Abrente nº 64

Page 1

Vozeiro de Primeira Linha

www.primeiralinha.org

Ano XVII • Nº 64 • Segunda jeira • Abril, maio e junho de 2012

Jornal comunista de debate e formaçom ideológica para promover a Independência Nacional e a Revoluçom Socialista Galega

Por umha greve geral de 48 horas

Luitamos para vencer

Editorial O massivo seguimento da greve geral de 29 de março, assim como o importante apoio às mobilizaçons do 1º de maio, confirmam a necessidade de vertebrar um amplo, sólido e unitário movimento de massas contra a política socioeconómica do governo espanhol e da Junta da Galiza. É inegável que segmentos significativos da classe trabalhadora começam a perder a paciência perante a gravidade da situaçom tomando consciência da magnitude da ofensiva burguesa e da necessidade de pará-la. Estamos a assistir, pois, a umha paulatina superaçom do adormecimento, medo e resignaçom que semelhava instalada no povo trabalhador galego. No entanto, nom podemos ficar aqui. Há que dar novos passos, dissipar ambigüidades e vacilaçons à hora de traçar umha estratégia de luita permanente, sustentada e in crescendo contra a burguesia. Já nom chega com a indignaçom. Há que passar à revolta ativa que contribua para gerar as condiçons subjetivas imprescindíveis para que os estalidos e conflitos sociais espontáneos, que se divisam no horizonte, transitem para a fase da luita organizada de massas sob umha orientaçom revolucionária que dispute o poder. Até essa etapa de caráter insurrecional fica muito caminho por andar, mas é dever da militáncia comunista avançar em todos os campos para que a insurreiçom nacional, obreira e popular seja a verdadeira alternativa às falsas soluçons reformistas e ao caos e miséria a que o capitalismo nos condena. O Estado espanhol tem claro que é policial a única soluçom a médio prazo

para poder sufocar a nossa ira, para esmagar a justa luita do povo explorado e oprimido. Nos últimos meses, tem acelerado os preparativos para um cenário cada vez mais nítido de agudizaçom e radicalizaçom da luita de classes. A burguesia está-se a armar até os dentes para se dotar dos meios suficientes com que exercer umha repressom em grande escala. É plenamente consciente que o capitalismo nom tem soluçom possível. Que para manter as atuais taxas de lucro terá que continuar a empobrecer mais e mais as camadas populares. A nova reforma do Código Penal em preparaçom, tendente a criminalizar as luitas populares, agravando as penas por se mobilizar e exercer o legítimo direito à defesa, pretende endurecer o Estado policial, amputando ainda mais os direitos e liberdades, seguindo as tendências em curso para assim blindar os privilégios da oligarquia. Frente a este panorama que se anuncia em factos e declaraçons permanentes, seria um suicído que as forças organizadas do proletariado galego optássemos polo autismo e a inaniçom. Se som tempos de luita, há que se preparar para luitar com eficácia para termos êxito. A nossa luita é para vencer, nom temos vocaçom de perdedores. Há que avançar na aprofundizaçom da luita. Há que ir preparando as condiçons para umha greve geral de 48 horas, com um claro e imediato objetivo: derrogar a reforma laboral e tombar o governo de Rajói. Nos dias de hoje, tam só a quatro meses da sua posse, o executivo do PP em Madrid é um governo que já manifesta sintomas de enfraquecimento. Há que acelerar o seu isolamento e perda de apoios mediante

a luita de massas contra os cortes na saúde e no ensino, o incremento de impostos, em prol da defesa dos postos de trabalho e contra o desemprego. Há que integrar reformados, juventude e mulheres na luita contra as políticas neoliberais do PPSOE. Temos que agir com determinaçom e decisom. Há que ocupar as ruas, agitar, denunciar. Politizar a classe obreira e a juventude. O movimento popular, que lentamente se vai configurando, tem que introduzir na tabela reivindicativa do seu programa a saída do Estado espanhol da UE, NATO e do FMI e, portanto, o fim do submetimento às diretrizes de Berlim, Bruxelas e Washington por parte de Madrid. Mas, sem exercemos o direito de autodeterminaçom para atingirmos a plena soberania e independência nacional da nossa Pátria, nom é possível a emancipaçom da classe trabalhadora galega. Nesta luita, há que ir por todas. Se exploraçom de classe e opressom nacional vam unidas, se Capital e Espanha som as duas caras da mesma moeda, temos que conjugar e fundir a luita de classes com a luita de libertaçom nacional. Nom som momentos de políticas pragmáticas nem soluçons possibilistas. Estamos numha etapa em que se require firmeza e decisom para divulgar sem timoratismos a alternativa radical comunista. Nestes tempos de ferro e sofrimento, há que esclarecer à nossa classe e ao nosso povo que só temos futuro destruindo o capitalismo e construindo simultaneamente de forma criativa e original o comunismo para a

Sumário 3 A degeneraçom das modernas organizaçons sindicais. Umha aproximaçom à colaboraçom obreiro-patronal (III) Daniel Lourenço Mirom

4-5 Entrevista com Jorge Beinstein, economista marxista argentino Maurício Castro

5-6 A emancipaçom da mulher é umha luita das mulheres Luzia Leirós Comesanha

7 O movimento de ocupaçons nos Estados Unidos, um processo histórico Berta Joubert-Cec

8 Defesa, resistência, ataque e insurreiçom Friedrich Engels


2

Nº 64 Abril, maio e junho de 2012

Editorial

Galiza e o mundo do século XXI. Nom há meias tintas.

contra os que seguem a enganar o povo sobre a possibilidade de reinstaurar o modelo de capitalismo de rosto humano dos oitenta e noventa.

A burguesia opta pola retirada parcial da máscara

Perante a inegável e cada vez mais inviável possibilidade de maquilhagem dumha realidade cada dia mais crua, a burguesia optou por umha mudança de tática. Mudou o falaz discurso de ocultaçom e maquilhagem da desfeita, e das promessas sobre umha imediata saída da crise, polo reconhecimento descarnado de que a situaçom obriga a um longo período de sacrifícios e adoçom de duras medidas para num futuro sem data clara poder superá-la. Ambas táticas coincidem em se apoiarem numha incorreta análise da realidade e na difusom de falsas esperanças que contribuam para rebaixar a tensom social. Ambas pretendem perpetuar o capitalismo e as suas injustiças e cada vez maiores desigualdades. Por isso ambas estám condenadas ao fracasso. Deste jeito, Mariano Rajói converteu as propostas difundidas nas conferências de imprensa posteriores ao Conselho de Ministros em mero spam. O único real do que conta, seguindo o guiom dos seus assesores e que deixou bem claro que as sextas-feiras vam ser um dia preto para o povo trabalhador. Semana após semana -tal como vem fazendo desde dezembroassistiremos ao anúncio de mais cortes sociais, incrementos de impostos e produtos básicos, privatizaçom de serviços, agressons contra os interesses populares, cortes nas liberdades e direitos. Com o coraçom num punho, assistiremos cada sexta-feira de semana em semana a umha chuva de medidas lesivas contra a Galiza e o seu povo. Mas nom podemos ficar de braços cruzados aguardando que algum dia escampe. Há cinco anos, prognosticávamos o atual cenário de crise sistémica capitalista e de crise estrutural do projeto nacional espanhol. Éramos desqualificados como “alarmistas”, mas as hemerotecas nom enganam. A tinta, diferentemente das palavras, nom a leva o vento.

Intervençom de Espanha polos organismos imperialistas é mera questom de tempo

Rajói tem muitas razons para nom conciliar bem o sono. A troika nom descansará até provocar a intervençom do Estado espanhol e convertê-lo num protetorado do capitalismo internacional. Obviamente, essa situaçom provocará a aceleraçom da catástrofe social a que nos conduz a economia de mercado. Para evitar falsas saídas de autoritarismos populistas caraterísticos das convulsas etapas de crise, é urgente e peremptório organizar povo trabalhador para a luita. Esta é a preocupaçom e tarefa prioritária das comunistas galegas e galegos. Os anos vindouros serám luminosos ou bem obscuros, em funçom da capacidade de incidirmos nas luitas e atingirmos sólido enraizamento no mais profundo da nossa classe.

Libertaçom de Miguel Nicolás

Agora anunciamos que as tendências em curso só permitem umha saída nacional e de classe de caráter revolucionário. Nom há outra hipótese. O tempo vai dar-nos novamente a razom. Entre outros factores e por este motivo, todas as expetativas e movimentos tendentes na Galiza a restruturar, a partir de postulados ideológica e politicamente anémicos, o campo da denominada “esquerda”, nom vam ser mais que umha reediçom do mesmo. Eleitoralismo, institucionalismo, práticas conciliadoras e pactistas, perpetuaçom da corrupta e parasitária casta política. Primeira Linha manifestou com clareza que nom vai participar em nengumha cerimónia de confusom. Tampouco em iniciativas interclassistas tendentes a

contribuir para amortecer as contradiçons em alta do capitalismo senil e do cada dia mais questionado regime da Segunda Restauraçom Bourbónica. Nom vamos participar em nengumha negociaçom para construir umha plataforma eleitoral cor-de-rosa e mornamente soberanista. E nom nos recusamos a tal participaçom por sectarismo, nem com base em purismos ideológicos, mas porque temos o firme convencimento de que a principal tarefa, hoje, para as forças revolucionárias é contribuirmos para reforçar a luita e a organizaçom obreira e popular com princípios inequivocamente anticapitalistas, tendo como epicentro a rua. Neste cenário, a batalha ideológica contra todas as variantes de reformismos

e oportunismos é mais necessária que nunca. Há que acompanhar a nossa classe e o nosso povo no incremento da sua consciência. Há que redobrar esforços em organizar, promover luitas, resistir a repressom, desafiar a lógica do sistema, ganhar referencialidade no intransigente combate

Primeira Linha manifesta a sua satisfaçom polo excarcelamento do jovem sindicalista viguês, após passar dezasseis meses preso. Saudamos o seu regresso à Pátria e a sua reincorporaçom à luita do nosso povo e da nossa classe contra as predadoras políticas da burguesia. Miguel, tal como Telmo Varela, atualmente preso longe da Galiza, som paradigma da luita coerente contra o Capital e Espanha, e património da Galiza rebelde e combativa.

Publicidade

Fernando Macías,3 15004 - A Coruña www.lumelibros.com Telf.: 981 263 408 Fax: 981 264 803

R/ Camélias, 10 36860 Ponte Areas Tel 986 661 970

R/ Real, 48 • Vigo Tel. 607 228 556

Santiago - A Coruña

R/. Angustia 4 baixo • Santiago Tel. 605 714 704

Entremuros, 12 - Compostela Tel. 981 576 778 | www.ocurruncho.com


Análise

Daniel Lourenço Mirom

Nº 64 Abril, maio e junho de 2012

3

A degeneraçom das modernas organizaçons sindicais. Umha aproximaçom à colaboraçom obreiro-patronal (III)

Instalaçom da fábrica Citroën no porto de Vigo, 1958.

Achegamos já a terceira entrega deste percurso pola evoluçom do facto sindical na Galiza. Um percorrido que, por causa da serôdia implantaçom na nossa terra de organizaçons obreiras próprias e a ausência de instituiçons e soberania nacional, seria difícil de abordar sem referenciar o quadro em que se desenvolveu o sindicalismo no Estado espanhol. Paradoxalmente, o periodo histórico que abordamos na anterior entrega e que vai preceder a proclamaçom da República espanhola a 12 de abril de 1931, é de maior interesse para o tema que nos ocupa que o breve mas intenso período que vai de 1931 a 1936 e o levantamento fascista afogou no sangue do melhor do nosso povo. Nom negamos as evidentes transformaçons operadas no movimento obreiro galego na Galiza durante esse periodo. De facto, e como assinala Velasco Souto1, as taxas de filiaçom sindical em 1932 davam arredor de 30.000 filiadas e filiados para cada sindicato, cifras que aumentam em 1936 a 40.000 para a CRG-CNT e 45.000 para a UGT. Este aumento nom é só numérico, pois também se dá umha extensom territorial e os sindicatos chegam a novas áreas da mao da penetraçom no movimento agrarista e da extensom das obras do caminho de ferro. Assim, junto aos núcleos tradicionais do movimento operário vemos como as sociedades se estendem por áreas onde a industrializaçom é quando menos escassa, como Monforte ou Maceda no interior, e a prática totalidade dos portos pesqueiros da Guarda até Ribadeu. Nestas novas áreas que conquista o movimento operário, constituem-se sociedades da construçom, de agricultores, de pescadores ou de ofícios vários, para integrar ao escasso proletariado que exista. Além do mais, a queda da ditadura de Primo de Rivera e a posterior proclamaçom da República espanhola, abriria um período no qual, por fim, podemos falar da consolidaçom definitiva do Direito do Trabalho e da Segurança Social como ramo independente do ordenamento jurídico espanhol. Esta consolidaçom virá da mao da constitucionalizaçom dos direitos laborais e, também, da enorme quantidade de leis e regulamentos jurídico-laborais que, dotariam a esta rama do ordenamento de “unidade interna e plenitude de conteúdos”2. No que diz respeito ao direito de associaçom, este fica consagrado na Constituiçom de 1931, concretamente no seu artigo 393, mas sem as restriçons dos períodos anteriores. Ainda que se continua aperfeiçoando os instrumentos para a soluçom institucional dos conflitos entre Trabalho e Capital, a dinâmica social e a ausência de umha certa establidade política deste curto mas intenso período histórico, impedem qualquer tentativa de cooptaçom estatal dos sindicatos de classe existentes na altura.

É por isto que, apesar da evidente expansom e crescimento do movimento operário da Galiza e a articulaçom do Direito espanhol do Trabalho, este período histórico tem umha importância relativa para o essencial do nosso percorrido pola evoluçom sindical.

Golpe e repressom. Da morte do movimento operário ao ressurgimento sobre bases renovadas

Em palavras de Velasco Souto, um dos mais destacados especialistas sobre o período histórico que nos ocupa, de “1936 a 1954 assassinárom o melhor do nosso povo”4. Por duro que poda parecer, o certo é que se perguntamos que fica na atualidade do movimento operário de pré-guerra deveríamos responder que nada, ou sendo muito generosos, muito pouco. Ainda que o novo regime vaia apresentar-se a sim mesmo como “sindical”5, durante o mesmo vai produzir-se umha abrupta rutura na evoluçom do movimento obreiro. No que se refere à UGT e à CNT, a situaçom para as duas centrais será relativamente diferente durante as duas primeiras décadas do franquismo, embora o resultado acabe por ser o mesmo6. Enquanto que da UGT praticamente temos que falar da sua defunçom imediata, a CNT tentará reorganizar-se nestes primeiros anos mantendo umha mínima estrutura clandestina. Mas em todo o caso como já dixemos o prioritário nom será a reivindicaçom laboral e sim outro tipo de atividade mais política. Finalmente a repressom e a divisom sofrida pola maior parte das organizaçons republicanas no exílio reduzirám a atividade dos restos organizativos do movimento operário de pré-guerra a umha questom testemunhal, com a exceçom do PCE, no renascer do bulir operário a partir da década de 1970. Como elemento novo neste período, temos que ressaltar a criaçom por parte do regime fascista dumha proposta “sindical” própria. Para sermos mais precisos, diremos que o novo regime nom cria, mas toma emprestado, um projeto ideado por um pequeno grupo que pretendeu transladar durante a IIª República os métodos e postulados dos fascismos europeus ao Estado espanhol7. Falamos da Falange de las JONS e do sindicalismo vertical. Esta força política marginal elaborou o modelo do sindicalismo vertical como instrumento de dominaçom sobre a vida social e económica e, com tal objetivo, o adota o novo regime e o pom em prática naqueles territórios que caim nas suas maos, ainda com a oposiçom de outros setores que se bem apoiavam o aniquilamento da IIª República defendiam outros modelos, tais como regimes corporativistas de inspiraçom católica. Mas, apesar de tal adoçom, o franquismo nom desenvolveria o projeto original desenhado polos falangistas, adaptando-os às suas próprias necessidades.

Assim, os sindicatos nom se convertêrom em centros de elaboraçom e execuçom das políticas e económicas, mas ocupárom umha posiçom subordinada a respeito do poder ministerial do governo. É assim que a Organizaçom Sindical Espanhola foi concebida como umha espécie de instrumento técnico de colaboraçom das políticas ministeriais, um elemento de enlace entre o regime, o Trabalho e o Capital. Fora da açom política das organizaçons sindicais, neste tempo nom deixa de existir um fermento para a explosom da classe operária submetida a umhas condiçons de exploraçom especialmente duras8, contexto em que se dam as greves de Ferrol e Vigo no 1946 contra a reduçom da raçom de azeite. Mas a repressom generalizada num tempo ainda muito próximo a etapa dos passeios e em que na Galiza atua umha guerrilha contra a qual se mobilizam multidom de meios policiais e militares impedem que estas greves nom sejam outra cousa que fenómenos pontuais. Da óptica da análise do associacionismo obreiro e a sua institucionalizaçom, devemos diferenciar duas etapa no franquismo. A primeira etapa inicial da que acabamos de falar e na qual, do ponto de vista normativo cabe destacar as leis de 26 de janeiro e de 6 de dezembro de 1940 de unidade sindical e de bases da organizaçom sindical e a de 23 de junho de 1941 de classificaçom de sindicatos. Produz-se um retrocesso em quase a totalidade da organizaçom anterior e passa a punir-se a greve e o fecho patronal, a supressom dos Jurados Mistos e os Tribunais industriais e a criaçom das magistraturas do Trabalho em 1940 e os Tribunal Central de Trabalho em 1941. A participaçom do Estado em todo o relacionado com as relaçons laborais ficará regulada pola Lei de 16 de outubro de 1942 de Regulamentaçons Laborais e pola Lei do Contrato de Trabalho de 19449. Na segunda etapa, umha vez alcançados os objetivos do holocausto planificado e aplicado de forma sistemática para distruir umha generaçom de dirigentes e militantes de esquerda, o regime franquista, sem abandonar a sua face mais autoritária, aposta decididamente numha liberalizaçom da economia e umha equiparaçom progressiva das relaçons laborais espanholas com as do resto das democracias burguesas que culminará duas décadas depois na chamada Transiçom.

O início da mutaçom do franquismo. Preparando a Transiçom

Pode parecer chocante a afirmaçom de que a Transiçom que culminaria na segunda restauraçom bourbónica e no estabelecimento do regime político que ainda subsiste no Estado espanhol, começa a fraguar-se na década de 1950. O certo é que sem entrarmos a avaliar se os reajustamentos que o fran-

quismo começa a introduzir naquela altura estavam já encaminhados para este cenário de forma consciente, o certo é que sim se operam umha série de reformas que estám perfeitamente enquadradas nesta lógica. O plano de estabilizaçom de 1959 é acompanhado por umha série de medidas que no terreno das relaçons laborais debuxarám um cenário mais flexível e acorde com o momento económico e social sem abandonar, por suposto, a puniçom da auto-organizaçom obreira. Assim, o regime embarca-se numha viagem em que, com perspetiva histórica, cada etapa parece encaminhar-se cara a reforma que se operaria na década de 1970, após a morte do ditador. Esta viagem tem como ponto de partida o ano 1956, com o ingresso do Estado espanhol na ONU e na OIT, que a partir de aí passará a ter um papel impulsor da equiparaçom do Direito do Trabalho e da Segurança Social espanhol com a do resto das democracias burguesas próximas. Só dous anos depois aprova-se a Lei de 24 de abril de 1958, de Convénios Coletivos Sindicais, em toda umha declaraçom das intençons com que o regime enfrenta esta nova etapa. É certo, tal e como afirma Montoya Melgar, que, inclusive na fase autárquica, ao regime foi impossível evitar toda forma de negociaçom coletiva, polo qual se viu obrigada a admitir fórmulas atenuadas e parciais10, mas será a Lei de 1958 que estabelecerá um modelo de negociaçom coletiva que suporá um fator decisivo no desenvolvimento das instituiçons jurídico-laborais, ainda num quadro de restriçons. A Lei de 1958 marcará o início da construçom no terreno laboral de um sistema contraditório na qual conviverá um capitalismo fortemente intervindo, mas ao serviço do Capital, e o reconhecimento de certos direitos sociais. Tal sistema contraditório continuará a desenvolver-se até a Transiçom e os Pactos da Moncloa, que além de no político tenhem umha profunda incidência no plano sindical. Mas antes de abordar esta fase, tracejemos as linhas da evoluçom sindical. 1 VELASCO SOUTO, Carlos F. Galiza na II República. Edicións A Nosa Terra, Vigo 2000, pág. 51. 2 PURCALLA BONILLA, Miguel Ángel; e JORDÁ FERNÁNDEZ, Antoni, Las Relaciones Laborales en España hasta la Constitución de 1978. Editorial Dykinson, Madrid 2007, pag. 55. 3 DE LA VILLA, Luis Enrique, Materiales para el estudio del sindicato. Instituto de estudios laborales y de la seguridad social, Madrid 1984, pág. 115. 4 VELASCO SOUTO, Carlos F. 1936. Represión e alzamento militar na Galiza. Edicións A Nosa Terra, Vigo 2006, pág. 347. 6 BERNAL GARCIA, Francisco. El sindicalismo vertical. Burocracia, control laboral y representación de intereses en la España Franquista (1936-1951). Centro de Estudios Políticos y constitucionales. Madrid 2010, pág. 15. 6 FERNÁNDEZ, Eliseo e PEREIRA, Dionísio. “A repressom contra o Movimento Libertário na Galiza durante a Guerra Civil e a posguerra” em A repressom franquista na Galiza. Edicións Embora, Corunha 2005, págs. 399 e ss. 7 BERNAL GARCIA, Francisco, op. cit. págs. 25 e ss. 8 Lembremos que até finais da década de 50 a maior parte dos produtos de primeira necessidade estám racionados. 9 PURCALLA BONILLA, Miguel Ángel e JORDÁ FERNÁNDEZ, Antoni, op. cit. pág. 95. 10 MONTOYA MELGAR, Alfredo. Derecho del Trabajo. Tecnos, Madrid 2006, pág. 20.

Daniel Lourenço Mirom forma parte do Comité Central de Primeira Linha


4

Nº 64 Abril, maio e junho de 2012

Maurício Castro

ENTREVISTA

Entrevista com Jorge Beinstein, economista marxista argentino

“A chegada do socialismo é umha necessidade, mas nom umha inevitabilidade”

A que tipo de crise estamos a assistir?

Na verdade, estamos numha crise de sobreproduçom que está a se transformar no seu contrário, umha crise de subproduçom.

Explica-nos isso um pouco.

Devemos partir da teoria de Marx sobre a crise, a única que ajuda a explicar boa parte do que está acontecer. Ele explicou que a dinámica de concentraçom de rendimentos e o facto de haver umha multidom de capitalistas a concorrerem entre si, fai com que se desenvolva um processo de inovaçom tecnológica que inevitavelmente aumenta a capacidade de produçom.

“O capitalismo está mostrando que nom era tam original. O padrom tecnológico capitalista, limitado polas condiçons históricas, deu para o que deu: a exploraçom de recursos até o esgotamento dos mesmos” Esse aumento de produçom, no século XIX, ia acompanhado da reduçom da massa salarial, provocando um desfase entre a oferta e a procura, o que resultava numha crise de sobreproduçom. Assim explicava Marx as crises da sua época, que eram diferentes das pré-capitalistas. Aquelas tinham sido crises de subproduçom próprias das economias agrícolas, pola sobre-exploraçom da terra decorrente do crescimento demográfico, que produzia colapsos na produçom agrária e os derrubamentos económicos, fames, morte de altas percentagens da populaçom, etc. Marx explica que no capitalismo industrial as crises se devem aos excedentes produtivos e nom à carência como em etapas precedentes. A partir da crise dos anos 70 do século passado, esta já nom se produz polo desfase entre oferta e procura. O Estado Keynesiano, instrumento fabricado polo capitalismo e que durante décadas lhe foi útil para a regulaçom que permitiu a saída de crises como a do 29 (da qual se saiu 10 anos mais tarde), permite controlar a queda da procura através da transferência de recursos aos assalariados. Se bem os salários se estancam, os desempregados tenhem subsídios e permitem assim manter o consumo e que nom haja revoltas.

impor-se e os capitalistas respondem a essa queda do lucro no seu sistema produtivo e um atalho para manter os lucros que nom existem no negócio produtivo é dedicar-se a negócios financeiros. Para isso, as empresas necessitam fundos, realizando-se empréstimos mutuamente e, entretanto, o Estado Keynesiano, para manter a procura, evita estabelecer impostos e libera papéis ao mercado, pedindo dinheiro emprestado. Parte dos excedentes financeiros vam assim para outras empresas, mas umha parte vai para comprar artigos públicos, gerando-se um circuito financeiro que se expande mais cada vez, derivando na chamada financeirizaçom da economia. O resultado? Em 1970, a massa financeira global podia ser de 50% do Produto Bruto Mundial. Neste momento, essa massa é de 20 vezes o Produto Bruto Mundial. A outra saída para manter a taxa de lucro por parte dos capitalistas foi evitar a subida dos salários, claro, mas conceder créditos públicos e privados. Nom aumentam o salário, mas repartem cartons de crédito, com o qual os trabalhadores e trabalhadoras vam diferindo para o futuro os pagamentos. A dívida privada, a dívida das empresas e a dívida pública vam crescendo. Por baixo da expansom financeira, produz-se umha expansom da dívida. Chega umha altura em que essa dívida se converte em impagável e o crescimento da massa financeira fica paralisado. Há quatro anos que estamos aí: a massas financeira nom cresceu mais desde 2008. Até hoje, conseguírom que essa massa financeira nom se derrube, mas nom cresce mais, daí que estejamos em recessom e que a ideia do crescimento num futuro imediato seja umha quimera. Os estados e as empresas sobre-endividadas, incapazes de pagar...

Nom pode haver umha nova expansom através da exploraçom de novos territórios e recursos?

Quais? Olha só um exemplo. Quando este desastre começou, a dívida pública japonesa era aproximadamente 25% do Produto Bruto japonês. Nestes momentos, é de 220%. A dívida pública mais a privada desse mesmo país era de 40% e agora é de 500%, tal como a británica; a estado-unidense, 400%; a francesa e a alemá está polos 320330%...

Entom qual é a saída?

Umha saída é baixar os custos, comprimindo a massa salarial. Outra é a predaçom de recursos renováveis e nom renováveis. Assim foi que conseguírom baixar o preço do petróleo e baixá-lo durante uns 20 anos através da exploraçom colossal de recursos. O mesmo com o cobre, o ferro, alimentos, etc.

“É preciso mudar o modelo, nom chega com apelar a um capitalismo sem crescimento, porque isso nom pode existir. O consumismo é a base para manter a procura e através dela a produçom e os lucros. Certamente, há umha produçom supérflua, mas só erradicando o capitalismo poderemos encontrar a alternativa, já que de facto o capitalismo já deixou de crescer” Assim, dá a impressom de que as crises se ultrapassam, mas a concorrência entre os capitalistas, que está na base de todas as crises anteriores, gera um aumento do potencial produtivo, mas com umha regulaçom da produçom em funçom da procura existente em cada momento. Assim, nom há excessos de mercadoria sobre o mercado, pois fam estudos sobre o que devem produzir exatamente em cada momento. Porém, o potencial de produçom é enorme (equipamentos, instalaçons, etc) isso sobe os custos de produçom e a velha regra de que isso fai cair a taxa de lucro volta a

O mesmo figérom com a exploraçom da terra, através das sementes híbridas, transgénicos, fertilizantes, esfoliantes... até arruinar as terras. Assim se fijo e se fai ainda nos Estados Unidos, Brasil, Argentina... Desde 2005, a produçom petroleira mundial deixou de crescer. Estamos no pico e começa a baixar a produçom nalguns países, mantendo-se globalmente nos 83 milhons de barris diários, mas com perspetiva imediata de descida da produçom. Com o cobre, o ouro, etc, acontece a mesma cousa. O capitalismo está mostrando que nom era tam original. Pensava-se que as crises

de subproduçom eram próprias do pré-capitalismo e que com o capitalismo nom haveria mais, mas agora estám a voltar, igual que em civilizaçons anteriores. O padrom tecnológico capitalista, limitado polas condiçons históricas, deu para o que deu: a exploraçom de recursos até o esgotamento dos mesmos.

Isso nom foi previsto por Marx... Será que é útil a teoria do decrescimento?

A teoria de Marx é sobre crises de sobreproduçom, mas agora já estamos às portas da crise de subproduçom devido ao esgotamento dos recursos. Samir Amin afirmou que a melhor maneira de ser marxista é avançar a partir de Marx. O próprio Marx afirmou até 12 vezes que ele nom era marxista. A melhor maneira de sermos marxistas é aplicarmos o marxismo nas condiçons atuais, marcadas polos limites históricos do próprio sistema. É preciso mudar o modelo, nom chega com apelar a um capitalismo sem crescimento, porque isso nom pode existir. O consumismo é a base para manter a procura e através dela a produçom e os lucros. Certamente, há umha produçom supérflua, mas só erradicando o capitalismo poderemos encontrar a alternativa, já que de facto o capitalismo já deixou de crescer.

Fala-se de pôr os chineses e os indianos a consumir...

Mas isso significa pagar-lhes 1.000 dólares em lugar de 200 e assim, a economia capitalista chinesa deixaria de funcionar.

Estamos a entrar na crise de subproduçom porque o capitalismo nom pode desenvolver mais as forças produtivas.

O capitalismo vai cair por ele próprio?

O grave desta situaçom nom é se cai ou nom cai. O grave é que o capitalismo entra numha etapa de autodestruiçom, sem expansom das forças produtivas, iniciando-se a retraçom das mesmas. O capitalismo opera já como destruidora de força produtiva. Carece já de progressividade histórica, é já um retrocesso. A questom é que há que destruir o capitalismo porque existe o risco que se destrua sozinho, num processo de autodestruiçom que mate milhons de pessoas em todo o mundo. Isso obriga a um esforço voluntarista para evitar que se gere um nível de barbárie como nunca vimos. O aumento dos fascismos na Europa, como estamos a ver em França, é um grande perigo que pode estender guerras como a que acabamos de ver na Líbia. Há forças destruidoras latentes que podem desatar-se como já aconteceu noutros períodos históricos de decadência civilizacional. O Império Romano é um exemplo: os escravos nom tomárom o poder para construir umha sociedade melhor. Roma passou de 1 milhom a 30 mil habitantes em 400 anos, demorando 1.000 anos a reconstruiçom.

As experiências socialistas fôrom tentativas de ultrapassar o capitalismo.

No século XX vivemos umha tentativa de superaçom do capitalismo que, visto hoje

com perspetiva, dá para entender o fracasso. Aquele era um capitalismo sem crise energética, que ainda nom recorrera ao Keynesianismo, que tinha algumhas margens importantes, apesar da crise entre 1914 e 1945. Daí sai um capitalismo maduro que, nos anos 70, se converte num capitalismo velho.

“Há entre 3 mil e 4 mil milh rebelar-se contra o capitalis governos progressistas da expressom dessa incipient intermédias devido à impo essas masssas tomem diret popular foi suficiente para reacionária, mas nom para a Nas condiçons da Rússia de inícios do século XX, nom era possível derrotar o capitalismo, mas deviam tentá-lo. Nom se pensava nos desafios do capitalismo senil, da tecnologia, dos seus limites como sistema histórico... porque existia um peso cultural muito forte do próprio do capitalismo que levou os comunistas russos a proporem um modelo de consumo equiparável ao capitalista com um sistema produtivo socialista. O capitalismo armou-se como sistema num período de quase 1.000 anos, daí que nom seja tam fácil destrui-lo. O socialismo fracassou no século XX e é agora que a pró-


Opiniom

pria Rússia pode aspirar a dar essa luita. Trotsquistas como Mandel formulárom que depois de 1945 estávamos num capitalismo tardio e que foi derrotado pola traiçom da URSS estalinista. Eu acho que nom, que nessa etapa nom havia capitalismo tardio e sim socialismo temperao, imaduro, entre 1917 e 1980. De facto, no século XVII e XVIII também tinha havido capitalismo temperao. A primeira crise com algum cheiro pró-capitalista foi a chamada Longa Crise do Século XVII, que dura quase 100 anos e que destrui o pré-capitalismo na Europa, vindo o século XVIII da Revoluçom Francesa, chegando-se

“O capitalismo entra numha etapa de autodestruiçom, sem expansom das forças produtivas, iniciandose a retraçom das mesmas. Carece já de progressividade histórica, é já um retrocesso” à Revoluçom Industrial. Da mesma forma, o Século XX foi o do socialismo temperao. Porém, a chegada do socialismo é umha necessidade, mas nom umha inevitabilidade.

De onde podem vir as energias que empurrem esse socialismo necessário?

A irrupçom do proletariado tem a ver com a massa miserável urbana expulsa das áreas rurais e que já Marx avançou que estava obrigada a crescer e rebentar contra o sistema que a explorava. Porém, já no século XXI que vivemos temos umha massa mundial em expansom onde estám os 250 milhons de operários da China, 100 milhons de operários industriais do resto do mundo, os quase 2.000 milhons de camponeses pobres do mundo, “comerciantes” que nem chega a pequena burguesia, mas sub-proletariado... e umha massa de operários privilegiados de ocidente que se está a proletarizar e empobrecer na própria Europa e nos EUA. Falamos de entre 3 mil e 4 mil milhons de pessoas que devem rebelar-se contra o capitalismo realmente existente. Os governos progressistas da América Latina som umha expressom dessa incipiente rebeliom, com soluçons intermédias devido à impossi-

“O capitalismo armouse como sistema num período de quase 1.000 anos, daí que nom seja tam fácil destrui-lo” bilidade ainda de que essas masssas tomem diretamente o poder. A pressom popular foi suficiente para derrotar a burguesia mais reacionária, mas nom para armar revoluçons populares.

A ruptura ainda nom se produziu em nengum lugar... Onde poderá produzir-se?

hons de pessoas que devem smo realmente existente. Os América Latina som umha te rebeliom, com soluçons ossibilidade ainda de que tamente o poder. A pressom derrotar a burguesia mais armar revoluçons populares” Nom, nom, nem sequer na Venezuela, que é ainda um país capitalista. Pode suceder em qualquer lugar, incluídos os Estados Unidos. Nom há determinismos sociológicos aí. As massas muito empobrecidas que nom conseguem emancipar-se e outras com melhores condiçons mas com mais consciência. Pode ser na Europa, Argentina, Venezuela...

E pode nom ser?

Pode nom ser, como vemos em África.

Maurício Castro fai parte do Comité Central de Primeira Linha

Luzia Leirós Comesanha

Nº 64 Abril, maio e junho de 2012

5

A emancipaçom da mulher é umha luita das mulheres

O debate sobre se os homens deveriam assistir aos atos públicos feministas ou ser membros das organizaçons feministas está de atualidade no nosso país, mas nom é um debate genuinamente novo. Seria contraproducente para a luita das mulheres fazer ouvidos surdos ao fenómeno, porque se trata de um problema de fundo. Para introduzir o debate comecemos por perguntar a nós próprias porque as mulheres do Povo Trabalhador Galego precisamos umha luita própria. Iniciemos o debate sob a premisa de que o interesse que manifestam alguns homens polo feminismo, em nengum caso deve supor um retrocesso para o Movimento Feminista Galego (MFG). Nom deve supor a perda de autonomia das mulheres e das organizaçons feministas. O importante grau de visibilizaçom da luita feminista conseguida polo Movimento nas últimas décadas, o processo de institucionalizaçom do movimento feminista sufrido na Galiza e no Estado espanhol a partir da década de oitenta e noventa, como parte de umha estratégia imperialista desenhada para desativar o verdadeiro feminismo combativo, e converter as organizaçons feministas em ONG`s, ou o desconcerto teórico atual que vivemos na Galiza propiciado polas teorias pós-modernistas, podem ser pontos de análise do fenómeno. Mas neste artigo, o importante do debate será responder a pergunta colocada no início. O de como satisfazer esse interesse dos homens polo feminismo poderá converter-se, se o MFG chega a tal acordo, num ponto do dia da agenda feminista.

A auto-organizaçom das mulheres é imprescindível

A experiência histórica da luita das mulheres pola sua emancipaçom demonstra que o desenvolvimento da auto-organizaçom das mulheres contra o patriarcado foi imprescindível para conquistar os direitos civis e políticos que nos eram negados. A auto-organizaçom foi umha imprescindível ferramenta para o avanço do movimento feminista. Analisando o período histórico da sociedade capitalista que vai desde finais do século XVIII até a atualidade, deparamo-nos com que as mulheres, além de ter um papel destacado na luita contra o sistema capitalista, também necessitárom criar organizaçons, sociedades clandestinas, jornais, grupos de estudo, clubes revolucionários de mulheres e outros espaços próprios dirigidos por elas mesmas, para luitarem contra a opressom derivada da simbiose entre capitalismo e patriarcado. Assim, se olharmos brevemente a história da luita de classes dos últimos douscentos anos, observamos que a finais do século XVIII, na Europa, as mulheres obreiras e das classes populares organizavam-se como consequência da tomada de consciência da sua situaçom como exploradas e oprimidas, trás a agudizaçom das contradiçons inerentes ao novo sistema de dominaçom burguês e a apariçom da “mulher trabalhadora”. Mas, principalmente, as grandes massas de mulheres organizavam-se como ato de resistência às legislaçons dos novos estados capitalistas, que negavam os direitos civis e políticos alcançados polos homens e proibiam a sua participaçom na política, a sua filiaçom sindical ou a sua assistência a atos públicos. Mas também era umha resposta contra a negativa das organizaçons sindicais da altura dirigida por homens de filiar mulheres sob o argumento de “proteger os salários e os empregos”. Estas experiências de açom coletiva supugérom um salto qualitativo na luita contra a opressom, a exploraçom e a dominaçom das mulheres. Estas experiências

possibilitárom que o Feminismo, como movimento politico e ideológico, aparecera com força na cena da luita de classes. Os direitos feministas conquistados na Comuna de Paris de 1871, só se podem entender se lhe damos a suficiente importância a estas experiências de auto-organizaçom e resistência das mulheres trabalhadoras e dos setores populares. Exemplos a estudar em profundidade som a Uniom das Mulheres para a Defesa do Paris, as ajudas da seçom femenina da Primeira Internacional, o Comité de Mulheres para a Vigilância ou o batalhom feminino da Guarda Nacional, que luitou durante a última semana da Comuna. As importantes e históricas conquistas feministas emanadas da Revoluçom de Outubro de 1917 nom se podem compreender sem nom nos remetemos à experiência acumulada de três décadas de trabalho feminista em prol da consolidaçom de um movimento centrado na defesa dos próprios interesses da mulheres da classe trabalhadora e dos setores populares, no seio do movimento operário. Um dos acertos vitais das militantes socialistas foi impulsionar a criaçom de espaços próprios para as mulheres, onde poder analisar e refletir sobre os seus próprios problemas como mulheres trabalhadoras e elaborar as suas revindicaçons. A reuniom nom-oficial de 1896 liderada por Clara Zetkin à qual assistírom 30 delegadas de 14 países, propiciou que germinara o que posteriormente se consolidaria como Movimento de Mulheres Socialistas. Lá, Zetkin1 defendia a necessidade imperiosa de criar seçons, sindicatos, cooperativas e jornais feministas com os que articular umha poderosa ferramenta para erradicar as miseráveis condiçons de vida nas que viviam milhares de operárias na Alemanha. A sua acertada aposta pola organizaçom das mulheres trabalhadoras prosperou, e supujo que em 1907 houvesse a suficiente acumulaçom de forças para realizar a Primeira Conferência Internacional de Mulheres Socialistas. Nessa Conferência, as mulheres elaborárom as bases mínimas do seu modelo organizativo de âmbito internacional e plasmárom as suas revindicaçons a respeito do sufrágio e os direitos laborais. Em três anos, a participaçom das mulheres no movimento

revolucionário aumentou de forma espetacular, como deixárom patente os informes da Segunda Conferência Internacional de Mulheres Socialistas de 1910 elaborados por Alexandra Kollontai2. Mas nom só isso; o movimento de mulheres socialistas conseguira converter-se numha força social a ter em conta. As revindicaçons feministas tinham que ser escuitadas, materializadas e satisfeitas. Esta experiência proporciou-nos um decisivo avanço teórico, que possibilitou analisar a fundo a opressom patriarcal no capitalismo de mais de metade da força de trabalho. Também podemos tirar conclusons das nefastas conseqüências que supujo a eliminaçom durante o estalinismo destas estruturas revolucionárias centradas na emancipaçom e nos direitos das mulheres trabalhadoras. Em 1930, foi abolido o Secretariado Internacional de Mulheres Socialistas sob a palavra de ordem de que todas “as questons das mulheres” se resolveram. As conquistas feministas da Revoluçom de Outubro fôrom-se paulatinamente derrogando. O Gleichheit, órgao de expressom revolucionário e feminista alemám, passou a chamar-se Mundo Femenino e a incluir notícias de moda, conselhos caseiros e receitas de cozinha. Na Galiza, também podemos tirar conclusons respeito da importância da trajetória de auto-organizaçom das mulheres desde meiados da década de setenta, período onde datamos o nascímento do MFG. As estatísticas demonstram as vitórias acadadas polo Movimento e o grau de tomada de consciência por parte das mulheres do povo trabalhador galego respeito do controlo do seu corpo, da natalidade e da sexualidade. Entre 1975 e 2009 reduziu-se de 32,7 a 6,7 a taxa específica de fecundidade em mulheres menores de 20 anos e de 309,7 para 83 em mulheres menores de 30 anos. O índice sintético de fecundidade ou número meio de crianças por mulher passou de 2,4 em 1975 para 1,1 no 2009. A percentagem de maes nom casadas passou de 3,4 % em 1975 a 34,2% em 2009, e a idade meia da maternidade passou de 28,1 anos em 1975 a 31,6 anos em 2009. Também podemos tirar conclusons positivas sobre a incorporaçom das mulheres do povo trabalhador de maneira maciça à educaçom universitária. Assim,

no ano letivo 1971/1972 as mulheres representavam só 35,5% do estudantado, passando a representar mais da metade (52,3%) em 1980. A partir desta década a percentagem de mulheres matriculadas na Galiza sempre foi superior à dos homens, e nos últimos dez anos a percentagem de mulheres nunca baixou de 61%. Mas, também houvo mudanças significativas nos estudos maioritariamente realizados por homens. Nos estudos técnicos ou engenharias, o número de mulheres matriculadas aumentou 2.000% em vinte anos, passando de 170 mulheres matriculadas em 1980 a 3.240 no ano 2.000. Estes factos nom som outra cousa que a demonstraçom empírica da importante luita das mulheres pola sua emancipaçom como mercadoria sexo-económica, propriedade privada do patrom, do marido e do pai. Som as consequências de rebelar-se contra o destino ao que nos condena o patriarcado: nascer para ser boas maes e esposas. Som factos que demonstram que a auto-organizaçom e a autonomia das mulheres é imprescindível para avançar face conquistas feministas, onde nós, com as nossas próprias forças construamos a nossa resistência. Em palavras da feminista portuguesa Ana Barradas: “Só se pode concluir que a emancipaçom do género nom depende da benevolência dos homens evoluídos, mas da revolta em massa delas próprias”3.

A criaçom de espaços própios como meio de auto-afirmaçom

Em 1977, a fotógrafa e feminista alemá Marianne Wex editava o seu trabalho Recuperemos o nosso espaço: a linguagem corporal feminina e masculina como resultado das estruturas patriarcais. Através de um compéndio de milhares de fotografias sobre mulheres e homens na rua, demonstrou que os homens empregavam o espaço, abrangendo o máximo possível, e as mulheres ao contrário. Muitas vezes passa que numha assembleia de 300 mulheres e 3 homens, som esses três homens os que falam primeiro. Estes som exemplos que evidenciam como o patriarcado afeta de variadas maneiras a vida e os comportamentos das mulheres. Desde o nascimento, o patriarpassa à página 6


6

Nº 64 Abril, maio e junho de 2012

Opiniom

A emancipaçom da mulher é umha luita das mulheres Vem da página 5

cado ensina-nos, impom-nos socialmente, que as mulheres sejamos complacentes com os homens, que nom valorizemos as nossas capacidades fisicas e psicológicas, que tenhamos medo a confundir-nos ao falar e atuar em público, descartemos as nossas próprias opinions ou duvidemos no momento de expressá-las. Todo isto tem um objetivo: manter-nos em silêncio, submissas e obedentes, para que aceitemos com resignaçom ou de forma inconsciente todos os privilégios que os homens, tanto da classe dominante como os companheiros da nossa classe, conseguem com a nossa opressom patriarcal e exploraçom económica. Ainda, esta dominaçom educacional, cultural e ideológica converte-se numha barreira que propicia que as mulheres militem menos nos movimentos revolucionários e se interessem menos que os homens pola política. Ninguém sabe mais da opressom e exploraçom das mulheres que elas próprias organizadas à volta dos seus grupos conscientizados, e por extensom, ninguém poderia desenhar melhor a estratégia e tática a desenvolver para luitar contra o patriarcado. Por isso as mulheres do povo trabalhador como coletivo, precisamos de espaços próprios, isto é, exclusivo de mulheres, onde, por um lado, sirva para nos reafirmarmos como coletivo revolucionário que luite pola emancipaçom de género sob os parâmetros nacional e social, e segundo, onde se eliminen todas as influências que a presença masculina infringe sobre o nosso comportamento e a nossa espontaneidade.

O nosso direito à autodefesa

Os complexos sistemas de alienaçom e repressom com os que se dota o sistema patriarcal inocula-nos para sermos

submissas. Necessita que as mulheres acreditemos nisto para prolongar a sua existência, mantendo o monopólio da violência em maos dos homens. Mas, como qualquer povo oprimido ou como qualquer classe social explorada, as mulheres temos o direito à autodefesa e a legítima necessidade de o pormos em prática. As mulheres necessitamos acreditar que temos que autodefender-nos. Mas necessitamos acreditar, e acreditamos que nós sozinhas organizadas coletivamente, temos a capacidade de fazé-lo. Perante a nova ofensiva patriarcal, enquadrada na crise sistémica capita-

lista, que procura aumentar a mais-valia roubada, aumentar a nossa opressom, e reforçar o patriarcado através de multidom e perfeiçoados sistemas de dominaçom, as mulheres do povo trabalhador galego nom temos nada a perder, e mais, sabendo que estas agressons recrucedem-se ao serem aplicadas sobre as mulheres de umha naçom oprimida como a nossa. Quando eliminam serviços públicos que recaem imediatemente sobre as já de por si danificadas costas das mulheres. Quando se recrudesce a violência machista e aumentam os assassinatos de mulheres a maos dos seus moços ou ma-

ridos, porque estes sentem que possuem o corpo da mulher como o seu sumidouro onde tirar as frustaçons. Quando penalizam e proíbem o aborto e cortam em liberdades sexuais. Quando precarizam o trabalho das mulheres em nome da flexibilizaçom do mercado de trabalho. O nosso direito a autodefesa aparece como o facho que ilumina umha nova sociedade feminista. As manifestaçons feministas devem ser um espaço onde as mulheres tenham um papel protagonista. Devem conservar o seu papel de demonstraçom de força feminista, onde as mulheres berrem bem

alto que estám dispostas a plantar-lhes cara à ofensiva patriarcal e ao machismo. Devem conservar a sua componente pedagógica, a de ser umha experiência de reafirmaçom como coletivo e demonstrar que acreditamos na nossa capacidade para a autodefesa. 1 Só em combinaçom com a mulher proletária o socialismo será vitorioso. Clara Zetkin 1896. 2 A Primeira Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, Stuttgart. 1907 e a Segunda Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, Copenhague 1910. 3 O feminismo ainda nom começou. Intervençom de Ana Barradas nas VI Jornadas Independentistas Galegas, maio de 2002.

Luzia Leirós Comesanha é militante de Primeira Linha

LIVROS Emilio Salgari Marulanda y las FARC para principiantes Montanhas da Colômbia, Marquetalia Editores, 2011, 207 páginas

Carlos Morais Disparos vermelhos Compostela, Abrente Editora, 2012, 577 páginas

Franck Fischbach (coord.) Marx. Releer El Capital Madrid, Ediciones Akal, 2012, 160 páginas

O presente livro é um caderno de formaçom política da mais importante guerrilha da América Latina, as FARC-EP, a organizaçom político-militar comunista e bolivariana que leva já quase 50 anos a combater o terrorismo da oligarquia colombiana e do imperialismo ianque e luitando pola Nova Colômbia, a Pátria Grande latino-americana e o Socialismo. Ao longo das suas páginas, tratam-se diferentes aspetos da história e a realidade atual das FARC e do conflito colombiano, destacando a figura do seu histórico fundador Manuel Marulanda, estratega militar e dirigente comunista de importáncia mundial. O surgimento das FARC como auto-defesa camponesa contra a violência estatal na década de 60, a consolidaçom militar, política e organizativa posterior, as relaçons e as divergências com o PCC, o impulsionamento de projetos políticos de massas como a massacrada Unión Patriótica na década de 80, a negativa a renunciar ao marxismo revolucionário após a queda da Uniom Soviética e os cantos de sereia do pós-modernismo, e a resistência atual frente ao narco-estado terrorista que conta com o apoio do imperialismo norte-americano. As FARC-EP definem-se como partido comunista em armas e defendem a necessidade estratégica da tomada do poder, combinando no percurso face o Socialismo todas as formas de luita, posto que a luita armada, imprescindível num país onde militantes de esquerda, ativistas populares e o povo no seu conjunto estám em contínuo perigo de morte, sempre foi combinada com alianças políticas e sociais para permitir avanços populares e o retrocesso nas posiçons da oligarquia. Esta obra contesta a falácia mil e umha vezes repetida polos lacaios da burguesia e do império, e que pretende apresentar as FARC-EP como umha narco-guerrilha sem ideais nem objetivos políticos. Umha suja mentira que as organizaçons revolucionárias em todo o mundo devemos tombar, levando aos factos o internacionalismo proletário e a solidariedade com os e as heroicas guerrilheiras farianas. (Anjo Torres Cortiço)

“Três perguntas singelas de complexas respostas”, um dos textos de Disparos vermelhos (trocando “três” por “inúmeras”) poderia intitular o livro de Carlos Morais. 62 textos-rajadas certeiras, narram e analisam parte da nosso quotidiano político, tendo sempre presente a Memória da Naçom Galega, situando-nos na história e na geografia. “Somos um país periférico do centro capitalista”, construindo um mesmo discurso, defrontando esquerda real e a mediocridade imposta “na transiçom” que perpetuara “...desse modo os privilégios de séculos de exploraçom e opressom mediante a reforma pactuada do franquismo”. Disparos contra o tartufismo e timoratismo político dos renegados e colaboracionistas, contra as políticas conciliadoras. Eis o resultado, umha compilaçom de ensaios da nossa realidade sob a perspetiva marxista carente de qualquer complexo perante a decadência do sistema, anunciada e analisada desde as primeiras páginas, e a “manipulaçom do movimento de massas e fracasso da estratégia reformista” entendendo a crise, as crises a partir da praxe política das luitas obreiras e populares, sempre a partir da Galiza, mas também em escala internacional. Recende internacionalismo: “esse marxismo renovado nutre-se explicitamente do internacionalismo do Che Guevara” (no prólogo, Néstor Kohan) e em cada batalha sempre ideológica como rajadas vermelhas que percorrem a naçom mais ocidental da Europa e dá motivos, força e “razons para luitar na Galiza do século XXI”. A coerência de Carlos Morais é, sem dúvida, umha rica contribuiçom, desejo e realidade que fam parte e explicam a necessidade de acumular forças insurgentes -nom só discursivas-, para avançar face a Revoluçom Galega. Um marxismo que se nutre de todas as luitas e da mesma solidariedade internacionalista do Che como a ternura nutritiva dos povos. Arma-se, entre outras muitas cousas, das contribuiçons dos discursos internacionalistas que ele menciona com profundo agradecimento, de amigos-camaradas ou de camaradas amigos: “Os coentros de rebeldia também som condimentos imprescindíveis para a Revoluçom”, admiraçom e profundo agradecimento ao camarada Francisco Martins. Ou centram o discurso sobre Castelao (“nem manipulado nem idealizado”). Marxismo em cápsulas, com invólucros, “porque ser comunista e independentista nom supom nengumha contradiçom”, que possibilitam que todas as componentes necessárias ao discurso fiquem unidas numha peça imprescindível para facilitar o manejo do armamento ideológico. (Xavier Moreda)

Nos últimos anos, está a se produzir um regresso de Marx, ao nuclear da reflexom social e política. O seu nome desliga-se do chamado “socialismo real” e dos respetivos Partidos-Estado, deixa de se usar como ideólogo dum sistema mal denominado “comunismo” (versom planificada dumha economia que nom foi além do capitalismo). A “economia social de mercado”, a seguir à queda do muro de Berlim, tampouco foi soluçom e abriu-se passagem à ideia de que o modo de produçom capitalista poderia superar-se (rem, já que logo, de fim da história). Eclodírom e ecoarom umha série de movimentos sociais e políticos que punham em causa o capital financeiro, a desregulaçom dos mercados, o ganho sem limites, o fetichismo da mercadoria… (pugnavam, pois, por umha nova mundializaçom). Voltar a Marx é contribuir para a Crítica da Economia Política e armar-se frente aos que desejam refundir o capitalismo e corrigir os seus desmandos. O Capital está mais de atualidade que jamais. E a obra que se resenha vê de compreender tal livro na óptica do mundo de hoje, embora nom de forma dogmática e catequística, aliás pronta a complementar, modificar e assinalar erros. Um processo dialético que redescobre e nom considera o mesmo como intocável. Também nom participa da ilusom de que tudo está em Marx. E nom pensa, numha casta de religiosidade, que se tenha de recuperar o Marx prístino ao tempo que se renega dos marxismos. Marx nom é um clássico, está vivo, porque analisa a lógica dumha formaçom social que é ainda a nossa, a lógica do reinado da abstraçom do valor. Nesta coletânea, Jacques Bidet ocupa-se de camo transformar, e nom se restringir a interpretar; Emmanuel Renault da dialética; Guillaume Sibertin-Blanc da lei de povoaçom do capital, biopolítica do Estado, heteronomia da política de classe; Franck Fischbach de como o capital captura o tempo; Moishe Postone da teoria crítica e da reflexividade histórica; e Stéphane Legrand do sujeito de O Capital. (Domingos Antom Garcia Fernandes)

WEB Marcha Patriótica (Colômbia) http://www.marchapatriotica.org “Umha esquerda surgida das luitas sociais para acabar a guerra”. Assim se define, num texto publicado na página, o novo projeto político articulado em torno da Marcha Patriótica que a finais do mês de abril convocou dezenas de milhares de colombianos e colombianas para marcharem sobre Bogotá, reclamando reforma agrária, justiça social, o fim da repressom política e a superaçom da guerra com base numha verdadeira democracia na Colômbia.

Mais de 1.700 organizaçons populares aderírom à convocatória, que foi mais do que umha histórica mobilizaçom de massas pola mudança política. A vocaçom de se constituir em agente político ao serviço da maioria do povo, esse que é vítima do regime oligárquico, fica patente visitando o sítio da Marcha Patriótica na internet. Vídeos, textos, imagens, documentos, análises... Vale a pena entrar nesta página e conhecer a crescente dinámica de participaçom popular na Colômbia, que aposta na numha nova e definitiva independência e ameaça o poder oligárquico, o que já está a custar criminalizaçom e repressom aos coletivos promotores.


Internacional

O Movimento Occupy tem aberto as portas à conscientizaçom das massas, embora elemental ainda, ao afirmar que há quem explore e quem somos explorados/ as. Tem propulsado a unidade de açom de diferentes luitas e a solidariedade. Isto é fundamental por sentar as bases de um movimento revolucionário. A crise financeira e económica originada em Wall Street e propagada polo mundo inteiro, bateu no povo estado-unidense de maneira feroz. Os EUA nom só tenhem imposto as suas medidas neoliberais fora das suas fronteiras, como no próprio país. E agora, com a crise, estas medidas estám a gerar umha vaga de cortes massivos em todos os níveis. Basta com dar umha vista de olhos ao último censo populacional. Este refletiu que 150 milhons de pessoas -metade da populaçom- vivem na pobreza ou bem perto dela tratando de nom cair nela. Desde que começou a crise no 2007, os salários tenhem diminuído sem parar. Agora há 30 milhons de pessoas desempregadas ou subempregadas. A alta tecnologia aplicada à produçom aumentou extraordinariamente a capacidade produtiva da classe trabalhadora. E isto nom é umha condiçom transitória. É permanente e originou umha reestruturaçom do sistema capitalista. As destrezas da classe trabalhadora transferiram-se a máquinas ou a software, resultando num empobrecimento da mesma. A quantidade de empregos reduziu-se e os que existem som pior remunerados. Reduçons nos salários e em regalias como as pensons de jubilaçom, seguro de saúde, etc estám à ordem do dia. Este é a situaçom precursora do Movimento Occupy. Foi a 17 de setembro do 2011 que esta realidade literalmente explodiu. Milhares de jovens, na sua maioria brancos e de classe média, universitários/as, vírom que nom tinham o futuro que lhes fora prometido. Simplesmente nom há trabalho. De repente, experimentárom o que durante geraçons tinham experimentado as comunidades oprimidas: afroamericana, latina, indígena. É importante sublinhar a composiçom deste movimento na sua origem, porque ilustra o crucial da luita contra o racismo umha questom nacional. Sendo um movimento maioritariamente branco, nunca tinham pensado que nom encontrariam emprego ao sairem da universidade. Anteriormente, tinham três ou quatro possibilidades de emprego com salários altos e regalias. Já nom. Agora, talvez arranjem um emprego na Mac Donalds ou Burger King, vendendo hambúrgueres. As ocupaçons começárom na cidade de Nova Iorque, no Parque Zuccotti. “Indignados!”. Daí estendeu-se o movimento como pólvora para centenas de lugares um pouco por todo o país. Os meios de comunicaçom corporativos cobriam-nas, dia e noite, e em geral favoravelmente. Ganhárom a solidariedade das comunidades próximas e de quase todos os grupos progressistas. Eram umas mini-cidades com biblioteca, cuidado infantil e da saúde, assistência legal, comida, etc. Além do mais, cabe destacar nom só a mensagem de 99% vs. 1%, mas a forma mesma deste movimento. Era, e continua a ser, um embriom de Democracia Popular. Refletido sobretodo nas Assembleias Gerais.

Repressom

Mas este embriom de democracia popular era um verdadeiro desafio ao sistema de democracia burguesa, eleitoral. Entom começou a repressom. Antes de natal. Com a desculpa de fazer cumprir mandatos sanitários e de “qualidade de vida” para as comunidades circundantes, os governos locais de todas as cidades, de maneira quase coordenada, começárom a ordenar os despejos. O que a polícia cumpriu com prazer. Outra liçom na luita de classes! O papel do Estado. Desta vez, a liçom foi dada a porradas, com bombas lacrimogéneas, balas de borracha, ataques da polícia montada a cavalo ou em bicicletas, as tendas de campanha destruídas, os livros e outros pertences destruídos ou confiscados. Mais de 5.000 detençons e centenas de pessoas feridas. Proibiu-se à imprensa corporativa cobrir os despejos. Só os meios permitidos pola cámara ou a polícia.

Berta Joubert-Cec

Nº 64 Abril, maio e junho de 2012

7

O movimento de ocupaçons nos Estados Unidos, um processo histórico

No entanto, os meios alternativos, as redes sociais como Facebook e Twitter, enviavam mensagens constantemente e montavam videos ao vivo da violência. Milhares de simpatizantes reuniam-se em minutos para apoiar. Só com violência, barricadas enormes e presença policial constante conseguiu o Estado prevenir as ocupaçons nos sítios originais.

Expansom

No entanto, embora já nom fosse coberto polos meios comerciais, o Movimento Occupy (MO) estendeu-se. Agora a palavra ocupaçom é requisito obrigado em qualquer luita que se considerar séria. Há ocupaçons de comunidades, de escolas, de prisons, etc. Nom necessariamente quer dizer que tenha umha ocupaçom física, mas o termo fomenta a ideia. Iniciou-se a luita conjunta do MO com sindicatos, estudantes, contra os despejos de casas, e em pró de prisioneiros. Em Oakland, Califórnia, no passado novembro, o MO uniu-se ao setor mais militante do sindicato de estivadores, local 100, e fechárom o porto apesar de que a liderança nacional do sindicato recusava o fechamento. A ocupaçom é a ordem do dia. No setor da educaçom muito importante. Ao nom se precisar umha força de trabalho qualificada, o governo nom quer aprovar fundos para a educaçom pública desde nível primário até o universitário. Este ataque provocou o início de um movimento estudantil a nível nacional. A estudantes,

mestres/as e familiares vam-se somando sindicalistas e grupos progressistas. Há resistência e luita contra os despejos de casas pola execuçom de hipotecas. Contra os fechamentos dos correios. O governo projeta eliminar 200.000 empregos e fechar 223 (de umas 461) escritórios de processamento de correio. Sobre imigraçom: Há resistência contra as leis anti-imigrante que começárom um movimento primeiramente em cidades mais pequenas, e depois em estados como o Arizona. Jovens imigrantes indocumentados/ as começárom um movimento chamado “Dream activists”, por umha lei que lhes permita estudar em universidades. No 1º de maio, sobretodo na cidade de Nova Iorque, com a quantidade de imigrantes mais diversa do país, vai convocar-se umha jornada unitária em que os sindicatos vam unir-se à Coligaçom de Imigrantes 1º de Maio. Umha iniciativa sem precedente. Anteriormente, os sindicatos recusavam-se a se juntar ao movimento imigratório neste dia tam significativo para a classe trabalhadora. Isto é um efeito direto do MO. Anti guerra: A 20 de maio, o movimento anti guerra vai manifestar-se em Chicago contra a cimeira da NATO. Os e as jovens do MO participam na organizaçom deste confronto com os senhores da guerra. Assim, há inumeráveis exemplos de luita em que se unírom os esforços do MO com outros em luita. É umha grande esperança.

Antirracismo: umha questom nacional

O movimento, no entanto, nom é homogéneo e tem muitas contradiçons e carências. A mais importante e decisiva é a que atinge o problema do racismo. Os EUA nom podem ter um movimento que se chame revolucionário se nom entende e pratica a luita contra o racismo. Um país que se baseou e enriqueceu com a mao de obra escrava e imigrante, tem, por necessidade, que pôr a questom nacional, a luita contra o racismo, em local prominente. Se nom o figer, nom poderá ser vitorioso. Isto demonstrou-se no MO. Houvo incidentes de insensibilidade e de inclusive racismo contra pessoas afroamericanas e imigrantes. No entanto, estám a conseguir-se avanços, que embora lentos, proporcionam umha base para a unidade. O racismo está bem vivo nos EUA. Precisamente na quarta-feira 21 de março convocou-se umha mobilizaçom a nível nacional polo assassinato a sangue frio na Flórida do jovem afroamericano Trayvon Martin por um homem branco. Trayvon Martin saía de umha loja depois de comprar doces e vestia um abrigo com capuz. Algo aterrador do caso, além da morte, é que o assassino ainda se encontra livre e nom fôrom nem sequer formulados quaisquer cargos. Isto demonstra o grau de racismo no país. O facto de que o MO comece por jovens brancos/as assegurou em certa medida o seu desenvolvimento. Basta recordar os grandes movimentos militan-

tes de afroamericanos como os Panteras Negras, que foi exterminado. Igualmente o movimento portorriquenho, o mexicano-chicano e o indígena dos anos 19601970. A situaçom em geral do povo afroamericano é terrível. Som 12% da populaçom geral nos EUA, mas 40% da populaçom penal.

As tarefas do movimento de vanguarda em EUA

Em breve, as nossas intervençons nas luitas mencionadas som: Primeiro de Maio -criar as condiçons para a unidade de sindicatos, imigrantes e o MO sem perder combatividade; Anti guerra -luitar dentro do movimento trazendo posiçons anti-imperialistas, por exemplo, contra toda a intervençom imperialista contra a Síria, Irám, e antes contra a Líbia; Correios -organizar solidariedade com os trabalhadores e trabalhadoras; Antirracismo -alargar as luitas em solidariedade com a família de Trayvon Martin e orientar o MO para a luita de classes e a solidariedade com as comunidades oprimidas e a necessidade da liderança desde estas comunidades. Nom é só 99 contra 1%. É a classe trabalhadora e oprimida contra a classe capitalista. É o sistema de exploraçom capitalista o que implica o desemprego em massa, a desigualdade e a crise, e portanto, o que há que fazer é destrui-lo. Berta Joubert-Ceci fai parte do Partido Workers World/Mundo Obreiro dos EUA www.workers.org


Friedrich Engels

Jornal comunista de debate e formaçom ideológica para promover a Independência Nacional e a Revoluçom Socialista Galega

Edita: Primeira Linha. Redaçom: Rua Costa do Vedor 47, rés-do-chao. 15703 Compostela. Galiza. Telefone: 616 868 589 / www.primeiralinha.org Conselho de Redaçom: Comité Central de Primeira Linha. Fotografia: Arquivo Abrente. Correcçom lingüística: Galizaemgalego. Maqueta: ocumodeseño. Imprime: Litonor S.A.L. Encerramento da ediçom: 6 de maio de 2012 Correspondência: Rua Costa do Vedor 47, rés-do-chao. 15703 Compostela. Galiza. Correios electrónicos: primeiralinhagaliza@gmail.com / primeiralinha@primeiralinha.org / Tiragem: 3.000 exemplares. Distribuiçom gratuíta. Permite-se a reproduçom total ou parcial dos artigos sempre que se citar a fonte. Abrente nom partilha necessariamente a opiniom dos artigos assinados. Impresso em papel reciclado. Depósito Legal: C-901-1997

Defesa, resistência, ataque e insurreiçom

“A insurreiçom é umha arte, tanto como a guerra ou qualquer outra, sujeita a certas regras de procedimento que, se forem esquecidas, produzirám à ruína do partido que nom as respeitar. Essas regras, deduçons lógicas da natureza dos partidos e das circunstáncias com que se tem de lidar num tal caso, som tam claras e simples que a curta experiência de 1848 tornárom os alemáns bastante bem familiarizados com elas. Em primeiro lugar, nunca brincar à insurreiçom, a nom ser que se esteja completamente preparado para encarar as conseqüências da brincadeira. A insurreiçom é um cálculo com grandezas muito indefinidas, cujo valor pode mudar todos os dias; as forças adversárias tenhem toda a vantagem da organizaçom, da disciplina e do hábito da autoridade tradicional; se os insurretos nom lograrem reunir numerosas forças contra o inimigo, serám derrotados e aniquilados. Em segundo lugar, umha vez entrado no movimento insurrecional, agir com a maior determinaçom e na ofensiva. A defensiva é a morte de todo o levantamento armado; está perdido antes de ele próprio se medir com os inimigos. Cumpre surpreender o adversário enquanto as suas forças estám dispersas, preparar novos êxitos, ainda que pequenos, mas diários; manter a moral ascendente que o primeiro levantamento vitorioso forneceu; reunir, deste modo, do nosso lado, aqueles elementos vacilantes que sempre seguem o impulso mais forte e que sempre procuram o lado mais seguro; obrigar os inimigos a retroceder antes de poderem reunir as suas forças contra nós; das palavras de Danton, o maior mestre da política revolucionária até hoje conhecido: audácia, audácia e mais audácia”. Revoluçom e contra-revoluçom na Alemanha, setembro de 1852 "A única conclusom é que a defesa nunca deve ser passiva, que tem que extrair a sua força da mobilidade e passar à ofensiva enquanto se apresentar a oportunidade". A tática da defesa ativa, janeiro de 1857

ficha de solicitude nome e apelidos endereço localidade

código postal

correio electrónico

telefone

publicaçom solicitada

Recebe as publicaçons da Abrente Editora na tua morada preenchendo o formulário e enviando-o co justificante de pagamento da publicaçom ou publicaçons escolhidas à rua Costa do Vedor 47, rés-do-chao. 15703 Compostela. Galiza. Número de conta para o ingresso 2091 0387 423000009169 de Caixa Galiza-Compostela. Ao preço da publicaçom há que acrescentar 5 e por gastos de envio.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.