não temos um plano”. Marcas do esquecimento Basta dar uma volta no centro de Aracaju que é possível encontrar as marcas do descaso, com inúmeros imóveis que foram destruídos ou se encontram abandonados. É o caso do Hotel Palace, o primeiro arranha-céu da cidade. Inaugurado no dia 24 de junho de 1962, o local impulsionou o turismo e foi considerado um grande centro cultural, econômico e político. Diversas celebridades nacionais se hospedaram no hotel, como a Seleção Brasileira

vencedora da copa de 1970, o escritor Jorge Amado, Roberto Carlos, Chacrinha, Luiz Gonzaga, Alcione, o grupo Dominó, Agnaldo Timóteo, Ângela Maria e presidentes como Emílio Garrastazu Médici e João Batista Figueiredo. O prédio pertence à Empresa Sergipana de Turismo (Emsetur) que ainda não tem projetos para restaurá-lo. Atualmente, é ocupado apenas no pavimento térreo por pequenos estabelecimentos comerciais. Aliás, poucas pessoas que trabalham nos arredores do prédio sabem a sua história. O historiador Francisco José Alves, professor da Universidade Federal de Sergipe, conta que em visita recente com alunos ao centro, ficou chocado com o abandono. Ele ressalta a importância da região, onde se encontra signos políticos, religiosos e culturais. “A Ponte do Imperador, em frente à Praça Fausto Cardoso, eu diria que é o maior sig-

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Bens tombados O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em Sergipe (Iphan) é o órgão do governo federal responsável por proteger e preservar os patrimônios materiais e imateriais do país. Em Aracaju, não existem bens tombados pelo Instituto, apenas pelo Governo de Estado, que ao todo são 39. Entre eles o prédio do Antigo Colégio Nossa Senhora de Lourdes, a Catedral Metropolitana, a Capela São João Batista e a Ponte do Imperador. A superintendente em exercício do Iphan, Venicia Rodomar, fala que o papel da instituição na capital é apenas de instrução dos processos de tombamento. “Como Aracaju ainda não é tombada, a gente não atua diretamente sobre esses imóveis, é tudo extraoficial. Mas o Iphan já realizou alguns estudos de conhecimento do patrimônio aracajuano”, diz. Contudo, esses inventários não estão abertos para o público. Segunda Venicia, trata-se de uma questão de segurança. “Abrir o que já foi identificado significa levá-los a risco. Porque se as pessoas entenderem que é possível um tombamento, pode ser que elas possam demolir ou descaracterizar. Quando se fechar o processo ficará disponível”. Segundo a lei de tombamento, a responsabilidade pela manutenção dos bens tombados é dos proprietá-

rios e cabe ao órgão tombador fiscalizar. “O tombamento não é uma expropriação, a pessoa continua dono. O que não pode é destruir ou descaracterizar. O problema no caso dos bens tombados, é que os proprietários em sua maioria não manifestam interesse em cuidar do bem”, explica o historiador Francisco. O Governo do Estado criou a DPHAC há seis meses, com a missão de realizar inspeções com registros fotográficos, emitir relatórios técnicos sobre o estado de preservação dos monumentos tombados e elaborar pareceres técnicos, sobre os bens históricos e culturais. Esses documentos são encaminhados para os responsáveis por esses bens. Quando um imóvel é tombado, o bem não pode ser demolido e qualquer obra de manutenção, restauração e reforma tem que ser antes avaliada pelo órgão tombador. Ações que não seguem a lei são cabíveis de multa. Se o dono percebe que o imóvel está em condições degradantes, deve imediatamente informar, mesmo que não tenha condições financeiras para realizar os reparos. A população que perceber essa descaracterização ou abandono, também pode e deve denunciar, junto ao Ministério Público. “O lei enquanto é texto é morta, ela só vigora e atua quando as pessoas cobram”, afirma Francisco. A ruptura entre o passado e o futuro O centro histórico é o berço da história e cultura da cidade de

Antigo Diário de Aracaju – Antes

Antigo Diário de Aracaju – Depois

Cine Rio Branco Inicialmente era chamado de Teatro Carlos Gomes, depois passou a ser denominado Cine Teatro Rio Branco e após alguns anos, ficou somente Cine Rio Branco. Inaugurado em 1912, era um dos cinemas mais antigos do Brasil. Foi tombado pelo patrimônio em 1985, porém em 13 de março de 1998, ocorre o destombamento durante o governo de Albano Franco. Até 2002, ano da sua demolição, era considerado o cinema mais antigo do mundo ainda em funcionamento contínuo. Atualmente é uma loja de móveis.

Aracaju. O seu planejamento e organização espacial, do chamado “quadrante de Pirro”, em referência ao autor do projeto, o engenheiro militar Sebastião José Basílio Pirro, tinha como centro a Praça Fausto Cardoso. A partir dali foi traçado o tabuleiro de xadrez que deu forma à nova capital e posteriormente as primeiras edificações que deram início ao conjunto urbano da cidade. É incontestável a relevância histórico-cultural de toda aquela área. Durante muitos anos foi realizada uma política de desenvolvimento urbano, sem dar prioridade à salvaguarda e proteção do patrimônio cultural. Com isso, muitos bens patrimoniais foram apagados da história. Mas qual é o real problema nessa questão? Nem todo mundo sente uma ligação com sua herança cultural. A cultura pode dar às pessoas uma conexão com certos valores sociais, crenças, religiões e costumes. Isso nos permite sentir identificação com outros de mentalidade e origens semelhantes. O patrimônio cultural pode fornecer um sentido automático de unidade, de pertença dentro de um grupo e nos permite entender melhor as gerações anteriores e a história de onde viemos. O verdadeiro desenvolvimento acontece através da salvaguarda, preservação e promoção do patrimônio cultural, fortalecimento da memória coletiva e identidade cultural. Não perceber a devida importância disso, é condenar as pessoas a viverem sem memória e hipotecar nosso futuro de forma irreversível.

Arquivo Público Municipal

Outras histórias

Amarildo Rezende

Ayalla Anjos

Diário de Aracaju Funcionou até o início da década de 1970 e fazia parte do grupo dos “Diários Associados”, de propriedade do grande empresário da comunicação do Brasil, Assis Chateaubriand, que introduziu a televisão no país através da Rede Tupi de Televisão. Também abrigou a Rádio Jornal de Sergipe AM-540 e foi residência de Manoel José Bomfim, médico, professor e intelectual brasileiro. Atualmente, o imóvel está abandonado.

aliado nesta questão, e sem dúvida, a conscientização da sociedade como um todo. Assim, só tem a ganhar as histórias e memórias do povo sergipano”, diz.

Acervo Memória IBGE

no arquitetônico identitário da cidade e está abandonada. A identidade de um povo se faz no resgate do passado e esses espaços são constituintes disso”, afirma. Entretanto, para ele o descuido com os bens culturais é inadmissível, mesmo que determinado imóvel não seja tombado. “Cabe aos gestores públicos cuidar de todos os bens do patrimônio público. O quadro geral é de abandono, para mim fica muito claro que é um crime”, fala. Segundo o assessor de comunicação da Empresa Municipal de Obras e Urbanização (Emurb) Ademar Queiroz, os imóveis são de responsabilidade dos proprietários. Apenas quando há riscos a população, como de desabamento, é que a defesa civil entra em atuação. Em outros casos, como a incidência de usuários de drogas ou criminosos, o Ministério Público é acionado através de denúncias. O diretor do DPHAC, Marcos Paulo, explica que sempre quando solicitado o órgão realiza visita técnica nos bens culturais materiais que ainda não foram tombados, por exemplo, obras de arte e edificações, para constatar a importância para a história, memória e cultura local.Quando um imóvel histórico caí no abandono ou é descaracterizado, é considerado um sério dano à salvaguarda patrimonial. “A forma mais eficaz para que isso não ocorra, é a união dos três poderes públicos: federal, estadual e municipal, em conjunto com o ministério público, que é um grande

Cine Rio Branco – Antes

Cine Rio Branco – Depois

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Meu cabelo, minha identidade O CABELO CRESPO COMO FORMA DE EMPONDERAMENTO DA MULHER NEGRA Yago Andrade

yagusandrade@gmail.com

O

projeto realizado para a disciplina Fotojornalismo II, ministrada pela professora Greice Schneider, tem como objetivo mostrar para a sociedade racista as lutas diárias que as mulheres negras tem de enfrentar por conta do preconceito. E mostrar acima de tudo, que seja crespo, colorido ou cacheado, com dreads ou Black Power, cada uma delas tem o direito de escolha e não cabe a sociedade impor como ela deve ser ou se

portar, mostrando que o cabelo crespo é belo sim, e que deixar os cachos soltos não é só mais uma moda, é a afirmação de uma identidade, da identidade negra. Mais informações sobre o projeto podem ser encontradas no endereço: https://meucabelominhaidentidade.exposure.co/meu-cabelo-minha-identidade

II Encontro das Crespas e Cacheadas da cidade de Estância, ocorrido no dia 15 e da Marcha do Emponderamento Crespo de Aracaju, realizada no dia 21 na capital sergipana.

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