FAROL

Page 1

1


2


FAROL

Redenção-PA Primavera de 2008 3


4


FAROL

5


José Rodrigues de Carvalho Esta obra foi publicada sob uma licença Creative Commons

Você pode: Copiar, compartilhar, distribuir, exibir e executar a obra sob as seguintes condições: Atribuição. Você deve dar crédito ao autor original, conforme estabelecido por ele nesta licença. Uso Não Comercial. Você não pode utilizar esta obra com finalidades comerciais. Não à Obras Derivadas. Você não pode alterar, transformar ou criar outra obra com base nesta. Para usos não previstos nesta licença, contate o autor Rua Cmdte Vicente de Paula, 172 68553-200 Serrinha - Redenção/Pará E-mail: zecau10@hotmail.com

6


JosĂŠ Rodrigues de Carvalho

FAROL

7


FAROL Capa: Alufá-Licutã Oxorongá Digitação: José Rodrigues de Carvalho Editoração: José Rodrigues e Alufá-Licutã Revisão: José Rodrigues de Carvalho

Ficha catalográfica: de Carvalho, José Rodrigues FAROL José Rodrigues de Carvalho-Redenção-Pará Literatura Sul Paraense - poesia

8


FAROL

de Carvalho, José Rodrigues Farol: poesia Apresentação, Alufá-Licutã 160 p.; il.

Redenção - Pará

9


10


"É fácil trocar as palavras, Difícil é interpretar os silêncios! É fácil caminhar lado a lado, Difícil é saber como se encontrar! É fácil beijar o rosto, Difícil é chegar ao coração! É fácil apertar as mãos, Difícil é reter o calor! É fácil sentir o amor, Difícil é conter sua torrente! Como é por dentro outra pessoa? Quem é que o saberá sonhar? A alma de outrem é outro universo Com que não há comunicação possível, Com que não há verdadeiro entendimento. Nada sabemos da alma Senão da nossa; As dos outros são olhares, São gestos, são palavras, Com a suposição De qualquer semelhança no fundo." Fernando Pessoa

11


12


APRESENTAÇÃO Na primavera de 2008 me foi apresentado este “Farol”, do poeta e educador Zé Rodrigues. Pelo fato de conhecer algumas criações do poeta, mesmo que fossem textos fragmentados, avulsos, imaginei, desde o princípio, não encontrar neste livro nada que não fosse, ou que se parecesse no mínimo com 'ousadia'. Mas, hei de fazer uma inconfidência: não esperava encontrar tamanha claridade e visibilidade poética, e, mesmo que o título me sugerisse uma luz a iluminar a imensa escuridade das cercanias de nossas vidas, não esperava encontrar tamanha inquietação humana. O livro “Farol” é denso, e, ao mesmo tempo a sua leitura se constitui em leveza e suavidade, não nos gasta as 'pestanas' no saboreio de suas páginas. Mesmo a um velho 'faroleiro' igual a mim, acostumado as interpéries do tempo, ao silencio das horas mais caladas, às serranias dos altos montes, ao desespero dos vales dos ossos despidos, às luzes dos faróis há muito apagados e a barcos à derivas à procura de portos seguros para atracar, este “Farol”, do poeta Zé Rodrigues deixou-me um tanto estupefacto. O livro nos corta a carne quando nos aponta a verdade dos nossos tempos, verdades nem sempre à mostra, pois se despida de suas vestes hipócritas nos causa um misto de rubor e asco: “Semblante que cai com a carne, ingratidão que se eleva às galáxias, chãos magmáticos, arcaicos, modernos futuristas e pós-modernos. Pedras rolam nas lágrimas: são pedaços de coração”.

O livro sugere a germinação de dias: “Renasce a cada solao alimento/ tempo/ regressa/ que diz, oculto, insensato, vil/ mas tem a verdade”, nos fala com a voz íntima sobre o desenxovalhar de nossa alma:”No ombro do medo/ planto em prantos o/ destino contristado./ E quando a dor, de tanto ser dor/ 13


se atenuar/ minh’alma, já enxuta e limpa/ aos tempos meus/ transcenderá”, e nos conclama à busca dos faróis perdidos (e ainda apagados) em altos penhascos: “Como uma sombra/ da atrevida nuvem/ que não consulta o sol”. Nos ensina também o quão devemos fazer para que os nossos faróis permaneçam iluminados: “Que ninguém cale,/ que não resvale o projétil”. O “Farol” do poeta Zé Rodrigues nos fustiga as entranhas com muitas outras verdades. Verdades estas nem sempre à mostra, mas que ele, sutil e sorrateiramente deixa na suspensão das palavras e nas entrelinhas dos versos. Como uma paisagem que se precisa descobrir com mãos ávidas, olhos lúcidos e pensamento crítico. O “Farol” do poeta Zé Rodrigues é como uma gaivota que se mantém presa entre os céus e os rochedos. Os dois a aprazera. E aos dois, constantemente lança ao infinito seus pios ensurdecedores. Alufá-Licutã Oxorongá Poeta

14


NOSSOS TEMPOS Semblante que cai com a carne, ingratidão que se eleva às galáxias, chãos magmáticos, arcaicos, modernos futuristas e pós-modernos. Pedras rolam nas lágrimas: são pedaços de coração. Corpo que se levanta, alma que se levanta e cai. Prazeres no inconsciente, morte na realidade virtual, tire sua conclusão! Os mesmos lugares e línguas confrontam-se por tecnologias. Biomassa de sangue arde em gotas ácidas, gélidas. Agora os botões comandam. E nós? Quando retornaremos ao inferno? Cadê o sol, o pai, a bio, frutos da tropicalidade pan?

15


OLHO / D’ALMA Quem viu a cor do viés luftal, de luto e certeza não dança na passa/ela tonal sepulcro de velcro e lacre que mareja desdenha e definha com lucidez fúnebre Pasmem!

16


SĂ“ ...Abri todas as janelas para ver-te chegar. Eu sabia onde vocĂŞ estava... dentro de mim, Claro, Mas, eu queira abraçar-te, Beijar-te Amar-te, e...

17


GERMINAÇÃO Na face estampa a sombra. Entre uma lembrança e um fato jaz o sorriso. Já não ri nem lamenta, apenas luta! Carrega a fé sem trégua. Não se entrega, combate. Flui ternura, anseia existência, clama essência pra ver/viver e viver pra crê. Renasce a cada sol ao alimento/tempo/regressa que diz, oculto, insensato, vil mas tem a verdade. Caminhar entre o ontem e o que virá na busca do semblante. Quem verá?

18


O QUE? Fun rum mundo num no tom som ĂŠ bom tem late vem VĂŞ quer ter vida Viver e lutar resistir pra ser

19


ÍNTIMO No latejar do temo eu e meus tempos tentamos desenxovalhar minha alma. Que, calada escala ribanceira a procura do que parte pra memória No ombro do medo planto em prantos o destino contristado E quando a dor, de tanto ser dor se atenuar minh’alma, já enxuta e limpa aos tempos meus transcenderá.

20


QUANDO VOCÊ VIAJOU Cá estou, não só, eu e uma parte sua; tu e uma parte d’eu. Mas cá, onde está eu sem tu, chora tua parte. Aos prantos acalanto eu

21


POR QUE LEMBRAR Lembrar só por lembrar. O ato de lembrar traz em si o ato de facilitar. E este, deve ser carregado de emoção, emoção do coração. Parece que o lembrar de hoje virou uma mera resposta a uma obrigação burocrática. É mais uma burocracia sistêmica que cada vez mais nos desumaniza. Aquilo que outrora era um gesto de afeto hoje não passa de um teclar dígitos de máquinas. É a máquina companheira da máquina. É o programa da máquina cumprindo sua função: o lembrar a máquina do dia que a outra máquina deixou de ser humana. Assim, as máquinas quando não tem presentes não vão à festa, não se sentem. E presente não mexe com máquinas, mexia com os humanos quando estavam se ‘desumanizando’. E AGORA?

22


EMBAIXADOR DE NINGUÉM Seu Deus, aqui tem terrorista não! Terroristas daqui desde cedo dividem o tempo entre a escola e o trabalho. A maioria não termina a letra. Tem não seu Deus, aqui tem terrorista não! Os terroristas daqui nasceram, cresceram e vivem em barracos de compensados, pedaços de outdoor, papelão e muito arame, pendurados como presépios nas encostas dos morros desse país. São terroristas não Deus, aqueles sub-humanos, alegorias da fome, bichos rudes que ficam sem comer pra honrar compromissos da “divida”. Morrem aos montes de “desastre militar”, mas, não revelam ódio, ousam ser puros. Já jurei seu Deus, aqui não! Aqui tem terrorista não! Esses acusados nasceram longe do pediatra, nunca viram um pré-natal, nunca tomaram vacina, jamais fizeram exames: Raio X Estetoscopia Angioplastia Endoscopia Eletrocardia Os réus sempre beberam raízes no lugar do Plasil. Sempre tomaram ervas no lugar da injeção. Terroristas não senhor, seu Deus! Eis aqui pessoas que desconhecem a informática, 23


a robótica, a quântica e a semântica. É um povo comandante Deus, que só conhece a sinfonia dos pássaros e não Mozart; só conhece o cabo da pá picreta enxada foice colher cutelo. É um povo moço, que só conhece a lei do “aqui se faz, aqui se paga”. As letras, só quando senta na areia e faz um “o”. E mais, robô aqui pra nós é por a mão no alheio. Pois é seu Deus, aqui tem terrorista não! A gente daqui ainda pensa que a terra, a água, as árvores, os animais, enfim, o mundo é do homem. E que todo mundo, como é filho do homem, manda! né? Diploma aqui só aqueles que os retratistas fazem nas escolas. Como crianças ele pega e põe na parede fictícia lembrando o saber, ou certificado de cabeleireiro, dançarino, bonzinho, etc. Esse povo faz algum terror, seu Deus? A riqueza, essa gente rejeitou. RESIGNAÇÃO!!!!!!

24


FRONTEIRAS DO CÁRCERE (ou, quando o pecado é a cor) Levanta, negra, da tua pouca sorte. Daqui a pouco pés brancos querem ruas limpas para passar. Acorda, negra, da tua fadiga, logo barrigas e bocas de gula querem o café na mesa. Corre, negra, em direção ao tronco, corpos brancos querem se vestir em limpas e engomadas roupas. Assusta, negra, a voz da casa grande, um patrão novo chegou. Quer colo e peito, e canção de ninar. Resigna-te, negra, nos eternos grilhões. A sinhá quer um pacato ouvido para ouvir seus brados de ódio e frustrações. Te desnuda, negra, da integridade e pudor. Uma pica branca quer testar a virilidade de quem nasce, vive e morre na dor.

25


DERMETEZ Esta tez rústica, que não é derme, dorme. Exala fim e respira saber. Encharcada de odor, sal, mel. Ah! Suor! Néctar da tez flor. Reluz humo da planta pêlo. Lençol protetora nas noites atlânticas. Se não é pela tua cor, o que mais inspira no algoz tanto horror? Ô tez! É chegada a hora, soam os tambores da história. Das histórias.

26


LUPA Ainda ontem era amanhecer quando você sorriu. O sol e uma estrela múltipla. comunicou às galáxias, vieram asteróides e astros. Você subverteu o universo.

27


IMBECILIDADE Deu na Ilíada: haverão Valquírias e Luzíadas. A Net ver: Urbano II conclamava on line a décima primeira cruzada. Ninguém fim ou fenícios, as torres persas que: sentenciadas por Hamurabi em Ur um mono Deus é Hebreu? De virgulino a Nero pôs triunvirato no centroplanalto, um alto império desenhado na alpercata. Um tamoio Ilietre Phdeia. Ali, aliado: Camões das cifras e OiKos(1) Foge, antes de manchar esse tapete com nosso sangue. (1) – unidade familiar e econômica

28


CRIANÇA Ser espontâneo, impetuoso, teimoso. Mas, além de tudo, carinhoso. Ser anjo e alma, arisco, frágil, aventureiro. Mas, porém, amável e dócil. Ser franco e sagaz, flor, pólen, fruto. Mas, além de tudo, amor. Ser riacho limpo, orvalho, romper da aurora, despertar, eco, cor, riso, alegria. Mas, além de tudo, esplendor.

29


ELDORADO, QUEM DIRIA! A princípio, ali eram tantos! Caiu um, tombou outro, e outro, e outro, e outro, e outro! E outro e outros três. E outro, e outro, e outro e mais outros dois. Outro, mais outro, Mais outro e mais outro. Ali se imortalizaram em nome do pão e do pai e do povo: 19 mártires!

30


INTIMIDADE No banheiro, a toalha e o pensamento tocavam alguns lugares esquecidos de meu corpo e, ... aos poucos, eu passei a perder a sanidade pelos seios pré-mastectomia. Só a lenda não transformou você. Qualquer mortal duvidaria, mas a porta do banho ainda está fechada. E do alto das minhas sensações me atiro no vácuo. Longe de qualquer atalho, não cedo, não temo, não retorno. digo apenas: -estou pra eros!

31


DEPOESIAR Depois que fechei a porta ela estava na rua; Depois que comi a sobremesa ela teve vertigem de fome; Depois que sorri e saí ela chorou e ficou; Depois de minha morte ela e outras e outros caminharão, continuarão a vida apesar do hoje.

32


ANECSBO Eu acho todas as cores lindas, porém, naquele dia sua última peça íntima nos joelhos, com aquela cor quase sem cor, combinou com a matiz quase clitoral de uma alameda pubiana que se desenhava quando você abaixava. Aquela sua pestanejada fez eclodir um vulcão na minha região pélvica que irradiou-se pelo corpo. Orgasnei!!!!

33


LIBERDADE O mundo hoje se reduz a oitenta centímetro “o tamanho do meu braço”. Outrora a professora dizia: -O mundo era do tamanho do meu lápis! Os troncos professor, ainda existem; mastigo mordaças e gritos. Há tanto sonho aqui nessa palmares da vida. Supereamos o medo, mas a guerra continua. Que casa tem o feitor? O que existe é uma terra só, um povo só, fragmentado por golpe certeiros da história. Hoje os tambores tocarão a nosso favor.. Somos bilhões e, nossos sentimentos são mais fortes a cada tempo. -Professora, os palmares multiplicaram os Zumbis!

34


MEGAMI HOJE A ilusão filtrada à cor contorna a áurea no vácuo utópico de grandeza. Na tela, no telão, na placa, no outdoor por imagem gigantesca. O homem/mulher tão pequeno na matéria, no amor, na paz, no perdão. Quão rebelde se elasticisa. Nem que entre uma lucidez e outra se esfacele no real.

35


SOBRE HUMANOS, HOMENS, HORTALIÇAS E OUTROS SOBREVIVENTES “...Amar e mudar as coisas me interessa mais” Belchior

Evolutivos degradantes e nocivos. Bípedes/Trípedes por entre as navalhas. Folhas/Brotos da última lua e primavera. Pendões pós eclípse/ebola em forse inferno/on line a serviço da reprodução sem realidade. Cosmo/neon linha tênue de signos. Símbolos/chapados com equilíbrio químico geneticamente modificado.

36


ESILANIA/DRENAGEM Meu tom não toca. E a fossa, quase póstuma, celebra a eternidade que o lixo de queixo opus. Donde o belo e o místico/mistério na confluência da insanidade turva minh’alma de razão. E que a tecnofase errante dos terreiros não concensuados é a lava de étna na qual meu corpo sufrageia.

37


CARTA DE AMOR Aquela carta é a mesma que readaptei e lhe reconquistei. Por que você quer ir agora? Minha timidez não permite que uma aura possa desaparecer assim. Quase intimista eu me arvoro a ser quem sou diante do que você provoca. -Fica! Ninguém compra o sol via internet de marte. Relevei o que sinto por você. Eu não olho mais pra traz pela janela, tenho seu nome como: Deusa, Inteligente, Natural, Amorosa. Existem distâncias sim. Dedicarei minha vida a te agradar, dar prazer. Espero a hora de te alcançar nesse vôo. Sei que também há tempo; e eu estou a te esperar. Aguardo.

38


INFANTO Olha o ó: oh! Veja só Sinta a: há! Leia o bê-a-bá Cante o i: ih! Diga o si: sir? Grite o não bem alto: Nãããããããããão!

39


O QUE A MEMÓRIA RECOMENDA Chuva na mesa quadriculada, detergente limpol, régua plástica (50cm) transparente, esponja grossa de bombril, buchas, copos, vidros, pratos, cebola branca. Calendário do ano passado. Medo n’alma, coragem no horizonte, morte perene, tudo compõe, recompõe. Te expõe na vergonha como o vício quadriculado da mesa. Pano no quaradouro, sonho em água, água, agual!

40


MEDO ESTRANHO O medo da multidão A fobia do olhar, do aplauso, da vaia, do ridículo. O pavor do anonimato, do estrelato, da crítica que constroe o medíocre, do normal, do afã e da expectativa pública. Me introjeto ou extrojeto num feto sem DNA. Sussurro e projeto verbos feios, dóceis, Doces, belos, fúria. Tento esconder o pânico, a angustia, a miséria na solidão, a crise do SER versos TER. Ao expor-me me apavoro.

41


QUADRO-GIZ (ou, Mestre-Quadro)

Cadê o corpo que andou nas salas e corredores? Cadê o pedagógico que formulou e orientou o saber fazer? Cadê a clientela que tripudiou e calou? Cadê o diretor que comandou a ida a lugar algum? Estamos aqui, em lugar nenhum, entre a dor e o dissabor de não ser quem sonhou. Ser apenas um sonho, ter somente o abstrato pra mostrar e as horas, as lembranças e desilusões na parede como quadro que dói mais.

42


BANZO / BANZEIRO Hoje eu vim falar do eterno banzo e dos trágicos e planejados banzeiros que a história produz numa porção a mais de melanina. Quero falar d cor, dessa cor! De um distante lugar arrastado do além-mar. Quero gemer essa dor, essa dor! De um eterno sofrer causado por violações ao direito de viver. Noticiada em internet e TV, efetivada pelo abençoado poder: O poder das cifras, o poder do Ter. E de onde vem? Do engenho e do asfalto: facões ontem, vassouras e pás hoje! Da senzala e das favelas: sempre as periferias, os porões. To tronco e das celas: castigo, chibatas ou cacetetes, necrotério. Da forca e da penitenciária: únicas escolas e templos pra nós. Não há mais quilombos, nem Gança Zumba, tampouco Zumbi. Sobram torturas e ber-béri 43


Quinhentos anos de holocausto e essa incômoda cor insiste, resiste. É chegado o grande dia: Levantemos das calçadas, larguemos lavanderias, pias e tanques. Penduremos as foices, vassouras e enxadas. Abandonemos os postos de babás, vigias e cozinhas. Vamos ao Grande Julgamento: a corte que corta, suprema que nos suprime, aguarda. Professam acusações, calam as defesas, soa o martelo. É dado a sentença: -CULPADOS! A imprensa indaga, quer notícia, resposta: -Nada a declarar! Ó Mãe África, cruze o atlântico sul ao nosso encontro!

44


PERFIL Do teu plano sítio urbano erguem prédios, casas e choupanas, que contrastam com poucos pés e muitos pneus. Que confunde e impressiona visitantes. de tua cartografia riscada, cordialmente norte-sul-leste-oeste se povoa. De aventureiros, retirantes, missionários e possuidores errantes. Da tua história pagã, laica e cristã, heróis anômalos e anônimos cobram o sangue que imprime seu nome numa página pretérita. Das tuas esquinas e periferias avançam desprezo e ganância das classes conflitantes. De tua cultura casta e estéril, porém grande, naqueles que prenhe aguardam o rebento. Da tua avareza e ostentação, quase sem livros e erudição, com tanto descaso para o “SER”, sem nem um pudor, tua plebe e tua elite divagam no “TER”. Teu designe conteúdo escondem entre buzinas: a acefalia. Da tua escatologia que revela o esgoto utopia, ratos pútrefos, odores concorrem com algumas alfazemas dos (já quase) findados jardins. 45


Da tua loucura sem hospício e idosos sem asilos, negros abarrotam nas favelas-senzalas e celas. Da tua juventude ante’nada no que há de mais new wave, impera a xenofilia. A vontade de parecer de outro lugar, contrasta com a trilha sonora dos “senhores das terras’: o pop caipira. Quem não conhece teus seios e entranhas, discurso, vaidade, proclama ufanismo: fronteira, seleiro, purgatório. Com o tempo vai te revelar?

46


CONGRESSOS DE LUTADORES E LUTADORAS DO POVO Foram dias de noites e noites de luar. De lua e sonhos a vida de luta triunfará. Com cada manhã de sol tinge a visão, o ver do porvir que salta da mente e retina. E os pés de andanças descansam para mais uma luta na vida.

47


INTROSPECÇÃO Como uma sombra da atrevida nuvem que não consulta o sol A depressão encharca meu eu, então vulnerável, minha psiché, mostrando a queda. Não foi só medo, trevas, baixa, ruína, queixa. Tais lembranças servem como acupuntura pra alma, detritos errantes vagueiam na minha penumbra. Delatar meu ego se revela ao carma num divã sepulcro onde jaz o(in)finito

48


OUTRO TEMPO A conta-gotas esgotamos o poço da paixão. Atingimos a discórdia vi intolerância. Rompemos com nefertite, e a monogamia já nem sugjaz no inconsciente. Não houve, nem haverá concórdia, ou contato juramentado no altar, no púlpito da sinagoga, ou no templo da era pagã. Estamos voltando à origem, e você se casou com a ciência. Suas necessidades “in vitro”, destronou-me, um elo se rompeu. E todos os dias o real reage à retina assombrado.

49


INDIGENTE Um filtro em pĂŠ, um filtro com grana, com fogo, com fome, com nome.

50


ENTRANHAS É só cor: cor do corpo, cor da dor, dor do corpo, corpo da cor. Cor d’alma: serena na cor, serena n’alma, n’alma da cor. Amena, sem dor: Dor com luz, mergulhado na vida e submerso no amor. Luz, apenas, esplendor.

51


SUB VER SIVO Sou o substrato social, apareço na TV e nas folhas de jornais. Apavoro quem tem, tenho ficha na depol, o nome no spc, sou herdeiro do país do carnaval. Sou suspeito e procurado, sou a ignorância pro-letrado, voto, rezo, peco, afronto a lei e a democracia. Eu estou no país dos magistrados. Quebro o protocolo e a harmonia, sou a paranóia do farto, adoeço, perambulo, pereço. Inverto a ordem e a verdade, estou no país da alegria. Economicamente me responda: -Onde está a isonomia:

52


DE (CLARA)AÇÃO Depois daquele dia... Fugi, refugiei-me, desvariei-me. Menti, movediçamente agi. Nuei pra ti, sangrei, gestei, pari. Contra a gravidade subi. Ao vosso, nosso, meu, teu amor, desci e depois... pós assim ficou.

53


FUSAO DO DIA SEGUINTE COM LEMBRANÇAS Começo do dia, manhã de domingo, garoa matinal: barco, vento, proa. Primeiros minutos e princípio diurno. Caminho pra lua. Até ontem, seja quente ou grupal; círculo, órbita e luz. Seja fera, caipora, curupira, cultivo cio ...

54


ASSIM Caras: cansadas, Línguas: ligeiras, Pernas: penduradas, Olhos: ofuscados, Mentes: treinadas enquanto vivas para ser menor. Mãos: ágeis e ávidas de recompensas Sonhos: o mínimo, vencer os íngremes degraus da discriminação. A vida: melhor que assim!

55


DESAFORO Nas duas lamas: uma que lava e outra que derrama. E os pingos pingos pingos! Pingavam sangue, soavam o que foi, matizavam eras e às esperas, paqueras, trevas. Há muito um rei pensou a ideologia, a orgia e a rebeldia. Só a diversidade é rica.

56


HOMENAGEM À RUA BOA ESPERANÇA De esperança só o nome. Esperança em que, em quem? -Nos casebres de madeiras ressecados, cobertos de amianto? -Na gambiarra elétrica que pode incendiar tudo de repente? -Na falta d’água, esgoto, limpeza? -Na força da mãe que vê o filho partir pra delinqüência e não pode fazer nada? -Nos cartazes que estampam os rostos dos inúmeros candidatos que ali passaram em épocas de eleição? -No fogão à lenha que pouco cozinha a carne, o arroz, o feijão e muito esquenta água, sal e milharina? Esperança em que? -No futuro de uma educação excludente? -Na Tele Sena? -Na ilusão do show do milhão? -Ou na Mega Sena? O por que do nome, alguém diz: -É um nome positivo, né?

57


PORQUE FECHEI A PORTA Molesta-me pensar no homogreta pré pubis, pós tela. Jargão concreto, semi virtual, cromo, senom, ego. Cabala e diacrônico, filo, ante cartesiano, órfão, antítese da pós modernidade, extemporânea da artificialidade, esgota o presente.

58


DEPOIS... NÃO SE SABE Não parou pra pensar, pra parar; conversou sem pensar, pra convencer. Olhou sem olhar, olhou pra certificar. Falou pra falar... Não se reconhece na fala. Calou por calar, está do lado dos que calam. Sonhou por sonhar. Seu futuro pertence a alguém. Deu as mãos pra se sentir “MASSA”. Soltou as mãos quando foi chamado(a) a viver.

59


CRISE Obrigado por não aceitar: o rótulo, o “saber”, o futuro nem o passado. Obrigado por não querer: o maniqueismo, o romantismo, a esperança, nem a fé nem um ismo. Obrigado por recusar: o sermão, a verdade, a perfeição, a luz, o céu, o chão, o ide, o ego, o eu, o nós, o vós, a eternidade, o modelo, o erudito, o popular. Obrigado por não me escutar.

60


ODE À UTOPIA Na calma, na alma, na fé, na luta. Repensa, alimenta, fomenta. Conquista na dor, no amor, no sonho, no viver. Se reconstrói: germina, se multiplica, contamina.

61


ESSE CONTO É ERÓTICO? Todos chegaram à meia noite. Pegaram o mesmo veículo para o hotel. Eles, de Jeans, elas, de quase nada. Cada um deles lia. Elas falavam da noite anterior, num quarto para casais. Na pequena cidade que deixavam havia pouca empatia, apenas uma fragrância exótica que tocou a libido do mais hetero. A pressa era comum a todos(as). Dava pra ver nos olhares, pelas “ventanas”. Propositadamente dois moveram-se de maneira sensual. Ele, acariciou discretamente a região pélvica, ela, tentou ajeitar parte da calcinha que insistia em descobrir uma das nádegas. Toc! Toc! Toc! Algúem batia no vidro. Chegada ao hotel.

62


PÓS JETO Que ninguém cale, que não resvale o projétil. Que ninguém fale o que sentiu, deixe que anulem. Peça que tabule, Descartes ordenou seus súditos às cátedras. Os segundos, terceiros, quartos, eternos cadernos esvaziaram a humanidade. Aquele protótipo laboratorial definha. Restou o pósjeto no caminho inverso: queda livre num assoalho de desespero.

63


AS ESTÉTICAS PRÉ-PÓS-POP Eu não vou descer do elevador no vazio. Impera o “mix-tribu” punk dark cluber brega-core corno-pop-penta macho Quase(?) Fêmea: drag queem e uma colher de prata cheia de refúgio. Mas ninguém transa glitter head banger rastafari surf-way mauricinho / patricinha E o tempo já não é aquele que tentamos (des)construir Fernando Pessoa estava certo: “-Fazer da interrupção um novo caminho” e da procura um encontro. E as mães da plaza de mayo encontrarão? Nem bad boy 64


ou lesbian-chic ché music, tampouco brega michês serão o que? Quem? Grunge?

65


O CRIME Por que de mim? Um corpo arquétipo, protótipo do que não deve ser? Amparo copos de rancor e me deleito depois pra ver. Não vejo, lamento em mim, exilo pra dentro num dentro que há muito furou. Dissipa quanto... andei, andei, andei... ? ??? ...ainda sentia e tinha a fé no passado (...) Também queria e perdeu o sentido na estrada.

66


INDAGAÇÕES Se eu corto? -Não corto! O corto curtir por si já é curto. Se o curtir é curto como devo curtir o curto? Que é curto porque é curto! E não convém curtir. Vivo, é melhor.

67


UM PRATO RAZO PARA OS QUE TEM FOME Mais herói, muito mais que coitado renasce em Ganga Zumba. Qualquer romper de corda ou corrente Zumbi deixa a senzala como Antonio Conselheiro herda multidões busca a liberdade num copo d’água. Zé Maria contesta em Constestado. E na coragem de mudar cabano-ribeirinho-marajoara passam E-mail. Maria Bonita destra acordos e lampiões repartem as posses. Porfiro subleva os camponeses. Formosos e trombam com o destino. Nunca mais um prato raso para quem tem fome. Os martires deixaram herdeiros. O que seria do amanhã sem eles / elas?

68


DIULIETE Mine saia, olhar com sabor de caldo de cana caiana, cio canino, felino, humano. Pano transparente, pudor corrompido, sacro profanado, sanidade depois da crise. Sorriso anti lágrima, orgasmo múltiplo-multiface. Quem a defenderá do juizo final ou a levará para o céu?

69


PÓS Sombras, camisas suadas, cruzes, martelos e luzes. Fogo, tempo, pós tempo, retro, protesto: -A vida hoje bateu à porta, ninguém atende a campainha. Aurora traz o d’amanhã, sono. Sonhe um sonho melhor por mim, pare o sol, estou na sombra, chamem todos, venham ver quando é que a noite vem buscar os seus. Ela não é mais tão única no universo.

70


DE DENTRO Minha estupidez aflorada manifesta na neoprasia órgica da fala muda-e-surda de antes pré-pagas pós-parto ant-imput. Culpa e curta metragem falsa/sem mala sem alça d as vísceras viárias sobejo do vômito da fome do homem que nem vê...

71


CONTRA ADIÇÃO Tanta terra, mamãe.

Tanta estrada, pés.

Tanta posse, papai.

Tanto vazio, mãos.

Tanta Fome, filho.

Tanta dor, alma.

Quanta inanição

Tanta fé, Deus

Qual torrão.

Qual perdão

Quanta Técnica, ciência.

Quanto Saber, homem.

Tão pouca solução

Tão pouca satisfação

Tal cortejo, história

Tal distancia, existencia.

À necrópole acolhedora

À passagem superior

Nem uma opção.

Convoca à transgressão

72


NINGUÉM MAIS SORRIU Na sombra d cidade, uma lenda, um sonho, uma chama, confraria. NÃO!!! do dia eu só vejo o luar. SIM!!! nas águas a humanidade reflete-se. O dia está lá! No cortejo do sistema, mil vozes, duas bocas, em dúvida clamaria. NÃO!!! Do dia eu só vejo a noite SIM!!! Na noite o dia reflete-se. A humanidade está lá Chorem e cantem comigo. Sozinho me recuso, não vou chorar.

73


ALEGRIA Eu, atento o quão não são são não ou são? Muita claridade, pouca escuridão. Por quem passou, ficou ou não passou? Larga “tardizinha”, flameja alegria aos furtivos daqui que pararam para ser mas não só ser, transcender. São páginas, são cinzas, são tidos e sidos aos tempos idos.

74


TERREIRO VIRTUAL Lá não tinha “rede” pra falar. A rede que tinha lá, seu moço, era pra nos balançar. A chuva, quando cai lá, seu nêgo; é água pra se banhar, é vida pra viver e não ácido pra corroer. A lua, comadre, se mudou de lá. Cansou de bater no asfalto e não ver o clarear. Aqui, eu não me conheço, sou alien, sou tropeço. Não piso em terra firme: minha língua, ignoro. Tenho que obedecer ordens que vem dos fios. Poso para um retrato alheio, semblante que não é meu.

75


FLUÍDOS E ROSAS Se lhe perguntarem por que grito, diga: -Ele sofre de insônia! Publique meus hábitos de arrogância; de tanto afadigado, não caí na tentação de cair, transgredir. Os fluídos, os sorrisos e as rosas que resgate vão continuar fazendo? O tempo só é livre para quem é livre. O romper do porão é legado do ontem antagônico. Eu espero da varanda o sinal.

76


ORIGEM Sou povo. Povo é igual ao “eu” que sou. Meu eu forjou-se no povo e o povo forjou-se em mim: do sorriso e do medo, de um acordo selado/pacto estreito do existir, celebrado com o adorno do medo, do parto: povo nasci. Da terra, do jirau, do frio e da fome sobrevivi. No povo paterno aprendi a brigar, a bater, a sorrir, a chorar, a lutar. Do povo materno herdei a coragem, o cisma, o labor no amor. Na clemência e na ousadia, nos arrabaldes da história me fiz povo resistência. Da matriz, que a história há 500 anos renegou, fundada a água sol e lua, feito mato, feito rua. Só um certeza tem: É o povo! É alguém!

77


LAMENTO ESCOLAR Não me sinto, estou número, estou causa de desânimo, estou em quem não me contém. Sou causa do plano, mas, não estou nele: demando investimentos nesses novos-velhos tempos.. Eu sou o centro daquilo que não tem centro. Da massa, sou tudo; mas os resultados me condenam à morte. Serei fênix um dia?

78


LEMBRANÇAS ... e trilhei essa estrada de sub-degraus. Não avancei ao pretérito; só tive peito, passagem pela penumbra a ... ... qualquer intervalo, entre a porta e o portal, que acolhe o nixon, nicho e... Aurora de sombra que só o outro ponto pártite rebenta que i... ... e alcancei trilhas e trilho pagão, trilhei-o.. Uma ou u...

79


GLOSSÁRIO Quase Feliz

Feliz quase!

Demais, sortes

Sortes demais!

Nunca perecer,

Perecer nunca!

Ainda fé,

Férainda! Vida

Pulsarvida,

pulsar!

80


DESAVISO ATEMPORAL Teria sentido um homem fugir do tempo? Do tempo que apregoa marcas e sulcos? Do tempo que picha, tinge e desbota alguns, ou tantos fios tĂŞnues entre a entrada temporal da morte, amazonamente trota, galopa, antes da vida, findar. Teria sentido um tempo fugindo do homem?

81


SENFLITO Vontade de ouvir meus CDs. Ler, comer, tanger e tagarelar. Roubar, rezar, amar e mentir. Sorrir, ouvir, punir e amanh達 n達o s達, v達 sabedoria e alegria, magia que tangencia o brilho do dia-a-dia e cala a noite.

82


MATERNIDADE Entre o calvário da maternidade, a redenção. No gueto do tempo tentado, o romper e criar, quem lhe dera, da matéria. Sem ilusão que manchais a antematéria. Quando a aurora mutilada num rompante sem ser o que é na fonte. Abriria a janela do binóculo da vida pensada / passada / emasculada nos sonhos

83


GEOSENTIDOS Na boca da noite eterna, alguns dentes rangem e tangem o paladar. E este , com o fono partem para outras terras anatômica.. Sem eco nem voz a saliva, em seu leito, desliza no sentido laringe-foz. Sozinho, numa região já inóspita, o olfato se torna mais um exilado. E o hálito de uma boca que nunca mais se abriu, rebela-se pela out. Feito furacão, açoita para as zonas de baixa pressão intestinal. Os sentidos exilados buscam apoio no sol. Querem a qualquer custo a luz. So ela devolverá seus lugares, suas sombras e virtudes.

84


MELANCOLIA Quando cessar o último ranger de giz no quadro-negro, que nem sempre é negro, é verde; e o último aluno cruzar o portão da escola indo embora, e o último professor fechar seu armário e colocar a chave no bolso partindo, é férias! Férias? Que férias? Pra que? Férias pra ter tempo, pra sentir como o tempo passou e pouco deixou em termos de crescimento humano. Férias, férias pra repousar a cabeça na consciência e se culpar, talvez por aquilo que poderia ter feito e se omitiu. Férias, pra ver como nossas crianças cresceram e já não demostram sentir falta da nossa presença, como nossos vizinhos, que não víamos há meses, engordaram. Enfim, pra se dá conta do mundo. E dentro desse resto do mundo nos percebermos também humanos, que pensam, sentem e sofrem... e sonham! Sonhamos desiguais mas sofremos problemas semelhantes, e podemos resolvê-los coletivamente. Mas, pra isso, precisamos sonhar sonhos maiores: o da liberdade pra todos(as). Aí sim, as férias poderão ter um significado bem mais amplo.

85


GRANDE HOMEM / PEQUENO SER Por ignorar o poder, ele se fez humilde; Pra sonhar com a paz, ele semeou amor. Por acreditar na solidariedade, ele repartiu. Por confiar na justiรงa, ele sucumbiu.

86


PSYCHÉ (Francisca Calvares Galvão)

Baixa, silenciosamente, ao transparecer razão de uma prece nítida, consciência, verdade, ternura, reminiscência: A essência do ser. Frágil, perpetua no silencio, cala! Tão bela que exala, abala! Gigante que espanta, encanta, desencanta, jubilar na alma.

87


TEATRO GRITO DE FOME A pobreza não gosta de olhar no espelho. E lá está seu rosto. A pobreza gosta é de olhar n espelho e lá está o rosto da classe patronal. A classe patronal é grande símbolo para a pobreza, é o sonho para a pobreza. A pobreza tem vergonha de si mesma. Agora ela precisa imitar os patrões para sentir-se bem. A classe patronal tira muito proveito disso, da classe produtora. O patrão sempre vai premiar a submissão e a idolatria com a principal manchete mundial. Existe uma terceira classe: ela está ruindo a base da classe patronal. O difícil é que a terceira classe não conta com mais ninguém, nem com Deus, nem com o lúcifer. Será que no dia do confronto, a classe pobre vai ficar do lado da classe patronal? Só a TV dirá!

88


PRETEXTO CONTRA O SAUDOSISMO Estou cansado de ouvir dizer que a geração anos sessenta foi, e é, a tal. A geração fim de milênio sim, fez e está fazendo uma revolução. Nós, hoje conseguimos romper com o determinismo natural. Não estamos sujeitos a limites da natureza: -Somos artificiais 100% Enquanto que a geração anos sessenta, o máximo que fez, foi desenvolver sentimentalismo. Transpondo a este obstáculo natural somos quase perfeitos para “nosso tempo”. Ninguém se assusta se disserem que, quem viveu os anos sessenta e alcançou os noventa, está envergonhado de suas performances caretas. O fim do milênio e início do outro é rigorosamente pragmático.

89


DE BRAÇOS ABERTOS Venha seu lado considerado bem: amor, fraternidade, justiça, beleza, compreensão, enfim, o que há de melhor. Maniqueisticamente pensando, você tem seu ruim, seu mal. Será que enquanto você ama odeia quem você é?

90


CONSUMO Essa idologia do perdularismo: natal demanda de uma grande aceitação da m e n t i r a

91


COMPARTILHAR, ASSUSTA! Não está em condição de ir e vir, não está em condição de amar, não está pra agradar. Está pra pedir apoio, está pra refletir sobre o caminho que trilhou, está pro interior. Esse não é o momento sonhado pela outra parte, essa não é a estrada a qual a mente deu a chave e o mapa. O emocional agora vive o amargo, existe algo bom armazenado, mas ainda é pouco pra fazer compartilhar o momento. Com medo de sofrer agarra a si mesma.

92


ANTI-HERÓI (kurt cobain) O Anti-herói alertava: -Não me idolatre, eu sou um produto perecível. O anti-herói estava preso às teias do show busines. Ele bem que tentava abrir os olhos de todos. O anti-herói se foi pra poupar a massa. A massa ensandecida não prestava atenção no que o anti-herói dizia. Ela só entendia e obedecia o que a mídia ordenava: -Consumam-no, ele é um herói. E foi assim, “os poucos” que o entenderam não puderam chegar perto, tocar o anti-herói para dizê-lo que o havia entendido. O anti-herói se foi, “os poucos” continuaram anônimo. Dizem que ele foi sugado por aquele buraco negro. Não é verdade. O anti-herói foi “um dos poucos” que conseguiu saltar aquele abismo. O anti-herói lançou mão do último trunfo: a vida! Mas conseguiu. É uma pena que tenha sido assim. Os seus algozes, anti-herói, ainda hoje lutam para tranformá-lo em ícone.

93


NATAL PELA FRESTA DA PORTA Querer o natal, quantos querem? -todosQuantos tem o natal de fato? -algunsO natal na mansão difere muito do natal na rua, ‘embaixo da marquise’. Enquanto o natal do centro excede fartura, na periferia também excede: amargura! Festeja o patrão a noite de natal, nesta mesma noite reza o peão pelo pão de amanhã. Na escola se glorifica o natal. Em casa, o sonho acaba, a vida é real. Mestre aprova e reprova. Quem aprova ou reprova o mestre? É natal! E os jovens, e as crianças, como foi divulgado e ensinado, o natal irão comemorar. E o ser humano, que não foi percebido naquele seres, como irão batalhar a sobrevivência? Que armas lhes demos a mais das que trouxeram, para lutarem e vencer na batalha da vida? Nada mais há de se pensar, o natal superou tudo! Como disse Eduardo Galeano: -Somos o que fazemos, mas somos principalmente, o que fazemos para mudar o que somos. 94


95


O “Farol” do poeta Zé Rodrigues nos fustiga as entranhas com muitas outras verdades. Verdades estas nem sempre à mostra, mas que ele, sutil e sorrateiramente deixa na suspensão das palavras e nas entrelinhas dos versos. Como uma paisagem que se precisa descobrir com mãos ávidas, olhos lúcidos e pensamento crítico. O “Farol” do poeta Zé Rodrigues é como uma gaivota que se mantém presa entre os céus e os rochedos. Os dois a aprazera. E aos dois, constantemente lança ao infinito seus pios ensurdecedores.

96


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.