Viagem à ilha da páscoa

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VIAGEM À ILHA DA PÁSCOA

Texto e ilustrações de 5º7 Escola Básica Pêro da Covilhã

AEPC 2013



Ilustração de Breno Cabral


Título: Viagem à Ilha da Páscoa Texto: 2013, Turma 5º7 AEPC Ilustração: 2013, Turma 5º7 AEPC Coordenação: Professora de Português Fátima Fradique 2013, Edição da Escola Básica Pêro da Covilhã Impressão: Nova Forma, Covilhã

Trabalho produzido no âmbito do Projeto aLer+


Viagem à Ilha da Páscoa

Texto e ilustrações da turma 5º7 do AEPC

AEPC, 2013



Ilustração de Breno Cabral



Capítulo I O final do primeiro período aproximava-se. Na Covilhã, já fazia muito frio e já nevava na Serra da Estrela. Estávamos em dezembro. A grande festividade aproximava-se e os meus pais tinham-nos prometido, a mim e à minha irmã, que iríamos passar as férias de Natal ou ao Sol numa praia paradisíaca qualquer ou numa estância de ski. A minha mãe e a minha irmã já tinham saudades do biquíni, das sandálias e dos vestidos fresquinhos e suaves de cetim e cachemira e até do odor do protetor solar, pois já estavam saturadas do frio, das camisolas de lã grossa, dos pesados casacos de fazenda, das botas de couro, das luvas e do cachecol. Apesar de não termos muito dinheiro, todos os anos fazíamos uma viagem. O meu pai trabalhava no departamento de investigação, na área de informática, na universidade, era engenheiro informático. O meu pai era apaixonado pela investigação, pela criação, pela invenção. Recentemente, tinha em mãos um projeto secreto, apenas do conhecimento do seu departamento e tinha-nos dito que, caso fosse aceite,

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poderia ganhar uma bolsa para o desenvolvimento do projeto e um prémio de aproximadamente 5.000 euros. Um dia, à hora do jantar, o meu pai perguntou -nos se gostaríamos de ir passar uns dias à neve, nos Pirenéus. A minha mãe e a minha irmã fizeram logo uma careta, mas eu acenei que sim, com a cabeça. Já me estava a imaginar a andar de ski e a deslizar na neve. - Mas, pai, umas férias na neve são caras, não são? Onde iremos arranjar dinheiro? – Questionei. - Soube hoje que o meu projeto foi aceite e, para além da bolsa para a investigação, recebi um prémio no valor de 3.500 euros. Pensei visitarmos o meu irmão em França, pois já faz alguns anos que lá não vamos. - Neve!? Frio!? Isso temos cá nós! – Exclamou a minha irmã Mariana. – Para termos neve, basta-nos subir até à Serra da Estrela e aí temos temperaturas negativas, neve, frio, agasalhos … eu quero sol, sol … - Eu, para falar verdade, também me apetece uns dias ao sol, pois as temperaturas por cá estão

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muito baixas. – Dizia a minha mãe. O meu pai argumentou, dizendo que fazia muito tempo que não víamos os nossos tios, o seu irmão. A muito custo, a minha mãe e a minha irmã lá concordaram, até porque o dinheiro só existia graças ao projeto do meu pai. Combinámos que, no dia seguinte, iríamos comprar as prendas de Natal para os nossos tios e os nossos primos e prepararmo-nos para a neve. Como a investigação me está no sangue, fui à internet e verifiquei que a meteorologia previa mau tempo, ventos fortes e probabilidade de avalanches. Alguns sítios da internet referiam que as estâncias de ski poderiam estar encerradas. Chamei o meu pai e, com receio, ele desistiu da ideia de visitar os meus tios. Decidimos que, após as aulas, no dia seguinte, que era o último dia de aulas, iríamos ver as ofertas disponíveis na agência de viagens em frente à escola.

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Ilustração de Miguel Brás



Capítulo II Ao final da tarde, fomos à agência. Entrámos e, enquanto esperávamos, íamos analisando os cartazes de divulgação, de forma a encontrar o destino ideal. O meu pai saiu para comprar uma garrafa de água e, ao entrar, escorregou num folheto promocional e, após algumas acrobacias, lá conseguiu não se estatelar no chão. Apesar de ligeiramente rasgado, via-se que o destino publicitado era a Ilha da Páscoa, uma ilha pertencente ao território chileno, situada no Oceano Pacífico. Quando chegou a nossa vez, o meu pai questionou o agente de viagens acerca do folheto. - Porquê Ilha da Páscoa? – Questionou o meu pai. - Porque foi descoberta num domingo de Páscoa. – Respondeu o senhor. - Ai sim?! – Admirou-se o meu pai. - Sim, o senhor Jacob Roggeveen, capitão holandês, desembarcou lá, no dia 5 de abril de 1722, dia de Páscoa. Anteriormente, esta ilha chamava-se

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Te Pito o Te Henua, que significava o centro do mundo. - Seria um bom destino. - Referiu a minha mãe. - Seria mamã, mas não esqueças o sol. – Relembrou a minha irmã. - Mas a Ilha da Páscoa tem com certeza praias e sol e seria bom conciliarmos isso com um pouco de história. – Insistiu a minha mãe. - Reparem no folheto! Poderíamos visitar o Parque Nacional Rapa Nui, considerado património mundial pela Unesco em 1995; ver os Moais, construídos pelo povo em homenagem aos seus líderes; visitar os três vulcões existentes em cada uma das pontas da ilha, que tem uma forma triangular … Já imaginaram! – Divagava o meu pai. - O que são Moais?- Questionei. - São estátuas, como esta que está aqui na imagem, que representam torsos masculinos humanos com orelhas muito compridas e sem pernas. – Respondeu o meu pai. - Pai, repara bem, tens a certeza que queres

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passar umas férias na ilha mais isolada do mundo? - Se vocês concordarem, não vejo porque não! Mas poderemos sempre pensar num outro destino. – Disse o meu pai. - Que outras ofertas estão disponíveis? – Questionou, dirigindo-se ao agente de viagens. - O Mar das Caraíbas, tropical, situado na América Central, apresenta inúmeras ilhas, como a Martinica, a República Dominicana, o Haiti, Porto Rico, Cuba, Bahamas, Jamaica, entre outras. Todas elas apresentam um clima fantástico, praias maravilhosas com areia branca muito fina, água azul transparente, paisagens idílicas … Olhámos uns para os outros e acenámos com a cabeça em concordância. Verificámos que aquele era mesmo o destino desejado e perfeito, que teve concordância imediata da minha mãe e da minha irmã, pois tinha sol, praia, areia limpa e o preço incluía viagem para um casal que poderia ser acompanhado pelos filhos gratuitamente. Ficou decidido que dois dias depois partiríamos para o Haiti.

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Ilustração de Breno Cabral



Capítulo III A minha mãe incumbiu-me de fazer a minha mala. Procurei, entre a minha roupa de verão, calções, t-shirts, chinelos de praia, calções de banho … Era esquisito pegar nesta roupa com o frio que estava lá fora, mas estava empolgado com as nossas miniférias. Como já estava de férias, resolvi fazer pesquisas acerca do nosso destino, o Haiti. O meu pai ligou a televisão e viu que estava a dar uma reportagem acerca de um tsunami que tinha ocorrido há uma hora. Eu e a minha irmã ficámos muito desiludidos, pois o que se previa serem umas férias fantásticas estava a tornar-se num adiamento constante. Combinámos deslocarmo-nos para o destino inicialmente pensado, por isso o meu pai dirigiu-se à agência de viagens, trocou as passagens para a Ilha da Páscoa e deixámos para trás o arquipélago das Caraíbas descoberto no século XV, mais precisamente em 1492, por Cristóvão Colombo, que procurava caminhos

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alternativos para chegar à Índia. Esta seria, quem sabe, uma outra viagem, que realizaríamos no futuro!

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Ilustração de Mariana Leitão



Capítulo IV Estávamos no aeroporto e o avião já levava uma hora de atraso devido ao mau tempo. Após muito tempo de espera, entrámos no autocarro para chegar ao avião. Já tínhamos descolado e a minha irmã não parava de perguntar “já chegámos, já chegámos…?” A viagem estava a ser muito aborrecida, sem nada para fazer, mas, finalmente, chegámos, 7h e 50m depois. Demos entrada no Hotel Orongo, dirigimo-nos à receção e pedimos a chave do nosso quarto. Entregaram-nos um cartão que dava acesso ao quarto nº 30 do 4º andar. Subimos de elevador e entrámos no nosso quarto. Estávamos na Ilha da Páscoa, também conhecida como Rapa Nui, a ilha dos gigantes de pedra. Era, sem dúvida, uma ilha isolada. Da varanda, olhando para o lado esquerdo, via-se mar, mar e mais mar. Um mar tão azul que, só de olhar, parecia

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encher a alma de uma paz impossível de alcançar no bulício da cidade. Olhando para o lado esquerdo vislumbrava-se lá ao longe uns cabeçudos em pedra que pensava serem os Moais. Depois de desfazermos as malas, apercebemonos da hora tardia e da fome que apertava. Resolvemos jantar, fazer uma visita pelo hotel e deitarmonos cedo para podermos partir com o primeiro grupo da manhã. Cada grupo partia com um guia, um verdadeiro Rapa Nui, que acompanhava os turistas na visita pela ilha. Disseram-nos para descansar, pois toda a visita era feita a pé e precisávamos de estar frescos e restabelecidos da viagem.

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Ilustração de Inês Freire



Capítulo V

Levantámo-nos

relativamente

cedo

com

o

entusiasmo de quem iria fazer uma visita inesquecível. Após o pequeno-almoço, juntámo-nos ao grupo no átrio do hotel. - Bom dia! Ao longo do dia, comunicarei convosco sobretudo em castelhano. Tentarei, por vezes, o português e o inglês, sempre que possível. - Nós compreendemos um pouco o espanhol. Referiu o meu pai. Os restantes turistas acenaram com a cabeça, indicando que partilhavam o mesmo conhecimento que nós. - Ótimo! Isso facilitará a nossa comunicação durante a visita. Como já devem ter percebido, sou um genuíno e orgulhoso Rapa Nui e podem tratar-me por Pablo. - Eu chamo-me Miguel. – Acrescentei. - Durante a viagem, teremos oportunidade de nos conhecermos Miguel. Agora vamos iniciar a nossa

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aventura. O percurso será todo feito a pé, pois é a única forma de imergirem dentro da vida e da cultura Rapa Nui. - Esta ilha é tão rica em história e cultura que à medida que caminhamos temos a sensação de estar dentro de um museu. – Dizia a minha mãe maravilhada, pois ao longo do passeio encontrávamos Moais; petróglifos, ou seja, rochas com imagens esculpidas; cavernas com imagens gravadas nas paredes; ruínas de casas e aldeias. - Conta a história - continuava Pablo - que no passado chegou a esta ilha o rei Hotu Matua com o seu povo e que vendo esta ilha paradisíaca, com palmeiras, pássaros e cavernas vulcânicas se instalaram e deram à ilha o nome de Rapa Nui. Mais tarde, os herdeiros do rei dividiram-se em tribos e desenvolveram a região. Como homenagem aos seus líderes esculpiram estátuas em rocha vulcânica. - Como foi que estas estátuas aqui vieram parar? Parecem tão pesadas? – Questionei.

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- Sim, chegam a pesar 30 toneladas e algumas atingem cerca de 15 metros de altura. O nosso povo acredita que eles, os Moais, se deslocaram em cima de troncos puxados por cordas, até ao local em que se encontram atualmente. Até porque, sabe-se que do século XII ao século XVI, quando foram construídos, não havia guindastes nem ferramentas em ferro. – Respondeu Pablo. - Porquê tantas estátuas? – Perguntou a minha irmã. - Acredita-se - disse Pablo - que foram construídas pelos primeiros habitantes da ilha com o objetivo de homenagear os seus líderes mortos. Por isso, estão todas de costas para o mar e viradas para o interior da ilha, vigiando e olhando pelas aldeias. - Os troncos, para deslocar as estátuas, obrigavam ao corte de árvores? - Perguntou a minha irmã. - Essa - respondeu Pablo - foi a razão que conduziu ao desequilíbrio do ecossistema, pois com a redução do número de árvores, houve o afastamento dos pássaros. Sem troncos, não havia madeira para

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fazer canoas, tornando a pesca perigosa e a deslocação para outras ilhas impossível. Estavam presos. A falta de recursos levou a lutas entre as diferentes tribos, atos de canibalismo inclusive. - Foi autodestruição! - Exclamei com tristeza. Parece semelhante ao que o Homem está a fazer ao Planeta Terra, gastando os seus recursos e destruindo as suas riquezas. Não sobreviveu ninguém? Interroguei. - Claro que sim, - apressou-se Pablo a responder - os povos sobreviventes, após um período tão negro nas suas vidas, cheio de fome e lutas, abandonaram o culto aos Moais, substituindo-o pelo ritual do Homem-Pássaro. - O que é isso? - Indaguei. - Veremos isso, quando visitarmos o local onde se realizava o ritual. - Referiu Pablo. Após a visita regressámos ao hotel. Estávamos necessitados de um banho e de comida. Após o banho, descemos para o restaurante e eu pedi o prato do dia, Bacalhau com Natas. Mas a minha irmã fez logo uma careta.

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- Não gostas! – Exclamei. – Neste momento, não haveria nada que me desse mais prazer de saborear. - Sendo assim, o que queres? – Perguntou o meu pai, dirigindo-se a Mariana. - Um bitoque, claro! – Respondeu ela. – Olhar para todas estas iguarias dá-me a volta ao estômago. Mesmo o bacalhau não tem o aspeto do da mamã. - Então, venha o bitoque. – Aceitou o meu pai, olhando a minha irmã com um sorriso. - Comer um bitoque e bacalhau a esta distância de casa, com a possibilidade de experimentar a gastronomia tradicional? É um desperdício! – Reclamou a minha mãe. – Eu vou optar pelo Tunu Ahi. - Tunu quê? – Perguntei, olhando a minha mãe. - Tunu Ahi, a versão rapa nui do curanto, um prato típico da costa chilena. É uma espécie de cozido ao ar livre com peixes, mariscos e verduras preparados em cima de pedras quentes e envoltos em folhas de bananeira. – Informou alegremente a minha mãe, orgulhosa dos seus conhecimentos.

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O meu pai olhava-a incrédulo. Não fazia ideia que a minha mãe conhecesse os costumes daquela região. Já o havia demonstrado nos conhecimentos históricos e agora no restaurante do hotel. - Penso que me fico pelo porco acompanhado com batata-doce e mandioca. – Afirmou o meu pai bastante convicto. – É mais seguro! Conversámos

imenso

durante

o

jantar.

A

minha mãe estava fascinada com tudo, com o passeio, com as estátuas, com as grutas, com o hotel e com o seu Tunu Ahi. Parecia uma menina num mundo de contos de fadas. Tinha sido realmente um dia fantástico e o cansaço começava a vencer-nos. A minha irmã ia deixando descair a cabeça em cima do prato. Decidimos irmo-nos deitar para podermos aproveitar o dia seguinte.

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Ilustração de Bruna Marques



Capítulo VI Levantámo-nos cedo. O dia prometia. Estava ansioso por rever Pablo para que nos levasse para outros sítios. O pequeno-almoço foi rápido, pois Pablo já aguardava o grupo à entrada do hotel. Pablo avisou que não regressaríamos para almoçar, pois faríamos uma paragem no passeio para um piquenique. Saborear alguns petiscos chilenos ao ar livre. Iniciámos a visita, fazendo um circuito que nos permitiu visitar os três vulcões. Ao longo do passeio, íamos parando para observar aves que desconhecíamos e nem conseguíamos identificar. Como ficámos para trás, para observar, apercebemo-nos de três homens que espreitavam os Moais, tentavam abanálos e tinham uma picareta na mão com que tentavam perfurar a pedra das estátuas. Pareceu-nos que alguns se mexiam, mas sabíamos que, tendo em conta o peso, era impossível. Ao longe, não dava para ver o que realmente faziam. Com receio de nos perdermos, corremos, eu e a minha irmã, para nos

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juntarmos ao grupo. Pablo disse-nos que deveríamos fazer uma paragem para descansar, deveríamos beber líquidos para nos hidratarmos e reabastecer as energias, pois da parte da tarde, até ao pôr do sol, aguardava-nos um longo percurso. No regresso, fizemos outro percurso, que nos permitiria ver todos os bustos ao longo da ilha. Pablo disse que aproveitássemos para tocar, pois rocha mais resistente não encontraríamos. - Pablo, posso tirar uma foto abraçada a um Moais? – Perguntou a minha irmã. - Claro, podem tirar todas as fotos que desejarem, todas as que vos permitam relembrar esta viagem inesquecível. – Respondeu. Encostámo-nos a uma estátua de costas para o mar e os meus pais pediram a Pablo que nos fotografassem. Quando pedi ao meu pai que me ajudasse a subir ao seguinte, notámos diferença na textura e na resistência. Comentámos com Pablo e ele disse ser impossível, pois as estátuas eram todas de uma rocha vulcânica, dura e resistente.

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À medida que nos aproximávamos da aldeia, ouvíamos um barulho intenso de uma multidão, mas falavam tão rápido que não compreendíamos nada. Pablo olhou repentinamente e estava com um ar assustado. - O que se passa Pablo? – Perguntei. Entretanto a atenção de Pablo foi para um turista que tropeçou numa rocha, pois não olhava para o caminho, tentando compreender a confusão que se instalara, e foi de encontro a uma estátua partindo um braço da mesma. O turista ficou assustado, pois não compreendia como conseguira partir uma estátua de rocha sólida. Olhou e viu que a estátua era oca. - Os habitantes estão a comentar que há estátuas que foram roubadas e substituídas por outras de material semelhante ao barro. – Referiu Pablo, dirigindo-se para o turista, tentando ajudá-lo a levantarse. – Peço-vos que não mexam em nada, pois temos de chamar a polícia local para comunicar o sucedido. - Fantástico! Um mistério! Estas férias estão a ser o máximo! – Gritava a minha irmã. Todos a olha-

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vam sem compreender o motivo da alegria no meio daquela confusão. Ao andar para trás e para a frente, como uma tolinha, a minha irmã partiu o outro braço da estátua. Pablo, reparando no ar assustado dela, brincou, dizendo que ela tinha ganho um prémio por ter derrubado uma estátua secular. A polícia chegou e pediu-nos para nos afastarmos das estátuas, pois teriam de verificar quais tinham sido substituídas. - Pai, hoje de manhã, quando íamos visitar os vulcões, vimos três homens junto às estátuas com uma picareta. – Disse. O meu pai falou com o chefe da polícia, mas não consegui compreender nada. - Pai, o que disse ele? – Interroguei ansioso. - Ele perguntou-me se podíamos ajudar na investigação. – Respondeu o meu pai. - Que disseste tu papá? – Perguntou a minha irmã. - Não disse nada, pois não posso tomar essa decisão sozinho, temos de nos reunir em família e ver se nos queremos envolver. – Disse o meu pai com

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receio de se envolver com criminosos e perder os últimos dias de férias que nos restavam. A visita cessou naquele momento. Foi-nos pedido a todos a identificação e local da estadia na ilha, pois, mais tarde, seríamos todos interrogados. Naquele momento, os polícias iriam aproveitar o resto de luz do dia para analisar as estátuas e verificar indícios da vandalização. Regressámos ao hotel, num estado de cansaço extremo. O meu corpo implorava cama. No entanto, acho que não conseguiria dormir com tamanha excitação, consequência da curiosidade sobre o motivo de tal mistério. Ao jantar, a minha mãe resolveu experimentar uma nova iguaria marinha, um peixe grelhado, cujo nome não me atrevo a pronunciar. O meu pai ficouse pelo cordeiro e pela mandioca e nós provámos um pouco do prato dos dois. Para falar verdade, a minha mãe tinha razão, era delicioso. A verdade é que o meu pai nunca foi muito amante de peixe, ele dizia que as espinhas picavam como as agulhas e os ossos não tinham ponta afiada, por isso não corria o risco

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de se espetar. Durante o jantar, o meu pai perguntou-nos o que tínhamos visto realmente. Nós descrevemos o mesmo cenário: três homens a abanar estátuas com uma picareta. De seguida, perguntou-nos o que pensávamos sobre o ajudar a desvendar o mistério. Nas mesas em redor, ouvia-se dizer que tinham encontrado dentro das três estátuas notas marcadas, cujo valor era coincidente com o assalto ao banco local há um mês atrás. - Jorge, penso que deveríamos ajudar na resolução do mistério. O Miguel e a Mariana ajudam na identificação dos três homens e se possível, ainda que seja no final do dia, gostaria de passar a nossa última noite cá, na feira artesanal Hanga Roa, e jantar, para a despedida, mais um dos pratos exóticos da região. – Referiu a minha mãe. Todos concordámos com a minha mãe, por isso não nos deitaríamos até que a polícia chegasse. Com tanta visita, agitação e emoção a minha irmã e a minha mãe nem se aperceberam que não deram uso aos seus biquínis.

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Quase de madrugada, chegou a polícia com novidades acerca do acontecimento. Reunimo-nos no átrio do hotel e um dos agentes, baixo, robusto, meio calvo e de bigode, comunicou-nos que havia três Moais falsos, ocos por dentro, cheios de notas que tinham sido roubadas no assalto ao banco. Perguntou quem tinham sido os meninos que tinham avistado os suspeitos. O meu pai comunicou: - Foram os meus filhos, o Miguel e a Mariana. - Eles terão de ser interrogados, mas, como são menores, terá de ser na sua presença e com a sua autorização. Podemos contar com o vosso auxílio? – Perguntou o polícia. - Claro que sim! Estamos de férias, mas podemos interrompê-las por um dia. – Concordou o meu pai. – Ainda pretendemos praticar o ritual do Homem - Pássaro e visitar a feira Hanga Roa antes de partirmos. – Concluiu. - Vão descansar um pouco, até cerca das 11 horas e depois podemos iniciar o interrogatório. – Sugeriram os polícias.

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Ilustração de Inês Freire



Capítulo VII A minha mãe acordou-nos às dez e meia para nos vestirmos e tomarmos o pequeno-almoço antes de irmos para o auditório do hotel, onde estariam os polícias à nossa espera pelas onze horas. Quando chegámos ao auditório, já nos aguardavam. Após os cumprimentos iniciais, indicaram-nos onde nos devíamos sentar. Um dos polícias pediu-nos para descrevermos o que tínhamos visto. - Quando estávamos a visitar os Moais, olhámos para trás e vimos três homens, dois altos e um mais baixo, que era muito gordo. Um dos homens altos era negro, com o cabelo louro encarapinhado e o outro era um magricela ruivo. – Referi eu. - Eles tinham na mão uma picareta. – Acrescentou a Mariana. - Provavelmente andavam à procura dos Moais falsos para retirarem as notas que lá tinham posto. – Pensava o polícia em voz alta. – Mas essa descrição não me é estranha, é coincidente com a dos três

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homens procurados pela polícia na sequência do assalto ao banco e dos últimos desacatos na ilha. Estes homens foram presos após o assalto, foram julgados e condenados, no entanto, durante o caminho que os levava à prisão, houve um acidente e fugiram. Os polícias ficaram com a certeza de quem andavam à procura. Eram os assaltantes do banco que tinham fugido. Pelo menos ficaram a saber que ainda se encontravam na ilha e iniciaram a busca em todas as pensões e hotéis da ilha. Após o almoço, decidimos ir junto à cratera, pois o meu pai queria praticar o ritual do Homem– Pássaro. Pablo aguardaria o grupo pelas 14 horas no átrio do hotel.

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Ilustração de Mariana Leitão



Capítulo VIII Às 14 horas, Pablo aguardava e os turistas iam chegando. Partimos. Pelo caminho Pablo ia falando: - Hoje, vamos ter um dia especial. Vamos dramatizar a vida de um nativo da ilha num momento muito importante. Assim, vamos a pé até à aldeia de Orongo. Nesta aldeia, os nativos competiam todos os anos para escolher o representante do deus Makemake na terra. - Como era a competição? - Perguntou um menino ao meu lado. - Os nativos vestiam-se de Homem-Pássaro e saltavam do penhasco formado pela cratera do vulcão, nadavam no mar cheio de tubarões até às ilhas em volta para trazer o ovo de uma ave migratória, a Fragata. - Informou Pablo. - Como se sabe tudo isso, se já se passou há muito tempo? - Continuou o menino. - Estes povos deixaram as suas marcas nos petróglifos espalhados pelas rochas da aldeia. - Con-

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cluiu Pablo. Estás a ver estes desenhos nestas rochas aqui? - Sim. - Confirmou o menino. - Quem quer transformar-se num nativo e praticar o ritual do Homem-Pássaro? - Perguntou Pablo. - Não sei se consigo, mas gostaria de tentar. Arriscou o meu pai. O meu pai despiu-se e Pablo, orientador do ritual, pegou num pau e mergulhou-o em lama. Logo de seguida, pintou a cara do meu pai, fazendo riscos nas faces e na testa. Não percebia muito bem a razão daquelas pinturas. O meu pai e Pablo saltaram o penhasco até ao fundo da cratera, entrando na água. Admito que me sentia um pouco nervoso e com receio que algo acontecesse ao meu pai. Encostei-me à minha mãe. Ela percebeu o meu medo e apertoume junto a ela. Relaxei, quando o vi acenar, gritando para nós. Tirei muitas fotografias. De seguida, o meu pai e Pablo escalaram, vindo ter connosco. Cerca de trinta minutos depois estavam junto de nós. O dia estava a chegar ao fim e decidimos regressar ao hotel para nos prepararmos para ir

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Jantar à feira de Hanga Roa. Quando regressámos ao hotel, soubemos que os assaltantes tinham sido encontrados numa pensão junto ao mar e já se encontravam na prisão. O dinheiro foi recolhido, contado e entregue ao banco. E os Moais falsos foram destruídos. A noite destinava-se, conforme desejo da minha mãe, à feira de Hanga Roa. Por lá iríamos jantar e, quem sabe, divertirmo-nos. - O que querem jantar? - Perguntou a minha mãe. - Hoje, mãe, a noite é tua. Decide o que desejas, que te acompanharemos. Não é verdade? - Referi eu, olhando para o meu pai e para a minha irmã. - Concordamos! - Responderam. - Então, sugiro um pastel de atum e queijo para entrada e um peixe grelhado acompanhado com batata-doce e após o jantar uma visita à feira para levarmos algumas lembranças e, por fim, assistiremos a um espetáculo para vermos e dançarmos a dança típica de cá, o sau sau.

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- Então, vamos jantar, para podermos ter tempo para tudo, pois, amanhã de manhã, estaremos de partida. - Relembrei eu. Estava de noite. Jantámos calmamente à luz de tochas e ao som de uma música muito agradável. No ar, pairava o aroma dos grelhados. Após o jantar fizemos uma visita pela feira e comprámos pequenos Moais para oferecer a amigos e familiares como recordação da nossa viagem. Por fim, assistimos a um grande espetáculo de dança por um grupo de bailarinos vestidos e maquilhados como se fossem nativos das tribos. O cansaço e o sono já pesavam. A minha irmã pedia para regressar ao hotel e dormir. Todos juntos decidimos voltar para o hotel, pois amanhã estaríamos de regresso à Covilhã.

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Ilustração de Leonor Nabinho



Capítulo IX Levantámo-nos cedo para nos arranjarmos e fazer as malas. Dirigi-me à varanda para uma última olhadela daquele paraíso e apercebi-me o quanto já sentia saudades de casa, da família e dos amigos. Iria regressar com muitas histórias para contar. Após o banho, descemos para tomar o último pequeno-almoço no hotel e, de seguida, subimos para ir buscar a bagagem, pois tinha chegado a hora de partir para passar o Natal a casa. Chamámos um táxi para nos levar à extremidade da ilha, pois aí é que apanharíamos o avião para regressar a Lisboa. Apanhámos um autocarro para embarcar no avião. O autocarro partiu logo de seguida. A minha irmã adormeceu de imediato e eu olhava pela janela vivendo mentalmente todas as nossas férias e imaginando as histórias que contaria aos meus avós maternos que iriam passar o Natal connosco. Iria dizer-lhes que as viagens de avião foram o máximo, que entrei nas nuvens, planei e saí. Contaria as visitas aos Moais, o mistério, as receitas que

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provámos, a história da ilha e o ritual do HomemPássaro. Contaria que vi o meu pai nu, que ele se pintou como um nativo da ilha, que desceu a cratera e que naquele momento nos preocupámos imenso com ele, devido à sua demora. Adormeci. - Acordem! Acordem! - Chamou o meu pai. - Já chegámos? - Perguntei eu, ensonado, esfregando os olhos. - Sim, vamos para o avião. - Informou o meu pai. - Mas estou com fome! - Queixou-se a minha irmã. - Agora não temos tempo para lanchar, tomem uma barrita de chocolate para aguentarem até ao almoço. - Disse a minha mãe. Devorámos a barrita em segundos. A fome persistia, mas tínhamos que aguentar. Já no avião, cerca de duas horas depois, a minha irmã começava com as suas lamentações “já chegámos”, “falta muito”, “quero ir para casa” … Quando chegámos ao aeroporto de Lisboa era de noite. Após termos ido buscar a bagagem, dirigi-

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-mo-nos ao estacionamento junto do nosso carro. Antes de sair de Lisboa, o meu pai fez-nos uma surpresa, levou-nos a ver o jogo

Sporting -

Porto. O resultado foi 1-1. Satisfeitos rumámos à Covilhã. Amanhã era véspera de Natal e ainda nos restavam alguns dias de férias para estarmos com a família, contar histórias e entregar as nossas lembranças.

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AUTORES E ILUSTRADORES: António Pinto Breno Cabral Bruna Marques Inês Freire João Venâncio Mariana Leitão Miguel Brás Leonor Nabinho




Ilustração de Breno Cabral


Iniciámos a visita, fazendo um circuito que nos permitiu visitar os três vulcões. Ao longo do passeio, íamos parando para observar aves que desconhecíamos e nem conseguíamos identificar. Como ficámos para trás, para observar, apercebemo-nos de três homens que espreitavam os Moais, tentavam abaná-los e tinham uma picareta na mão com que tentavam perfurar a pedra das estátuas. Pareceu-nos, que alguns se mexiam, mas sabíamos, que, tendo em conta o peso, era impossível. AEPC


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