Claro! Desejo

Page 1

um que se faz muitos

Enquanto decidíamos o título desta edição, a dúvida era entre “cla ro! Desejos” e “claro! Desejo”. Afi nal, trata-se de singular ou plural? Caminhando pelos parágrafos dos textos que engordam a revista, o ato de desejar dá pistas de que talvez seja plural, separado em caixinhas. Está borrifado na psicologia, na so ciologia, na filosofia e nas ciências biológicas.

Em todas as frentes, parece ser ele aquilo que move projetos, deter mina o destino de pessoas ou de uma sociedade – tudo isso acontecendo porque, mesmo em segundas-feiras de manhã fria e chuvosa, alguém de cidiu levantar da cama. Dentro desse alguém, piscam as fagulhas pelo de

sejo de concretizar algo. Mas essa característica multifacetada do desejo nos permite classificá-lo em mais ou menos, quente ou gelado, forte ou fraco, esquerda ou direita?

Desde o desejo verbalizado que escapa da boca por um ato falho, o interes se da mulher que escreve cartas de amor para o seu amado psicopata enjaulado na prisão, o impulso gerado pelo marketing nos consumidores para vender seus produtos, até a completa apatia daqueles que não sentem desejo. Toda essa rede com plexa nos parece culminar num só turbi lhão: o desejo, no singular.

Nesta edição, o claro! Desejo pretende oferecer munição ao leitor para que ele encontre e entenda os vários rostos do desejo no mundo e em si mesmo.

(11) 30914112. O claro! é produzido pelos alunos do sexto semestre de Jornalismo como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo Impresso - Suplemento.

claro! desejo 2
Expediente - Reitor: Carlos Gilberto Carlotti Junior. Diretora da ECA-USP: Brasilina Passarelli. Chefe do departamen to: Luciano Maluly. Professora responsável: Eun Yung Park. Capa: Jorge Fofano. Editores de conteúdo: Guilherme Caldas e Gusta vo Zanfer. Editor de Arte: Sebastião Moura. Editor Online: Wálace de Jesus. Diagramadores: Aline Novakoski, Ana Luiza Cardo zo, Arthur Macedo, Guilherme Gama, Henrique Araújo, Jaqueline Silva, Júlia Rodrigues, Juliana Alves Mendonça e Thiago Gelli Carrascoza. Repórteres: Alessandra Barrozo, Beatriz Herminio, Beatriz Lopomo, Bruno Kristoffer, Drica Marcelino, Giovana Preto, Ivan Conterno, Julia Mantuani, Juliana Matias, Luiz Attié, Manuel Savoldi, Natane Cavalcante, Patrick Fuentes, Thomas Toscano, Tomás Novaes e Vitor Cavalari. Endereço: Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443, prédio 2 - Cidade Universitária, São Paulo, SP, 05508-020. Telefone: Diagramação Henrique Araujo Arte Jorge Fofano por Guilherme Caldas e Gustavo Zanfer

sobre a tranquilidade do espírito

“Acostuma-te à ideia de que a morte não é nada”, diz Epicuro, filósofo helenístico. Fácil falar. A vida em suas cores e impulsos nos convida a desfrutá-la, criando desejos. Eles que nos movem, nos dão paixões, ideias e ambições. Mas a eles estamos presos, correndo para realizá-los antes de nossa hora final.

A professora Maria Cecília Reis, tradutora da obra do filósofo, explica que, para ele, “os desejos necessários para a felicidade são: se alimentar, ter abrigo, conforto, saúde, amizades. Geram a tranquilidade da alma e são saciáveis, por isso não geram angústia”.

Mas a mente cria desejos não naturais. Fama, poder, dinheiro e até imortalidade “são desejos vãos, falsas necessidades”, complementa. Por último, os desejos natu rais, mas não necessários – comer queijo em vez de pão, beber vinho e não água – , são bons em moderação, mas desnecessários para felicidade.

O desnecessário, hoje, é essencial. A alegria é relativa, boa apenas se comparada a outros stories. A visão moderna sobre o pensamento epicurista interessa o filósofo Markus Figueira (UFRN) que classifica esses tipos de desejo, como ter muitos seguidores nas redes sociais, como “sem sentido

para Epicuro”. Para Figueira, “o consumismo é produto disso, dessa opinião vazia, dessa imoderação”.

Vive-se pensando em não ficar por fora, em não ficar para trás e se perde a noção do agora. Por isso, Antonio Ike da, de 21 anos, sentiu que precisava deixar as redes. “Isso não permitia que eu pensasse e sentisse o mundo, era um lugar para fugir do tédio.” Como ele, um a cada cinco jovens se afastou das redes durante a pandemia, segundo pesquisa de 2020 da agência Dentsu Aegis Network.

Epicuro via a vida na cidade como angustiante, angústia experienciada por Fabiana Camargo, que buscou no bu dismo um caminho para a tranquilidade da alma. A religião oriental prega, como o filósofo grego, o exame cauteloso dos impulsos, sendo a imoderação a raiz da dor. Mas nem os monges vivem sem emoções, impulsos e desejos. Meditar não é viver sem vontades, mas, sim, controlá-las. “Dá para morar numa caverna e só pensar em grana, ou morar numa casa luxuosa e não se apegar a nada daquilo”, diz Fabiana.

Renunciar aos desejos em um mundo de estímulos é difícil, mas é a única rota de escape de nossas prisões. O mestre de Fabiana a ensinou: “Somos aprisionados por sentimentos, percepções, impulsos e consciência, que obs

Diagramação

3 novembro 2022

marketing (in)sustentável

A publicidade fetichiza os sentidos, crenças e valores individuais para preencher desejos fabricados para os consumidores. Repleta de referências acadêmicas, Dayse Maciel, professora da ESPM, afirma que o marketing não cria necessidades, mas influencia os desejos.

Com um mercado repleto de consumidores engajados politicamente, empresas que priorizam as ESG (práticas ambientais, sociais e de governança de uma organização) ganham cada vez mais público. Segundo o estudo Top Risks 2022 (Eurasia Group), 65% dos millennials já boicotaram marcas por discordarem de suas posições sociais, como alinhamento político, enquanto 83% buscam companhias que atuam de acordo com seus valores.

Bianca Lopes, estudante da Unesp, passou a boicotar empresas devi do à proximidade das marcas com o presidente Jair Bolsonaro. Em 2016, o Ministério Público do Trabalho condenou a Riachuelo, que defende valores como responsabilidade social e sustentabilida de, por trabalho análogo à escravidão.

Nos últimos anos, cresceu o número de corporações que oferecem produtos sustentáveis para engajar o

público. No entanto, é possível ver que corporações podem aderir às ESG apenas de fachada para atrair consumidores como Bianca. Não à toa, Luciana Florêncio de Almeida, professora do Programa de Pós-Graduação pela ESPM, levanta a questão do greenwashing – uso da linguagem publicitária com apelo ecológi co, sem adoção prática de ações que reduzem o impacto ambiental.

Sonia Consiglio, líder empre sarial engajada com o desenvolvimento sustentável pelo Pacto Global da ONU, aponta que a agenda ESG é estratégica e impacta na reputação das companhias: “Falamos da criação de um novo modelo de mundo onde questões sociais, ambientais e de governança integram a dimensão econô mica e financeira”.

Finalmente, Consiglio classifica a prática de greenwashing como uma ação insustentável a longo prazo, já que “não há campanha de marketing vitoriosa em cima de algo que não existe”.

Bianca, que trabalha há anos com marketing, conta que “não é sobre der rubar o capitalismo, mas é a diferença entre não mudar absolutamente nada ou fazer a escolha menos pior”.

claro! desejo 4
por Diagramação Thiago Gelli Arte Luisa Costa

Denver, 9 de outubro de 1987 Teddy,

Toda noite me pego pensando em você! Espero que esteja bem, tão bem quanto me fez.

Quando te mandei a primeira carta, estava muito frágil. Tudo me parecia ser negado. Me sentia sozinha, incompleta. Então, vi uma en trevista sua na televisão. Aquilo me intrigou. Como um assassino po dia estar no seu momento mais vulnerável e ainda se mostrar tão gentil e calmo nessa situação? Eu precisava saber se me entenderia.

Então, você me respondeu, com tanto carinho e atenção, muito mais do que mereço. Você sempre sabe o que dizer no momento certo: as palavras de apoio, os elogios. Me faz sentir a mulher mais especial do mundo, como nunca havia acontecido antes. Estou apaixonada!

Acabo me isolando das pessoas, que fazem com que me sinta errada por ter esse amor. Eles já não entendiam pelo que estava passando e não compreendem o porquê te procurei.

Meus pais e amigos vivem a me importunar, dizendo que me relacionar com você é o que trauma tizados ou quem tem problemas familiares fariam. Eles não conseguem entender que não é a falta de algo que me fez te amar, mas o sentimento que você despertou em mim.

Você consegue entender o que sinto melhor do que eu mesma. Só não entendo porque, às vezes, você assume uma postura áspera, fria e rude, como o monstro que dizem que você é, não o homem galante que amo e desejo.

Estou fazendo de tudo para juntar o dinheiro que me pediu. Para compensar a demora, mandarei presentes, mesmo que não tenha me pedido nada desta vez (cigarros, alguns doces e remédios para te dar um pouco de conforto no resto de sua pena).

Entendo sua situação e por isso peço que fique calmo. Seu amor já me ajudou a curar as minhas feridas e sei que o meu irá curar as suas. É só questão de tempo. Até lá, continuarei te ajudando aqui de fora da forma que conseguir.

Não perca a esperança, pois eu não perderei. Um dia, iremos nos encontrar e fugir para bem longe dessas pessoas que não entendem nosso amor e, então, poderemos trocar nossos votos em paz. Mal vejo a hora de sentir meu corpo em seus braços.

Arte Luisa Costa Colaboração Gilmar Rodrigues, “Loucas de amor”; Adelle Forth , “Psychopathy and the Induction of Desire”; Thais Castoldi, psicóloga Diagramação Henrique Araujo Morrendo de amor, Louise Mae Welsh Bundy

o Éden no divã

por

Adão e Eva viviam tranquilamente no Jardim do Éden, paraíso na Terra. Só existia um porém: estavam vedados de comer o fruto do conhe cimento. Seduzidos pela serpente, se rendem ao desejo e provam o gosto que lhes era proibido, sendo expulsos do Éden por terem transgredido a única regra que lhes havia sido imposta.

Dentro do campo dos desejos, é comum que as coisas mais atraen tes sejam aquelas que não temos – ou que não podemos ter. De acordo com Nazaré Almeida, especialista em terapia focada na compaixão e dou tora em psicologia pela USP, isso é algo natural. “Em termos genéticos [...], é saudável que todos nós sejamos curiosos”, diz Nazaré.

Aí emerge o desejo, que está longe de ser um botão que se aperta. É algo derivado do contexto em que está inserido, iniciando-se na mente para envolver o corpo. É o caso de pessoas que fantasiam loucamente ao pensar em um personagem de um filme – inalcançável –, somente para não ver graça nenhuma quando o mesmo ator revela-se em outro papel.

O desejo nessas situações é irreprimível, muito diferente da atitude que se pode tomar, absolutamente passível de controle. Em um contexto propício, o objeto de desejo pode ser percebido como a maior satisfação para nossas necessidades momentâneas.

claro! desejo 6

Sentir-se deixado de lado é lhar, psicanalista pela Unesp, diz que

o ciúme é o primeiro indicativo de que há algo errado ao levantar questões emocionais que precisam ser cuidadas porque é acompanhado de sentimentos de insegurança, ansiedade e medo do abandono.

Na literatura, há um retrato extremo do ciúme em “O Mouro de Veneza”, de Shakespeare, em que Otelo leva o sentimento às últimas consequências e assassina sua esposa ao desconfiar que ela o traía. Porém, descobre logo depois que ela era fiel e que tudo não passava de imaginação.

Nem todo ciúme termina em tragédia, mas é um alerta vermelho com potencial de corroer um relacio namento. A desconfiança pode provocar o afastamento do casal, ou seja, o oposto ao desejado pelo ciumento.

O psicólogo explica que isso se chama “profecia autorrealizadora”, já que o ciumento pode sufocar a ponto do parceiro desejar ir embora.

O desejo de controle pode agir como um monstro invisível que atormenta uma relação, como apon ta Padilha. Os ciumentos enxergam que sua existência depende de estar em um relacionamento, sendo o de sejo de controle algo persistente.

7 novembro 2022 Diagramação
Ana Luiza Cardozo Arte Jorge Fofano Colaboração Leide Batista, terapeuta cognitivo comportamental pela Faculdade Castro Alves

desejos abafados

Dezesseis de setembro de 2022. Mahsa Amini, de 22 anos, caminhava em um parque em Teerã, capital iraniana, quando foi detida pela polícia. A razão? Uma mecha do seu cabelo escapava de seu hijab, o tradicional véu islâmico.

Três dias depois, foi encontrada morta com fratura óssea e hemorragia cerebral. Seu rosto passou a ser estampado em cartazes e seu nome proclamado pelas ruas, em protestos que vieram a se tornar os maiores em décadas no Irã.

Antes da Revolução Iraniana, em 1979, que depôs a monarquia autocrática e ocidentalizada dos xás e instalou a república islâmica teocrática dos aiatolás, às mulheres muçulmanas que desejavam se cobrir era imposto o desvelamento vio lento. Hoje, às mulheres que não desejam se cobrir, é imposto o véu obrigatório. De símbolo de protesto, o hijab virou símbolo de opressão. O que não muda? Seus desejos seguem fraturados. Hemorrágicos.

Para que Mahsa pudesse sair do país, precisaria da permissão do seu marido. Se ele não puder, tudo bem. O seu sogro deve fazê -lo ou, na ausência dele, seus cunhados. Andar de bicicleta e cantar é proibido. Qualquer contato com outro homem com quem não tenha vínculos parentais é desencorajado em espaços públicos pela Polícia da Moralidade, divisão policial responsável por fazer cumprir os códigos de vestimenta e pudor do país. Exílio, desobediência, incendiar o véu, cortar os cabelos: a resistência feminina é histórica e variada. Em 2006, elas saíram às ruas recolhendo assinaturas para mudar cada lei misógina do país. Em 2014, fizeram do Facebook uma plataforma de protesto, postando fotos e vídeos sem o hijab em locais públicos. Este ano, protestam em massa nas ruas. O aumento do conflito social no Irã prova que cada desejo abafado move essas mulheres, que restam a sonhar, incansáveis, pelo mínimo. Desejos como deixar seus cabelos à mostra, sem poderem ser mortas por isso.

claro! desejo 8
Arte Luisa Costa Diagramação Juliana Alves e Thiago Gelli Colaboração Ana Raietparvar, antropóloga da UFF; Fernando Brancoli, professor de RI da UFRJ; Taís Penteado, advogada; Luiza Müller e Alexandre R. da Silva

corpos fechados para afetos

Desinteresse nas coisas, indiferença no dia a dia e sensação de impotência, em casos extremos, pode ser um sinal de depressão. Os medicamentos, nesses casos, conseguem facilitar os impulsos elétricos entre neurônios, diminuindo apenas os sintomas. Não há uma única explicação biológica para a apatia ou a falta de interesse. O que se pode afirmar é que fatores orgânicos e psíquicos somam-se à influência do ambiente, muitas vezes determinante.

O cérebro possui um sistema de recompensa cujo principal mensageiro é a dopamina e esse mecanismo incentiva condutas que nos beneficiam. Do ponto de vista biológico, uma alimentação saudável e um ambiente agradável aos anseios é essencial para uma mente sã. Entretanto, as razões químicas sozinhas não explicam as convicções adotadas ao longo da vida que contribuem decisivamente na busca por essa carga de prazer.

As pessoas desejam ser desejadas e se frustram quando não são aceitas. A boa notícia é que deixar de querer o que a sociedade impõe não é, por si só, um inconveniente. Como o cérebro humano tem uma grande capacidade de adaptação, os desejos podem ser canalizados para novos tipos de satisfação.

Colaboração

Algo parecido acontece com os chamados assexuais, pessoas que sentem pouca ou nenhuma atração sexual. Até o século passado, essas pessoas eram consideradas impotentes ou frígidas, mas hoje entende-se que não há desarranjos fisioló gicos nelas, já que a dopamina pode vir através de outras atividades. Para o budismo tibetano, por exemplo, a satisfação de desejos pode ser encontrada não deixando que as emoções perturbadoras, como o consumo compulsivo, tenham grande influência. As imposições da publicidade fazem com que as pes soas tenham cada vez mais impulsos que não se concretizam. Sempre surge um produto melhor que outro no mercado. Contudo, ao não manifestar o desejo, as pessoas desenvolvem neuroses que podem levar à depressão. A apatia é uma falta de lugar no mundo que leva ao isolamento e última instância ao suicídio. Nesses casos, é preciso uma assistência que ofereça meios para retomar a vontade de viver.

Diagramação

9 novembro 2022
Arthur Macedo Arte Luisa Costa Adriano Esteves, mestre em psicologia; Arilton Martins Fonseca, doutor em bioquímica; Giórgia Neiva, psicóloga e antropóloga; Girliani Silva, doutora em psiquiatria; Marco Antonio Caldieraro, doutor em psiquiatria; Maurício Ghigonetto, monge budista; Paulo Naoum, doutor em bioquímica; Paulo Bezerra, doutor em psicologia; Pinheiro Vermelho, do CEBB

Umamulher grávida sai em busca de jabutica bas, compra três quilos e os devora de uma vez. O resultado foi correr para um hospital com dores intensas e ter uma boa história. Isso, que pa rece cena de filme, foi vivido por Vânia Lira du rante a gestação do mais novo de seus três filhos.

d comendo por

Seja por doces ou frutas, os desejos alimentares são muito comuns durante a gestação. Segundo Lídia Aragão, professora de medicina obstétrica na UFBA, dois terços das mães relatam algum tipo de compulsão por alimentos.

Embora muitos acreditem que esses desejos na gravidez não sejam reais, a medicina e a psicologia os explicam. Para os obstetras, as vontades estão relacionadas a alterações de or dem hormonal.

Outro fator é o impacto da gravidez na via mesolímbica, parte do cérebro que produz a dopamina. Esse sistema conecta o apetite à sensação de recompensa, por isso que, ao saciar os desejos, a gestante fica satisfeita. Para Vânia, comer jabuticabas era como a alegria de receber um presente.

Solange Frid, mestre em psicologia na PUC-RJ, defende que os desejos não são apenas pelo alimento. “Existe uma necessidade emocional de ser provida por alguém”, explica.

A satisfação dos desejos também está ligada à antiga crença de que a criança nasça com a cara do alimento. Porém, não há comprovação científica de que o bebê tenha problemas caso a mãe não sacie a vontade.

No entanto, existe um limite para os desejos como algo

Colaboração

Liga Acadêmica de Ginecologia e Obstetrícia da Bahia

saudável. Há um transtorno alimentar chamado picamalácia. A principal característica é o desejo por objetos não co mestíveis. Segundo uma pesquisa de 2009 da UFRJ, 14,4% das grávidas têm a síndrome e, de acordo com Aragão, tudo melhora após o parto.

Mãe de quatro filhos, Cida Santos teve sintomas de picamalácia em uma de suas gestações – ela sentia vontade de comer filtro de barro. Para ela, o objeto gerava o mesmo desejo de um chocolate.

A picamalácia merece atenção devido às complicações, segundo Anna Karenina Azevedo, professora de nutrição na EACH-USP. O hábito pode causar infecções por parasitas e envenenamento, por exemplo. O transtorno pode estar relacionado, também, à deficiência de alguns nutrientes como ferro e zinco.

Já psicólogos apontam que a síndrome é uma resposta a um quadro de estresse. Uma a cada quatro mães sofre de exaustão na gravidez, como aponta pesquisa deste ano do Hospital Nacional da Criança. O processo de gerar um ser humano pode pressionar essas mulheres e ter efeitos preju diciais à saúde dela e do bebê, como o hábito da picamalácia.

Diagramação

claro! desejo 10

oops! ou esca p

Escorregando pelos lábios e fazen do vítimas sorrateiramente, o ato falho não perdoa. Uma gafe corriqueira pode ser culpa do cansaço, do esquecimento ou até da desatenção. De todo modo, chamar o atual namorado pelo nome do ex é sempre uma situação difícil de se safar.

“O ato falho não se refere a um fracasso, mas sim a um ato bem sucedido de realização do desejo inconsciente”, afirma o psicanalista Leonardo Assis. O conceito é definido por Freud como uma manifes tação do inconsciente em que um equívoco na fala, memória ou gesto é concretiza do. Lapsos freudianos, como também são conhecidos, possuem diversas causas e po dem estar ligados a elementos reprimidos.

É possível identificar situações em que constatações conhecidas pelo inter locutor, mas ainda não conscientemente reconhecidas, emergem à superfície em um momento de distração. Nesse caso, não existe a revelação de um desejo, mas de um fato cravado no inconsciente. Na psicanálise, não há receita de bolo.

“Os sonhos, os chistes e os atos falhos são formações do inconsciente que só podem ser lidas com seu devido rigor – na orientação deles de extrair uma enunciação singular – no que chamamos

Colaboração

setting analítico”, detalha Assis sobre a expressão referente à dinâmica entre analista e paciente.

A motivação do ato falho de manda autoconhecimento e investiga ção da psique com ajuda profissional. Uma namorada que insiste em chamar seu parceiro pelo nome do ex pode tanto estar manifestando o desejo de reatar uma antiga paixão, quanto sen do vítima de um hábito.

Após a gafe cometida e temen do estar desejando o ex-namorado, ela procura um psicanalista na tentativa de entender seus sentimentos. Com questionamentos, provocações e perguntas, o mistério que permeia o ato vai se dissolvendo na medida em que o “enunciado” vai se revelando – uma frase expressa pelo paciente que desven da o sentido do ato, oculto até então

Por meio da fala, em uma interpretação conjunta entre paciente e profissional, busca-se entender o que o inconscien te comunica. Para esta namorada, o desejo pelo amor de outrora.

Eliana Machado, psicanalista e membro da EBP/AMP; Camila Farias, professora de psicologia da UFPel; Marcia Müller Garcez , doutora em psicologia pela UFRJ.

11 novembro 2022
Diagramação

vai com medo mesmo

“Ah, meu deus, eu vou morrer”. Essa é a sensação vivida por 490 mi lhões de pessoas que buscam esportes e atividades radicais como uma forma de diversão – tais como pular de paraque das, fazer parkour em grandes edifícios e até surfar no teto de vagões de trem. Gabriel Aglio é um desses cora josos. A primeira vez que fez highline – modalidade em que os praticantes caminham sobre uma fita de nylon esticada em meio a prédios e canyons –, suas pernas tremiam tanto que ele mal conseguia ficar de pé. Mesmo assim, tudo o que pensava naquele momento era que queria voltar para a fita. “Essa era a sensação que eu queria sentir mesmo.”

aaaaa Essas aventuras impensáveis para muitos não são só do interesse de Ga briel. Existe uma gama de esportes, atividades e programas voltados para pessoas com esse aparente desejo pelo perigo.

aaaaa Para entendê-las, primeiro é preciso compreender a química da coisa. Quando o cérebro se sente ameaçado, os neurotransmissores liberam a adre nalina, hormônio que desperta a sensa

Diagramação

ção de “luta ou fuga” e estimula os sentidos.

AAAO corpo não para por aí: a noradrenalina, que vem em seguida, aumenta nossa capacidade de ficar alerta. Ela nos dá a sensação de controle, gerando um enfrentamento da situação.

aaaaa É esse choque de adrenalina e noradrenalina o que as pessoas procuram, então? Segundo Renato Miranda, professor e psicólogo do esporte na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), essa não é a te oria mais aceita atualmente.

Em vez disso, estudos do psicólogo Mihaly Csikszentmihalyi traba lham com o chamado “sentimento de fluxo”. Para ele, o prazer que as pessoas têm de passar por essas situ ações que envolvem o medo não se origina do perigo propriamente dito – mas do desejo de controlar o que, para muitos, é inimaginável. “Profissionais enxergam essas situações com poder, confiança e calma, de maneira harmônica”, complementa Miranda.

Para Rodrigo Stavale, profissional de parkour, “cada vez que eu faço um salto que me dá medo, eu colo co um tijolo no muro que me separa do medo. Eu continuo sentindo ele, mas ele não vai ser capaz de me travar”. Em outras palavras, o desejo não é pelo perigo em si, mas a capa cidade de enfrentá-lo com maestria.

claro! desejo 12
Júlia Rodrigues Arte Luisa Costa Dados Extreme, levantamento de 2021
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.