MEDIA + Igual - Boletim N.º 5 Janeiro 2014

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Boletim Informativo Escrita Igualitária nos Media

Janeiro de 2014

Boletim Informativo Integra uma selecção de notícias publicadas de 1 a 31 de Janeiro de 2014, a partir da monitorização de nove títulos de imprensa escrita portuguesa: - dois de âmbito regional: As Beiras Diário de Coimbra - sete de âmbito nacional: Correio da Manhã Diário de Notícias Público Caras Maria Happy Woman Men’s Health Nesta edição: 1. Editorial 2/3. Visibilidades positivas 4/5. Desigualdades e estereótipos 6/7./8/9/10. Violência doméstica 11. Em poucas palavras 12. A fechar/ Agenda/ Saber +

MEDIA+igual Com a viragem do ano e a publicação do boletim dedicado à monitorização de Janeiro, chegámos sensivelmente a meio do projecto MEDIA+Igual. Este tem sido um caminho que nos enche de orgulho, já com a sinalização de 456 artigos na imprensa relacionados com questões de (des)igualdades de género nos meios de comunicação social. A que se junta também a consequente desconstrução de exemplos negativos e a visibilidade dada aos exemplos positivos que — felizmente — também vamos encontrando nas páginas dos jornais e revistas monitorizadas. Na análise deste mês, a violência doméstica surge como tema predominante, através de um retrato mediático em que as mulheres surgem como vítimas e os actos dos agressores muitas vezes menorizados por variadas justificações. Não esquecer, a este respeito, que, em Janeiro, três mulheres morreram, num período de apenas dois dias, às mãos dos seus actuais/ex companheiros.

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visibilidades positivas As questões ligadas às (des) igualdades de género na Administração Pública — e à própria linguagem inclusiva — ganharam uma visibilidade mediática acrescida com a cobertura noticiosa do jornal Público. Em dois momentos distintos, a 04 e 22 de Janeiro, o diário dedicou artigos alargados (de uma e duas páginas, respectivamente) ao Plano Nacional para a Igualdade de Género, Cidadania e Nãodiscriminação 2014-2017 . No primeiro artigo, “Governo vai avaliar se a ‘linguagem inclusiva’ já chegou à Administração”, é positivo o destaque dado ao próprio documento legislativo, mas também a diversidade de fontes e de áreas de análise. O alerta para o diminuto número de empresas públicas a implementar planos de igualdade

(relembrando a legislação anterior à publicação do novo Plano Nacional) serve também como pressão pública para que esta realidade seja invertida. É também de notar, neste primeiro artigo, a relevância dada à área da educação (com o debate sobre a necessidade de existir uma disciplina específica que aborde a igualdade de género). No segundo artigo do Público, “O género feminino aparece entre parênteses no Plano para a Igualdade”, o ênfase é colocado na linguagem inclusiva. Explorando as contradições entre o que o Plano para a Igualdade preconiza e a forma como este foi publicado oficialmente (em Diário da República), a notícia explica a importância da referência a ambos os géneros das palavras de forma igualitária, assim

como a relevância do uso de uma linguagem inclusiva. Isto mesmo tendo em conta que, no primeiro artigo sobre o Plano Nacional, da autoria da mesma jornalista, era referido que a linguagem inclusiva poderia ser feita com parênteses ou barras diagonais — quando este segundo artigo acaba por estar centrado no uso errado dos parênteses. Esta apresentação de informação contraditória, em textos distintos, pode contribuir para uma percepção errada do tema da linguagem inclusiva.


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visibilidades positivas Também no jornal Público surge este artigo (de 08 de Janeiro), dedicado ao Festival de Cinema de Cannes e à escolha de Jane Campion para presidir o júri do certame. Com o título “Jane Campion, a única mulher com uma Palma de Ouro, preside ao júri de Cannes em Maio”, há uma óbvia referência a assimetrias de género. E se, em boletins anteriores, este tipo de títulos foi criticado por o género da pessoa não ser relevante para a notícia, aqui passa-se o contrário: as assimetrias de género no Festival de Cannes são uma parte fundamental do artigo. Neste caso, o título é justificado e salientado pela positiva, assim como o restante artigo. Ao longo do discurso jornalístico, é dada visibilidade à falta de mulheres galardoadas com a Palma de Ouro, através de argumentos de realizadoras e do colectivo feminista francês La Barbe, que fez publicar uma carta aberta sobre este tema (da qual o Público cita o seguinte trecho: “os homens adoram que as mulheres tenham profundidade, mas só no que toca ao seu decote”). A própria Jane Campion é citada na sua denúncia do sistema de estúdios “como uma espécie de sistema de velhos rapazes”. Esta visibilidade às assimetrias de géneros na cultura cinematográfica acaba por contribuir para a des-

construção desta realidade, através do alerta à opinião pública. O artigo é enriquecido com argumentos factuais (“mas [Jane Campion] continua a ser, em 67 anos de história do festival, a única mulher que ganhou a Palma”) e recurso a uma diversidade de fontes relevantes. Também a escolha da fotografia

ilustrativa é bastante interessante. Em primeiro plano, surge a realizadora neozelandesa, isolada. Atrás, inúmeros fotógrafos (na sua grande maioria do sexo masculino) fotografam a presidente do júri. Ou seja, também a imagem exibe uma componente visual muito forte de assimetrias de género, o que contribui para a leitura discursiva deste tema.


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desigualdades e estereótipos “Não há supermulheres”. É desta forma que o Diário de Noticias intitula um tema dedicado à conciliação de cargos de chefia com actividades da esfera familiar, através da apresentação do caso específico de três mulheres. Por um lado, considera-se positiva a valorização das carreiras femininas e a visibilidade dada às mulheres em cargos de chefia. No entanto, o modelo de discurso apresen-

tado recai na distinção de casos isolados, que funcionam como excepção — e, portanto, poderão reforçar estereótipos de que esta realidade dos cargos de chefia não se aplica a todas as mulheres. Ainda numa perspectiva de estereótipos, verifica-se que, mais uma vez, o retrato mediático de mulheres em cargos de chefia não é dissociado da esfera familiar. E, portanto, reforça-se o papel, dito ‘natural’, da mulher como esposa,

mãe e cuidadora do lar. Tendo em conta que, tradicionalmente, a esfera familiar é frequentemente associada ao feminino, este tipo de representações mediáticas tendem a legitimar papéis assimétricos de género. Ainda a este respeito, a apresentação de cada uma das mulheres é sempre feita com o seu nome, idade e número de filhos/ netos (assumindo-se que estes sejam os seus aspectos identitários básicos). Essa normalização e naturalização do papel da mulher na família é também reforçada através de alguns dos testemunhos apresentados (por exemplo, “sou mulher e tenho de continuar a fazer coisas enquanto tal, tenho marido e não posso descurar isso, sou mãe e não posso descurar dos meus filhos”). De forma a que o artigo fosse mais diverso, seria benéfica a inclusão de exemplos mais heterogéneos, tanto a nível dos cargos desempenhados, como da classe social das entrevistadas. Ao nível das funções nas empresas, por exemplo, as três mulheres apresentadas desempenham cargos ligados à gestão de recursos humanos, tradicionalmente vistos como mais ligados ao género feminino (e, neste contexto, acabando por reforçar novas assimetrias de géneros em áreas profissionais). De referir ainda que a caixa “Portugal é o país com mais milionárias” não está associada ao tema principal do artigo, podendo gerar leituras erróneas.


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desigualdades e estereótipos Na cobertura mediática à publicação “Análise do género nos serviços do MJ [Ministério da Justiça]”, este artigo do Diário de Notícias, de 6 de Janeiro, dá conta dos principais resultados da realidade de homens e mulheres funcionários/ as da Justiça. No geral, este é um artigo positivo, que faz uma análise de género em contexto laboral, incluindo perfis exemplificativos de mulheres dirigentes que são exclusivamente profissionais (não se adiantando pormenores da esfera pessoal/ familiar de cada uma destas mulheres). No entanto, a forma como a linguagem é usada neste discurso jornalístico acaba por transmitir algumas mensagens ambíguas, como o que acontece no próprio título, “Mulheres já estão a ganhar mais mas chefiam menos”. Este título acaba por generalizar os dados do Ministério da Justiça a uma realidade mais ampla, contribuindo para uma mensagem (errada) de que as mulheres, no geral, ganham mais do que os homens (quando o que se verifica é o contrário). O título poderia, por isso, ser mais explícito, coadunando-se melhor ao subtítulo e ao próprio texto. Também a caixa que acompanha o texto está desajustada do tema principal. Apesar de se referir a um estudo sobre “As Mulheres na Magistratura em Portugal”, não existe nenhuma componente de género associada ao texto. Muito

pelo contrário, o título escolhido “Portugueses têm imagem negativa dos tribunais” pode parecer, à primeira vista, uma reacção aos dados apresentados no texto principal (de que as mulheres ganham mais, em média, no Ministério da Justiça, mas não ocupam tantos cargos dirigentes) — quando, na verdade, se tratam de dados independentes do relatório tratado no artigo principal. O primeiro parágrafo denota ainda usos de linguagem que poderão reforçar estereótipos: “Ainda são os homens quem ocupa mais cargos dirigentes da Justiça, mas as

mulheres já são a maioria e têm, até, os ordenados mais altos”. O uso das palavras “ainda” e ´”até” vem legitimar um statuos quo de que as chefias são maioritariamente homens . Seria interessante que no artigo, constasse a distinção, no que diz respeito ao género, entre cargos de nomeação e vagas a concurso. Por fim, é importante sublinhar que as regras de contratação da função pública obrigam à não -discriminação entre géneros. Daí que a realidade no sector público não possa ser generalizada ao sector privado.


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violência doméstica Em apenas dois dias de Janeiro, três mulheres foram assassinadas pelos companheiros (actuais ou anteriores). Daí que, em termos mediáticos, estes diferentes casos tenham surgido frequentemente juntos na imprensa diária monitorizada. A realidade é trágica e a junção dos múltiplos casos na mesma cobertura mediática permite dar visibilidade à dimensão da violência doméstica em Portugal. O artigo do Diário de Notícias de 14 de Janeiro, “Tiro fatal no rosto põe fim a ‘relação de amor-ódio”, retrata a morte de Ana Raquel. Logo no início do texto, há a referência aos outros dois femicídios, o que descontrói a perspectiva destes crimes como caso isolado. No entanto, o título acaba por repercutir estereótipos associados à violência doméstica, nomeadamente com a justificação do agressor pela referência ao “amor”. A expressão “relação de amor-ódio” denota uma simetria entre o casal, contrária às assimetrias verificadas na violência doméstica. Já a caixa final, “Vítimas não vêem sinais de violência e desculpam” é bastante positiva, por dar visibilidade a sinais de violência no namoro. O artigo cita fontes da APAV (Associação Portuguesa de Apoio à Vítima) e da UMAR (União Mulheres Alternativa e Resposta).

destaque ao homicídio de Ana Raquel, no artigo “Executa mulher a tiro em frente às filhas”, de 14 de Janeiro (na página ao lado). Trata-se de uma descrição muito mais sensacionalista do que a do Diário de Notícias, com vários pormenores do homicídio. A própria expressão “saco de pancada” acaba por recair neste sensacionalismo discursivo (transformando a violência em entretenimento), apesar de retratar a continuidade de agressões sofrida pela vítima.

Também o Correio da Manhã deu

O jornal faz igualmente uma refe-

rência aos outros casos de homicídio de mulheres pelos respectivos parceiros, em Janeiro. Notam-se, no entanto, várias tentativas de encontrar uma justificação dos agressores, na apresentação destes outros casos. Ainda no Correio da Manhã, verifica-se que a informação sobre “queixas retiradas” acaba por passar uma mensagem errónea, tendo em conta os actuais procedimentos legais. Nesse sentido, eis o esclarecimento da APAV, para o Média+Igual, sobre o tema:


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violência doméstica O crime de violência doméstica, previsto no art. 152º do Código Penal, é um crime público, isto é, qualquer pessoa o pode denunciar às autoridades, sendo esta denúncia o suficiente para que o Ministério Público instaure o procedimento criminal. Não é necessário que seja a própria vítima a apresentar queixa-crime, podendo o Ministério Público tomar conhecimento da ocorrência por conhecimento directo; porque outra autoridade judiciária ou um órgão de polícia criminal o presenciou, lavrando auto de notícia; porque alguém soube da ocorrência do crime e o denunciou ao Ministério Público. Por ser um crime público não é admissível a desistência de queixa, ou seja, o procedimento criminal não cessa com a comunicação do ofendido de que pretende desistir da queixa-crime. No entanto, caso a/o ofendida/o declare

perante as autoridades policiais ou judiciais que não pretende o procedimento criminal, apesar de não ser admissível a desistência da queixa, é possível, desde que estejam preenchidos os pressupostos legais, que o Ministério Público proponha uma suspensão provisória do processo, mediante a imposição ao arguido de injunções ou regras de conduta. Frequentemente, nos casos de violência doméstica, existem vítimas que depois de apresentada a denúncia informam as autoridades de que pretendem “desistir” da queixa, ou seja, que não desejam prosseguir com o procedimento criminal. Nestes casos o Ministério Público pode verificar a existência dos pressupostos para aplicação da suspensão provisória do processo, indo ao encontro da vontade da/o ofendida/o, ao mesmo tempo que aplica injunções e regras de conduta ao/à arguido/a

de forma a prevenir a ocorrência de novos casos. Por desconhecimento ou falta de informação, muitas vítimas que viram o procedimento criminal suspenso, referem-se a esta medida como “desistência de queixa”. Porém, é possível que haja situações de violência doméstica qualificadas como crime de ofensas à integridade física e não como crime de violência doméstica e, nestes casos, dado que se trata de um crime semi-público, já será admissível a desistência da queixa. Aconselha-se, portanto, uma melhor averiguação sobre as eventuais “desistências”, bem como uma atitude pedagógica informando de forma simples, mas precisa, sobre as etapas do procedimento criminal. Neste sentido, pode ser consultado o site www.infovitimas.pt. APAV — Coimbra


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violência doméstica Na cobertura do homicídio de Manuela Santos pelo seu ex-companheiro, tanto os discursos mediáticos do Diário de Notícias, como do Correio da Manhã acabaram por procurar justificações para o crime, através de suposições não provadas. No caso do Correio da Manhã, o artigo de 13 de Janeiro, intitulado “Executa mulher por ciúmes e dívidas” (em baixo), o próprio título reforça a tentativa de justificação do homicídio. Além disso, logo no primeiro parágrafo pode ler-se que “José Henriques, taxista, 50 anos, não aguentou mais os ciúmes nem o facto de a ’ex’ não lhe pagar o que devia e ainda gozar com ele”. O discurso, legitimado por surgir no espaço mediático, assume como ‘facto’ as alegações do agressor, sem as questionar, nem desconstruir. Neste retrato mediático, verifica-se, portanto, um certo grau de culpabilização da vítima. A expressão “não aguentou” também carac-

teriza a situação como um acto impensado, a que o homicida não conseguiu resistir. Contudo, o próprio texto acaba por denotar que o agressor passou a noite à porta da casa da vítima, o que reflecte premeditação. Desta forma, o discurso jornalístico acaba por construir um reforço de assimetrias de género e tentativa de justificação de crimes de natureza passional.

No artigo do DN, “Mulher morta a tiro no interior do seu café pelo antigo companheiro”. de 13 de Janeiro, verificam-se idênticas tendências de justificação do crime, embora não de forma tão explícita como no Correio da Manhã (até porque o discurso deixa claro que se tratam de alegações do agressor e não afirmações legitimadas pelo próprio jornalista).


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violência doméstica “‘Ecossistema com falhas’ explica violência doméstica” é o título deste artigo da edição de 09 de Janeiro do Diário de Coimbra. Num trabalho jornalístico dedicado exactamente à cobertura de um debate sobre violência doméstica na perspectiva da Psicologia, o discurso mediático falhou na desconstrução da mensagem veiculada no evento.

percepção errónea da violência doméstica por parte do público. Isto mesmo tendo em conta que há vários aspectos muito relevantes (e de visibilidade positiva) mencionados ao longo do artigo (por exemplo, a questão das assimetrias de poder entre géneros no “ecossistema” social). No entanto, esse efeito positivo acaba por ficar perdido pela falta de desconstrução jornalística dos conteúdos do debate.

Ao longo do artigo, as citações usadas são várias e extensas, mas acabam por não ser contextualizadas. O discurso jornalístico limita-se, assim, a repercutir citações, sem trabalhar na descodificação da mensagem para o público generalista. Como resultado, a forma como o discurso está apresentado acaba por contribuir para uma

Caso existisse oportunidade de um maior trabalho de desconstrução dos conteúdos do debate, o texto poderia resultar num discurso mais claro e, por isso, com um papel mais relevante na formação de uma opinião pública informada, no que diz respeito à violência doméstica e às assimetrias sociais entre géneros.

Também no Diário de Coimbra surge o artigo “Homem acusado de violar menor de 14 anos que engravidou”, a 10 de Janeiro. Numa notícia dedicada ao julgamento de um padrasto acusado de violar a afilhada menor, o discurso acaba por dar bastante ênfase aos pormenores do aborto que a jovem fez (resultado da violação). Esta questão surge logo na primeira coluna de texto, com uma referência minuciosa aos dias de gestação, local do procedimento de interrupção voluntária da gravidez e de quem foi a decisão (da menor e da mãe). Sendo um tema social delicado, os pormenores poderão

deixar vulnerável a menor (mesmo estando a sua identidade protegida). O mesmo se aplica às descrições — também pormenorizadas — dos abusos do agressor. Acabam por não ter relevância para a informação pública do caso (são pormenores do julgamento) e menorizam a protecção da menor. Tendo em conta o papel dos media e a sua visibilidade pública, torna-se relevante que esta sensibilidade de protecção das vítimas exista por parte dos profissionais e dos próprios órgãos de comunicação social.


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violência doméstica O artigo “Salta por janela a fugir à mulher”, da edição de 05 de Janeiro do Correio da Manhã, foi seleccionado pela representação mediática específica de um caso de violência doméstica em que a agressora é uma mulher. A construção do discurso e a linguagem usada enfatizam um carácter bizarro e até cómico da situação, acabando por reforçar assimetrias de género (o caso é retratado como ‘cómico’ porque sai do ‘comum’ no que concerne aos papéis de género na violência doméstica). De realçar, ainda, a patologização

da mulher agressora. Enquanto a maioria dos artigos monitorizados relativos a violência doméstica tentam encontrar uma justificação para os crimes quando perpetrados por homens (nomeadamente os ciúmes), neste caso não são apresentados motivos para o comportamento da mulher. Há, no entanto, uma ênfase na tal dimensão de patologia (“mulher em fúria”, “foram precisas cerca de quatro horas para acalmar a agressora — que acabou detida e transportada pelos Bombeiros de Esposende para a unidade de psiquiatria do Hospital de Braga”). O discurso reforça, desta forma, estereótipos que associam o comportamento agressivo das mulheres à

loucura/histeria — numa patologização genderizada comum ao longo da história.

em poucas palavras Público, 28/01/2014

A expressão “mulheres de conforto” resulta de um branqueamento oficial, através da linguagem, da escravatura sexual a que as mulheres retratadas no artigo foram sujeitas durante a segunda Guerra Mundial. Ao reproduzir este mesmo uso de linguagem, sem contexto imediato (nem no título, nem na entrada), o discurso jornalístico serve como continuador deste branqueamento. Além disso, o tema da escravatura sexual associada ao esforço de guerra surge aqui como tema ‘exótico’, sem a desconstrução de que se trata de uma realidade global.

Diário de Notícias, 22/01/2014

Dando espaço a um tema surgido nas redes sociais, o Diário de Notícias acabou por legitimar — através do discurso mediático — a tentativa de fiscalização da aparência feminina. O artigo reporta-se à escolha de vestuário (considerado inapropriado) de uma assessora do Palácio de Belém durante a condecoração do futebolista Cristiano Ronaldo. O tema em si, e o recurso a fontes especialistas em protocolo, parece uma forma de legitimar um ‘mexerico’ das redes sociais. Além disso, o tema denota assimetrias de género no escrutínio de indumentárias de homens e mulheres.


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entrevista: Reynald Blion MEDIANE, assim se chama o projecto conjunto entre o Conselho da Europa e a União Europeia para promover a diversidade e a nãodiscriminação nos media europeus, através da troca de boas práticas entre profissionais. A poucas semanas do encontro de Lisboa, agendado para os dias 26, 27 e 28 de Março e que pretende reunir contributos do sector dos media, o coordenador do projecto, Reynald BLion, defende que as soluções devem ser encontradas entre os próprios profissionais. Como surgiu a necessidade de criar um projecto centrado exclusivamente nos media? Já desenvolvemos três projectos relacionados com os media no âmbito do trabalho do Conselho da Europa desde os anos 90, altura em que fizemos recomendações aos vários governos para que promovessem a não-discriminação. A realidade que observámos nos anos 90, em virtude dos resultados de investigadores, foi que os grupos minoritários não estavam incluídos nos conteúdos mediáticos. As notícias eram feitas e dirigidas a homens brancos, com mais de 45 anos. E essa acaba por ser uma ten-

dência que continua. A partir da observação de que muitos grupos não estavam incluídos na produção de notícias, o Conselho da Europa apresentou recomendações para que os governos desenvolvessem medidas. Depois disso surgiu a necessidade de acções directas com o sector mediático. Quais os resultados esperados deste projecto MEDIANE? Como Conselho da Europa, somos um mediador para que os media possam ter ideias sobre a melhor forma de implementar mais inclusão e diversidade [nos conteúdos mediáticos]. Queremos que sejam encontradas soluções comuns, baseadas na troca de experiências e boas práticas. Consideramos que é melhor aproximar os media para que eles encontrem as suas próprias soluções. Não somos uma organização de media, estamos aqui para facilitar e não para dizer ‘façam isto’, ‘façam aquilo’… Qual tem sido a adesão do sector dos media até agora? Entre 1995 e 2005, quando apresentámos recomendações e resoluções, tivemos um primeiro enquadramento valioso para contactar

organizações que representam os órgãos de comunicação social. Além disso, o Conselho da Europa é valorizado pelas organizações de media devido ao trabalho realizado em prol da liberdade de imprensa. No primeiro projecto ligado directamente ao sector, convidámos várias organizações europeias para contribuírem para enriquecer as propostas do Conselho. Foi um primeiro momento para mostrar que queríamos participar como mediadores, numa abordagem inclusiva para encontrar soluções comuns. Hoje estamos ligados directamente a cerca de 560 players do sector mediático. Tem sido um processo difícil? Ao início foi realmente difícil trabalhar directamente com os media, porque não estávamos habituados. Hoje em dia, e através das organizações de representação dos media, mais de 6000 profissionais estão envolvidos neste trabalho ou recebem informação para a partilha de ideias. E outros projectos independentes já foram lançados pelos próprios media, graças a estas partilhas de boas práticas.


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fomos notícia O projecto MEDIA+Igual ganhou ampla cobertura mediática, a nível regional, mas também nacional, durante o mês de Janeiro. A iniciativa de monitorização de imprensa foi notícia da Agência Lusa, com base numa entrevista feita à coordenadora do projecto, Carla Duarte, do IEBA. A partir daí, foram várias as referências on-line ao projecto. A cobertura noticiosa surgiu, por exemplo, no sítio web do diário As Beiras, do Notícias de Coimbra (regionais), do jornal Expresso, da revista Visão, do Diário Digital, do Diário de Notícias da Madeira e do Notícias ao Minuto (nacionais). No geral, o destaque foi dado à “maioria” de artigos problemáticos sinalizados e à invisibilidade de certos grupos minoritários nos media.

saber + Debater a sexualidade, quebrar preconceitos Reflectir sobre vários aspectos relacionados com a sexualidade humana, a partir da experiência em meio clínico. Este é o propósito do debate “Sexo e Saúde: Orgulho e Preconceito”, uma iniciativa da Associação ‘não te prives’ — grupo de defesa dos direitos sexuais e membro integrante do projecto MEDIA+Igual —, agendada para 02 de Maio, no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. O objectivo passa por perceber as resistências, os preconceitos e o que se pode e deve trabalhar de forma a agilizar e garantir um atendimento inclusivo e justo. Ente os oradores/as, estarão a jornalista São José Almeida, o psiquiatra Hugo Bastos, a médica de família Teresa Tomé e a técnica de serviço social Marta Correia. Para mais informações sobre o evento e a ‘não te prives’ , consulte: naoteprives.org

agenda Reunião MEDIA + Igual 13 de Março Casa de Chá, Jardim da Sereia Coimbra 14h00

na internet Siga-nos no Facebook, em:

www.facebook.com/mediamaisigual Conheça outras iniciativas IEBA:

www.ieba.org.pt/

créditos Edição: IEBA—Centro de Iniciativas Empresariais e Sociais, Janeiro 2014 Revisão: ULAI—Unidade Local de Análise de Imprensa - APPACDM Coimbra, APAV, GRAAL, NÃO TE PRIVES, SOS RACISMO, UMAR Contactos: IEBA—Parque Industrial Manuel Lourenço Ferreira, Lote 12—Apartado 38, 3450-232 Mortágua | ieba@ieba.org.pt


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