Entornos

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ESTADO DE MINAS DOMINGO, 13 DE AGOSTO DE 2017

ENTORNOS

ALÉM DA METROPÓLE

ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A PRESS

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MUNICÍPIOS

9.460 KM ²

A BH DOSVIZINHOS MARTA VIEIRA, TERESA CARAM E LUCAS NEGRISOLI*

DE EXTENSÃOTERRITORIAL

1,6%

DETODAS ASTERRAS MINEIRAS

5

MILHÕES DE HABITANTES

26%

DA POPULAÇÃO DO ESTADO

3,35

MILHÕES DE ELEITORES

24%

DO ELEITORADO DE MINAS

R$ 206,6 BI TOTAL DO PIB

40%

DO PIB ESTADUAL

Com o devido respeito ao escritor que melhor definiu Minas Gerais – João Guimarães Rosa –, na Minas que são muitas, “inconfidente, brasileira, paulista, emboaba, lírica e sábia”, Belo Horizonte chega aos 120 anos também como sinônimo de “muitas outras”, uma espécie de metrópole sem limites. A BH que acolhe todo dia dá emprego e proporciona renda a milhares de trabalhadores e estudantes de dezenas de cidades abrigadas em seu entorno, das vizinhas mais industrializadas Contagem, Betim e Pedro Leopoldo a Nova Lima dos condomínios residenciais e que processa ouro extraído em grande profundidade, e a Ribeirão das Neves, em busca de saídas para desenvolver a sofrida economia local. Dentro desses limites, onde pulsa a vida de 34 municípios que formam a terceira maior região metropolitana do Brasil, pelo menos 450 mil pessoas se deslocam, quase 85% delas em direção à capital. Tamanha interdependência faz desses mais de 380 mil forasteiros em BH, assim como de quem parte da capital para trabalhar e consumir na vizinhança, protagonistas de histórias de amor e ódio pela cidade que recebe, mas sufoca em razão de deficiências do seu sistema de serviços públicos essenciais, como numa panela de pressão. Essa é a sensação da babá Maria Aparecida Pereira Nogueira, de 52 anos, quando se vê espremida na fila do metrô ou dentro dos ônibus num trajeto de até 3h20min de duração de casa, no Bairro Santana, em Ribeirão das Neves, ao apartamento da patroa, no Bairro Buritis, Região Oeste de BH. Os ponteiros do relógio marcam 5h40 no momento em que Cida se prepara para tomar a primeira das três conduções e começar a jornada diária às 8h45. Terminadas as tarefas do dia, às 17h, o retorno nem sempre indica a hora certa de pisar de novo em casa. O tempo da volta sempre dependerá do trânsito e da sorte nos ônibus tomados no percurso. “Meu sonho é ser pobre por apenas um dia. Estou cansada de ser pobre todo dia”, diz a babá, que adotou

BH como local de trabalho, a exemplo de tantos outros moradores da região metropolitana, devido à escassez do emprego, não raro combinada aos baixos salários, em cidades mais pobres do entorno da capital mineira. Prova disso é que 60% dos moradores de Neves que trabalham têm o seu ganha-pão garantido em outros municípios, segundo levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Não bastasse a falta de oportunidades para trabalhar perto de casa, o drama vivido, de forma marcante, por quem depende do transporte público na Grande BH é traduzido em números desanimadores: 19%, em média, dos trabalhadores levam mais de uma hora por dia para chegar ao trabalho. Outro problema grave para quem trafega entre a capital e sua vizinhança é a segurança pública. A assistente financeira Naiara Dias (acima), de 26, transita diariamente entre o endereço de moradia em BH e o local de trabalho em Contagem e enfrenta o risco de caminhar pelas ruas no começo das manhãs – ela acorda às 5h – e à noite. “Nos horários de pico a superlotação no metrô é demais. Há dia em que eu não consigo nem entrar no vagão. O maior problema é a segurança. No trajeto que faço ocorrem muitos assaltos”, reclama. Atraída pela experiência e o salário numa indústria de alimentos instalada em Contagem, há seis anos ela faz o trajeto de casa à estação do metrô José Cândido da Silveira, com destino ao Bairro Eldorado, ponto de partida do ônibus especial mantido pela empresa. No percurso de volta, Naiara desce do metrô às 20h30 e segue por 15 minutos em rua já deserta. No aniversário da capital, ela e a babá Cida Nogueira é que pedem um presente. O desejo é o mesmo: de ter acesso na Grande BH a sistemas públicos eficientes de transporte e segurança. (*) Estagiário sob a supervisão de Teresa Caram


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AS 5 CIDADES MAIS RICAS DA RMBH

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ENTORNOS

ESTADO DE MINAS DOMINGO, 13 DE AGOSTO DE 2017

BELO HORIZONTE

2.491.109

POPULAÇÃO

LIGAÇÕES ESTREITAS TRABALHO E ESTUDO SÃO OS PRINCIPAIS MOTIVOS PARA O FLUXO ENTRE CIDADES AO REDOR DE BH. NESSEVAIVÉM,TODOS ACABAM COMPARTILHANDO OS PROBLEMAS

87.656

PIB (EM R$ MILHÃO)

R$ 35.188

RENDA PER CAPITA

0,810 IDH

CONTAGEM

643.476

POPULAÇÃO

26.275

PIB (EM R$ MILHÃO)

R$ 40.833

RENDA PER CAPITA

0,756 IDH

BETIM

412.003

POPULAÇÃO

22.024

PIB (EM R$ MILHÃO)

R$ 53.456

RENDA PER CAPITA

0,749 IDH

NOVA LIMA

88.672

POPULAÇÃO

9.158

PIB (EM R$ MILHÃO)

R$ 103.282

RENDA PER CAPITA

0,813 IDH

SANTA LUZIA

214.830

Belo Horizonte e as cidades do entorno da capital mineira não apenas se tocam. Elas são engolidas pela proximidade e uma economia interdependente para satisfazer as necessidades de 5 milhões de habitantes numa área de 9.460 quilômetros quadrados de região metropolitana. Os vizinhos seguem BH, embora alguns deles tenham chegado em algum momento da história do seu desenvolvimento econômico a experimentar a condição de destino da população expulsa da cidade grande. Nessa concentração em volta da metrópole, a ligação com Contagem extrapolou os limites e virou exemplo de conexão nacional. Circulam entre as duas cidades 119,6 mil pessoas por dia, terceiro maior movimento entre as nove maiores regiões metropolitanas do país, de acordo com levantamento mais recente, de 2010, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os maiores deslocamentos se dão entre os municípios de Guarulhos e São Paulo e entre Osasco e São Paulo, de acordo com o estudo Arranjos Populacionais e Concentrações Urbanas do Brasil. O fluxo de pessoas entre os municípios, segundo o IBGE, revela que as concentrações urbanas no Brasil se caracterizaram por intenso deslocamento para trabalho e estudo. Na Grande BH, é o motivo que explica também a ligação estreita de uma dezena de cidades atraídas pela capital. Uma das mais próximas, Nova Lima está na oitava posição do ranking, com fluxo de 13.565 pessoas que se deslocam à metrópole em razão de trabalho e estudo. O publicitário Felipe Schepers, de 30 anos, engrossa essa corrente diariamente e não tem dúvidas de que o destaque da capital na produção de tecnologia da informação, além da capacidade de oferecer alternativas de trabalho, reforça o elo entre os municípios, alimentado por jovens como ele. “BH tem um polo de inovação muito ativa e isso estimula jovens de outros municípios da região metropolitana a buscarem mais a capital para estudar e trabalhar. É uma cidade mais contextualizada com tecnologia e do ponto de vista de trabalho tem muito mais opções”, afirma Schepers. Ele mantém em BH uma empresa de soluções para pesquisas de mercado on-line integrada ao chamado San Pedro Valley, uma comunidade de startups que ajuda a perpetuar a fama da cidade, frequentemente lembrada por seus barzinhos, como polo de desenvolvimento tecnológico. Morador de Nova Lima desde os 7 anos de idade, o publicitário atravessa a Zona Sul da capital todos os dias para comandar a pequena empresa, numa rotina que se inicia às 6h para despertar o filho Erick Davies, que vai e volta da escolinha de carro com o pai. “BH tem um papel fundamental para mim no meu crescimento profissional e no pessoal, pensando na minha maturidade, nas opções de lazer, cultura, conhecimento e gastronomia”, afirma.

QUALIDADE DEVIDA

Quando o assunto, no entanto, envolve vida tranquila e de qualidade, BH perde o posto. Schepers não abre mão do cenário bucólico da cidade histórica, conhecida pela atividade minerária do passado e seus atuais condomínios residenciais, matas e córregos. Com 91 mil habitantes, Nova Lima registra IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), – indicador que reflete as condições socioeconômicas da população – de 0,813 e PIB per capita (o Produto Interno Bruto, soma da produção de bens e serviços, dividido pela população) de R$ 103.282,14. Num grande contraste social com outros municípios da Grande BH marcados pelo baixo IDH, a capital já se transforma em fonte de lazer nem sempre acessível. É como vê a capital a babá Maria Aparecida Pereira Nogueira. “Belo Horizonte, para mim, representa trabalho, o que eu não tenho onde moro. Neves também não tem praticamente opções de lazer”, reclama. As horas de folga de Cida só têm sentido dentro da casa ampla e confortável onde ela e o marido curtem os dois filhos e os três netos nos fins de semana. Neves tem PIB per capita de R$ 10.315 e IDH de 0,684, enquanto a capital detém renda por habitante de R$ 35.188 e IDH de 0,810. Quanto mais próximo de um, maior é o desenvolvimento social das cidades traduzido pelo IDH.

POPULAÇÃO

3.245

PIB (EM R$ MILHÃO)

R$ 15.105

RENDA PER CAPITA

0,715 IDH

ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A PRESS

LUCAS NEGRISOLI, MARTA VIEIRA E TERESA CARAM

DESCENTRALIZAÇÃO É O CAMINHO Diminuir a dependência entre os municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte e os problemas decorrentes da pressão do entorno sobre a capital mineira envolve mais que reverter as deficiências no transporte. A solução passa pela descentralização do poder de atração, hoje muito concentrado em BH, e a criação de novos polos de desenvolvimento e serviços na região, avalia a diretora-geral da

"BHTEM UM PAPEL FUNDAMENTAL NO MEU CRESCIMENTO PROFISSIONAL E NO PESSOAL, PENSANDO NA MINHA MATURIDADE, NAS OPÇÕES DE LAZER, CULTURA, CONHECIMENTO E GASTRONOMIA" ● FELIPE

SCHEPERS,

publicitário, morador de Nova Lima, que trabalha em BH

Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Flávia Mourão Parreira do Amaral. “Faz parte das diretrizes do Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado da Região Metropolitana de Belo Horizonte induzir novas centralidades capazes de atender pessoas e a fluxos para reduzir a dependência em relação à capital”, afirma. Parte desse conceito já se aplica aos municípios de Contagem e Betim e a áreas próximas da BR-262, que liga Minas ao Espírito Santo, onde o trabalho seria melhorar a estrutura de grande diversidade de serviços. Outro centro que polariza fluxos da Grande BH compreenderia Nova Lima e as proximidades do entrocamento da BR-040 ao acesso a Ouro Preto. Uma terceira alternativa abrange a Zona Norte da capital e todo o eixo da MG-10, englobando as cidades de Confins, Lagoa Santa e Pedro Leopoldo, com a característica de poder oferecer áreas a projetos da iniciativa privada. A articulação desses novos centros, contudo, demanda um sistema viário eficiente, contemplado na forma de projeto no Plano de Mobilidade Metropolitana. Flávia Mourão observa que a proposta é estudar ligações viárias que são necessárias, junto ao mapeamento do que existe hoje e pode ser aproveitado, além de estudos sobre como integrar as formas de transporte. A licitação do projeto foi con-

cluída. A Subsecretaria de Regulação de Transportes da Secretaria de Estado de Transportes e Obras Públicas informou que está na etapa final dos procedimentos para emitir a ordem de serviços. O prazo de vigência do contrato é de 15 meses, permitindo, portanto, que até o fim de 2018, na expectativa da diretora da Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana, as prefeituras municipais tenham em mãos todo o trabalho de levantamento e identificação das obras necessárias ao plano de mobilidade. Nessa etapa caberá outro esforço, o de buscar recursos para viabilizar o sistema metropolitano de transporte. À reportagem do EM, a Prefeitura de Contagem afirmou, em nota, que a integração do sistema municipal de transporte aos das demais cidades da Grande BH é o maior desafio. “Quase metade dos passageiros de Contagem viaja para outros municípios. Além disso, garantir a modicidade tarifária, ou seja, a qualidade no serviço com preço acessível”, diz a nota. O mesmo raciocínio vale para a segurança pública, tema que tem levado o governo municipal a trabalhar junto com a administração de BH. “Contagem faz limite com Belo Horizonte, isso faz com que as duas cidades tenham aspectos semelhantes no que diz respeito à criminalidade e à violência. Alguns autores de crimes praticados em Contagem residem em Belo Horizonte, e vice-versa.”


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ESTADO DE MINAS

DOMINGO, 13 DE AGOSTO DE 2017

AS 5 CIDADES MAIS POBRES DA RMBH

FOTOS: ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A PRESS

RIBEIRÃO DAS NEVES

319.310

POPULAÇÃO

3.293

PIB (EM R$ MILHÃO)

R$ 10.315

RENDA PER CAPITA

0,684 IDH

NOVA UNIÃO

5.766

POPULAÇÃO

62,291

PIB (EM R$ MILHÃO)

R$ 10.803

RENDA PER CAPITA

0,662 IDH

Melhorias na segurança e na qualidade no transporte são demandas diárias para a babá Maria Aparecida Nogueira, que demora mais de três horas para chegar em casa

INSEGURANÇA AO REDOR PROXIMIDADE TORNA A VIOLÊNCIA UM PROBLEMA CADA VEZ MAIS COMUM. PARA ESPECIALISTAS, COOPERAÇÃO ENTRE PREFEITURAS PODE MELHORAR A SITUAÇÃO LUCAS NEGRISOLI E MARTA VIEIRA

TAQUARAÇU DE MINAS

4.006

POPULAÇÃO

46,492

PIB (EM R$ MILHÃO)

R$ 11.606

RENDA PER CAPITA

0,651 IDH

FUNILÂNDIA

4.153

POPULAÇÃO

42,288

PIB (EM R$ MILHÃO)

R$ 10.183

RENDA PER CAPITA

0,655 IDH

Em maior ou menor grau, mais que a mobilidade, é a segurança pública que afeta ricos e pobres na capital, pressionada por um público flutuante calculado em, no mínimo, o equivalente a 18% de toda população de 2,5 milhões de pessoas, estimada em 2010 pelo IBGE. Dados do Atlas da Violência de 2016 mostraram que apesar da redução do número de homicídios em Belo Horizonte – de 1.351 em 2004 para 731 em 2014 –, os assassinatos cresceram em Minas. No estado, a evolução foi de 2,5% no mesmo período. Estão na Grande BH os dois municípios líderes nessa preocupante taxa de homicídios. Em Betim, há registros de 51,5 casos por 100 mil habitantes e Vespasiano convive com índice de 43,9 em idêntica base. O doutor em sociologia, professor titular da UFMG e secretário municipal de Segurança Urbana e Patrimonial, Cláudio Beato, afirma que soluções para a segurança pública no contexto da Grande BH têm de ser pensadas num modelo de colaboração. “É preciso somar forças, nunca subtrair ou dividir. O compartilhamento de informações entre as guardas dos municípios limítrofes e a realização de ações conjuntas, sempre que viável, é um caminho que se apresenta como o de maior potencial para conduzir ao sucesso.” O risco e o medo nas ruas, combinados à ineficiência do transporte público, são determinantes na relação que a assistente financeira Naiara Dias tem com as duas cidades por onde transita diariamente – BH, local de moradia, e Contagem, de trabalho. A razão de ter escolhido trabalhar longe de casa, de acordo com ela, foi o salário encontrado no município vizinho. Empregada na fábrica da Forno de Minas, uma das maiores indústrias de alimentos do estado, ela usa o metrô até o Bairro Eldorado e de lá segue em ônibus da companhia. No trajeto de casa à estação do metrô e durante os 15 minutos de caminhada de volta para casa, a frequência de assaltos assusta, mas ela avalia que o custo/benefício ainda compensa. “Os salários (em Contagem) são muito

de BH resultou no surgimento de novo bairros, gerando uma demanda por melhorias nos serviços públicos, como o de saneamento básico, de transporte, de saúde e de educação, o que intensificou os problemas urbanos, com destaque para a violência”, justifica. O planejamento de políticas públicas para a segurança, segundo Beato, evoluiu com a aproximação das pastas municipais de várias cidades da região metropolitana. “Os contatos e a troca de experiências já ocorriam de forma pontual entre as guardas municipais dos diferentes municípios. Mas grandes passos estão sendo dados neste ano, com a reunião conosco dos secretários municipais de Segurança de Betim, Nova Lima e Contagem, ocorrida em maio, seguida do encontro entre os corregedores das guardas desses municípios no mês seguinte, e outros posteriores. Nessas ocasiões, são discutidos os problemas, reforçando-se ainda mais a aproximação e a colaboração entre as cidades.”

ALTO CUSTO

Naiara enfrenta trajeto em que há assaltos frequentes melhores do que os de Belo Horizonte. Estou há seis anos na empresa e é um ambiente muito bom para trabalhar, apesar do trajeto”, diz Naiara. O secretário Cláudio Beato afirma ter havido uma grande mudança no panorama da segurança em BH desde janeiro, com as novas responsabilidades da Guarda Municipal, que deixaram de ser apenas patrimoniais, passando a instituição a agir como força de segurança direcionada à prevenção da violência na capital. “O crescimento populacional

Quem contrata trabalhadores sujeitos às pressões do transporte público deficiente e da insegurança nas ruas de BH e entorno é forçado a driblar as dificuldades, o que, em geral, custa caro. A patroa da babá Cida Nogueira, a jornalista Clarice Mendes, desembolsa todo mês cerca de R$ 400 só para o pagamento das passagens para seis viagens diárias em ônibus feitas pela assistente. Não são raras as noites em que Clarice usa aplicativos de transporte particular para levar Cida para casa em segurança, quando as reuniões estendidas durante o trabalho dela exigem que a babá faça horas extras ao fim da jornada de trabalho, que termina às 17h. A Forno de Minas informou disponibilizar estrutura de transporte fretado para o trajeto da fábrica ao metrô do Bairro Eldorado, em Contagem; ao Bairro Nacional e proximidades, também em Contagem, e ao município de Ribeirão das Neves. Do quadro de pessoal da indústria, 45% moram em Contagem e 55% em outros municípios da Grande BH, sendo 22% na capital.

DEPOIMENTO

HEGEL BOTINHA, diretor comercial do Grupo Selpe, especializado em intermediação de mão de obra

FORTUNA DE MINAS

2.872

POPULAÇÃO

33,832

PIB (EM R$ MILHÃO)

R$ 11.780

RENDA PER CAPITA

00,696 IDH

NOVOS CAMINHOS “Demarcar os entornos da capital mineira fica cada vez mais difícil. Afinal, a cidade vai se expandindo e ocupa todos os espaços ao redor, com uma limitação tênue em relação aos outros municípios. Enquanto Belo Horizonte registra o maior número de posições para cargos estratégicos e executivos, no entorno a procura é mais voltada para profissionais de nível técnico e operacional. Essa extensão de limites explica a interdependência com Contagem, Nova Lima e Ribeirão das Neves, três ve-

tores escolhidos para mostrar como um se alimenta de BH ao mesmo tempo em que alimenta BH, ou seja, marca a migração de consumo, emprego, geração de renda e mobilidade entre eles. De um lado, Contagem, como um cinturão que abriga pequenas, médias e grandes empresas de vários segmentos industriais. Do outro lado, Nova Lima,marcadapelamineração,prestação de serviço, comércio e inovação. E Ribeirão das Neves, que tem nas empresas de logística e de atacado a esperança de

uma via para se desenvolver. A expansão, no entanto, leva também muitas empresas a abrir o caminho para o home-office (o trabalho em casa). Os profissionais passam a se deslocar apenas alguns dias por semana. Elas criaram, ainda, mecanismos para facilitar o deslocamento entre os municípios com rotas próprias de transporte. De outro lado, se antes todo mundo queria ir para os grandes centros urbanos, hoje a realidade é outra. As pessoas estão fazendo o movimento inverso, buscam morar e

trabalhar em cidades menores para ter maior qualidade de vida e segurança. Como Belo Horizonte tem foco maior na prestação de serviços e comércio, a mão de obra é flutuante. Muitos moram aqui e trabalham no entorno e vice-versa. Nova Lima, por exemplo, que recebeu diversos investimentos do mercado imobiliário em condomínios e prédios residenciais, tem atraído pessoas que procuram moradia com qualidade de vida, mas trabalham em BH. É um movimento natural.”


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ESTADO DE MINAS

DOMINGO, 13 DE AGOSTO DE 2017

FOTOS ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A PRESS

Melhorar o transporte no entorno da capital é um dos principais desafios de BH e das cidades da região metropolitana

UNIDASTAMBÉM NA CRISE CIDADES VIZINHAS DE BH SÃO ATINGIDAS EM CHEIO PELA ESTAGNAÇÃO DA ECONOMIA, O QUE PÕE EM XEQUE A CAPACIDADE DA CAPITAL EM ABSORVER DEMANDAS DE TODA A REGIÃO POR EMPREGO E SERVIÇOS MARTA VIEIRA E TERESA CARAM Um caldeirão de demandas dos próprios moradores e de quem adotou Belo Horizonte como fonte de emprego, renda e educação, associado à infraestrutura de menos, desafia a capital de 120 anos. A crise da economia brasileira adicionou tensão à fervura, pondo em xeque a capacidade de BH de se manter como polo da região metropolitana. Um dos sinais de cansaço, neste ano, foi o ingresso da cidade na lista dos municípios que mais demitiram do que contrataram durante o primeiro semestre. O saldo do emprego com carteira assinada em BH ficou negativo em 5.022 vagas de janeiro a junho, corte de 0,55%, o que pode parecer pouco, mas não para a força geradora de postos de trabalho na capital. No período acumulado de 12 meses até junho, houve 21.369 dispensas de trabalhadores com registro na cidade a mais que as contratações. O resultado foi 2,32% inferior ao do mesmo período do ano passado, com base nas estatísticas divulgadas pelo Ministério do Trabalho e do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Os municípios do entorno de BH, da mesma forma, sofrem o impacto do freio imposto à economia, depois do dinamismo que eles viveram entre 2000 e 2015, como observa o economista Mario Marcos Sampaio Rodarte, professor da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG e pesquisador do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da instituição. Como ocorreu no Brasil, a expansão fora da metrópole gerou emprego e promoveu renda nas cidades das regiões metropolitanas. “Elas deixaram de ser cidades-dormitório para oferecer ocupações aos seus habitantes, mas com a crise esse movimento estancou. Ainda é cedo para dizer, mas estudos mostram que numa crise econômica os empregos mantidos nas capitais são imediatamente atingidos. Depois, a crise se ramifica em direção ao interior, passando pelos demais municípios das regiões metropolitanas”, afirma Mario Rodarte. Consultor e especialista em análise de informações, Antonio Braz de Oliveira e Silva observa que a capital mineira viveu diferentes períodos de atração de gente à procura de emprego e oportunidades de renda, embora tenha se mantido como principal núcleo urbano da região metropolitana, recebendo fluxo

ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A PRESS

CONFIRA NO EM.COM.BR Entornos, a terceira das 12 partes da série de reportagens multimídias do especial BH120 do Estado de Minas traz conteúdo exclusivo de vídeos, entrevistas, fotografias e infografias. No site você poderá conferir ainda as datas de divulgação dos próximos temas.

importante de moradores dos municípios do entorno. “Esse fluxo significativo da população de outros municípios buscava o acesso a serviços que até certo momento e ainda hoje só existiam na capital (por exemplo, serviços médicos, educação superior, comércio especializado e mesmo serviços bancários e públicos dos governos federal e estadual) e para trabalhar.” Ainda nos anos 1970, o ritmo de crescimento da capital começou a ser superado por várias cidades vizinhas, que se beneficiaram de sua localização em relação à capital e das políticas de incentivo à industrialização. Elas atraíram novas empresas em novos setores da atividade econômica e saíram favorecidas da expansão daqueles já instaladas.

Esse movimento ao inverso, da metrópole para a periferia, foi observado entre 2000 e 2010 por pesquisadores como Carlos Lobo. O cruzamento dos dados do IBGE sobre o que os economistas chamam de movimentos pendulares tradicionais (aquele fluxo de deslocamento das pessoas da periferia das regiões metropolitanas para as capitais) e inversos (o fluxo de gente que deixa as capitais, ao escolher as periferias), indicou um crescimento maior na direção dos demais municípios. Na década analisada pelo pesquisador, o número de pessoas que iam todo dia da capital para os demais municípios da Grande BH e voltavam para casa cresceu 77%, ao passo que da periferia para a capital esse fluxo aumentou 43%. Braz e Silva destaca que, ainda assim, a capital mineira continuou a ser referência. “Houve um crescimento do fluxo de trabalhadores da capital para esses municípios, atraídos pelos empregos nas grandes empresas que ali se instalaram.” Betim, por exemplo, cresceu com a instalação de uma fábrica de automóveis da Fiat e a atração, ao longo dos anos, de um cinturão de fornecedores de peças e partes de veículos que alcançou Contagem, Pedro Leopoldo e Sete Lagoas, já na Região Central do estado. Nova Lima, por sua vez, tradicionalmente influenciada pela atividade da mineração de ouro e ferro, deveu parte do seu crescimento demográfico recente ao aumento do número de condomínios de luxo.

FOTOS: Alexandre Guzanshe

ALGUNS DOS DESAFIOS DA CAPITAL COMO POLO DA REGIÃO METROPOLITANA ● Oferecer infraestrutura eficiente de transporte para

garantir a mobilidade de moradores e da população de estudantes e trabalhadores do entorno que chegam todo dia à capital e retornam aos locais de moradia

● Reduzir a deterioração dos indicadores da segurança

PAPÉIS CRUZADOS

REPORTAGENS: Lucas Negrisoli MartaVieira Teresa Caram

NA CORDA BAMBA

EDIÇÃO DETEXTOS: Rafael Alves Renato Scapolatempore

pública

● Desenvolver políticas públicas conjuntas com os

demais municípios e liderar iniciativas conjuntas das cidades da região metropolitana para conter a expansão urbana desordenada

● Integrar ações dos diferentes municípios, muitas com

a participação de instituições dos governos estadual e federal, envolvendo as áreas de saúde, abastecimento de água, saneamento e coleta e tratamento de lixo

Solucionar o problema da saturação de áreas para investimentos do setor privado

● Criar e atrair empresas capazes de gerar empregos e

reverter a expansão sem planejamento, oferecendo alternativa de trabalho de qualidade e renda a quem chega

● Enfrentar os impactos da crise da economia sobre o

emprego e os investimentos do setor privado

REVISÃO: Ademar Fulgêncio

PROJETO GRÁFICO: Júlio Moreira

COORD. MULTIMÍDIA: Fred Bottrel, Rafael Alves e Renan Damasceno

ARTES: Janey Costa e Quinho

DIRETOR DE REDAÇÃO: Carlos Marcelo Carvalho

EDIÇÃO ANTERIOR Contornos, a segunda das 12 partes da série em homenagem a BH, publicada em 30 de julho, está disponível no site Em.com.br/BH120.


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